A NOVA NAU CATRINETA
(em redondilha maior como manda a tradição)
Lá vem a Nau Catrineta
que tem muito que contar!
Pegai, bardos na caneta,
há muito que anunciar!
Havia um lindo planeta,
muito bom de habitar:
nem estrela nem cometa
o podiam molestar.
Era limpo todo o ar
que ali se respirava!
Dava gosto ir ao mar
que era grande e ondeava!
O vizinho acudia
se ao lado alguém chorava:
no coração dele ardia
o desejo de ajudar.
Usava-se o necessário
que a terra boa dava,
mas sabia-se quão precário
era o bem que ali guardava.
E assim se foi vivendo,
com tal conta e medida,
que no mundo foi havendo
abundância bem sortida.
E ninguém ali buscava,
por mais que o desejasse,
ter mais do que precisava
p’ra que o ar se não estragasse.
Mas o bicho da ambição
deu aos homens tal saber,
tal desejo e compulsão,
que a terra deu em tremer!
Os rios e mares sujos,
atmosfera corrompida,
estes foram males cujos
frutos queimaram a vida.
Chegou o mundo a tal abismo,
tão perto de se perder,
que fico perplexo e cismo:
que futuro vai haver?
Estes foram os anúncios
que a Nau Catrineta trouxe:
os anúncios serão prenúncios
de Alguém com uma fouce?
12.04.2020
Eugénio Lisboa,
pedindo desculpa, pelo atrevimento, aos trovadores d’antanho que congeminaram os versos da primeira Nau Catrineta.
Lourenço Marques |
TOADA AFRICANA,
COM HEPTASSÍLABOS
EM FORMA DE ESCUDO
Ao João Filipe Bugalho
Há já muitos, muitos anos,
onde o espaço era imenso,
naqueles meridianos,
onde o sol era intenso,
naqueles anos, dizia,
em que a vida era doce
e o amor florescia,
por mais dura que fosse
a luta do dia a dia,
era ali que acontecia,
que tudo se dilatava,
que o tamanho aumentava
de tudo o que era bom,
que assim nos sustentava,
naquela imensa baía,
ouvindo, do mar, o som!
Tendo assim experimentado
o sabor do paraíso,
já não é, digo eu, preciso
temer o assalto tentado
pela peste que nos tenta:
ter vivido nos alenta!
O passado sempre conta
quando o vírus já desponta!
10.04.2020
Eugénio Lisboa,
que está muito consciente de que isto não é a “Toada de Portalegre”, dedicada ao Francisco Bugalho, mas é o que se pode arranjar nesta emergência e vai dedicada ao João Filipe Bugalho, que nos tem mimoseado com magníficos exemplos da sua arte consumada.
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