domingo, 15 de abril de 2018

Ao Domingo Há Música

Há uma música do povo

Há uma música do povo,
Nem sei dizer se é um fado —
Que ouvindo-a há um chiste novo
No ser que tenho guardado...

Ouvindo-a sou quem seria
Se desejar fosse ser...
É uma simples melodia
Das que se aprendem a viver...

E ouço-a embalado e sozinho...
É essa mesma que eu quis...
Perdi a fé e o caminho...
Quem não fui é que é feliz.

Mas é tão consoladora
A vaga e triste canção...
Que a minha alma já não chora
Nem eu tenho coração...

Se uma emoção estrangeira,
Um erro de sonho ido...
Canto de qualquer maneira
E acaba com um sentido!
                9-11-1928
Fernando Pessoa, Poesias Inéditas (1919-1930).  (Nota prévia de Vitorino Nemésio e notas de Jorge Nemésio.) Lisboa: Ática, 1956 (imp. 1990). - 102.

O Fado é a vaga e triste canção que  comove  muita da gente da minha terra. Tecido com a melodia das palavras , que  só os  poetas conhecem, ora  consola, ora embala. 
Hoje,  esta música do povo  chega nas vozes de Mariza e Camané, dois nomes maiores do Fado.

Camané, em Sei de um rio.

Sei de um rio…
Sei de um rio
Em que as únicas estrelas
Nele, sempre debruçadas
São as luzes da cidade

Sei de um rio…
Sei de um rio
Rio onde a própria mentira
Tem o sabor da verdade
Sei de um rio

Meu amor, dá-me os teus lábios!
Dá-me os lábios desse rio
Que nasceu na minha sede!
Mas o sonho continua…

E a minha boca (até quando?)
Ao separar-se da tua
Vai repetindo e lembrando
"Sei de um rio…
Sei de um rio…”

Sei de um rio
Ai!
Até quando?
Poema: Pedro Homem de Mello/Música : Alain Oulman


Mariza, em  Chuva.

Chuva
As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir

Há gente que fica na história
da história da gente
e outras de quem nem o nome
lembramos ouvir

São emoções que dão vida
à saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder

Há dias que marcam a alma
e a vida da gente
e aquele em que tu me deixaste
não posso esquecer

A chuva molhava-me o rosto
Gelado e cansado
As ruas que a cidade tinha
Já eu percorrera

Ai... meu choro de moça perdida
gritava à cidade
que o fogo do amor sob chuva
há instantes morrera

A chuva ouviu e calou
meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade
Jorge Fernando

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