"Uma palavra. Disse-a. Amo-te - uma palavra breve. Quantos milhões de palavras eu disse durante a vida. E ouvi. E pensei. Tudo se desfez. Palavras sem inteira significação em si, o professor devia ter razão. Palavras que remetiam umas para as outras e se encostavam umas às outras para se aguentarem na sua rede aérea de sons. Mas houve uma palavra - meu Deus. Uma palavra que eu disse e repercutiu em ti, palavra cheia, quente de sangue, palavra vinda das vísceras, da minha vida inteira, do universo que nela se conglomerava, palavra total. Todas as outras palavras estavam a mais e dispensavam-se e eram uma articulação ridícula de sons e mobilizavam apenas a parte mecânica de mim, a parte frágil e vã. Palavra absoluta no entendimento profundo do meu olhar no teu, palavra infinita como o verbo divino. Recordo-a agora - onde está? Como se desfez? Ou não desfez mas se alterou e resfriou e absorveu apenas a fracção de mim onde estava a ternura triste, o conforto humilde, a compaixão. Não haverá então uma palavra que perdure e me exprima todo para a vida inteira? E não deixe de mim um recanto oculto que não venha à sua chamada e vibre nela desde os mais finos filamentos de si? Uma palavra. Recupero-a agora na minha imaginação doente. Amo-te. Na intimidade exclusiva e ciumenta do nosso olhar mútuo e encantado. Fecha-nos o lençol na claridade difusa do amanhecer, estás perto de mim no intocável da tua doçura. Frágil de névoa. Fímbria de sorriso e de receio, de pavor, no meu olhar embevecido. Uma palavra. A primeira que em toda a minha vida me esgotou o ser. A que foi tão completa e absorvente, que tudo o mais foi um excesso na criação. Deus esgotou em mim, na minha boca, todo o prodígio do seu poder. Ao princípio era a palavra. Eu a soube. E nada mais houve depois dela."
Vergílio Ferreira, in “Para Sempre”,1983 ,Quetzal Ed.
O Amor
O amor é
um nome de mulher
na boca de um homem.
um nome de mulher
na boca de um homem.
O amor é
uma flor perfeita
na lapela de um homem só.
uma flor perfeita
na lapela de um homem só.
O amor é
um continente sem fronteiras
para que tudo aconteça.
um continente sem fronteiras
para que tudo aconteça.
O amor é
a alegria do corpo
sem vergonha de amar.
a alegria do corpo
sem vergonha de amar.
O amor é
dividir somente
o que se pode partilhar.
dividir somente
o que se pode partilhar.
O amor é
uma cidade azul
no dorso de uma nuvem.
uma cidade azul
no dorso de uma nuvem.
O amor é
um rapaz loucamente
apaixonado por uma rapariga.
um rapaz loucamente
apaixonado por uma rapariga.
O amor é
tão fácil e tão simples
que até se torna difícil.
tão fácil e tão simples
que até se torna difícil.
O amor é
tudo aquilo que um dia
ganhamos coragem para ser.
tudo aquilo que um dia
ganhamos coragem para ser.
O amor é
gostarmos de nós
e sabermos porquê.
gostarmos de nós
e sabermos porquê.
José Jorge Letria, in "O Amor o que é?", com ilustrações de Catarina França
Não te rendas
Não te rendas, ainda é tempo
De se ter objectivos e começar de novo,
Aceitar tuas sombras,
Enterrar teus medos
De se ter objectivos e começar de novo,
Aceitar tuas sombras,
Enterrar teus medos
Soltar o lastro,
Retomar o vôo.
Não te rendas que a vida é isso,
Continuar a viagem,
Perseguir teus sonhos,
Destravar o tempo,
Correr os escombros
E destapar o céu.
Não te rendas, por favor, não cedas,
Ainda que o frio queime,
Ainda que o medo morda,
Ainda que o sol se esconda,
E o vento se cale,
Ainda existe fogo na tua alma.
Ainda existe vida nos teus sonhos.
Porque a vida é tua e teu também o desejo
Porque o tens querido e porque eu te quero
Porque existe o vinho e o amor, é certo.
Porque não existem feridas que o tempo não cure.
Abrir as portas,
Tirar as trancas,
Abandonar as muralhas que te protegeram,
Viver a vida e aceitar o desafio,
Recuperar o sorriso,
Ensaiar um canto,
Baixar a guarda e estender as mãos
Abrir as asas
E tentar de novo
Celebrar a vida e se apossar dos céus.
Não te rendas, por favor, não cedas,
Ainda que o frio te queime,
Ainda que o medo te morda,
Ainda que o sol se ponha e se cale o vento,
Ainda existe fogo na tua alma,
Ainda existe vida nos teus sonhos
Porque cada dia é um novo começo,
Porque esta é a hora e o melhor momento
Porque não estás sozinho, porque eu te amo
Retomar o vôo.
Não te rendas que a vida é isso,
Continuar a viagem,
Perseguir teus sonhos,
Destravar o tempo,
Correr os escombros
E destapar o céu.
Não te rendas, por favor, não cedas,
Ainda que o frio queime,
Ainda que o medo morda,
Ainda que o sol se esconda,
E o vento se cale,
Ainda existe fogo na tua alma.
Ainda existe vida nos teus sonhos.
Porque a vida é tua e teu também o desejo
Porque o tens querido e porque eu te quero
Porque existe o vinho e o amor, é certo.
Porque não existem feridas que o tempo não cure.
Abrir as portas,
Tirar as trancas,
Abandonar as muralhas que te protegeram,
Viver a vida e aceitar o desafio,
Recuperar o sorriso,
Ensaiar um canto,
Baixar a guarda e estender as mãos
Abrir as asas
E tentar de novo
Celebrar a vida e se apossar dos céus.
Não te rendas, por favor, não cedas,
Ainda que o frio te queime,
Ainda que o medo te morda,
Ainda que o sol se ponha e se cale o vento,
Ainda existe fogo na tua alma,
Ainda existe vida nos teus sonhos
Porque cada dia é um novo começo,
Porque esta é a hora e o melhor momento
Porque não estás sozinho, porque eu te amo
Mario Benedetti, em ” Poemas de Mario Benedetti”, Montevideo (Uruguai)
Optima selecção.
ResponderEliminarDe Vergílio Ferreira ao grande Mário Benedetti,o amor celebra-se sempre através da vida, do combate pela FELICIDADE.
ResponderEliminarUm conjunto de textos muito bem escolhidos. Só o amor nos redime!... Uma menção muito rápida e especial a esse belíssimo romance "Para Sempre" do Vergílio Augusto Ferreira, que teve um excepcional seguimento em "Cartas a Sandra"... Para nós, o "Para Sempre" é o mais bem conseguido livro do Vergílio. A propósito, ... Alguém sabe quem foi a "Sandra", personagem?... - Varela Pires
ResponderEliminarQuem será a Sandra? Mónica, Xana ,tantas mais personagens a quem escreveu cartas ou a mulher desaparecida? A escrita de Vergílio Ferreira nos últimos romances tem muito de autobiográfico. Quem será?
ResponderEliminarToda a escrita é autobiográfica. As personagens femininas na obra do Vergílio são uma e a mesma mulher/personagem , sempre renovada, desmontada, reconstruida, viva, literariamente acrescentada, prolongada, que teve o seu início, o seu protagonismo nos anos de juventude, na cmaradagem vivenciada do autor na velha Coimbra estudantil do seu tempo. - Varela Pires
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