sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Que falta me faz, Mãe

                                               Amamos as nossas mães quase sem o saber e só nos damos conta 
                                                          da profundidade das raízes desse amor no momento da derradeira separação. 
                                                                                                                                       Guy Maupassant

                                                           A suprema felicidade da vida é a convicção de ser amado por aquilo 
                                                           que você é, ou melhor, apesar daquilo que você é. 
                                                                                                             Victor Hugo

Sempre que chega este dia, o dia do seu aniversário, recordo como todos nós gostávamos de a surpreender. Tínhamos aprendido com a Mãe. Cada um de nós, acrescentado pelos seus netos, intentáramos numa oferta que a fizesse sorrir. Não era preciso muito. A Mãe sorria-nos sempre. O seu sorriso era  maravilhoso. E contentava-se apenas com uma frase carinhosa num simples cartão. Quantos cartões fiz eu,  no meu tempo de criança e menina. Colocava-os na sala para serem  encontrados logo pela manhã. E quando estava no colégio, eles vinham pelo correio. Diziam-me  as suas amigas mais chegadas que a Mãe se  comovia muito e chorava. Em si,  a comoção tinha estes dois lados: olhos cheios de lágrimas e um sorriso abundante de ternura. E, Mãe, tenho tanta saudade de a ver comovida. Tenho tanta saudade de si: de a chamar, de a ouvir, de a esperar, de a visitar, de a ter aqui  connosco. Que falta me faz , Mãe. Nem sei , quantas vezes me ouço a chamar por si. A contar-lhe dos sucessos e insucessos dos filhos. E dos netos, Mãe? Já são cinco. A última tem cinco meses. É uma menina . Claro que é linda! De todos lhe falo em surdina. Não sei se me escuta , mas sei que não a esqueço. E dos livros que leio, sei que posso comentá-los consigo. Ensinou-me a gostar de ler. Aliás, todos nós nascemos no reinado dos livros. A Mãe fez-nos crescer lendo-nos. E abriu-nos à descoberta. O mundo vinha nas páginas que se folheavam. A televisão e os telemóveis não faziam parte desse mundo. Quando a televisão chegou , a leitura já não era uma experíência, era uma necessidade. 
E do cinema, quantos filmes vimos juntas. A Mãe partilhava connosco essa paixão. Era um dia luminoso ir consigo à matinée ao Tivoli, ao S. Jorge, ao Condes ou ao Monumental. Começámos crianças nessa aventura . E como perdê-la em adulta? Impossível . O cinema continua a ser uma constante presença  tal como a Música. Não sei como esquecer os sons que enchiam a nossa casa e como nos explicava a respectiva autoria. Era eclética. Havia de tudo: música clássica, música popular , Jazz  , Flamenco . Havia, isso sim Mãe,  alegria e felicidade . Havia vida, Mãe, porque  a vida  era isso. A Mãe ensinava-nos a viver. E consigo tudo era possível. Não havia nuvem que não se desvanecesse. Não era alisar o caminho . Não era fingir um país de maravilhas. Sabíamos de assuntos apenas murmurados. Esses descobrimos mais tarde. Mas ao mostrar-nos o caminho, a Mãe mostrou-nos de que força e de que  sonho éramos feitos. Tudo se nos mostrou possível . A Mãe sabia-o. 
Obrigada , Mãe.
Que falta me faz, Mãe.

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