terça-feira, 15 de setembro de 2015

Assim vai o "sonho" americano

As primárias dos multimilionários
"Em 2012, Barack Obama e Willard Mitt Romney gastaram, cada um, cerca de mil milhões de dólares para financiar as suas campanhas presidenciais. O multimilionário nova-iorquino Donald Trump, em vez de pagar a sua quota-parte a um candidato, decidiu entrar ele próprio no jogo: «Eu ganho por ano 400 milhões de dólares, então que diferença é que faz para mim?»… Um outro multimilionário, Ross Perot, prometeu em 1992 «comprar a Casa Branca para a entregar aos americanos que já não a podem pagar». Provavelmente Trump vai, por sua vez, ser derrotado. Mas não sem antes ter esclarecido, à sua maneira, o funcionamento do sistema político norte-americano: «Eu sou um homem de negócios. Quando [candidatos] me telefonam, eu dou. Se preciso de alguma coisa dois ou três anos mais tarde, ligo-lhes e eles estão lá para mim». Hillary Clinton, antiga senadora de Nova Iorque e candidata às primárias democratas, também «lá» foi: «Disse-lhe para ela vir ao meu casamento, e ela veio. Sabe porquê? Entreguei dinheiro à fundação dela». Para conseguir um presidente incorruptível, sugere Trump, escolham-no a ele na lista dos grandes corruptores!
Uma sentença do Supremo Tribunal eliminou em 2010 a maior parte das restrições aos donativos políticos [1]. Desde então, as grandes fortunas exibem sem pudor os seus favores. Para explicar o número sem precedentes de candidatos republicanos à Casa Branca (dezassete), o New York Times revela que quase todos podem contar «com o apoio de um multimilionário, o que significa que a sua campanha já não tem uma relação real com a sua capacidade para angariar fundos dirigindo-se aos eleitores». John Ellis (Jeb) Bush já redefiniu a natureza dos «pequenos donativos». Para a maior parte dos candidatos, é menos de 200 dólares; para ele, menos de 25 mil dólares…
Três multimilionários – Charles e David Koch, Sheldon Adelson – tornaram-se, assim, os padrinhos do Partido Republicano. Os irmãos Koch, que detestam os sindicatos, pretendem gastar 889 milhões de dólares com as eleições do próximo ano, quase tanto como cada um dos dois grandes partidos. O governador do Wisconsin Scott Walker parece ser o favorito dos irmãos, mas três dos concorrentes deste responderam humildemente à convocatória que eles fizeram, na esperança de conseguirem também alguma parte da esmola [2].
Entretanto, o governador Walker está também a tentar agarrar Sheldon Adelson, a oitava fortuna do país e adorador do primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu [3]. Mais uma vez, ele não é o único a acarinhar o multimilionário octogenário. Há dois anos, Adelson considerava que os Estados Unidos deviam lançar mísseis nucleares sobre o Irão em vez de negociar com os seus dirigentes. Talvez os dezassete candidatos republicanos tivessem esta apreciação em mente quando debateram entre si a 6 de Agosto último. Em todo o caso, todos eles se opuseram ao acordo recentemente assinado entre Washington e Teerão.
Serge Halimi, Le Monde diplomatique – edição portuguesa, sábado 5 de Setembro de 2015
Notas
[1] Ler Robert W. McChesney e John Nichols, «Estados Unidos: media, poder e dinheiro completam a fusão», Le Monde diplomatique – edição portuguesa, Agosto de 2011.
[2] Marco Rubio, Ted Cruz e Rand Paul, respectivamente senadores da Florida, do Texas e do Kentucky.
[3] Ler «Netanyahou, président de la droite américaine?», La valise diplomatique, 4 de Março de 2015, www.monde-diplomatique.fr.

Sem comentários:

Enviar um comentário