quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Recordar José Afonso


«A reedição de 11 discos de José Afonso e espectáculos musicais em várias cidades portuguesas e no estrangeiro contam-se entre as iniciativas a realizar, hoje, para assinalar os 25 anos da morte do cantor.
Lisboa, Grândola, Barreiro, Coimbra, Açores, Barcelona e Newark são alguns dos locais onde os 25 anos da morte de José Afonso são lembrados hoje,para manter «vivo o espírito do Zeca e a lição de dignidade» que transmitiu a todos, como disse à agência Lusa Francisco Fanhais, companheiro de cantigas e de estrada de José Afonso, no período antes do 25 de Abril de 1974 e actualmente dirigente da Associação José Afonso.
Considerado durante muito tempo um músico de intervenção, José Afonso é, para Francisco Fanhais e para o jornalista Viriato Teles, «muito mais do que um cantor ou um músico de intervenção».
Essa designação serve mesmo, para Francisco Fanhais, «para menosprezar toda a parte poética e musical que José Afonso revelou e é um álibi muito bom para que os divulgadores de música o possam banir com toda a tranquilidade».
«Cada uma das canções de José Afonso faz parte de um conjunto de grande valor musical e poético que, penso, está ainda por descobrir», disse Francisco Fanhais.
Também o jornalista Viriato Teles, autor do livro "As voltas de um andarilho – Fragmentos da vida e obra de José Afonso", considera que José Afonso «está ao nível de um dos grandes criadores musicais do mundo».
«Ao contrário do que habitualmente fazemos, que é compararmos os portugueses com artistas estrangeiros, eu acho que o Pete Seeger é o Zeca Afonso norte-americano», disse o jornalista, sublinhando que José Afonso «está ao nível de um Bob Dylan, John Lennon, Léo Ferré ou mesmo de um Jacques Brel».
Considerar a obra de José Afonso apenas do ponto de vista da cantiga de intervenção «é do mais redutor que existe, até porque mesmo nesse campo ele esteve sempre à frente do tempo dele», disse Viriato Teles à Lusa, acrescentando que a obra musical de José Afonso era «tão complexa do ponto de vista poético como musical».
in "AJA", 22 de Fevereiro de 2012

Canção da Paciência
Muitos sóis e luas irão nascer
Mais ondas na praia rebentar
Já não tem sentido ter ou não ter
Vivo com o meu ódio a mendigar

Tenho muitos anos para sofrer
Mais do que uma vida para andar
Bebo o fel amargo até morrer
Já não tenho pena sei esperar

A cobiça é fraca melhor dizer
A vida não presta para sonhar
Minha luz dos olhos que eu vi nascer
Num dia tão breve a clarear

As águas do rio são de correr
Cada vez mais perto sem parar
Sou como o morcego vejo sem ver
Sou como o sossego sei esperar

Muitos sóis e luas irão nascer
Mais ondas na praia rebentar
Já não tem sentido ter ou não ter
Vivo com o meu ódio a mendigar

Tenho muitos anos para sofrer
Mais do que uma vida para andar
Bebo o fel amargo até morrer
Já não tenho pena sei esperar

Letra e Música: José Afonso
Álbum: "Como Se Fora Seu Filho",1983

1 comentário:

  1. Muito!... Recordar José Afonso é recordar um dos ídolos da minha juventude. Corremos riscos, algumas vezes, quando a polícia política reprimia quem era contra a Ditadura e a Guerra do Ultramar,em situações que não vêm ao caso reportar, até porque envolvem pessoas ainda vivas... Porém, foi bom, podermos ter percorrido, ter acompanhado um pouco o trilho que o Zeca já vinha trilhando havia largo tempo. O grupo de que fazia parte quando era estuante de liceu - em termos de teatro - foi a Lisboa insistir com ele para vir a Faro nos ver representar a peça do Romeu Correia, "O Vagabundo das Mãos de Ouro". O Romeu, grande Romeu, genial dramaturgo e generoso amigo. E ele - o Zeca- esteve em Faro, no Liceu João de Deus nessa noite a assistir (quase em anonimato...) à nossa representação. No final, a pedido de nós e da assistência, com uma capa pelos ombros subiu ao palco, mas o combinado previamente era ele não proferir qualquer palavra em público. E ele cumpriu, com grande pena nossa!... Se não tivesse sido assim, provavelemnte teria sido preso (?) mais uma vez pela PIDE... O nosso Ídolo. o maior símbolo da nossa jubventude. Aquele que representava a resistência ao Regime através da canção. Pois... o José Afonso cantou "Olhão", a outrora "Vila da Restauração", meu berço natal! E outras cançõs de combate. Que emoção!... Passaram 25 anos sobre a sua morte! Parece-nos que foi ontem!... Viva José Afonso para todo o sempre!...

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