I
Meu irmão, recebeste a Palavra.
Meu irmão, recebeste a Palavra. O que a vida te escondeu, porque é a morte, revelou-to a morte, porque é a vida.
[Meu irmão], tudo neste mundo é símbolo e sonho - é símbolo tudo quanto temos, sonho tudo quanto desejamos. O universo inteiro, de que somos parte por castigo e erro, é uma alegoria cujo sentido hoje conheces visto que teus olhos, por fechados, estão abertos, e teus ouvidos, por oclusos, podem enfim ouvir.
Sabes já, meu irmão, visto que estás desperto que o sol é negro e a terra vazia; que o que amámos é o que desconhecemos, que o que sonhámos é o que conhecíamos.
Teu caminho agora é entre onde cessam os astros e a luz do sol não é lei nem dia. Que o Supremo Arquitecto dos Universos te dê a luz que te mostre a profundeza dos abismos e te permita não regressar senão para ser, quando houveres de o ser, nosso Irmão, nosso Juiz, e nosso Mestre; mas, se assim não for ainda, que a paz seja com o que tiveres que ser!
Ave atque vale, frater!
3-9-1934
in Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa . Teresa Rita Lopes. Lisboa: Estampa, 1990
P - Abri o átrio, Mestre do Átrio, e que o neófito apareça entre as duas colunas.
P - Abri o átrio, Mestre do Átrio, e que o neófito apareça entre as duas colunas. Parareis entre as duas colunas, e fareis o sinal da Ordem. Falareis quando vos for correspondido.
P - Que trazes, Mestre do Átrio?
R - Um neophyto, cego, nu e pobre.
P - Que quer ele?
R - A luz, o calor e a vida.
P - Onde quer ele a luz, o calor e a vida?
R - Nesta Ordem.
P - Que o neófito se adiante.
R - Está adiantado.
in Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa . Teresa Rita Lopes. Lisboa: Estampa, 1990
Roteiro maçónico de Lisboa: Nas ruas e praças de Lisboa, os repórteres Paulo Bastos e Emanuel Prezado foram à procura desses sinais visíveis. Uma reportagem TVI em 13- 1- 2012
III
P - Agora, que vos foi dada a luz, baixareis, porém, os olhos para o chão.
P - Agora, que vos foi dada a luz, baixareis, porém, os olhos para o chão. Não podeis ainda suportar a luz que vem do alto. Que vedes no chão? Branco e negro misturados. O que vedes no chão não é o chão que vedes, mas a matéria e (...) da vida. A vida é luz e sombra, dia e noite, trabalho e repouso, bem e mal.
Depois, entrareis este (...) sustentado por 3 colunas - duas que vedes bem, outra de que vedes só o topo [?] [...]. Estas colunas são as que, erguendo-se do olho divino, sustentam o tecto d'este templo onde vedes escritos os sinais do [...]. São elas a presença - da Verdade, do Bem e da Beleza.
Passastes também estas duas outras colunas que estão no Átrio d'este Templo, pois o sentido dessa, que não vistes, não vos será revelado agora. Baste-vos que passásseis cego entre elas e sem ter que conhecê-las.
Fernando Pessoa, in Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa . Teresa Rita Lopes. Lisboa: Estampa, 1990
Um olhar sobre Lisboa Simbólica
Cidades com seus comércios (...)
Cidades, com seus comércios (...)
Tudo é mesmamente estranho, mesmamente
Descomunal ao pensamento fundo
Estranhamente incompreendido.
Tudo é mistério, tudo é transcendente
Na sua complexidade enorme,
Um raciocínio visionado e exterior;
Uma ordeira misteriosidade,
Silêncio interior cheio de som.
Fernando Pessoa, in Fausto - Tragédia Subjectiva.
Fernando Pessoa. (Texto estabelecido por Teresa Sobral Cunha. Prefácio de
Eduardo Lourenço.) Lisboa: Presença, 1988
Ah, tudo é símbolo e analogia!
Ah, tudo é símbolo e analogia!
O vento que passa, a noite que esfria
São outra cousa que a noite e o vento
Sombras de vida e de pensamento.
Tudo que vemos é outra cousa.
A maré vasta, a maré ansiosa,
É o eco de outra maré que está
Onde é real o mundo que há.
Tudo que temos é esquecimento.
A noite fria, o passar do vento
São sombras de mãos cujos gestos são
A ilusão mãe desta ilusão.
9-11-1932
Fernando Pessoa , “Primeiro
Fausto” in Poemas Dramáticos . Fernando
Pessoa. (Nota explicativa e notas de Eduardo Freitas da Costa.) Lisboa: Ática,
1952 (imp.1966)
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