De gatos falemos! De que mais havíamos de
falar? é este o título de um poema de produção ulterior à conclusão do opíparo manual felino que a editora Guerra & Paz acaba de publicar. O seu autor , Eugénio Lisboa, aprovaria o formato e a ilustração da obra que não teve tempo de folhear. É uma obra póstuma, de extraordinário fulgor e vivacidade, já que se trata de um precioso Manual prático de Gatos para uso diário e intenso.
O gato é uma beleza máxima que eternamente desafia, afirmava, com profunda convicção, este apaixonado poeta do feérico felino . A paixão e o fascínio por essa majestosa esbelteza eram tão intensos que, num texto de 2023, "Leonardo e o Gato", revela : “Leonardo não inventou o gato. Criou beleza como ninguém, congeminou engenharias, máquinas de guerra, aviões e conheceu a anatomia dos seres vivos, com uma abundância e minúcia que não tiveram nem antecedentes nem herdeiros. Mas não inventou o gato. O advento do gato é anterior ao advento de Leonardo. Como criador, Leonardo competiu com Deus e ganhou, mas nem Leonardo nem Deus criaram o gato. Quem criou o gato? É o mais indecifrável mistério do Universo. Há uma teoria que sustenta ter sido o gato que se inventou a si mesmo, visto não se conceber outro poder capaz de o fazer. Mas, quando observamos os olhos de um gato, tudo o que vemos é mistério insondável. (...) Quando Leonardo o viu, pela primeira vez, teve a mais singular e perturbante das sensações: um misto de deslumbramento e dor. Deslumbramento, porque nunca vira, na natureza dos vivos, uma tal esbelteza, uma tal perfeição, um tal acerto dos números. O gato era a fórmula final da perfeição."
E porque cantar o gato e tecer-lhe loas não é labor para qualquer métrica , apenas os rigorosos catorze decassílabos o servem. Assim confessa Eugénio Lisboa na Nota Introdutória ao felino Manual: "A majestade divina do gato exige uma oficina mais rigorosa e mais aristocrática: exige o formato mais nobre da poesia – o SONETO. O rigor, a densidade, o muito no pouco. A liberdade máxima conseguida dentro do mais apertado colete de forças: a prisão que não prende, mas liberta. Menos do que o soneto é muito menos do que o gato merece."
Os sonetos, que compõem o livro, são ilustrados por uma prole de formosos gatos que se irmana numa quase possível confraria a que a insigne Ísis, a gatinha de Eugénio Lisboa, preside.
É ela que, num rememorar do tempo primeiro, carregado de emoção, dá início ao Manual com o poema " A minha companheira Ísis", - Cabias na palma da minha mão/quando chegaste , naquela manhã./ Ver-te tão pequenina , que emoção,/ tu mínima e peluda castelã!
De 2012 a 2024, Ísis cimentou o seu lugar. Instalou-se, cresceu, deixou-se mimar e fez-se soberana até se tornar a grande e única companheira de Eugénio Lisboa.
No soneto " O gato é quem mais ordena", de 22.05.2023, é já a assertiva Ísis a ditar as directivas que podem conduzir à sabedoria e à felicidade do poeta:
Repousada no meu computador,a minha gatinha Ísis, repete-me,com assertividade e sem pudorque eu preciso dela e compete-meem tudo mas em tudo, obedeceràs suas directivas de felino.Só assim , felicidade e saberserão, de certeza, o meu destino.(...)
Da paixão inicial ao amor ilimitado, Ísis encheu páginas e páginas da vasta obra deste grande escritor.
O Manual é apenas um pequeno repositório, mas um repositório de grande sedução não fosse o GATO a única e exclusiva musa. Gato que se expande em vários representantes a quem o poeta dedica alguns dos sonetos. Ao fazê-lo, permite que o leitor conclua que existe uma rede de amantes deste singular animal que partilha, amiúde, essa grande admiração por esse ser perfeito que é Gato.
Ao longo da obra , vão surgindo poemas que, para além de todos os gatos vivos e não vivos do poeta, são dedicados a outros garbosos gatos dessa rede, tais como o Lindo, a Lua, a Matilde ou a Moon.
E se a construção da obra se fez em torno do Gato , a Ísis, inteligente gatinha, soube nomear Eugénio Lisboa ( informação fornecida pelo próprio) como seu director de recursos humanos para que nunca se deixasse de acreditar que : Amizade de gato é coroa / de grande glória e de aparato, / que não pode vir senão de gato/ e nunca por nunca ser, de pessoa!
No último soneto, A Ascensão do Gato, entroniza-se definitivamente o Gato, para que não persista qualquer dúvida:
(...)Conta-se que um dia , o Altíssimo,querendo a si próprio ultrapassar-se,congeminou um animal belíssimo,que o fez completamente babar-se !Chamou-lhe gato e este, olhando Deus,perguntou: És um dos criados meus?
O posfácio de Onésimo Teotónio de Almeida celebra o livro e celebra o brilhante intelectual, o singular escritor e o homem verdadeiramente grande que foi e sempre será Eugénio Lisboa.
As palavras esclarecedoras de Otília Pires Martins fecham o Manual . Algumas servem para dar nome e contextualizar as imagens dos gatos que embelezam a obra , outras vêm carregadas de uma verdadeira e longa amizade pelo colega, o Doutor Eugénio. E todas, em comovido e afectuoso uníssono, não deixarão de tocar profundamente qualquer leitor.
Manuel da Fonseca, o editor da Guerra & Paz, comprometera-se com a edição e publicação do livro com o poeta Eugénio Lisboa, em vida . Honrou esse compromisso e fez desta obra um belíssimo e saboroso presente de Natal, tal como ambicionava o seu autor.
Título: Manual prático de Gatos para uso diário e intenso
Autor: Eugénio LisboaCategoria(s): Ficção, Poesia, Sem categoria
Nº de Páginas: 92
Ano de Edição: Novembro 2024
Editora: Guerra & Paz
Preço: 18,00 €
Preço: 18,00 €
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