terça-feira, 5 de agosto de 2025

Perder a noção do tempo

 
Mais uma semana de um outro Agosto . Diz-se que ser velho é perder a noção do tempo. Ele passa voraz e sem corpo. Talvez seja essa a grande vantagem da tal "geração grisalha". O tempo não tem peso nos dias porque já se corporizou em nós. O traço, que tínhamos, perdeu o vigor primeiro e alastra-se na fugacidade de traços que se esvaem em réplicas informes. As rugas, o corpo vivido dão-nos a dimensão dessa voracidade do tempo, em nós. Mas , se o corpo o sente, o espírito continua a afirmar que é hoje o presente e o futuro é só amanhã. E o vigor do pensamento liberta-se da proximidade desse futuro que sabemos carregar um fim. Sonhamos, cantamos, rimos, choramos e somos nós como sempre o fomos.
Registo um excerto de Carta ao Futuro de Vergílio Ferreira:
«O que há a redimir é a adequação deste milagre brutal de nos sabermos uma evidência iluminada, de nos sentirmos este ser que é vivo, se reconhece único no corpo que é ele, na lúcida realidade que o preenche, o identifica nas mãos que prendem, na boca que mastiga, nos pés que firmam, de nos descobrirmos como uma entidade plena, indispensável, porque ela é de si mesma um mundo único, porque tudo existe através dela e é impossível que esse tudo deixe de existir, porque ela irrompe de nós como a pura manifestação de ser, e o «ser» é a única realidade pensável — o que há a redimir é a adequação desta fantástica evidência que nos cega e a certeza de que ela está prometida à morte, de que o seu destino é a impossível e absoluta certeza do não-ser, da pura ausência, da totalidade nula, da pura irrealidade. »

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