sábado, 14 de novembro de 2020

O Hospital e a Praia

O Hospital e a Praia 

E eu caminhei no hospital
Onde o branco é desolado e sujo
Onde o branco é a cor que fica onde não há cor
E onde a luz é cinza

E eu caminhei nas praias e nos campos
O azul do mar e o roxo da distância
enrolei-os em redor do meu pescoço
Caminhei na praia quase livre como um deus

Não perguntei por ti à pedra meu senhor
Nem me lembrei de ti bebendo o vento
O vento era vento e a pedra pedra
E isso inteiramente me bastava

E nos espaços da manhã marinha
Quase livre como um deus eu caminhava

E todo o dia vivi como uma cega

Porém no hospital eu vi o rosto 
Que não é pinheiral nem rochedo
E vi a luz como cinza na parede
E vi a dor absurda e desmedida.
Sophia de Mello Breyner, in Grades, Publicações Dom Quixote, Novembro de 1970,  pp. 27, 28

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