sábado, 13 de junho de 2015

As Quedas de Água de Kalandula, uma das maravilhas de Angola



No céu  o reflexo do fogo
e as silhuetas dos homens negros batucando
de braços erguidos 
No ar a melodia  quente das marimbas
Poesia africana
Agostinho Neto, in " Para Além da Poesia , Sagrada Esperança", Clássicos da Literatura Angolana, Editora Grecima

                              Não sei se nada serei quando a morte me apanhar
                             Mas sei que tudo posso ser, enquanto a vida se celebrar.
                                                                                         MJVS

O Município de Kalandula situa-se a oeste/ Norte da Província de Malanje com uma superfície  de   70  mil  e    37  quilómetros  quadrados.  Está  sub-dividido  em  5  comunas (Kalandula, Kota, Kinje, Kateco Kangola, Kuale) e depois em regedorias.  
Com 18 regedorias e 548 sobas, a região tem uma população estimada  em 72 mil e 400 habitantes, uma notável singularidade já que era composta por 140.000 ,antes da guerra. A pequena vila de Kalandula dista cerca de 85 km de Malanje.
 Rua Principal e única de Kalandula ao entardecer
            Rua Principal  e única de Kalandula ao amanhecer

A magia do entardecer em Kalandula

Hotel Yolaka ,único hotel em Kalandula
Hotel Yolaka ,único hotel em Kalandula
A vila de Kalandula está construída em torno  da única rua , vinda do tempo colonial. Esta rua alberga a  administração municipal construída recentemente, o renovado palácio do administrador, o novo edifício da administração, o comando da polícia, algumas lojas comerciais, um posto de combustível e o único hotel. Não há indústria no município . É conhecido principalmente por um fenómeno natural: as Quedas de Kalandula, cataratas que são  as segundas maiores em África, depois das cataratas de Victoria, entre a Zâmbia e o Zimbabwé.
A identidade cultural  dos povos do Município de Kalandula é caracterizada por hábitos alimentares, práticas e costumes próprios e um pendor especial para o uso do instrumento musical Marimba.
A vila de Kalandula foi fundada a 02 de Setembro de 1929. A população dedica-se  à agricultura, pesca e caça artesanal.
No cimo de um belo planalto, a vila domina uma extensa savana onde a sinuosa linha do rio Lucala se distingue entre os  verdes tons de uma profusa e diversa vegetação.






Até 1975 teve a designação de Duque de Bragança, nome atribuído para homenagear o soberano português, Dom Pedro V, que tinha o titulo  de Duque de Bragança.

As quedas de água de Kalandula são as segundas maiores de todo o continente Africano, com um caudal  muito  forte de água, mesmo durante a época seca do Cacimbo. As suas águas alimentam o Rio Lucala e a enorme floresta da zona.


“Existem explicações diversas para a génese e morfologia das quedas de água. A formação de cada queda de água é detectada através da análise do  arcabouço estrutural , da evolução tectónica, da morfologia e dos processos erosivos.
Acerca destas quedas há poucas informações documentadas, poucos estudos. Pela análise do local, pode-se  concluir que as  quedas são de origem erosiva. Ao longo dos séculos, as águas foram moldando o local. Por esse motivo, as rochas são macias, redondas. É possível caminhar na base da queda de água", mas o caminho até lá é íngreme e escorregadio .


Estas quedas de água são um ponto de visita obrigatório para quem vem a Angola. Dizem os visitantes que as Quedas de Kalandula são das mais bonitas de todo o mundo.
 A vila de Kalandula dista das Quedas cerca de 8 km. Na estrada que  as une, está instalado um acampamento  de especialistas em desminagem. A guerra cega e  cruel deixou um rasto de terror  e perigo. Sendo a guerra civil uma atrocidade inclemente entre irmãos armadilhou fortemente este chão com um rol  de mortíferas surpresas. A maior parte dos terrenos que preenchem  o mapa de Angola está desminada. A desminagem foi uma das mais relevantes iniciativas  da última década, após a reconciliação nacional  cujo 13º aniversário se celebra neste ano de 2015. 
Fazer  este percurso  é, no entanto,  um exercício seguro e de intensa descoberta.
A meio caminho descortina-se uma neblina  que se eleva em gotículas como que a tentar iludir o visitante sobre o estado atmosférico. Não é o mau tempo instalado. Não é o nevoeiro a ofuscar . Pura ilusão. Só quem não sabe o que produz  a força da água quando se lança em queda livre para um abismo também de água feito. O choque faz volatilizar  a água e o resultado são as manchas  de pequenas  gotas agregadas em nuvens translúcidas e frágeis. Um espectáculo deslumbrante que nos transcende para lá da nossa pequenez terrena. Perante esta força, em estado puro,  qualquer  respiração se contrai em espasmos de assombro e de reverente encanto. 










Um miradouro, em ponto estratégico, oferece a quem  lá chega uma vista panorâmica deste extraordinário local. Em frente, distingue-se, na outra colina, o tosco de uma pousada projectada no tempo português. Arrogante desafia-nos a uma visita.  Os olhares que guarda sobre as quedas podem ser  o que resta para que se vislumbre o paraíso.

Aliciados partimos à descoberta.  Os guias, rapazes gentis e educados nas regras antanhas desta tradição milenar, acompanham-nos até ao local. São  25 km que se cruzam com aldeias remotas onde animais e crianças se misturam  à beira da estrada. As sanzalas de traça africana , exibem uma   população que  cuida da limpeza interior das casas ( ainda fiéis à cobertura de colmo) e dos espaços exteriores em pura terra batida.





Rebanhos de cabras, pescadores, agricultores das lavras com catanas, mulheres com os filhos às costas ou com enormes cestos à cabeça  vão surgindo ao longo da estrada. É o retorno ao tempo primevo, à forma inicial do homem  a viver daquilo que a natureza lhe oferece ou daquilo que semeia e labora na terra . Não há  parabólicas e nem sequer lá chega a electricidade. No entanto , em cada sanzala há o quimbo da conversa. É lá que se trocam ideias e experiências. Nada que se confunda com os tablets ou  smartphones que silenciosamente se manejam enquanto se espera uma refeição num sofisticado restaurante ou num modesto café, no robotizado mundo ocidental. Não . Aqui o tempo não parou. Apenas se deixa ir ao ritmo da vida que a terra permite e que cada um abarca.


A pousada está localizada numa extensa propriedade privada. Para aceder ao tosco que tem a vista ,espera-nos uma caminhada de cerca de trinta minutos. E o paraíso mostra-se. A água , em turbilhão, ecoa  numa  sinfonia  de estrondosa escala ascendente



Neste espaço aberto, chegam, nas palavras dos guias , as lendas, as crenças e as histórias que habitam o local. São as sereias que choram, os pescadores que enfrentam enormes crocodilos para protecção da pesca. É o pomar que tem frutos de todas as variedades , mas que mata quem se atreva a provar frutos diferentes.
Assim lhes contaram. Assim repetem os guias em lengalenga popular herdada de sábias e antigas vozes.


E se não é o Paraíso o que as Quedas de Kalandula deixam antever, é certamente, o simulacro  de um tempo virgem em que a natureza pródiga era o encanto maior do Homem.


E para complementar a informação sobre  as Quedas de Kalandula, uma das maravilhas de Angola, apresentam-se dois registos em vídeo.



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