O que pensa Francisco: 5. sobre a Política"
Por Anselmo Borges
"O Papa Francisco não é ingénuo em relação aos políticos e ao poder, sobretudo
nas mãos de medíocres. Ainda cardeal de Buenos Aires, contava uma piada. "Uma
pessoa aparecia a correr a pedir socorro. Quem o perseguia? Um assassino? Um
ladrão? Não..., um medíocre com poder. É verdade: pobres dos que estão sob o
domínio do medíocre. Quando um medíocre acredita e lhe dão um pouco de poder,
pobres dos que estão sob a sua alçada. O meu pai dizia-me sempre: "Cumprimenta
as pessoas quando fores subindo, porque irás encontrá-las quando vieres a
descer. Não duvides"."
No entanto, somos todos animais políticos. Já Papa, respondeu a uma pergunta
sobre a formação dos jovens: "Envolver-se na política é uma obrigação para o
cristão. Enquanto cristãos não podemos lavar as mãos como Pilatos. Temos de nos
meter na política, porque a política é uma das formas mais altas da caridade,
pois procura o bem comum. Os leigos cristãos devem trabalhar na política. A
política está muito suja, mas eu pergunto: "Está suja porquê?" Porque os
cristãos não se meteram nela com espírito evangélico? É uma pergunta que eu
faço. É fácil dizer que a culpa é dos outros... Mas eu, o que é que faço? Isto é
um dever! Trabalhar para o bem comum é um dever para um cristão."
Então, o que se passa para que a política se tenha tornado suja? Os políticos
pensam mais nos seus interesses e nos dos partidos do que no bem comum. E "todos
temos tendência para ser subornáveis". Quando um agente da polícia manda parar
um automobilista por excesso de velocidade, "é provável que a primeira frase a
ouvir--se seja esta: "Como podemos resolver o assunto?" Faz parte da nossa
natureza, temos de lutar contra esta tendência para a recomendação, para a
cunha, para nos porem em primeiro lugar na lista." E há a tendência para "o
pecado do carreirismo". E há a desinformação: "Hoje, cada órgão de comunicação
social monta algo diferente com dois ou três dados: desinforma." E hoje importa
mais a imagem do que as propostas políticas: "Já Platão dizia, em A República,
que a retórica está para a política como a cosmética para a saúde." Isto é "um
pecado contra a cidadania". Vivemos numa sociedade de sofistas, na qual as
pessoas gostam de ser enganadas por discursos belos e falazes.
O cardeal acrescentava que a sua família materna é do lado radical e lembrava
as conversas do avô, carpinteiro, com o senhor Elpidio, vendedor de anilinas.
Afinal, tratava-se de Elpidio González, que fora vice-presidente da nação.
"Ficou-me gravada a imagem desse antigo vice--presidente que ganhava a vida como
vendedor. É uma imagem de honestidade."
É preciso trazer a ética para a política: urge reabilitá-la. Precisamente
porque "o amor social se expressa na actividade política para o bem comum", é
"necessário reverter o seu desprestígio". Essencial é o diálogo: "Diálogo,
diálogo, diálogo." O poder tem a sua legitimação última no serviço do bem
comum.
E a Igreja? Deve anunciar e promover os valores e denunciar as injustiças e a
violação dos direitos humanos: aí, o padre ou o bispo estão "a profetizar, a
exortar, a catequizar a partir do púlpito". Isto é política com maiúscula. "O
religioso tem a obrigação de definir os valores, as linhas de comportamento, da
educação." "O risco que os padres e os bispos devem evitar é o de caírem no
clericalismo, que é uma posição viciada do religioso." "A Igreja defende a
autonomia das questões humanas", não lhe competindo, por exemplo, pronunciar-se
sobre como o médico deve fazer uma operação. Na política, é preciso respeitar
uma "laicidade saudável", que respeite as diferentes competências. "O que não é
bom é um laicismo militante, que toma uma posição contra a Transcendência ou
exige que o religioso não saia da sacristia. A Igreja transmite os valores, e
eles que façam o resto."Religião e política estão ao serviço da comunidade. O religioso serve as
dimensões humanas para o encontro com Deus e a plenitude da pessoa e, assim,
"não é errado a religião dialogar com o poder político; o problema é quando se
associa a ele para fazer negócios por baixo da mesa". Ora, tem havido de tudo." Anselmo Borges em Artigo de Opinião, publicado no DN, em 21/09/2013