Manoel de Andrade é um renomado poeta brasileiro. Autor de várias obras de poesia e de um excelente volumoso livro de Memórias do período do seu exílio, no tempo da Ditadura que manchou de terror o Brasil, durante 21 anos(1964-1985), vive em Curitiba , no Paraná.
Actualmente , o Brasil está em constante tumulto provocado pela ganância que acometeu os governantes de um Partido do qual era esperada a humanização da política. As parangonas dos jornais congregam-se, diariamente, para noticiar novos escândalos fraudulentos sobre um povo indefeso e castigado. A injustiça social grassa e as assimetrias acentuam-se.
Homem de ideais, defensor da equidade social e da justiça laboral , Manoel de Andrade, o poeta da América Latina, escreve uma carta, em jeito de desabafo de um poeta, a um amigo jornalista que vive fora do Brasil.
"Frederico, meu caro,
não dá
mais para segurar essa bandeira. Não há mais governabilidade. A inércia vai
contagiando tudo. Todos nós, que acreditávamos num mundo mais justo,
esperávamos muito dos projectos políticos do Partido dos Trabalhadores, que
nos acenava com as melhores promessas da história republicana. Lula tinha apoio
popular para resgatar nossa maior dívida social, que é a reforma agrária, mas
não o fez quando tinha os movimentos sociais na mão. Incluiu, é
verdade, na economia, milhões de brasileiros, mas as estruturas não foram
mudadas, como, por exemplo, no México, em 1910, na Bolívia, em 52, e Cuba, em
59. Eu sei que aqui não houve uma revolução armada como lá, mas o grave é que o
decantado sonho socialista do PT, para o Brasil, até 2026, se transformou,
exclusivamente, numa dinastia partidária pelo poder.
As
reformas estruturais, e são muitas, não foram feitas. A desigualdade
social continua e a sociedade está despolitizada. Dilma ganhou as eleições com
uma margem muito pequena, e a vitória foi dada pelo Nordeste, num curral
eleitoral domesticado com Programas Sociais como o Bolsa Família, Bolsa
Escola, etc. Reconheço que são excelentes os programas como Minha
Casa Minha Vida, Pronatec, etc., mas, pelo desenrolar dos factos, tudo indica
que, maquiado pelas boas intenções sociais, havia uma busca de perpetuação
política inconfessável por trás de tudo isso.
O
governo do PT fomentou o consumismo, todos compraram carros, agora não podem pagar
e as montadoras estão demitindo. Ou seja, criou as ilusões transitórias do
consumo, as aparências pessoais, mas não promoveu políticas sociais permanentes
que garantissem a saúde, a educação, o saneamento, etc., para qualificar a vida
dos que realmente necessitam. Agora o governo federal está falido, os
investimentos foram zerados, as obras foram paradas e os programas sociais
atingidos. O desemprego cresce dia a dia e o povo não tem mais como apertar o
cinto. Infeliz de quem precisar da saúde pública. A população pobre está
entregue à própria sorte. É triste, dá vontade de chorar, ante as lágrimas
dessa pobre gente, agonizando e sem atendimento nas filas dos hospitais
públicos, sem médicos suficientes, há meses sem receber medicamentos, materiais
básicos, cancelando cirurgias vitais e remarcando consultas para o próximo ano.
Acabaram
com a Petrobrás e a dimensão crescente do escândalo está acumulando processos
de acionistas e investidores em todo o mundo.
Mas, além dela, há outras empresas estatais investigadas pela Operação
Lava Jato, porque a corrupção é sistêmica e está entranhada no poder. O
que fazer ante todo esse lixo moral espalhado na sala de visitas da nação
e exposto, pela mídia, ao mundo inteiro? Jogar as evidências para
debaixo do tapete, somente para salvar o governo, ou investigar e prender
corruptos e corruptores?
A
verdade é que o país já está à deriva. O governo está chegando ao fundo do
poço. Não temos mais credibilidade internacional. O apoio ao governo só
vem daquele núcleo duro do PT. Mas até quando essa gente, acuada pelos factos,
se manterá nessa trincheira? O problema não é mais ideológico. Por trás dessa
aparente cumplicidade política há uma militância sectária, impaciente e
violenta que continua manipulada, mamando e esperneando porque sabe que poderá perder suas
benesses.
Eu já
abri o olho e te recomendo que faças o mesmo. O governo do PT está virando um
castelo de cartas. Não dá mais para segurar. As denúncias são muito graves. Políticos
e empresários envolvidos, estão jogando a toalha. Cada dia surge um facto
novo. Você leu as revelações do Delcídio Amaral (ex-líder do PT, no Senado) na
revista IstoÉ?
Bem,
meu amigo, você, como eu, é homem de esquerda, que não negoceia suas convicções,
e por isso mesmo creio que não esperava esta minha reposta. Mas não se amofine
com a minha sinceridade. Você está no Chile e eu estou aqui, em Curitiba, na
“sede” da Lava Jato, no olho desse furacão político e a decepção é muito
grande. Se deu para engolir o Mensalão, o Petrolão está embrulhando meu estômago
e da nação. É duro, mas qualquer cidadão consciente está sem referência.
Por aqui, no mundo político, não se salva ninguém. O PSDB também está enrolado
com a corrupção no Metrô de São Paulo. Enfim, a cidadania está órfã.
Sou
contra o Impeachment, não pela incompetência da “Presidenta”, mas pelo respeito
ao povo que a elegeu democraticamente. E se não fosse por isso, seria porque não
há ninguém decente, na sucessão, para colocar no seu lugar. Sobretudo o PMDB,
com o Michel Temer, que histórica e fisiologicamente, é o partido mais corrupto
e oportunista da República. Estamos vivendo num mar de expectativas. As ondas do
escândalo varrem sem cessar as nossas praias. Vamos aguardar os próximos dias
para ver até aonde essas águas contaminarão nossos anseios e nossas decisões.
Um
fraterno abraço..., Manoel"
É um comentário honesto que infelizmente se perde no meio das baboseiras que os media multiplicam e fazem ressoar até chegar onde julgam que está a salvação; uma ditadura fascista militar ou não. Esta geração se calhar está a precisar de comer o pão que o diabo amassou tal como a nossa geração conheceu...
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