"Como na esfera política, ensina-se a criança que ela é
livre, é uma democrata, dispondo de vontade própria e mente livre, morando num
país livre, e podendo tomar suas próprias decisões. Ao mesmo tempo, ela é
prisioneira das suposições e dos dogmas de sua época, que ela não questiona,
porque nunca lhe disseram que eles existiam. Quando um jovem chega à idade em
que precisa escolher (continuamos a aceitar sem discutir que a escolha é
inevitável) entre as artes e as ciências, ele costuma escolher as artes porque
julga que nesse campo há humanidade, liberdade e opção. Ele não sabe que já se
emoldurou ao sistema, não sabe que a própria escolha é resultado de uma falsa
dicotomia enraizada no coração de nossa cultura. Os que o percebem e que não
querem submeter-se a mais padrões, tendem a ir embora, num esforço meio
inconsciente e instintivo de encontrar trabalho onde eles, como pessoas, não
serão divididos entre si mesmos.“ Doris Lessing, in Prefácio d' "O Caderno Dourado" ,
Editora Record
Morreu Doris Lessing, “uma das grandes
vozes literárias do século XX"
A escritora britânica Doris Lessing,
prémio Nobel da Literatura em 2007, morreu, ontem, aos 94 anos
"Produziu
cerca de um livro por ano, em quase 40 de escrita. Nobel da Literatura 2007, a
britânica morreu ontem, aos 94 anos, em Londres
Poderia
ter sido médica e não se teria dado mal como agricultora. "E muito mais
coisas. Tornei-me escritora por frustração, motivo pelo qual, penso eu, muitos
escritores se tornam escritores." A entrevista à "The Paris
Review" é de 1987, vinte anos antes dessa notícia que chegou entre
alcachofras e cebolas, com a banalidade de uma ida rotineira ao supermercado.
"Sabia que ganhou o Nobel da Literatura?", pergunta-lhe o repórter da
Reuters. "Oh Christ", solta Doris acabada de chegar das compras,
voltando-se de imediato para trás para soldar a dívida da corrida com o
taxista. No ano seguinte, à revista "Time", Lessing desvaloriza a
invocação do nome do filho de Deus e a aparente excitação do seu desabafo.
"Se me é permitido ser mazinha, a Suécia não tem mais nada. Não há grande
tradição literária portanto tiram o maior partido possível do prémio."
Bastava então que o ouvido estivesse ligado até ao final da frase para perceber
que há poucas coisas mais aborrecidas que ser abordado quando há sacos para
descarregar. "I couldn't care less". Para
o bem e para o mal, a idade pouco ensina a amestrar os desencantos da infância
e no estádio de adulta manteve-se igual a ela própria: controversa, de língua
sem rédea e cabeça livre de restrições. "À medida que envelhecemos, não
ficamos mais sensatos. Ficamos irritáveis", dizem os cabelos grisalhos à
mesma publicação, indiferentes a cartas de apresentação dos senhores da
academia, que louvaram a autora de "épicos sobre a experiência
feminina", um sucedâneo de feminista, rótulo que a britânica enjeita - mas
que na verdade recusaria menos que a brandura do eufemismo.
Segundo Vinicius Jatobá,( escritor e crítico literário brasileiro), "a maior herança de Doris Lessing é uma
atitude: seus livros sufocam, constrangem, não negoceiam. E
isso porque sua grande cruzada sempre foi ideológica. Por trás de uma gramática
que engloba conflitos entre indivíduos e sociedade, entre assumir um papel e
uma responsabilidade determinada, seja no coração de uma família, como mãe e
esposa, ou perante um partido e sindicato, há uma escrita feita de uma pátina
de cores muito contrastantes - sem zonas de cinza. O que busca é retratar a
verdade por trás das grandes ideias, e palavras. Toda rudeza de sua literatura
é provocada por um compromisso inalienável com a verdade."
Nascida
a 22 de Outubro de 1919 em Kermanshah na Pérsia, actualmente Irão, Doris Lessing
é autora de uma obra vasta e diversificada com cerca de 50 títulos. Ficou
conhecida pela sua militância de esquerda, mas também pelas suas posições
anti-apartheid, anti-colonialistas e feministas." Artigo baseado em recortes da imprensa e outros
Primeiro Poema
A palavra , vida inteira, mata.
O seu silêncio não fala nem cala: ri.
Sem antes, nem depois, nem agora.
É o infalável que fala.
Não o ouças: ouve-o.
Oh, falar sem ouvir,
como ri o riso
pleno dos mortos
os meus e os teus mortos
debaixo de nós.
Manuel António Pina,1991 in " Primeiros Poemas - Todas as Palavras, poesia reunida" Assírio & Alvim, Abril de 2012
Celebrar Manuel António Pina
"Os 70
anos do nascimento do escritor, falecido o ano passado, serão assinalados com
diversas iniciativas que incluem leitura de poemas em cafés e locais que Pina
frequentava, no Porto.
Um
grupo de mais de 30 pessoas vai formalizar, em breve, a constituição do Círculo
Literário e Artístico Manuel António Pina, anunciaram à Lusa dois dos
fundadores desta associação, que pretende promover a figura do escritor e
jornalista.
O
anúncio é feito quando passam, nesta segunda-feira, 70 anos do nascimento do
escritor, falecido o ano passado, data que será assinalada com diversas
iniciativas que incluem leitura de poemas em cafés e locais que Pina
frequentava, no Porto.
Agostinho
Santos, artista plástico e jornalista, e Luís Humberto Marques, director do
Museu da Imprensa, afirmam que “o leque de fundadores ainda não está fechado”,
mas quiseram anunciar na altura do aniversário do escritor.
Os
artistas José Rodrigues, Armando Alves, Graça Morais, os jornalistas Sérgio
Almeida, Fernando Martins, Leite Pereira e Manuel Tavares, o director da
Faculdade de Belas Artes, Francisco Laranjo, o presidente da cooperativa Árvore
Amândio Secca, o subdirector do Museu Reina Sofia, João Fernandes, a presidente
do Instituto Politécnico do Porto, Rosário Gambôa, e os familiares directos de
Manuel António Pina, são algumas das pessoas anunciadas como integrando esta
iniciativa.
O
objectivo da associação é “promover sem fins lucrativos e por todos os meios ao
seu alcance, o desenvolvimento de actividades culturais e científicas
relacionadas com a vida e obra do jornalista e escritor Manuel António Pina”.
A
edificação de um busto na cidade, que conta com a oferta de José Rodrigues para
a concepção, é uma das primeiras iniciativas em ideia, revelou Agostinho Santos.
Hoje,
segunda-feira, dia em que o escritor faria 70 anos, o Museu de Imprensa promove
a leitura de dez poemas em sete locais frequentados pelo escritor, numa
iniciativa intitulada “7 X 10 - Homenagem a Manuel António Pina”, que inclui
também o descerrar de placas de homenagem.
O
périplo poético que, do Museu, passa, a partir das 12:00 horas, pela padaria
Ribeiro, Livraria Lello, café Piolho, estação de metro da Trindade, terminando
nos cafés Orfeuzinho e Convívio, local onde a leitura caberá ao actor António
Capelo. Neste local, haverá também um momento de fado, com Helena Sarmento, que
interpretará “saudades da Prosa, de Manuel António Pina. “Lusa
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