Os portugueses ao longo da sua história sempre souberam sonhar a Liberdade, quer quando a não sabiam, quer quando a perdiam, quer quando a não ganhavam. A LIBERDADE encarnou tantos anseios e formas que se tornou, nos tempos modernos, um valor primeiro e fundamental para a Humanidade .
Liberdade encerra um conceito, uma ideologia proactiva e não pode restringir-se ao vocábulo, à palavra que se lance no ar e apenas se propague em ondas sonoras sem se corporizar efectivamente. É esse o grande problema que a rodeia e ameaça. Para muitos liberdade é ser gente, ser pessoa, ter voz e ter pão. Para outros é agir, expressar, viver uma vida para e com outros. Liberdade é tudo isso e muito mais, já que a Liberdade cultiva-se todos os dias vigilante e solidariamente.
Em 1640, a Liberdade de um país foi recuperada, mas a liberdade de um povo terá sido preservada? Expulsámos os Espanhois de Portugal. Repetiu-se a independência há quase 400 anos. E hoje estará o país livre, apesar de Abril ter existido? Possivelmente Não, se Liberdade significa autonomia, soberania, independência. Os défices, as Agências de Rating, o FMI, as Bolsas e as constantes oscilações do Mercado são os monstros redutores da Liberdade e os novos suseranos dos países. Hoje, neste 1º de Dezembro de 2010, o capital substituiu "Castela".
Cantiga de Abril
Às Forças Armadas e ao Povo de Portugal
“Não hei-de morrer sem saber qual a cor da liberdade”
Jorge Sena
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Quase, quase cinqüenta anos
reinaram neste país,
e conta de tantos danos,
de tantos crimes e enganos,
chegava até à raíz.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Tantos morreram sem ver
o dia do despertar!
Tantos sem poder saber
com que letras escrever,
com que palavras gritar!
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Essa paz de cemitério
toda prisão ou censura.
e o poder feito galdério,
sem limite e sem cautério,
todo embófia e sinecura.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Esses ricos sem vergonha,
esses pobres sem futuro,
essa emigração medonha,
e a tristeza uma peçonha
envenenando o ar puro.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Essa guerra de além-mar
gastando as armas e a gente,
esse morrer e matar
sem sinal de se acabar
por política demente.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Esse perder-se no mundo
o nome de Portugal,
essa amargura sem fundo,
só miséria sem segundo,
só desespero fatal.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Quase, quase cinquenta anos
durou esta eternidade,
numa sombra de gusanos
e em negócios de ciganos,
entre mentira e maldade.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Saem tanques para a rua,
sai o povo logo atrás:
estala enfim, altiva e nua,
com força que não recua,
a verdade mais veraz.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Jorge de Sena, 1974
Obras de Jorge de Sena, in "40 anos de servidão" , Edições 70 , 1989
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