"O
arquitecto brasileiro Oscar Niemeyer, que
morreu quarta-feira (5) aos 104 anos, foi um dos profissionais mais
premiados e influentes do mundo.
O seu
trabalho, sempre cheio de curvas em concreto que tornavam o seu estilo
inconfundível, marcou a paisagem urbana do Brasil e de outros países.
Nasceu
no Rio Janeiro a 15 de Dezembro de 1907. Desde criança que gostava de
desenhar e muito cedo decidiu estudar Arquitectura. Trabalhou com Lucio Costa
. O seu primeiro projecto individual a ser construído foi a Obra do
Berço, em 1937, no Rio de Janeiro - um edifício nitidamente influenciado por Le Courbusier.
Em 1940, Niemeyer conheceu Juscelino Kubitschek, na altura
prefeito de Belo Horizonte. A seu pedido, planeou o conjunto arquitectónico de Pampulha (1943).
Foi com esse projecto que "o mundo clareou". "Defendo
uma arquitectura diferente. Acho que a arquitectura não basta
servir bem ao homem. Ela tem de ser bonita e, para ser bonita, tem que ser
diferente, tem que criar surpresa, espanto. Tem de ser audaciosa. De modo que
adoptei um trabalho que é uma invenção."
Essa
obra foi importante também pela relação que estabeleceu com Kubitchek,
eleito em 1956 presidente do Brasil com o plano ambicioso de construir uma nova
capital numa região despovoada no centro do país. E convidou para essa
empreitada Niemeyer. O edifício do Congresso e o Palácio do Planalto são
alguns dos projectos que exemplificam bem o estilo de Niemeyer.
"Não é ângulo recto que me atrai, nem a linha recta, dura, inflexível,
criada pelo homem", explicava. "O que me atrai é a curva livre e
sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso dos
seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida. De curvas é feito
todo o universo."
Ele
achava que, apesar de todos os problemas que se vieram a revelar mais tarde,
Brasília tinha valido a pena: "Brasília deu certo, era isso que JK queria,
levar o progresso para o interior." "É uma cidade muito calma, muito
tranquila." Mas a sua cidade preferida continuava a ser o Rio de Janeiro:
"Eu gosto mesmo é do Rio. Do Rio da praia, dos amigos, de olhar para o
mar, de sentir que a natureza é fantástica."
Com
um passado ligado ao Partido Comunista, Niemeyer não escondia a sua
admiração por Lula. Numa entrevista no ano passado, dizia: "Continuo a
defender a mensagem básica que é possível reconhecer nos escritos de Marx - a
sua confiança no advento de uma sociedade mais justa e mais fraterna. Aprecio
muito a coragem política e a capacidade de resistência ao imperialismo dos EUA
de líder como Fidel, em primeiro, e Chávez. Não sou cientista
político, portanto, não posso avaliar 'tecnicamente' o grau de eficácia do
modelo político adoptado na Venezuela e na China."
Aos 95 anos começou a estudar filosofia. Niemeyer faleceu
às 21:55 horas de quarta-feira (23:55 em Lisboa), aos 104 anos
Um pouco por
todo o mundo, registaram-se muitas reacções à sua morte tais como:
"Neste
momento, não posso deixar de recordar as palavras do próprio Niemeyer que disse
'A vida é um sopro!' A vida do Arquitecto Óscar Niemeyer foi muito mais do que
isso e o seu legado será para sempre reconhecido" - Cavaco Silva, Presidente da República de Portugal
"A
carreira de Niemeyer foi excepcionalmente longa e ilustre, mas o que fez dele um
arquitecto de excepção não foi só o seu vigor e talento. Ele incutiu ao seu
trabalho um poderoso sentido de humanismo e envolvimento global" - Ban Ki-moon, secretário-geral da ONU
"Na
altura em que o pessoal da ONU em Nova Iorque é realojado de instalações
temporárias para o seu agora renovado complexo, maravilhamo-nos de novo com a
sua visão para criar um lar belo e inspirador, a partir da qual prestamos o
nosso serviço para toda a humanidade" - Ban Ki-moon, secretário-geral da ONU
Oscar
Niemeyer é "um arquitecto e um criador que domina o século XX e o princípio
do século XXI também", para além de ter sido " uma pessoa
encantadora", "realizada completamente com uma vida longa" - Álvaro Siza Vieira, arquitecto português
"A
preservação desta herança para as gerações futuras e fruição destes espaços
singulares (...) são o mínimo que podemos fazer para honrar este legado" -
Luigi Valle, administrador do grupo
Pestana, detentor da única obra em Portugal com o traço de Niemeyer, o
Casino Park Hotel, no Funchal
Niemeyer foi
"uma das grandes figuras da arquitectura do século XX, a par de Frank Lloyd
Wright, Mies van der Rohe e Le Corbusier" - Francis Rambert, director do Instituto
Francês de Arquitectura em Paris
Manuel Alegre compôs um poema para Óscar Niemeyer , após ele ter revelado numa entrevista
que tinha no seu atelier um poema do poeta emoldurado, a "Trova do Vento
que passa". Manuel Alegre enviou-lhe o poema inspirado na obra e na pessoa do mítico arquitecto brasileiro. Alegre e Niemeyer não se ficaram por esta troca poética,
ainda trocaram recordações e combinaram projectos em que ambos participariam, uma
revista que o arquitecto queria editar." Fonte: Imprensa
POEMA PARA OSCAR NIEMEYER
Gostava de estabelecer entre as palavras e o silêncio
aquelas proporções que Oscar Niemeyer consegue
entre volumes e não volumes
entre cheios e vazios.
Gostava de inventar linguagem dentro da linguagem
como Niemeyer inventa espaço dentro do espaço.
Mas como criar na escrita o nunca escrito?
Gostava meu caro Oscar Niemeyer
de pegar na caneta e fabricar um pouco de infinito
fazer com sílabas e fonemas
o que você faz com traços e com esquemas.
Mas eu não posso meu caro eu não posso ou não sei
construir uma cidade com poemas.
Tão pouco sei se Deus tem mão e se desenha
não sei sequer se existe ou simplesmente
deixou para Oscar Niemeyer
o oitavo dia da criação.
Mas é o que parece quando você faz um croqui
e depois é Brasília
uma catedral um museu uma mulher
ou uma casa em Canoas.
Com Oscar Niemeyer o Brasil é mais Brasil
o mundo se refaz se reinventa se revoluciona
contra a injustiça contra a opressão contra a fealdade.
Cada projecto seu é um acto de harmonia
traço a traço você subverte o espaço
e semeia a beleza na desordem estabelecida.
Consigo é possível a utopia
consigo a arquitectura é outra vida.
Manuel Alegre, 4/08/2003
Gostava de estabelecer entre as palavras e o silêncio
aquelas proporções que Oscar Niemeyer consegue
entre volumes e não volumes
entre cheios e vazios.
Gostava de inventar linguagem dentro da linguagem
como Niemeyer inventa espaço dentro do espaço.
Mas como criar na escrita o nunca escrito?
Gostava meu caro Oscar Niemeyer
de pegar na caneta e fabricar um pouco de infinito
fazer com sílabas e fonemas
o que você faz com traços e com esquemas.
Mas eu não posso meu caro eu não posso ou não sei
construir uma cidade com poemas.
Tão pouco sei se Deus tem mão e se desenha
não sei sequer se existe ou simplesmente
deixou para Oscar Niemeyer
o oitavo dia da criação.
Mas é o que parece quando você faz um croqui
e depois é Brasília
uma catedral um museu uma mulher
ou uma casa em Canoas.
Com Oscar Niemeyer o Brasil é mais Brasil
o mundo se refaz se reinventa se revoluciona
contra a injustiça contra a opressão contra a fealdade.
Cada projecto seu é um acto de harmonia
traço a traço você subverte o espaço
e semeia a beleza na desordem estabelecida.
Consigo é possível a utopia
consigo a arquitectura é outra vida.
Manuel Alegre, 4/08/2003
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