sábado, 30 de novembro de 2024

Os meus livros de Dezembro

Hoje, sugiro raridades para trocar entre amigos: antes que acabem. Obrigado por lerem esta newsletter

Os meus livros de Dezembro
Ah, e se o tamanho conta
por Manuel S. Fonseca
“O que eu gostava da Senhora Dona Agustina. Sem ela, talvez eu nunca tivesse sido editor. E é meia-mentira, porque devo à Senhora Dona Mécia, mulher de Jorge de Sena, como ela gostava de dizer, a outra metade de ser eu editor.
Mas o que eu queria dizer é que o tamanho conta e um centímetro faz cá – e lá – muita diferença. Ora, os primeiros livros que fiz com Agustina e Mécia eram quadrados perfeitos com 30 cm de largura por 30 cm de altura. São livros tão lindos que estão esgotados. E são irrepetíveis. Como os que agora apresento e que, felizmente, não estão esgotados e ainda podem oferecer este Natal.
Na imagem, à cabeça destes livros de Dezembro estão dois 30 por 30, que me trazem lembranças ternas. O Fama e Segredo na História de Portugal foi, ia jurar, o último livro que Agustina Bessa-Luís escreveu antes de ir para os grandes e etéreos salões onde deve haver bailes e bonecas como a que ela tinha, e me mostrou, tão grande e sem uma perna. Esse livro, como As Meninas, com Paula Rego, (o mais irreverente e tão picantemente provocatório ensaio sobre arte que o mundo já leu), como o Livro de Agustina, uma autobiografia em que aprendi e nunca me esqueço que «há poucos homens que saibam amar as mulheres e merecê-las», são todos encomendas minhas, muito conversadas em idas à Buenos Aires e até ao Gólgota, à casa e jardim tão bonito que Agustina cultivava no Porto.
Estes livros – o mais delirante livro sobre a história de Portugal, Fama e Segredo, aqui na versão grande e na edição de bolso, mas capa dura, as Meninas e o Livro de Agustina  foi o destino que os pôs na minha mão? E já ouço Agustina a segredar-me: «O destino não é uma fatalidade, é um conflito breve com um sonho.»
No meio da imagem dos meus livros de Dezembro está uma capa toda em ouro: foi a que eu quis dar ao Físico Prodigioso, de Jorge de Sena. Ai o tamanho! É mais de um metro de capa. Desdobra-se em quatro pastas, guardas pintadas pela Mariana Viana – o miolo também. O desdobramento da capa, diga-se, responde ao superlativo erotismo desta novela seniana. Leio O Físico e invejo-o ao vê-lo despertar com Dona Urraca a abraçar-lhe as pernas e a dizer-lhe: «És um deus, és um deus, és um deus.» Olho para esta edição de luxo e penso se não foi em Santa Bárbara, à conversa na cozinha com Mécia de Sena, que o sonho deste livro começou, e que as conversas com Isabel de Sena completaram.
De um erotismo mais directo, carnal e cama, a roçar uma ostensiva pornografia, é a poesia de Claude Le Petit, o último poeta a morrer numa fogueira em Paris. Sobre o seu O Bordel das Musas derramou-se, no entanto, a subtileza do traço a negro do escultor João Cutileiro. Como é que o convenci a fazer estes 22 desenhos (ou são mais?). Foi pela admiração que mostrei ao pingo de descontraída vaidade com que ele me mostrou o seu atelier em Évora? Sei é que os desenhos de Cutileiro conferem ao livro um erotismo de delicados lábios e lábil anca, que um delicioso emaranhado de cabelos – tantos cabelos – despenteia e… perturba.
Haverá um erotismo pessoano? Se há, foi o que a pintora Ana Vidigal encerrou, velado, a fazer o pino às escondidas, na pintura com que abriu Minha Mulher a Solidão, a antologia em que reuni toda a concupiscência de Fernando Pessoa. É o livro graficamente mais inventivo que o Ilídio Vasco, designer da Guerra e Paz, já fez.
Capas duras, papéis especiais, grafismo a rasgar como o vento, pintura, fotografias, lombadas a nu, eis o que todos os meus livros de Dezembro ostentam com pundonor. É assim, também, a edição especial do Ensaio Sobre a Cegueira, de José Saramago, com ilustrações do notável pintor que foi Rogério Ribeiro e que só pude publicar pela gentileza de Vasco Teixeira, da Porto Editora. Tudo já preparado pela mão hábil de editor, o meu amigo José da Cruz Santos. São os últimos exemplares.
Linda, com cartas e poemas, é a Contradança de Camões, com as ilustrações de Hans Huyghen van Linschoten, talentoso espião holandês na Goa do século XVI. Há contradança entre poemas e cartas, como há contradança entre as ilustrações,  os poemas e as cartas.
E são de Camões, as imagens que fazem o retrato do último livro que Vasco Graça Moura escreveu e me quis deixar: em Retratos de Camões, Graça Moura defende que talvez o único retrato verdadeiro do poeta seja o que dá capa ao livro «saído da mão do próprio Camões, num momento de narcisismo autocontemplativo».
Como  Fama e Segredo, de Agustina, como este livro de Vasco Graça Moura, também o Nacional e Transmissível, outro imponente 30 por 30, foi o último livro que Eduardo Prado Coelho escreveu antes de ir para a grande viagem – e tenho mais alguns «últimos livros» que muito prezo. O Eduardo vinha à editora tomar café e atacar um ou outro pastel de nata. O livro foi um desafio que lhe lancei: o que é mesmo ser português em 22 tópicos, do bacalhau às sopas e ao «senhor doutor». As coisas que, por serem nossas, nos amam. E, respondeu-me o Eduardo: «Ninguém gosta de não ser amado.»
Os meus livros de Dezembro são livros de amor, uns com mais beijos do que outros, lembranças de luxo em livros de luxo. São livros grandes, que se podem mesmo medir aos palmos, de um editor de palmo e meio.”
Manuel S. Fonseca, editor da Guerra & Paz

Pensamento do dia

Carta de Kafka ao amigo Oskar Pollak
“Penso que devemos ler apenas os livros que nos ferem, que nos apunhalam. Se o livro não nos acorda com um golpe na cabeça, por que o estamos lendo, então? Porque isso nos deixa felizes, como vós escreveis? Meu Deus! Seríamos mais felizes se não tivéssemos livro nenhum. E o tipo de livro que nos deixa felizes é aquele que nós mesmos facilmente escreveríamos se precisássemos. Mas nós precisamos dos livros que nos afectam como um desastre, que nos atormentam profundamente, como a morte de alguém que amamos mais do que a nós mesmos, como ser jogado numa floresta isolada de todos, como um suicídio. Um livro deve ser o machado que quebra o mar gelado em nós.”
Franz Kafka,  em carta a Oskar Pollak, amigo da época da escola, datada de 27 de Janeiro de 1904.

sexta-feira, 29 de novembro de 2024

A Floresta Adormecida

 
A Floresta Adormecida
por Raul Brandão
30 de Junho (1926)
“As Flores e o Corvo erguem-se uma defronte da outra, separadas por um canal de quinze milhas, o Corvo espesso e nu, as Flores violeta e verde com rochas violetas e os cimos dum pasto delicado. Pelos altos das falésias povoações esparsas, o Monte, a Fazenda, Cedros, Ponta Ruiva, entre colinas arredondadas e renques de hortenses que dividem os campos. Lá para o fundo três pináculos escuros e mais longe alguns cerros de um azul quase negro. A costa vai-se aproximando com saliências e negrumes, e o verde tenro das ervas cada vez mais tenro, destacando-se da massa espessa, onde emergem os píncaros cada vez mais escuros. Um esguicho de sol cai de entre nuvens pesadas, ilumina e doira, desfaz-se em poeira sobre o primeiro piano, enquanto o outro se conserva esfumado. Mais pesada é a massa dos montes, o recorte dos penedos; só a água dum verde-claro estremece a meus pés. Entramos pelas rochas afiadas do porto de Santa Cruz. Duas outras ruas muito limpas, a igreja, a praça, o convento, e logo por trás uma colina esmeralda de formas regulares e perfeitas como um seio túmido apontando o bico para o céu.
1 de Julho
Hoje, outro dia enevoado. Com este tempo turvo, amanhece tudo cheio de orvalho, as árvores, os milhos, o trevo em flor, as fitas prateadas da erva, cujas hastes estremecem e não podem com o peso. Olho num espanto a volúpia do monte verde cortado por sebes azuis de hortenses, com uma grande nuvem cor de chumbo em cima; a falésia monstruosa em roxo e verde, a luz carregada de humidade com clarões esbranquiçados de nevoeiro, que alastram e se desfazem em névoa peneirada e fina; o Corvo ao longe, desaparecendo na humidade e reaparecendo, quando a cortina se descerra – a fisionomia estranha da terra, a vida efémera da água, da chuva e do tempo fantasmagórico. O carácter desta paisagem é a serenidade com uma pontinha de tristeza...Sempre. enevoada e fresca, húmida, como aquele monte voluptuoso ao fundo, é uma paisagem casta, que se oculta e revela, uma paisagem feminina no momento único em que se desnuda com pudor. A chuva é leve, as névoas molhadas não passam de orvalho doirado que o sol ilumina e atravessa. E quando cai (cai muitas vezes), é em borrifos que vêm lá de cima de uma brancura, sobre o calor abafado. De repente aparece o Sol – de repente tudo muda à vista, como um cenário, tornando-se difuso e turvo.
As nuvens nos Açores têm uma vida extraordinária, uma vida que não percebo bem! Hoje uma sobre o Corvo lembra uma auréola magnética. Amontoam-se no horizonte, surgem outras em bando, esguias nas extremidades, a que chamam baleotes e que indicam mudança de tempo. Há-as escuras com claridades extraordinárias pelo lado de trás; há-as que viajam no céu com importância de deuses... Tenho a impressão de que há nas Flores a luz mais delicada dos Açores, a luz vaporizada que se sensibiliza a todos os momentos. É talvez da cor, que é única, do pó roxo, do verde dos pastos sempre tenro e uniforme – é talvez da mistura dos nervos do mar, da chuva de Verão, do sol que se desfaz em oiro sobre tudo isto, e destas nuvens mágicas que interceptam a luz ruborizando-se como grandes velários de cor – para logo se desfazerem diante de meus olhos em arabescos, em fios ténues, em farrapos... Todas as cores se fundem e acabam por se apagar em cinzento, deixando só resquícios na atmosfera húmida. Nunca assim vi ambiente tão rico em prestigio, sempre diverso e sempre em movimento. É o cinzento que predomina – mas um cinzento colorido onde bóiam cores húmidas, principalmente o verde e o violeta –jorrando, atabafando em pardo e violeta montes verdes a escorrer. Éo que dá prestigio a esta terra molhada, onde o próprio sol parece molhado molhado e doirado, tão leve que mal trespassa o cinzento... Então, um momento iluminado, o panorama respira, arfa devagarinho como um seio, ainda orvalhado do banho e aquecido pelo Verão, ruborizado e sorrindo por ter de despir a camisa diante da gente. Outras vezes tudo desaparece ou toma proporções fantasmagóricas e a água goteja doirada. Água, ar e bruma intimamente se casam para produzirem esta impressão casta e cinzenta ou toda violeta como a obra de arte de uma individualidade estranha.
Esta atmosfera explica que a ilha esteja quase toda a regime pastoril. Deixam de cultivar os campos para obter mais erva: é o menor esforço. O gado que não dá leite, farta-se e engorda para o mercado. Anda durante o Verão, dia e noite, nas relvas; só de Inverno o trazem para a porta e o metem nos palheiros. Quase não há lavrador, mesmo pobre, que não tenha três vacas leiteiras. Erva – erva – erva fofa que cresce, é logo devorada e sai pelas tetas dos bichos. De todo este verde casto brota, incha, corre um jorro constante de leite que todos os dias se transforma em manteiga. Não se vê correr como as águas da Fazenda ou da Ribeira, mas o seu volume é muito maior. Carne e leite, eis o resultado do calor abafadiço e da nuvem persistente que cobre a ilha e não a larga, amornando-a e humedecendo-a. Todas as aldeias do litoral, viradas para o mar, têm uma dúzia de campos de milho e de batata-doce e cultivam alguns olheiros de inhames necessários para a sua alimentação. O resto é pasto. À volta e sempre, relvas, ondulações verdes de colinas. Dão leite os montes e vales, e até dão leite as crateras dos pacíficos vulcões, que às vezes abrigam uma aldeia no seio. Um grande jorro branco corre de toda a parte para as fábricas, se transforma em manteiga e é embarcado para esse mundo. A grande canseira da lavoura florentina é ordenhar duas vezes por dia as vacas enormes que trazem a rasto um úbere monstruoso como uma doença. Da transparência verde e oiro, mágica e aérea, toda molhada e calma, com grandes píncaros aparecendo e desaparecendo nas nuvens desgrenhadas – quase imaterial – sai leite branco e tépido, como se o ar, o verde, a chuva, os clarões esbranquiçados, a atmosfera móvel, se convertessem em leite, e esta fantasmagoria cinzenta e roxa que a gente só vê nas nuvens fugidias, doiradas pelo sol e que arremedam todas as imagens, fosse gerada de propósito para ama de criação. Tudo tende para o mesmo fim. A erva vê-se crescer dum dia para o outro, regada pelo céu e sob uma luz velada de estufa. Por isso aquele grande monte voluptuoso se me afigura simbólico. É um seio que se tumifica: do bico apontado para o céu escorre um jorro perene de leite.
(…)
Subo lá acima àquele seio túmido e doirado, cuja pele atinge a magnificência dos veludos. Lá do alto abrange-se parte da ilha, os vales cheios de árvores, a costa recortada, os grandes plainos do fundo retalhados como uma manta pobre, farrapo mais claro de trigo, farrapo amarelo de centeio já maduro. Às vezes vem do mar um chuveiro e toda a amplidão desmaia ou se turva e afasta. Entre a cortina vaporosa distingo o dorso arredondado das relvas, uma casota branca donde irrompe um cedro dum verde de sepulcro, riscos escuros de pinheirais, e pouco a pouco desvendando-se, toda a amplidão sossegada, o anfiteatro da Ribeira de Barqueiros, a chapada quase negra da falésia, o Corvo violeta, e a meus pés a vila em relevo. A impressão é de frescura e calma, de névoas misturadas de oiro. Esta paisagem molhada e verde é vaga como um sonho: entreabre-se, fecha-se, sorri e adormece... Um silêncio enorme (todos os ruídos são abafados pela névoa), uma amplidão de ervas gotejando, uma luz serena e toldada.
Duas estradinhas de alguns quilómetros acabam logo ali, uma no Boqueirão, outra na Ribeira da Cruz, seguindo por entre casinhas brancas, quintalejos, hortas, milhos envernizados de novo, renques de faias formando abrigo para o vento. Pastos e mais pastos, e os tourinhos deitados na erva com a barriga cheia e que já não podem comer mais. Todos os bichos estão fartos. Dos taludes rebentam moutas de sardinheiras, pés de malvões ou de hortenses viçosas. Mais postos sempre... É o paraíso das vacas: negras, amarelas, malhadas, com uma grande dignidade e o sentimento da sua importância, tomam o caminho, com o extremo das pontas doirado e os úberes enormes a rasto pelo chão. Outras afogam-se na erva tenra e comem e digerem, dormem e comem de dia e de noite, olhando quem passa com desprezo. Por um rasgão vê-se o mar espelhado onde a luz esbranquiçada das nuvens se reflecte, e lá no fundo a Ribeira de Barqueiros com um biombo de montes muito verdes. Todos os tons do verde estão aqui representados, cheios de viço e frescura − o verde-azul e derretido nos fundos, o verde-escuro dos lagos de inhames, o verde macio das relvas, o verde-negro das faias, apagados e fundidos no orvalho. Em direcção oposta segue outra estrada pelas Alfavacas, cultivadas a milho, a batata-doce e a tabaco, disposto em linhas regulares e com as folhas pontiagudas entreabertas. Sempre a mesma humidade e a mesma cor... E este verde sossegado insinua-se pouco e pouco e pacifica. Fica-nos na retina a cor verde e nos ouvidos a flauta afastada dos melros que assobiam sem interrupção no arvoredo formando biombo aos campos de milho. Esta linda estrada estaca de repente diante da falésia e em frente da baiazinha de S. Pedro. Espero o pôr do Sol doirado por trás das nuvens cinzentas, espero a irrealidade do crepúsculo nesta luz sempre cheia de surpresas. A costa para o nascente desdobra-se em cinzento, em roxo e negro no primeiro plano, com uma grande nuvem cor de chumbo a desfazer-se-lhe em cima e um rasgão de céu mais alto e claro, de planície etérea cor-de-rosa. Da névoa esfarrapada sai um clarão de fogo – riscos de oiro atravessam a poeira incendiando tudo em explosão. Por baixo a falésia alta derruba-se sobre o mar, com filamentos verdes derretidos nas águas. No segundo plano o azul mistura-se ao roxo e ao negro requeimado de grandes penedos. E no fundo anda pó verde do mar entranhado no pó roxo que dilui tudo na mesma tonalidade – as águas, o céu, as rochas aguçadas e dramáticas. Mais um momento e o drama chega ao auge: um crepúsculo em que a gente vê as cores despenharem-se num abismo uma atrás da outra – o azul, o roxo, o lilás, enquanto o horizonte se incendeia. Tudo isto, diante dos meus olhos deslumbrados, escurece, torna-se violeta, afoga-se em névoa, morre num estertor violeta e cinzento. E, por trás dos montes já negros, levanta-se, aumenta e nunca mais cessa a fumarada prodigiosa das nuvens...”
Raul Brandão, in As Ilhas Desconhecidas, Quetzal Editores

Em três linhas
"Este livro é feito com notas de viagem, quase sem retoques. Apenas ampliei um ou outro quadro, procurando sempre não tirar a frescura às primeiras impressões. Tinha ouvido a um oficial de marinha que a paisagem do arquipélago valia a do Japão. E talvez valha... Não poder eu pintar com palavras alguns dos sítios mais pitorescos das ilhas, despertando nas leitores o desejo de os verem com os seus próprios olhos!..."
1926.
R.B ( Raul Brandão)

quinta-feira, 28 de novembro de 2024

As palavras de Churchill e a vitória dos aliados

 
                           Winston Churchill,30 de Novembro de 1874 - 24 de Janeiro de 1965) 
As palavras de Churchill ajudaram na vitória dos aliados na Segunda Guerra?
"Não tenho nada a oferecer senão sangue, trabalho, lágrimas e suor".
"No discurso inaugural como primeiro-ministro do Reino Unido, em 1940, Winston Churchill apontou como as palavras teriam papel importante, durante a sua liderança, no combate  a Hitler e à Segunda Guerra.
Este e outros discursos memoráveis de Churchill testemunham a importância dada pelo estadista à retórica. Com apenas 22 anos, por exemplo, ele escreveu: "De todos os talentos concedidos aos homens, nenhum é tão precioso como a graça da oratória. Quem dela desfruta possui um poder mais duradouro do que o de um grande rei".
Mas falar publicamente não foi algo natural para Churchill. 
Saiba como ele superou ridicularizações e problemas na fala para ser um dos oradores mais reconhecidos da política mundial.
Língua presa
Churchill odiava a sua língua presa quando estava na escola, tentando eliminá-la com exercícios.
Mas, quando já era primeiro-ministro, ele percebeu que a característica poderia ser uma arma no esforço de guerra ,  dando-lhe uma marca autêntica em transmissões de rádio. Então, suas dentaduras eram confeccionadas de forma a preservar a língua presa.
Um conjunto de dentaduras do estadista foi leiloado em 2010 pelo valor de cerca de 15 mil libras ( cerca de 17.995,00 Euros). Outro conjunto está hoje no Museu Hunterian, em Londres.
"Estes são realmente os dentes que salvaram o mundo", diz Jane Hughes, representante do museu. "Eles foram vitais no esforço de guerra"
Um orador disciplinado
Quando Churchill se tornou primeiro-ministro, logo reconheceu a importância da oratória em inspirar uma nação em guerra. Inicialmente, ele enfrentou críticas sobre a sua oratória e vocabulário, frequentemente vistos como antiquados. Mas eventos traumáticos durante o verão de 1940 levaram o drama a um nível que foi ao encontro da prosa do estadista.
A informalidade não era uma característica de Churchill - na verdade, ele gastava muito tempo preparando e treinando a sua fala. Era uma forma de superar o nervosismo em falar publicamente, algo que ele sentiu desde cedo.
Diferente de muitos políticos modernos, Churchill não contava com redactores de discursos. Ele era o dono de sua palavra, defendendo que "a história será gentil comigo, porque eu pretendo escrevê-la".
Rascunho e versão final do discurso de Churchill de 18 de Junho de 1940;
estadista formatava textos em formato de 'salmos'
| Foto: Churchill Archives Centre, Churchill College,
Cambridge, reproduzido com a permissão de Curtis Brown, London

Ele foi um grande escritor, ganhando o prémio Nobel de Literatura em 1953. Entre seus métodos revelados, escrevia  o texto em formato de salmos. As passagens fraseadas ajudavam-no a manter uma cadência na fala, entremeada por um ritmo próprio e pausas dramáticas.
Ele também usava uma linguagem emotiva e metáforas, além de estimular fortemente a imaginação dos ouvintes - quase simulando a presença destes no campo de batalha. Dominava ainda a arte da aliteração (repetição em sequência de algum fonema), frequentemente repetindo as palavras mais sonoras para maximizar o impacto.
As palavras e a batalha
Provavelmente, o mais famoso discurso de Churchill foi o de 18 de junho de 1940, quando a Grã-Bretanha ficou sozinha na guerra, após a derrota da França, que teve parte do território ocupado pelo exército alemão.
Cópias do discurso hoje alocadas na Universidade de Cambrigde revelam quanto tempo o estadista gastou fazendo rascunhos e mais rascunhos dele.
Allen Packwood, director do sector de arquivos relacionados a Churchill na universidade, explica como o político editou o discurso até o último minuto.
"A página é coberta por anotações suas feitas à mão. Ele sabia do peso daquilo, mas foi capaz de produzir o discurso naquele momento de extremo stress", explica Packwood.
Hoje, o discurso ganha crédito importante por dar ânimo ao Reino Unido, nas vésperas do combate  aéreo entre alemães e britânicos sobre as águas do Canal da Mancha. Mas, segundo o pesquisador Stephen Bungay, a reação inicial ao discurso foi muito entusiasmada.
"Churchill falou na Câmara dos Comuns, à tarde, e a transmissão aconteceu à noite. O seu secretário escreveu que 'ele havia falado pior do que na ocasião anterior'. O parlamentar Harold Nicolson disse que Churchill soou 'péssimo'. Para Cecil King, proprietário de um jornal, ele (Churchill) soava como quem estivesse doente ou bêbado. Churchill falou o tempo inteiro enquanto fumava um charuto, o que somado à sua antiga dificuldade em pronunciar a letra 'S' pode ter feito parecer que ele estava bêbado", diz Bungay.
Apesar do cepticismo inicial, as palavras de Churchill inspiraram os britânicos e, para vários historiadores, teve papel relevante em impulsionar a vitória dos aliados na Segunda Guerra.
Um relatório do Ministério da Justiça britânico (Home Office) apontou que o discurso foi considerado "corajoso e esperançoso". A popularidade também cresceu, de acordo com uma pesquisa da empresa Gallup - que indicou uma taxa de aprovação de 88% em Julho.”
BBC, 11.02.2018

quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Parabéns, Mãe!

 

Tudo é incerto neste mundo hediondo, mas não o amor de uma mãe.
James Joyce
Os braços de uma mãe são feitos de ternura e os filhos dormem profundamente neles.
Victor Hugo

Não queria começar pelo estado do mundo. Não, querida mãe. Hoje era o dia  do seu aniversário. Ao longo da sua vida viveu um difícil  tempo de após guerra mundial e soube como o mundo foi hediondo durante a segunda guerra mundial. O Homem não tem memória e repete-se em vil e tenebrosa acção. Vivemos tempos  muito  tempestuosos com várias partes do mundo em perigosas guerras. Uma delas na nossa velha Europa. Essa, querida mãe, é uma guerra dura sem explicação para os tempos hodiernos. A ilimitada gula de um homem pelo poder  leva-o a   invadir  e destruir um  outro país vizinho e soberano. Uma atrocidade para a  heroica Ucrânia e a mais infame vileza de  Putin, o hediondo invasor, governante russo . 
Tenho a certeza de que as lágrimas lhe correriam ,com abundância , perante as imagens que os media vão divulgando. São imagens terríveis.  Tudo isto compõe o nosso mundo de agora.
Que falta nos faz a sua presença. Seria tudo mais fácil  e o dia de hoje dar-nos-ia a oportunidade de nos agregarmos em torno da mãe. Como era e sempre foi fácil mimá-la. 
Neste dia, cultivávamos a celebração da vida pela vida. A mãe sempre nos ensinara a celebrar essa dádiva maior: A vida. E pela vida, fomos aprendendo a justeza desse louvor.  Era a mãe a maior impulsionadora. Cobria-nos de surpresas sempre que um aniversário eclodia. E num gesto de ternura  , como lhe era característico, reunia todos em uníssono festejo. 
O sorriso era uma constante  no seu rosto. Um sorriso que vinha de dentro e que nos aquecia e fortificava. 
Não sei se igual sorriso terei tido e tenho  para meus filhos e netos. Mas sei que tentei caminhar no seu rasto. A sua imagem não esmorece no meu coração.
Sei também  que todos nós, seus filhos, sentem os seus braços de terna protecção como o modelo  que se fez e faz luz na vida de cada um.   
Que saudade, querida mãe. Os nossos parabéns.

Interlúdio Musical

Uma voz que, em qualquer género, é sempre Voz.
Andrea Bocelli & Chris Stapleton ,em Il Mare Calmo della Sera (Lyric Video) .
 
Andrea Bocelli & Shania Twain, em Da Stanotte in Poi , (de This Moment On). (Official Lyric video).
   
Andrea Bocelli & Dua Lipa , em  If Only (Official Music Video).
 
Andrea Bocelli & Cecilia Bartoli, em  Pianissimo (Official Music Video).
 

terça-feira, 26 de novembro de 2024

As vítimas inocentes

 
O Homem: questão para si mesmo. As vítimas inocentes
por Anselmo Borges
“Quando olhamos para os horrores do mundo hoje, concretamente para a Ucrânia e o Médio Oriente, é o horror pura e simplesmente, pensando concretamente nas vítimas inocentes. Mas não foi sempre assim? Veja-se Auschwitz. A gente vai lá e fica estarrecido. Bento XVI foi lá também e deixou estas palavras: Há “um silêncio que é um grito interior para Deus: Por que te calaste? Por que quiseste tolerar tudo isto? Onde estava Deus nesses dias? Por que se calou?”
Ele deixou uma encíclica sobre a esperança - Spe salvi -, e nela debruça-se sobre uma pergunta decisiva, “a pergunta fundamental da Filosofia” (Max Horkheimer) : o que podem esperar as incontáveis vítimas inocentes da História? Quem lhes fará justiça? Elas clamam, um grito ensurdecedor percorre a História.
E ergue-se um ateísmo moral precisamente por causa das injustiças do mundo e da História . “Um mundo no qual há tanta injustiça, tanto sofrimento dos inocentes e tanto cinismo do poder, não pode ser obra de um Deus bom.” Quase se poderia dizer que se é ateu ad majorem Dei gloriam, para a maior glória de Deus, como se, perante o horror do mundo, a justificação de Deus fosse não existir. É-se ateu por causa de Deus.
Afastado Deus, deve ser o Homem a estabelecer a Justiça no mundo. Mas não será esta uma pretensão arrogante e intrinsecamente falsa? Quem não ouve o eco das palavras de Sófocles: Na terra “há muita coisa terrível, mas nada existe mais terrível do que o Homem”. Tem, pois, razão Bento XVI, ao acrescentar: “Um mundo que tem de criar a sua Justiça por si mesmo é um mundo sem esperança. Ninguém, nem nada responde pelo sofrimento dos séculos.”
Aqui, ele lembra a Escola de Frankfurt, nomeadamente Max Horkheimer e Theodor Adorno, que viveram filosoficamente a inconsolável “tristeza metafísica” da impossibilidade de fazer justiça às vítimas da História. De facto, mesmo supondo, no quadro do marxismo e da ideia do progresso moderno, que algum dia fosse possível erguer uma sociedade finalmente justa, transparente e reconciliada, ela não poderia ser feliz, já que ou essa sociedade se lembrava de todas as vítimas do passado, que não participam dela, e seria atravessada pela infelicidade, ou não se interessava por elas e então não era humana, porque insolidária.
Horkheimer e Adorno exprimiram uma filosofia em tenaz: por um lado, não podiam acreditar num Deus justo e bom; por outro, há uma verdade da religião, apesar de todas as suas traições no conluio com o poder e os vencedores: a religião “no bom sentido” é, segundo Horkheimer, “o anelo inesgotável, sustentado contra a realidade fáctica, de que esta mude, que acabe o desterro e chegue a justiça”.
Não se trata de um desejo egoísta, mas da esperança contrafáctica de que a realidade dominante da injustiça não tenha a última palavra. Daí, o “anelo do totalmente Outro”, o “anelo da justiça universal cumprida”, “a esperança de que a injustiça que atravessa a História não permaneça, não tenha a última palavra”. E Adorno também escreveu que, frente às aporias da razão, neste domínio, a única filosofia legítima seria “o intento de contemplar todas as coisas como aparecem à luz da redenção”.
Embora se não possa afirmar nada para lá da imanência, a pergunta pela esperança truncada das vítimas, que acusam o mundo da História dos vencedores, obriga a pensar para lá dos limites da imanência, colocando a pergunta pelo Absoluto enquanto pergunta pela Justiça universal.”
Anselmo Borges, em Artigo de Opinião , publicado no DN de 24.11.2024

segunda-feira, 25 de novembro de 2024

Celebrar o 25 de Novembro


Tem um ano esta crónica de Eugénio Lisboa. Eclodia , nessa época, em Portugal, uma acesa discussão  sobre a celebração do 25 de Novembro. Eugénio Lisboa não recuou perante essa estranha  balbúrdia ao  registar a sua opinião. Homem destemido, independente, nunca fugiu a pensar pela sua própria cabeça contra modas ou marés. A clarividência das suas asserções foram sempre  de uma profunda e inteligente justeza. 
A nossa eterna gratidão.
 
Celebrar o 25 de Novembro
por Eugénio Lisboa
“Vai por aí uma estranha balbúrdia, que é também uma vergonhosa balbúrdia: celebrar ou não celebrar o 25 de Novembro, conjuntamente com o 25 de Abril. A gente democraticamente moderada, que sempre se identificou com o movimento que, em 25 de Novembro, pôs cobro a fantasias totalitárias de vascogonçalvistas inconformados com o advento de uma “democracia burguesa”, mostra-se agora bizarramente desconfortável com a celebração daquele movimento salvífico. Porque tal celebração é “fracturante”, por outras palavras, pode desagradar ao PCP e ao BE.
Quanto ao fracturante, já lá vamos. Antes disso, quero apenas chamar a atenção para um importante pormenor: o 25 de Abril e o 25 de Novembro significam exactamente a mesma coisa: o 25 de Abril deitou abaixo uma ditadura e o 25 de Novembro impediu que outra ditadura se instalasse, em substituição daquela. Exactamente o mesmo, pelo que se não divisa a razão de celebrar uma e nos encolhermos, envergonhados, perante a outra.
Quanto à data de 25 de Novembro ser “fracturante”, temos conversado: todas, mas todas as datas que assinalamos são ou foram fracturantes. Celebrar o 25 de Dezembro é fracturante para os portugueses muçulmanos ou budistas ou simplesmente ateus ou agnósticos; o 1º de Dezembro é fracturante para os portugueses favoráveis à união de Portugal com a Espanha: havia muitos, na altura da Restauração, havia não poucos entre os do tempo da Geração de Setenta e bastantes portugueses haverá ainda hoje favoráveis a tal união, ou, no mínimo, nada preocupados com o advento dela; o 5 de Outubro é fracturante, para os monárquicos: há-os por aí e o nosso MNE acolhia, não há muito, um número não insignificante deles (até nunca percebi como, sendo monárquicos, aceitavam representar, no estrangeiro, um Estado republicano); os feriados de Fátima são fracturantes para os agnósticos, os ateus e os portugueses praticantes de outras religiões. Agradecia que me dessem, sendo capazes, uma data celebrativa que não seja fracturante. O 25 de Abril, a cuja celebração, justamente se não objecta, é também uma data fracturante: todos os saudosistas do Estado Novo não escondem a sua aversão a essa data. E todos nós sabemos de gente, ao mais alto escalão da hierarquia do Estado, que sempre se recusou a exibir um cravo vermelho na data da Revolução dos cravos. Portanto, invocar o carácter fracturante do 25 de Novembro é apenas uma vergonhosa cobardia de quem se assusta com o sururu que venham a fazer os suspeitos do costume. Para os quais, de resto, o 25 de Abril que gostam de celebrar, não é o mesmo 25 de Abril que assinalam os outros portugueses… Fractura? Por amor de todos os deuses do Olimpo: arranjem outra desculpa! Não celebrar o 25 de Novembro corresponderá a uma grande maioria de portugueses ajoelharem perante uma minoria recalcitrante e conhecidamente pouco amiga da liberdade de pensamento. Não vejo um Mário Soares a ceder desta maneira!”
                                                                        25.11.2023                     
Eugénio Lisboa,
           que não tem receio absolutamente nenhum dos Anónimos do Costume.

domingo, 24 de novembro de 2024

Ao Domingo Há Música

Cabo Verde

É assim, a música

A música é assim: pergunta,
insiste na demorada interrogação
– sobre o amor?, o mundo?, a vida?
Não sabemos, e nunca
nunca o saberemos.
Como se nada dissesse vai
afinal dizendo tudo.
Assim: fluindo, ardendo até ser
fulguração – por fim
o branco silêncio do deserto.
Antes porém, como sílaba trémula,
volta a romper, ferir,
acariciar a mais longínqua das estrelas.
Eugénio de Andrade, in "Os lugares do lume", Editores Assírio & Alvim, Junho de 2019

O poeta  sabe como a Música interroga sobre tudo,- o mundo, a vida-, e como, fulgurantemente, vai dizendo tudo sobre o que não se vislumbra para que nada fique por se sentir. 
O apontamento de hoje traz-nos uma  voz quente de Cabo Verde. Um autor e compositor que tem actuado nos mais variados palcos do mundo e tem  sido galardoado com distintos prémios.  Foi também Ministro da Cultura de Cabo Verde.

Mario Lucio, em Oh Linda (com Coro e Orquestra Gulbenkian).Arranjos: David Lloyd. Maestro: Rui Pinheiro. Maestrina do Coro: Inês Tavares Lopes. Mix e mastering: Rui Ferreira.
“Cretcheu», Mario Lucio com Coro e a Orquestra Gulbenkian, é fruto de um encontro entre o artista cabo-verdiano e uma das mais prestigiadas orquestras europeias, a Gulbenkian, que resultou em dois concertos realizados em Lisboa na Grande Sala da Fundação Calouste Gulbenkian, nos dias 8 e 9 de Junho de 2022. 
"Esteticamente, projectei este disco de modo a que o ambiente, a toada e o sentimento da minha música, a tradicional e a autoral, encontrassem a música do Outro. A minha música vem de muitas músicas, muitas músicas têm também da minha. A proposta não é trazer a música tradicional, ou popular, para o ambiente sinfónico, nem o inverso, mas, sim, conseguir uma confluência, um enlace", diz Mario Lucio.

.  

Mario Lucio, em Força de Cretcheu (com Coro e Orquestra Gulbenkian). Arranger: Élodie Bouny. Producer: Mario Lucio. Composer: Eugénio Tavares. Lyricist: Eugénio Tavares

 

Mario Lucio, em  Migrants (Shakespearience). Lyrics and Music: Mario Lucio. Arrangement: Rui Ferreira . Choir Arrangement: Sofia Adriana Portugal . Percussion/Bass: Rui Ferreira . Galician Tambourine: Tiago Manuel Soares . Electro-Acoustic Guitar/Electric Guitar: Telmo Sousa . French Horn/Wagner Tuba: Ricardo Matosinhos . Flute/Piccolo Flute: David Leão . Choir: Sofia Adriana Portugal .Vocal: Mario Lucio .

  

"O júri da secção de world music da Académie Charles-Cros, a Academia Francesa de Música atribuiu o Prix de La Musique, na sua selecção dos melhores desse ano ( 2023), na categoria Criação ao álbum “Migrants”, de Mario Lucio - o músico e compositor cabo-verdiano – editado pela Banzé/MDC/PIAS. A cerimónia aconteceu na sexta-feira, 31 de Março de 2023, no Musée des Confluences de Lyon. Mario Lucio torna-se, assim, no segundo músico cabo-verdiano a merecer a prestigiosa distinção, depois de Cesária Évora, em 1995, ter recebido este prémio, tido como o equivalente francês do Grammy, atribuído anualmente a grandes destaques ou obras impactantes na cena musical mundial. A Académie Charles-Cros foi criada em 1947 por um grupo de críticos e especialistas em gravação. O atual presidente é o renomado maestro Alain Fantapié. A Academia, além de sua função deliberativa coletiva, trabalha com comissões especializadas (Música Clássica, Música Contemporânea, World Music, Jazz e Blues, Canção, Público Jovem, Letras e Documentos Sonoros). 
O disco "Migrants" foi produzido e arranjado por Rui Ferreira.

sábado, 23 de novembro de 2024

Dois escritores no quarto andar


Dois escritores no quarto andar 
por Rubem Braga
"A última crônica de meu livro Um pé de milho é sobre a rue Hamelin, de Paris, “onde morreu Proust”, faço notar doutamente, e onde vivi eu. Ao escrever aquela crônica eu ouvira cantar o galo, mas não sabia onde. Digo ali que “onde Proust morreu vive hoje um sindicato”. Era o que eu pensava na ocasião.
Eu vivia no quarto andar do número 44 e no segundo habitava meu amigo, o escritor gaúcho dom Carlos de Reverbel. Juntos fomos procurar o tal número onde morreu Proust e demos com o tal sindicato. Mas acontece que procurávamos um número errado. O verdadeiro — descobrimos depois — era o nosso 44 mesmo…
Não quero fazer pouco de dom Carlos de Reverbel, mas eu sou um proustiano mais íntimo do que ele. É verdade que meus inimigos assoalham que eu jamais li, no duro mesmo, todos aqueles volumes, embora, em conversas de salão eu seja capaz de discretear sobre Swann, descrever Combray ou Balbec, falar de Albertina ou da senhora duquesa de Guermantes. “O Braga tem as lantejoulas, mas não sabe as coisas” — murmuram os invejosos.
Pois que se mordam de inveja: Proust morreu exatamente no apartamento do quarto andar, de número 44, onde eu vivi. Dom Carlos morava, eu já disse, no segundo; pode alegar a seu favor que várias vezes foi ao quarto me visitar, o que o classifica, sem dúvida alguma, como o segundo proustiano do Brasil.
Léon Pierre-Quint conta que Marcel Proust alugou todo o quarto andar do edifício, que então devia ser novo; ali morreu em 1922, ano em que pela primeira vez eu vinha ao Rio de Janeiro, vestido de marinheiro do Encouraçado S. Paulo, trazido pela minha irmã para ver a Exposição do Centenário. Eu tinha nove anos de idade, nunca ouvira falar de Proust e estava longe de supor que 25 anos depois iria dormir na cama em que ele morria aquele ano. Mais pobre do que Marcel, aluguei apenas o grande quarto de frente com uma entradinha e um banheiro, o que me custava 6 mil francos em 1947; não era caro, levando-se em conta que nesse tempo eu era casado.
Conta Leon Pierre-Quint que Proust escolheu um quarto muito frio (não diz qual) temendo que a calefação central fizesse mal à sua asma. Não posso afirmar, mas devia ser o meu quarto; era friíssimo. Imagino quantas vezes ele não se quedou, como eu, a olhar a rua lá em baixo, pela vidraça encardida, a esfregar as mãos de frio. Ah, bem que me parecia suspeita aquela velha cama, bem que notei certos estremecimentos nas cortinas e pressenti, no tapete desbotado, o rasto de antigos pés que o pisaram em noites de insônia, e vagas nódoas de remédio. Posso informar com a maior segurança que, pelo menos nos últimos anos de sua vida, Proust não tomava banho de chuveiro. Não havia chuveiro na casa. Encontrei uma banheira com manchas de sujos imemoriáveis; mandei lavá-la, esfregá-la, flambá-la com álcool, mas nem assim me animei a tomar um banho nela; preferi comprar um chuveirinho de borracha que adaptamos à pia. Eu não podia adivinhar que era a banheira de Proust…
Às vezes, pela madrugada — conta o biógrafo — Proust despachava Odilon em um táxi para procurar algum amigo que viesse conversar com ele. Imagino-o perfeitamente à espera, escutando o ruído agônico do pequeno elevador que, no quarto andar, para perigosamente entre dois degraus da escada, uma velha escada sempre às escuras em que os passos reboam absurdamente alto. O amigo o encontrava na cama, com um lenço no pescoço, todo vestido sob os cobertores, com luvas de algodão, vários pares de meias e o plastron branco sobre a camisa amarrotada, no quarto fechado cheirando a remédios, a fumigações, a Proust. Eu positivamente ainda recolhi ali um pouco desse cheiro, dentro do qual foi escrito o último volume de Sodoma e Gomorra; homem bárbaro de um país semibárbaro, me lembro de que muitas vezes combati esse cheiro abrindo de par em par as portas que dão para a sacada e a que dá para o corredor, formando corrente de ar para grande pânico da arrumadeira. Ah, se eu soubesse aproveitar bem aquele cheiro, que coisas sutis não haveria escrito no lugar das croniquinhas triviais que eu mandava para O Globo!
Proust cochilava três dias à custa de veronal, depois ficava três dias desperto à custa de cafeína, falando de literatura, de pintura (esses jovens: Giraudoux, Picasso…), recitando Anatole ou Beaudelaire, discutindo finanças e mundanismo, falando em mandar vir seus livros, seus móveis, suas coisas, o que nunca chegou a fazer.
Também tive minhas noites de insônia na rue Hamelin; não terá ficado dentro de mim um pouco da angústia proustiana? Seria distintíssimo, mas receio que não; três copos de Beaujolais me punham facilmente em boa forma.
De qualquer modo, os jovens intelectuais que quiserem escrever sobre Proust devem me consultar para “fazer ambiente”. Posso, por exemplo, descrever o cubículo em que a concierge lá em baixo (uma velha, positivamente a mesma da era proustiana) está sempre fazendo contas, passando roupa a ferro ou espichando o nariz para ver quem entra, quando não atende ao telefone com sua voz chorosa:
– Passy, soixante-et-un deux fois…
Tomem nota, rapazes: Passy 61-61; é o antigo telefone do Proust e do Braga."
Rubem Braga, in Ai de ti, Copacabana , Global Editora, São Paulo ,Brasil
Rubem Braga
AUTOR E OBRA 
"Rubem Braga (1913-1990) foi um escritor e jornalista que viajou e viveu em diferentes lugares do Brasil e do mundo. Além disso, entre 1961 e 1963, foi embaixador do Brasil em  Marrocos. Como escritor, lançou seu primeiro livro de crônicas, O Conde e o Passarinho, em 1936, seguido por diversos outros, e escreveu inúmeras crônicas que foram publicadas em diferentes jornais e revistas. Sobre a relevância como cronista, Miguel Sanches Neto, escritor e professor de literatura, explica: "As crônicas de Machado e de boa parte dos escritores do século XIX tinham um tom seco, quase jornalístico e eram cheias de referências históricas, próximas do gênero que hoje conhecemos como jornalismo literário. Rubem Braga conferiu à crônica o lirismo, a poesia e a leveza que antes não existiam". Assim, além de ser uma referência, pode ser considerado um precursor do desenvolvimento da crônica no Brasil, estabelecendo parâmetros que, até hoje, exercem influência no modo como esse gênero é pensado e feito.
 Ai de Ti, Copacabana! é uma seleção, feita pelo próprio autor, de crônicas escritas de abril de 1955 a fevereiro de 1960. São textos que trazem características como fluidez, brevidade e oralidade, e abordam uma variedade de temas como amores, tempo, morte, viagens, encontros e desencontros, sendo interessante notar que a leveza da linguagem utilizada pelo autor muitas vezes contrasta com a forte carga emocional, poética e subjetiva que essas crônicas carregam, fazendo o leitor se emocionar e ser tocado diante de situações corriqueiras como um encontro com velhos amigos ou a observação do sol que entra pela janela."

sexta-feira, 22 de novembro de 2024

A propósito da Apresentação do último livro de Eugénio Lisboa, "Manual Prático de Gatos para Uso Diário e Intenso"



Um gato tem absoluta honestidade emocional: os seres humanos, por uma razão ou outra, podem esconder seus sentimentos, mas um gato não.
Ernest Hemingway

Como aquelas grandes esfinges que vagam pela eternidade em atitudes nobres sobre a areia do deserto, eles olham sem curiosidade para o nada, calmos e sábios.
Charles Baudelaire

 

No passado dia 19, na magnífica Livraria Travessa, em Lisboa, aconteceu um belíssimo momento entre Eugénio Lisboa e muitos amigos. Amigos especiais porque  vinham à celebração do seu último livro , um hino ao felino mais protegido e amado por todos, sua Alteza Real , o Gato. 
O convite, formulado pela Editora Guerra & Paz , avisava , com  todas as letras, do carácter de tal evento, ou seja, a apresentação de um terno e intenso livro  de homenagem a gatos. 
Não sei se o livro fosse apenas dedicado a gatos, sem a pena brilhante e clarividente de Eugénio Lisboa, teria feito acorrer tantos amantes de gatos. Sei  que, quem lá foi, pretendeu homenagear Eugénio Lisboa e a sua longa e persistente paixão por gatos , sem  esquecer o lema  de  Mark Twain: Quando um homem ama gatos, sou seu amigo e camarada, sem maiores apresentações.
No início da sessão , a cantora Amélia Muge cantou , a cappella, um poema de Eugénio Lisboa que fará parte do seu  novo disco. E a rede, em torno do poeta, estabeleceu-se. Os elos  apertaram-se em  afecto, apreço por tanta ventura literária, proporcionada por este poeta maior.
Manuel S. Fonseca, além de  editor , tem, nas palavras, o manejo talentoso de quem sabe escrever para, de um modo empático e eficaz,  apresentar  os dois intervenientes na sessão. Luís Caetano , o grande promotor da Literatura  da Antena 2, com programas dedicados às diversas áreas.  E o filho de Eugénio Lisboa, João Lisboa, crítico de música do Jornal Expresso.
Luís Caetano , também um amante de gatos, era, pois,  o apresentador natural   e de mérito deste opíparo Manual de Gatos.  Entrevistou , variadas vezes,  Eugénio Lisboa nos seus programas.
Entre as merecidas referências feitas  por  Manuel da Fonseca, destacamos estas: Pela força das coisas e pela ronda da noite, o Luís Caetano tem agarrado na literatura, na sua irmã poesia, no seu irmão romance, e tem-lhes oferecido uma aventura dialogada, sussurrada, musicada.
Pesa nos ombros de Luís Caetano um rosário de assombrosos desabafos literários: Portugal deve ao Luís Caetano, horas de confissões íntimas, de autoras e autores, até de alguns editores, horas de prazer, as pequenas e grandes delícias, dulcíssimos abades de Priscos da literatura. Obrigado Luís, por estar connosco.
Sobre João Lisboa, Manuel Fonseca  teceu o seguinte: E quero dizer obrigado ao João Lisboa que acompanhou a preparação desta edição e deste lançamento. Vamos ouvi-lo, no final, depois da apresentação do Luís Caetano.
O João falará do seu pai, certamente, mas também deste livro onde, afinal, o João também está, como personagem, de corpo inteiro, em romanesca e felina relação com a Ísis, com a Artemísia. Obrigado, João, por nos honrar com a sua presença.
Quer um  quer outro souberam evocar o poeta e dar ao livro a dimensão que merece. Um livro de extraordinário fulgor e de infinda e deliciosa ternura por esse elegante e misterioso felino.
O momento maior foi proporcionado pela audição da gravação de um poema de Eugénio Lisboa , lido pelo próprio poeta,  realizada num programa de Luís Caetano. A comunhão foi total. Eugénio Lisboa era um entre todos os que ali estavam. Num instante, a  sua presença passou a ser real, física. Se a emoção fosse mensurável, seria possível ter atingido a grandeza máxima, a eternidade do instante.
As palavras do poeta  Giuseppe Ungaretti ganharam ,de novo, forma:  O gato é um amigo silencioso que nos ensina a encontrar a paz dentro de nós.
E a preciosa aferição de que os poetas não morrem rendeu-se à  verdade do momento.  Eugénio Lisboa provou-o . 
Manuel S. Fonseca soube homenageá-lo. Para ele, junto um veemente e grato aplauso, tal como aquele  que  solicitou para  Eugénio Lisboa.

Título: Manual Prático de Gatos para Uso Diário e Intenso
Autor: Eugénio Lisboa
Categoria(s): Ficção, Poesia, Sem categoria
Nº de Páginas: 92
Ano de Edição: Novembro 2024
Editora: Guerra & Paz
Preço: 18,00 €

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Viver com gatos ajuda a ser sábio

Quem o afirma é Eugénio Lisboa e acreditamos plenamente. Eugénio Lisboa era um  amante de gatos. Teve vários e a última, Ísis,  foi a grande companheira de todos os dias. Além de um fulgurante e multifacetado escritor , Eugénio Lisboa era um homem cultíssimo e detentor de uma  magna sabedoria. 
Acaba de ser publicado um livro dedicado ao Gato, Manual Prático de Gatos Para Uso Diário e Intenso, mas Eugénio Lisboa  escrevia muito e nunca deixou de compor  outros poemas felinos até nos deixar, a 9 de Abril deste trágico ano.  Eis alguns :

Ode (insuficiente) ao gato

De bons condimentos, é, de certeza,
feito o gato, emissor de beleza,
inventor de quanto é esbelteza,
descendente da mui alta nobreza,
dotado de altíssima destreza,
com momentos raros de safadeza,
e tiques de inigualável leveza,
mesmo meditando, a cocar a preza,
filósofo, todo ele subtileza,
implacável, mas sempre com fineza,
dado a ademanes de Sua Alteza,
fazendo tal inveja à gentileza,
de cauda perpendicular e tesa,
é tudo isto o gato, de certeza,
pra já não falar da sua esperteza!
          24.12.2023
Eugénio Lisboa
Um gato no inverno

Um gato no inverno é outro gato,
muito secreto, mas muito próximo.
Aquece-se com seu espesso fato,
de pelo muito lustroso e finíssimo.

No inverno o gato descobre nichos
impensáveis: só ele os imagina,
entre todos os concebíveis bichos,
co’a sua imaginação felina!

No inverno, melhor que nós, ele sabe
o modo sábio como se aquece
e os bons sítios onde um gato cabe!

Quentinho, escondido, o gato esquece
a actividade que embrutece
e louva o não fazer, que engrandece!
          24.12.2023
Eugénio Lisboa


NOTA: Este título – UM GATO NO INVERNO – foi-me sugerido pelo título de um romance célebre – UN SINGE EN HIVER – cujo talentoso autor, Antoine Blondin, pertenceu, com Roger Nimier, ao movimento literário conhecido como dos “hussards”.
O gato de Leonardo
Ser gato

Não é gato quem quer, é só quem pode
Se nem Leonardo inventou o gato,
o melhor é que ninguém se incomode
a querer entrar nesse campeonato.

Ser gato é empresa transcendente,
muito além de qualquer poder humano.
Sonhar sê-lo é sonho de demente,
que ignora as subtilezas do bichano.

O mais que se pode é tender pra gato,
mas sem nunca lá se poder chegar!
O percurso a fazer, longo e chato,

convida o candidato a meditar:
antes, talvez, evitar as alturas,
do que ficar com nódoas e fracturas.
          29.12.2023
Eugénio Lisboa

Inventário de razões para se ser gato

Os gatos nunca sonham com impérios,
não trocam nunca uma boa soneca
pela honra de dirigir ministérios
ou pelo direito a usar beca.

Os gatos não cambiam um petisco
por um Rolls-Royce ou por um Ferrari.
Se pretendem estender-lhes um isco,
mostrem-lhes um prato de calamari.

Os gatos têm ambições modestas:
cama, mesa e roupa bem lavada,
de vez em quando, umas lindas festas,

e, de preferência, não fazer nada!
Se o gato em qualquer nicho cabe,
o gato, acima de tudo, sabe!
          31.12.2023
Eugénio Lisboa
Metamorfose

Transformei-me finalmente num gato,
isto é, aprendi a bem viver:
trabalho e chatices não acato
e porreiríssimo é o lazer!

Viver com gatos ajuda a ser sábio,
e a descobrir tesouros escondidos :
em vez de frequentar o alfarrábio,
observar o felino bem flectido.

Os olhos do gato inculcam mistérios,
que muito importa desvendar:
antes isso que conquistar impérios,

que apenas servem para devastar.
O gato é o melhor instrutor
e, do bom viver, o melhor gestor!
          03.02.2024
Eugénio Lisboa

domingo, 17 de novembro de 2024

Ao Domingo Há Música

 

Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos – onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida
E é um sonho louco este nosso mundo…
Mario Quintana, Os Degraus

Que mais desejar, quando as cordas se soltam ou as teclas acordam. A música impregna o ar e, se nos abrirmos ao momento, o sonho    acomete-nos e a loucura, que tolda o mundo, desaparece. É esse o próprio enigma da Música.
Schindler´s List Theme, de John Williams, com o virtuosismo do violinista Itzhak Perlman, acompanhado pela Los Angeles Philharmonic, sob a direcção do Maestro Gustavo Dudamel
  
Chopin, “Raindrop” Prelude, pelo perfeccionista do piano Lang Lang.
Vivaldi Winter (1st movement), com o virtuoso do violoncelo Luka Sulic , acompanhado por  outras preciosas cordas. 
 

sexta-feira, 15 de novembro de 2024

A magnificência da natureza


Ao longe, os rios de águas prateadas
Por entre os verdes canaviais, esguios,
São como estradas liquidas, e as estradas
Ao luar, parecem verdadeiros rios!
António Nobre,

Um registo dos melhores momentos da Natureza  para lembrar quão desastrosa tem sido a mão humana  ao agredi-la com desleixo, ganância e severa destruição. Basta um olhar para que se conclua que se vai perdendo  essa beleza gratuita, com tanta agressão e algumas calamidades incontroláveis. 
Não há cimeiras climáticas que sejam suficientes para estancar a poluição, se o Homem o não  quiser.
Os melhores momentos da Mãe Natureza ,em 4K HDR 60 FPS Dolby Vision 

"Mergulhe na beleza, de tirar o fôlego,  do nosso planeta com "Os melhores momentos da Mãe Natureza em 4K HDR 60 FPS Dolby Vision". Este vídeo impressionante captura as paisagens dramáticas e inspiradoras que a natureza tem a oferecer, exibindo cores vibrantes e detalhes intrincados que ganham vida em ultra-alta definição. De pores-do-sol serenos a cachoeiras estrondosas, cada quadro é uma celebração do mundo natural, habilmente filmado em resolução 4K e aprimorado com tecnologia HDR para uma experiência de visualização incomparável. Sinta o poder da natureza enquanto explora montanhas majestosas, florestas exuberantes e oceanos tranquilos, todos apresentados em hipnotizantes 60 quadros por segundo para um movimento fluido que dá vida a cada cena. Seja  um amante da natureza, um viajante ou simplesmente buscando um momento de paz e tranquilidade, este vídeo certamente o  cativará e inspirará. Não se esqueça de desfrutar, comentar e se inscrever para mais experiências visuais impressionantes que destacam a beleza do nosso mundo. Ative suas configurações Dolby Vision para a melhor experiência de visualização! Junte-se a nós nesta jornada visual e testemunhe os melhores momentos da Mãe Natureza como nunca antes!"