"A
poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar
o mundo, a actividade poética é revolucionária por natureza; exercício
espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo;
cria outro. Pão dos eleitos; alimento maldito. Isola; une. Convite à viagem;
regresso à terra natal. Inspiração, respiração, exercício muscular. Súplica ao
vazio, diálogo com a ausência, é alimentada pelo tédio, pela angústia e pelo
desespero. Oração, litania, epifania, presença. Exorcismo, conjuro, magia.
Sublimação, compensação, condensação do inconsciente. Expressão histórica de
raças, nações, classes. Nega a história, em seu seio resolvem-se todos os
conflitos objectivos e o homem adquire, afinal, a consciência de ser algo mais
que passagem. Experiência, sentimento, emoção, intuição, pensamento
não-dirigido. Filha do acaso; fruto do cálculo. Arte de falar em forma
superior; linguagem primitiva. Obediência às regras; criação de outras.
Imitação dos antigos, cópia do real, cópia de uma cópia da Idéia. Loucura,
êxtase, logos. Regresso à infância, coito, nostalgia do paraíso, do inferno, do
limbo. Jogo, trabalho, actividade ascética. Confissão.Experiência inata.Visão,música, símbolo. "Octavio Paz, in " O
Arco e a Lira", Ed. Cosac Naify
O escritor argentino Julio Cortázar (1914-1984) referiu-se a este ensaio do grande escritor e poeta mexicano Octavio Paz (1914-1998) como “o melhor ensaio sobre poética já escrito na América”. A Música também é poesia , afirma Paz. Assim, se extrapolarmos estas palavras iniciais deste admirável texto para a Música, teremos uma mesma verdade. E a Música poderá ser oração, litania, pifania, presença, pão dos eleitos...Arte de falar em forma superior; linguagem primitiva.Obediência às regras; criação de outras...
E, partindo dessa verdade, descobrimos uma peça musical vestida de diferentes interpretações, em que a obediência às regras está presente, mas a criação de outras sonoridades transforma-a num acto de verdadeira libertação.
- "You'll Never Walk Alone"(1945), do musical "Carousel" de Richard Rodgers e Oscar Hammerstein, pela soprano Susan Bullok, nos BBC Proms de 2011.
- Na voz de Louis Armstrong, a mesma canção adquire um novo fulgor. Surge diferente, enroupada de outra graciosidade. Louis Armstrong , o mágico, criador de outros paraísos e fazedor de dias maravilhosos. What a wonderful singer!
- E, apenas no piano, a belíssima interpretação de Nina Simone.
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