“Tão regrada,
regular e organizada é a vida social portuguesa que mais parece que somos um
exército do que uma nação de gente com existências individuais. Nunca o
português tem uma acção sua, quebrando com o meio, virando as costas aos
vizinhos. Age sempre em grupo, sente sempre em grupo, pensa sempre em grupo.
Está sempre à espera dos outros para tudo.
Somos incapazes de revolta e de agitação. Quando
fizemos uma "revolução" foi para implantar uma coisa igual ao que já
estava. Manchámos essa revolução com a brandura com que tratámos os vencidos. E
não nos resultou uma guerra civil, que nos despertasse; não nos resultou uma
anarquia, uma perturbação das consciências. Ficámos miseravelmente os mesmos
disciplinados que éramos.
Trabalhemos ao menos - nós, os novos - por perturbar
as almas, por desorientar os espíritos. Cultivemos, em nós próprios, a
desintegração mental como uma flor de preço. Construamos uma anarquia
portuguesa.”
Fernando Pessoa, O Jornal, 8-4-1915 (excertos), in "O Banqueiro Anarquista", Ed.Antígona
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