Entrevista
Adriano Moreira. "O mau governo é o culpado da pobreza do país"
12 jun, 2015 • João Carlos Malta (texto) e Conceição Sampaio (imagem)
Portugal faz parte do
"Clube Europa" há exactamente 30 anos. Para Adriano Moreira, o pior
destas três décadas foi a adesão ao "neo-riquismo", um "vício
que não é aceitável" e que nos conduziu a uma "crise
brutal". "O principal problema da Europa é não ter conceito
estratégico", sentencia.
Em 1985,
Portugal era um país em transição. Da influência que exerceu em África, o país
passou a ser influenciado pela mão da Europa. Neste jogo de poderes, o
professor Adriano Moreira faz, na Renascença, um balanço sobre o mais e o menos
das últimas três décadas.
O ex-ministro,
antigo deputado e dirigente partidário não esquece a importância que a entrada
na Comunidade Económica Europeia (CEE) teve na passagem para a democracia sem
convulsões, mas lembra a humilhação de ver ministros portugueses a negociar com
funcionários de instituições internacionais durante a última intervenção da
troika.
Pelo meio, o
antigo presidente do CDS culpa o "mau governo" por empurrar o país
para um modelo em que a barriga cresceu mais do que os olhos podem alcançar. E
critica o "neo-riquismo" como um "vício" intolerável.
Qual o melhor e o pior momento destes
30 anos?
O melhor foi
a adesão, porque foi um grande amparo para que a vida politica portuguesa
evoluísse para o regime democrático sem grandes convulsões. E sem agressões. Há
vários líderes, mas, internamente, foi o general Eanes a peça fundamental para
transferir o poder militar tranquilamente para a organização constitucional.
O pior
momento foi aderir ao "neo-riquismo", o gastar mais do que os
recursos do país. Isso conduziu-nos à crise brutal que estamos a atravessar e a
um período insuportável para a dignidade internacional, que passa por ver os
ministros portugueses a discutir com empregados de organizações internacionais.
Empregados discutem com empregados e nós temos melhores [empregados] do que
eles nas universidades. Os ministros vão aos centros políticos. Para mim, o
poder da palavra deve vencer a palavra do poder.
Quando diz que o pior foi a adesão ao
"neo-riquismo", ele não era inevitável para pertencer a este grupo?
Era inevitável
com governos sem prudência governativa. Qualquer governo com prudência
governativa não se aventura com obrigações em relação às quais não tem
recursos. O "neo-riquismo" é um vício que não é aceitável em qualquer
governo. Não se pode substituir o credo dos valores pelo credo do mercado, sem
regulação ética.
Não é
preocupante a ideia da falta de legitimidade democrática em instituições que
tomam decisões muito importantes para os europeus como o Banco Central?
O principal
problema da Europa é não ter conceito estratégico. E são evidentes as divisões
que os factos vão impondo entre países pobres e ricos. O mercado sem ética não
é aceitável para quem, como eu, defende a doutrina social da Igreja.
Em
1985, Portugal era um país em transição. Da influência que exerceu em África, o
país passou a ser influenciado pela mão da Europa. Neste jogo de poderes, o
professor Adriano Moreira faz, na Renascença, um balanço sobre o mais e
o menos das últimas três décadas.
O ex-ministro, antigo deputado e dirigente partidário não esquece a
importância que a entrada na Comunidade Económica Europeia (CEE) teve na
passagem para a democracia sem convulsões, mas lembra a humilhação de ver
ministros portugueses a negociar com funcionários de instituições
internacionais durante a última intervenção da troika.
Pelo meio, o antigo presidente do CDS culpa o "mau governo" por
empurrar o país para um modelo em que a barriga cresceu mais do que os olhos
podem alcançar. E critica o "neo-riquismo" como um "vício"
intolerável.
Qual o melhor e o pior momento destes 30 anos?
O melhor foi a adesão, porque foi um grande amparo para que a vida politica
portuguesa evoluísse para o regime democrático sem grandes convulsões. E sem
agressões. Há vários líderes, mas, internamente, foi o general Eanes a peça
fundamental para transferir o poder militar tranquilamente para a organização
constitucional.
O pior momento foi aderir ao "neo-riquismo", o gastar mais do que os
recursos do país. Isso conduziu-nos à crise brutal que estamos a atravessar e a
um período insuportável para a dignidade internacional, que passa por ver os
ministros portugueses a discutir com empregados de organizações internacionais.
Empregados discutem com empregados e nós temos melhores [empregados] do que
eles nas universidades. Os ministros vão aos centros políticos. Para mim, o
poder da palavra deve vencer a palavra do poder.
Quando diz que o pior foi a adesão ao "neo-riquismo", ele não era
inevitável para pertencer a este grupo?
Era inevitável com governos sem prudência governativa. Qualquer governo com
prudência governativa não se aventura com obrigações em relação às quais não
tem recursos. O "neo-riquismo" é um vício que não é aceitável em
qualquer governo. Não se pode substituir o credo dos valores pelo credo do
mercado, sem regulação ética.
Não é preocupante a ideia da falta de legitimidade democrática em
instituições que tomam decisões muito importantes para os europeus como o Banco
Central?
O principal problema da Europa é não ter conceito estratégico. E são evidentes
as divisões que os factos vão impondo entre países pobres e ricos. O mercado
sem ética não é aceitável para quem, como eu, defende a doutrina social da
Igreja.
Apesar de estarmos há muito tempo na Europa, até há cerca de dez anos era
uma entidade abstracta de onde vinha muito dinheiro. Agora já começamos a olhar
mais para a dimensão política. Isso tem só a ver com a redução do número de
euros?
Sabe que a entreajuda deriva do facto de sabermos que a hierarquia dos
países já não depende da capacidade militar. É preciso ter capacidade
tecnológica. A Europa foi chamada "luz do mundo" e o avanço
científico e tecnológico é um património inestimável. Depois, vieram as ajudas
financeiras, o "neo-riquismo", veio o gastar mais do que havia em
disposição. Veio a evolução do estado para estado exógeno, ou seja, um país que
sofre consequências de decisões em que não participou.
Vivemos num estado exíguo que não tem recursos para os objectivos que tem de
cumprir. Qual é a causa principal disto?
Penso que foi o mau governo. Discute-se muito quais as causas da pobreza os
países, mas tenho sempre a ideia que entre as causas tem que se dar o lugar ao
mau governo. Um bom governo não permitiria uma política destas, que levou a uma
situação de fragilidade, sacrifício, fadiga financeira, desemprego, emigração e
quebra de natalidade.
O Conselho Europeu ainda é importante ou é uma mera caixa-de-ressonância da
vontade alemã?
Há um problema com certeza com o funcionamento da Europa e isso é
indiscutível. Isso é resultado da falta de conceito estratégico e faz com que o
embarque para um directório possa ser colectivo e venha substituir o regular
funcionamento dos regimes. Mesmo nos regimes democráticos, encontramos sítios onde
o conselho de ministros é importante e outros em que o presidencialismo do
primeiro-ministro é que é importante. A forma de governo, se não for cuidada,
degenera."RR
Sem comentários:
Enviar um comentário