domingo, 31 de agosto de 2025

Ao Domingo Há Música



Há palavras que nos beijam

Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.
Alexandre O'Neill, No Reino da Dinamarca

O poema do poeta Alexandre O'Neill tem todas as palavras que, neste apontamento, possam ser ditas. Muitas serão expressas por talentosas vozes deste nosso país. Outras ficarão no imaginário de quem as escutará para cumprir a beleza e o mistério que vestem a Língua Portuguesa. 

Mariza, em  Há Palavras Que Nos Beijam.
 
Gisela João, em A Morte Saiu à Rua ( Letra e Música de Zeca Afonso).. 
"É o primeiro single do novo álbum de Gisela João, editado em Janeiro de 2025. Gisela João reimagina e reinterpreta a icónica canção de Zeca Afonso, de 1972. A sua voz, forte e feminina, dá nova vida a esta peça de resistência, acrescentando profundidade e criando uma mistura inesquecível entre tradição e contemporaneidade, afirmando um Portugal vivo e democrático. "
  
 Buba Espinho com Bandidos do Cante e Grupo Coral Infantil de Ourique, em Um dia hei-de voltar, ao vivo no Coliseu dos Recreios.
.
Ana Moura, em  Tens Os Olhos De Deus. Letra e Música de Pedro Abrunhosa.
 
Pedro Abrunhosa com Sara Correia , em  Que O Amor Te Salve Nesta Noite Escura,(Ao Vivo). Música e Letra de Pedro Abrunhosa.
 

sábado, 30 de agosto de 2025

Nesse verão

5 - Nesse Verão
por Maria José Vieira de Sousa
"Crescera e a hora da entrada no colégio já estava marcada há muito. Nesse verão, que antecedeu a sua entrada, foi uma azáfama na casa. A costureira sob as orientações da mãe ou da Augusta ia fazendo o enxoval que o colégio exigia. Por vezes tinha de fazer provas, já que algumas peças de vestuário e do uniforme eram também da responsabilidade das alunas. Assim, procuravam-na pela quinta , obrigando-a a perder momentos preciosos que estava tentando prolongar na companhia de Antero.
Nesses dias, os dois, sentindo aproximar-se a separação, tinham ingenuamente celebrado um acordo de ligação eterna. Deitados na relva, entrelaçando as mãos e fechando os olhos murmuraram o juramento que Antero preparara e lhe ensinara:
Sol que nos aqueceis, Luz que nos guiais,
e vós, Terra, Ar, Água que nos amais
vede e guardai este laço que mantemos
de juntos nosso destino sempre vivermos.
Acreditavam que, embora temporariamente separados pela força da entrada no colégio, estariam destinados um ao outro para sempre. Para eles sempre e eterno tinham o mesmo significado. Naquela idade, a percepção da dimensão temporal era diferente e construída frequentemente pelo devir cénico das “estórias” que recheavam os livros que iam lendo! O universo da quinta era então povoado por mil e uma aventuras onde os grandes heróis enfrentavam múltiplas adversidades que, após duras e prolongadas lutas, acabavam por vencer, alcançando gloriosas vitórias. E assim viveriam eternamente unidos e felizes.
Era um mundo fantástico e fantasioso que lhes enchia a cabeça e os fazia correr um para o outro, a cada dia que passava. A saudade era permanente quando não estavam juntos. Como seria estar longe?
E a saudade da separação começava a desenhar-se à medida que a partida iminente para o colégio se ia impondo pela presença cada vez mais volumosa das malas e das caixas que se iam amontoando na sala de costura! Até lençóis e toalhas lá tinham sido colocados com o seu nome bordado a ponto de cruz e com um estranho número 74 que viria mais tarde a descobrir ser o seu número de identificação no colégio.
Chegara a temer nunca mais voltar à quinta, pois o enxoval era tão grande que mais parecia ser o da despedida definitiva. A mãe sossegou-a, quando lhe mostrou a lista imensa que o colégio lhe enviara.
Naquele dia, acordara ainda mais cedo. Foi à cozinha e Benta, que já acendera o enorme fogão de lenha, assustou-se com a sua chegada repentina. Pediu-lhe silêncio e roubando uma fatia de pão do cesto que já estava em cima da grande mesa rectangular da cozinha, dirigiu-se para a porta. Entendendo o que a sua menina pretendia fazer, Benta encheu de imediato uma caneca com o leite ainda morno obrigando-a a bebê-lo.
- Não se demore menina! Hoje é dia de partir cedo. O carro já está carregado, pelo que os senhores não tardam a aparecer para a levarem ao colégio.
Sem mais para ouvir, desatou a correr para o encontro, junto ao rio. Diria adeus às árvores, aos pássaros, às flores, ao rio e decerto perderia o coração na hora de deixar a quinta e Antero, o seu amigo.
Antero já lá estava. Também ele acordara mais cedo e veio esperá-la. Tinha um presente: uma pulseira entrançada em fio de arame com feno e caules verdes que fizera em segredo. Trazia o cheiro da terra. Guardá-la-ia para sempre.
Foi dolorosa a despedida. Os irmãos ficaram a acenar no portão com a Augusta e a Benta que teimavam em disfarçar a lágrima que tentava  assomar no canto dos olhos. Até os cães pareciam choramingar de cabeça baixa e orelhas murchas não reagindo sequer à passagem do carro.
Soube, então, que a saudade era uma dor que lhe esmagava o coração. Encostou-se à mãe e fechando os olhos chorou para dentro para que ninguém visse. E era assim que, ao longo da vida, choraria!
Nessa noite, grande e dominadora, aprendeu também que a saudade seria a sua mais constante e fiel companheira.
O colégio era enorme. Foi entregue à Directora que declarou velar por ela e zelar para que a sua aprendizagem se desenvolvesse eficazmente.
Os pais prometeram visitá-la logo que voltassem à grande cidade, bem como escrever-lhe semanalmente. Quando eles partiram, uma vez mais sentiu o coração doendo !
Como naquele tempo os estabelecimentos de ensino tinham separação de sexos , aquele colégio só admitia raparigas.
A recepção às alunas era feita progressivamente das mais novas, que chegavam pela primeira vez ao colégio, até às mais velhas dos anos cimeiros de ensino que, por serem já experientes e conhecedoras das normas que o regulavam, tinham apenas uma sessão de boas vindas
Com o tempo foi apreciando o primeiro dia de entrada no colégio pela vivacidade e informalidade que continha o reencontro com as colegas. Todas traziam segredos e acontecimentos para partilhar. E havia muita alegria que catalisava a tristeza da saudade da partida ! Era sempre o primeiro dia do resto dos dias longe de casa."
Maria José Vieira de Sousa, in O Lugar, memórias de um romance, pp. 21-23, Junho de 2008

sexta-feira, 29 de agosto de 2025

Um caminho de palavras

Um caminho de palavras

"Sem dizer o fogo - vou para ele. Sem enunciar as pedras, sei que as piso – duramente, são pedras e não são ervas.
O vento é fresco: sei que é vento, mas sabe-me a fresco ao mesmo tempo que a vento. Tudo o que eu sei, já lá está, mas não estão os meus passos e os meus braços. Por isso caminho, caminho porque há um intervalo entre tudo e eu, e nesse intervalo, caminho e descubro o meu caminho.

Mas entre mim e os meus passos há um intervalo também: então invento os meus passos e o meu próprio caminho. E com as palavras de vento e de pedra, invento o vento e as pedras, caminho um caminho de palavras.

Caminho um caminho de palavras
(porque me deram o sol)
e por esse caminho me ligo ao sol
e pelo sol me ligo a mim

E porque a noite não tem limites
alargo o dia e faço-me dia
e faço-me sol porque o sol existe

Mas a noite existe
e a palavra sabe-o."

António Ramos Rosa, in Sobre o rosto da terra , Livraria Nacional,1961

Escrevo para unir mas em cada sílaba separo

Escrevo para unir mas em cada sílaba separo
No fundo das palavras há talvez uma passagem
um rio subterrâneo Coloco uma palavra
sobre a página e tudo de súbito se move
mas não neste quarto onde tudo permanece imóvel

Que ignoradas luas presente cada verso
ou que violentas panteras o fazem estremecer!
Por vezes a palavra deslumbra-se
com uma mulher prodigiosamente nua
e por isso ela se entrega ao silêncio
não para desistir mas para respirar

Ninguém pode suportar a maravilha
e se quer dizê-la é preciso fugir-lhe
para não ficar demasiado preso a ela
e poder amá-la na medida da distância

 António Ramos Rosa, in AS PALAVRAS , Campo das Letras, Abril de 2001

quinta-feira, 28 de agosto de 2025

O mostrengo de Moscovo







Benfeitor precisa-se

Destruir, sem pestanejar, um povo
inteiro, de frio, fome e de sede,
é próprio do mostrengo de Moscovo,
que, com frio de lagarto, procede

ao seu prazer perverso e favorito
de pôr-se sempre em bicos de pés,
para se mostrar muito homenzito,
arrasando todo um país rés vés.

Matar não lhe custa porque não sente
e, com toda a desenvoltura, mente,
porque assim gira seu ego demente!

Putine rima bem com assassine,
mas também com fulmine e chacine:
venha um benfeitor que o elimine!
           22.11.2022
Eugénio Lisboa, in Soneto , modo de usar, Guerra & Paz Editores, Abril de 2024, p 97


O mostrengo
                               ( retrato de Putine)

Pálido e traiçoeiro,
ele tem o sangue frio,
de insensível bandoleiro,
que convoca calafrio.

Bufo de rosto sombrio,
assassino mafioso,
solitário arredio,
bom cliente de Lombroso,

salafrário teimoso,
saudoso de impérios,
megalómano ardiloso,
vomitando impropérios,

bom filho de Satanás,
bicho que não teve mãe,
no inferno assarás
ou dele ficarás refém!
            25.03.2022
Eugénio Lisboa, in Poemas em tempo de guerra suja, Guerra & Paz Editores, Setembro de 2022,  p 41

quarta-feira, 27 de agosto de 2025

Os assombrosos sons

Víkingur Ólafsson interpreta  Sonata No. 42 in D minor (Arr. by Víkingur Ólafsson), de Domenico Cimarosa.
"Ouça o assombroso arranjo de Víkingur Ólafsson para a Sonata para Teclado nº 42 de Domenico Cimarosa. Foi extraído do seu novo álbum "Mozart & Contemporaries".
Neste novo álbum, Ólafsson apresenta algumas das suas obras favoritas de Mozart para teclado, acompanhadas por peças de uma seleção de contemporâneos do compositor. Estes contemporâneos incluíam C.P.E. Bach, Haydn, Galuppi e Domenico Cimarosa, o compositor desta faixa em particular. "Talvez todos os quatro ofereçam uma oportunidade para calibrar o ouvido contemporâneo em relação às ideias, estilos e gostos predominantes da época", comenta Ólafsson. Espero que este contexto específico, uma mistura do célebre e do obscuro, possa alterar ligeiramente a nossa sintonia psicológica, removendo parte da bagagem que todos trazemos connosco em relação à música de Mozart. De qualquer modo, foi isso que me propus fazer: abordar até as obras mais conhecidas de Mozart com a mesma liberdade e entusiasmo infantil que senti ao descobrir as obras raras e incrivelmente líricas de artistas como Galuppi e Cimarosa."
 
Víkingur Ólafsson interpreta Mozart: Adagio in E Flat (Arr. Ólafsson from String Quintet No. 3 in G Minor, K. 516).

terça-feira, 26 de agosto de 2025

Viajar pela Espanha

Viajar torna uma pessoa modesta - vê-se como é pequeno o lugar que ocupamos no mundo.
Gustave Flaubert
Espanha in 4K - Incredible Scenes & Hidden Gems ( lugares incríveis e pérolas escondidas), por 4kfilms Adnan

segunda-feira, 25 de agosto de 2025

As minorias estúpidas


AS MINORIAS ESTÚPIDAS
por Eugénio Lisboa
"Um representante estúpido de uma minoria respeitável não merece mais carinho do que um representante estúpido de uma maioria igualmente respeitável. Ser uma minoria não é uma virtude, do mesmo modo que o não é ser uma maioria. São factos da vida, não são méritos nem deméritos.
Vem tudo isto a propósito desta nova versão da “apropriação cultural” que é o facto de um papel de personagem trans, numa peça de teatro, só poder ser desempenhado por um actor, se este for trans. Que se impeça um actor trans de desempenhar um papel qualquer – trans ou não trans – é uma coisa diferente e reprovável, por ser uma injustificada discriminação. Mas que se considere que o papel de um personagem trans só pode ser desempenhado por um actor trans é do domínio da pura idiotice, porque é ignorar tudo sobre o que é teatro e o que é ser actor. Extrapolando as consequências desta ideia peregrina, um médico só poderia ser desempenhado por um médico, um padre por um padre, um criminoso por outro criminoso, um Hamlet só por um Príncipe da Dinamarca, um Othelo por um mouro (lá se ia pelo dreno abaixo a magnífica interpretação de Laurence Olivier), e os rinocerontes da peça de Ionesco por verdadeiros rinocerontes. Que estas ideias estúpidas surjam é do domínio da diversidade humana, mas que haja quem lhes dê alguma atenção carinhosa é do domínio do paternalismo mais suspeito. Uma idiotice é uma idiotice é uma idiotice, como teria dito Gertrude Stein, se alguém lhe aparecesse com estas tontices da apropriação cultural.
Em geral, estas ideias “luminosas” originam-se nos Estados Unidos da América e espalham-se rapidamente pela Europa, como fogo por palha seca. Nós somos sempre os últimos a absorver estas idiotices e fazemo-lo com o orgulho contente dos provincianos. Aqui há uns anos atrás, tivemos o orgulho de ser negro e, depois, o orgulho de ser homossexual e o “dever” de sair do armário (Eugénio de Andrade foi estupidamente vituperado por a sua poesia não ser ostensivamente homossexual…). Ora ser negro ou ser homossexual não são motivo nem de orgulho nem de vergonha, porque nem um nem o outro fizeram nada para sê-lo: são-no, ponto final. Como o direito a preservar a sua vida íntima – caso de Eugénio de Andrade – é um direito a respeitar e vale tanto para o homossexual como para o heterossexual. Não há literatura homossexual nem literatura heterossexual, há só literatura, boa ou má. Não vejo que nenhum deles tenha vantagem em remeter-se para um gueto. Estas causas do “politicamente correcto” pertencem à categoria milenar e altamente reprovável da REPRESSÃO. São perigosas para a saúde mental e para a saúde tout court. E são, sobretudo, graves atentados à inteligência. Como falar com clareza e candura destas coisas faz mau sangue a muita gente que odeia pensar, preparo-me para o que aí vem. É fartar, vilanagem, como disse o outro em Alfarrobeira."
Eugénio Lisboa, 25.12.2023

domingo, 24 de agosto de 2025

Ao Domingo Há Música


Ninguém pode suportar a maravilha
e se quer dizê-la é preciso fugir-lhe
para não ficar demasiado preso a ela
e poder amá-la na medida da distância.
 António Ramos RosaAs Palavras

 Nem sempre é possível descobrir o que há de maravilhoso escondido na nossa memória. Alguém dizia que em tudo é preciso moderação porque nem a capacidade  de armazenar todas as memórias é possível numa vida longa.  A minha já se alonga. Mas  permite-me revolver  tantos momentos. Chegam soltos e livres de amarras . Há uns que puxam outros. E entre eles , há os que, de supetão, sem licença ou permissão, se impõem fortes e subjugadores. Vêm vestidos de tempo. E o tempo deixa  que, na medida da distância, os revivamos num sabor quase idêntico .

Barbra Streisand, em Memory (Official Video).
   
Rod Stewart e   Amy  Belle, em I Don't Want To Talk About It (from One Night Only! Live at Royal Albert Hall).
 
Queen, em Love of My Life.
 
Scorpions, em  Wind Of Change (Peters Pop-Show, 31.12.1991)
   
Bruce Springsteen & Pattiem  Tougher Than The Rest.

sábado, 23 de agosto de 2025

Os velhos sabem pouco




Os velhos sabem pouco e pesam muito no orçamento
 
Não sou suficientemente novo
pra me dar ao luxo de saber tudo,
dizia Wilde, sem ir a Moscovo,
onde, de resto, ficaria mudo.
 
Os velhos sabem todos quase nada:
com o tempo, esqueceram o que sabiam.
Mas, nos jovens, o saber sobrenada
e, com tal saber, tudo alumiam!
 
Quanto menos se sabe mais se sabe,
é o farol que guia a juventude;
não há, de facto, saber que acabe,
 
se a ignorância é cheia de atitude.
Sabem tudo os jovens que nada sabem,
por isso é bom que os velhos acabem!
                            20.08.2023
Eugénio Lisboa, (soneto inédito)
 
Nota: Por enquanto, é só uma cantiga de escárnio e maldizer. Mas lá chegaremos, lá chegaremos, e não vai ser preciso esperarmos muito. A aceleração para o pior é cada vez maior. Não tarda muito, os velhos vão ser os principais culpados de tudo. Há por aí muito monte, para onde os levar, dando-se-lhes uma manta. 

sexta-feira, 22 de agosto de 2025

Ansiada, amada e bem vinda, eu vinha juntar-me à família

I – Para lá do tempo
por Maria José Vieira de Sousa
 
O presente é o lugar onde vivemos, enquanto o passado é o lugar onde sonhamos.
  John Banville, Retalhos do Tempo, um  memorial de Dublin
 
"Naquele tempo, o meu nascimento já não era uma novidade. A minha mãe sabia-lhe  todos os segredos. Desde quando os primeiros sintomas se anunciavam até à explosão final de um outro ser, de uma outra vida. Há vários anos que vinha sendo mãe. Eu era o seu terceiro filho. Não era, em precisão e em objectividade, a novidade. Aquilo que faz de uma mulher a maior geradora de riquezas e que a eleva a um patamar de transcendência total e única: a descoberta da maternidade. A minha mãe  já a descobrira há alguns anos . Ansiada, amada e bem vinda, eu vinha juntar-me à família.
Preparara tudo com mão mestra. Encomendara um soberbo enxoval, embora aproveitando algumas peças da minha irmã que nascera havia dois anos. O berço fora remodelado apenas nas forras interiores. Era uma peça valiosa,  de madeira trabalhada, que vivia na família com vaidade. Fora e seria também o leito de todos os meus irmãos. O meu pai herdara-o quando casara. Fora a aposta para o sucesso de uma grande família. Sendo ele o mais novo de sete irmãos, tinha sido o último  a usá-lo. O berço competia-lhe e, de acordo com o vaticínio da minha avó paterna, era o símbolo da fertilidade futura.
Nesse dia aprazado , nasci de mansinho. Eu, uma singular criaturinha.  Esta, que, para lá do tempo, tenta reescrever uma história que findou. Pequenina, roliça, embrulhada em vermelho púrpura , já que nascer exige também esforço para quem quer aparecer. Vinha aumentar uma família predestinada a ser numerosa.  E foi.  Seis filhos que se sucederam, ano após ano, dando à casa e à  família o estatuto real  de grandeza. E essa grandeza não era apenas  quantitativa.  Éramos muitos numa grande  casa. Mas uma casa grande onde se  respirava uma buliçosa alegria e um eufónico ruído.
Nasci à noite. Quando o dia de um Agosto, quente e estival, estava a sumir do calendário, nesse ano glorioso. Era a véspera do dia da cidade. O meu pai, apostado em unir-me a uma data assinalável, decidiu registar-me  no dia seguinte. Pensava ele que esse gesto me traria fama e glória. Enganou-se ou enganei-o eu. Não fiquei na história dos notáveis, nem a isso me propus. 
Nasci com um sorriso a aflorar nos lábios. A minha mãe nunca se cansava de o referir. Sorriso que passou a ser um traço identificativo  e talvez o mais sedutor da minha personalidade. Mantive-o ao longo da vida. Era um sorriso único, realçava a minha mãe. Cativei-a infindamente. Ela tinha, porém, um sorriso maior do que o meu. Era a luz que sempre se acendeu desde o meu primeiro dia. Iluminava tudo à sua volta. E que falta me faz essa luz.( As mães não deveriam partir. Deixar-nos órfãos.) 
A azáfama que causou o meu nascimento  obrigou à requisição de familiares. A minha avó espanhola, andaluza de Sevilha, deixou Lisboa e rumou ao Norte. Era a minha avó materna. Recém viúva de um gentleman alemão. Efusiva e decidida, passou a comandar, com mão forte, os empregados da casa e os netos.  Isolou  a minha mãe e com ela ,lá fui eu, também, para os aposentos mais recônditos da casa. Pretendia resguardar-nos da agitação de uma casa habitada por adultos e por crianças e dos intensos ruídos que campeavam pela rua devido à festa da cidade. Nos primeiros dias, a minha mãe aceitou as regras impostas com algum agrado e também pela conformidade que tinham com os preceitos, então, usuais e seguidos pelas  parturientes. Os partos  eram feitos em casa. No entanto, havia  uma terapia definida para uma boa convalescença que passava pelo repouso e por uma  alimentação específica. À minha mãe, apesar de ter uma mãe bem esclarecida e aberta, foi-lhe totalmente aplicado esse tratamento.  Ao fim de meia dúzia de dias, o isolamento tornou-se insuportável. Era uma fatalidade a que minha mãe não queria  entregar-se. De rebelião em rebelião, decidida e  doce, ora filha dedicada , ora mãe independente, conseguiu amaciar a relutância da  minha avó e mudar-se para o quarto que lhe pertencia.
O calor e a confusão da casa em nada me perturbavam. Dormia feliz e cândida como compete a um recém- nascido. Estava na minha casa , no lugar que me haviam reservado. O quarto dos meus pais. Enorme, de tecto alto, mas acolhedor e confortável. Vivi nele os primeiros meses de vida  até completar um ano. Só lá voltei a dormir, quando a Escarlatina me tomou e foram obrigados a isolar-me por causa do contágio. Tinha eu cinco anos."
Maria José Vieira de Sousa, in O Livro que já escrevi - Memórias, Maio de 2018, pp.6-8

quinta-feira, 21 de agosto de 2025

Viajar pelos lugares imperdíveis da Roménia

A Europa é um continente de encantos e de assombros. Descobri-lo é sempre uma imperdível surpresa.
Os lugares imperdíveis da Roménia em 4K, por 4k Films  Adnan

Na Memória do 21 de Agosto

James Cook descobre a Austrália
21 Agosto 1770
"O capitão europeu James Cook foi quem descobriu a Austrália, quando explorava o continente para o Reino Unido. A descoberta foi no dia 21 de Agosto de 1770 e recebeu o nome de Nova Gales do Sul. A região já havia sido visitada por portugueses em 1522 e em 1525 e por holandeses no século XVII.
Foi postulada pelo geógrafo Ptolomeu que denominou o continente de Terra Australis Incógnita com a hipótese de ser fonte do rio Nilo. A terra australis provocava obsessão e imaginação aos navegadores que pensavam haver grandes riquezas de ouro e especiarias. Foi preciso quase 300 anos de viagens para que James Cook no final do século XVIII descobrisse a terra que hoje é chamada de Austrália.
Após descobrir que a terra australis não era as terras do sul, também a abandonou assim como fizeram os portugueses.
Somente em 1642 ,  a Austrália foi oficialmente descoberta. Um holandês chamado Abel Tasman chegou  a uma ilha ao sul da Austrália e então chamou-a  Tasmânia.
Em 1868, a terra descoberta foi usada para abrigar 168.000 ingleses que cumpriam pena; eram ladrões, trapaceiros e convictos. Em 1830, o envio dos ingleses já tinha sido suspenso e então passou a ser cobiçada pelos fazendeiros ingleses. Em 1851, foram descobertas grandes quantidades de ouro por todo o território, o que atraiu vários curiosos e gananciosos por fortunas."
Fonte: Cais da Memória
A Batalha do Vimeiro
21 Agosto 1808
"A Batalha do Vimeiro foi travada no dia 21 de agosto de 1808, no âmbito da Primeira Invasão Francesa de Portugal. De um lado, estava o exército francês napoleónico comandado por Jean Andoche Junot constituído por cerca de 13000 homens e, do outro lado, o exército anglo-luso composto por aproximadamente 19000 homens, comandado por Sir Arthur Wellesley, o futuro Duque de Wellington.
Após a Batalha da Roliça, que teve lugar no dia 17 de Agosto, Sir Arthur Wellesley trouxe as suas tropas para o Vimeiro para cobrir o desembarque de reforços na Praia de Porto Novo. De modo a proteger esta operação, criou uma linha defensiva na zona do Vimeiro, postando
 tropas nas elevações de terreno.
No dia 20 de agosto, Junot, que estava em Torres Vedras, coloca as suas divisões em marcha para a batalha.
Na manhã do dia 21 de agosto, Junot ordenou um ataque direto ao outeiro do Vimeiro (onde hoje se encontra o Monumento Comemorativo do Primeiro Centenário da Batalha e o Centro de Interpretação da Batalha do Vimeiro) e enviou também tropas por norte, no sentido de fazerem uma manobra de envolvimento.
Os confrontos mais importantes e decisivos aconteceram no outeiro. Após dois ataques fracassados e percebendo a impossibilidade de fixar o inimigo na colina, Junot enviou tropas para tomar a localidade. Na zona da Igreja, travou-se uma sangrenta peleja que acabou com a retirada dos franceses, perseguidos pela cavalaria anglo-lusa.
 
Sem conhecimento da situação do flanco esquerdo, duas brigadas francesas confrontaram os britânicos nos altos da Ventosa e Fonte Lima. Uma vez mais, os franceses viram-se forçados a recuar .A Batalha do Vimeiro foi uma vitória inegável do exército anglo-luso sobre as forças da França Imperial, pondo termo à Primeira Invasão Francesa. Em termos de baixas (mortos, feridos, prisioneiros, desaparecidos) foram de cerca de 1800 homens para os franceses e de 720 para o exército anglo-luso."
Fonte: Cais da Memória

quarta-feira, 20 de agosto de 2025

Ali, no meio das águas...

A vida a bordo
por Maria Ondina Braga
"Se um dia soubesse contar das minhas viagens e das pessoas que nelas conheci, penso que teria um assunto de romance.
Primeiro, as viagens por mar. Há na vida a bordo certa intimidade, ao mesmo tempo espontânea e fictícia, que marca tanto os viajantes como a tripulação de um sinal humano e fútil. É-se nessas viagens mais sincero e mais insensato que nunca. Creio mesmo que ali, no meio das águas, cada qual se mostra o que deveras é, com as suas grandezas e as suas misérias, como se, postos de parte preconceitos e medos, todos quisessem, enfim, representar o papel que lhes ditou o grande autor.
Tais viagens são, sem dúvida, as mais interessantes e as mais inverosímeis também. O encanto que a ociosidade e o mar concedem àqueles dias no barco desfaz-se logo que se anuncia o porto de desembarque, ninguém se conhecendo mais depois, cada um ingénua e precipitadamente ocupado em reajustar a máscara do mundo."
Maria Ondina Braga, in Estátua de sal, Círculo dos Leitores (ed. refundida e ampliada), p.167

terça-feira, 19 de agosto de 2025

Da crueldade assassina


    Escrevi e publiquei neste blog , em Maio de 2022, esta crónica que reproduzo . Pertencia a uma série de crónicas a que dei o título de Crónicas da Infâmia. De lá para cá , a infâmia continua e numa reprodução alucinante. A dor e a estupefacção têm sido de tamanha intensidade que deixaram a própria infâmia uma palavra menor para dar nome à trágica hecatombe que os tiranos deste mundo têm provocado. Morrem diariamente pessoas, seres humanos de todas as idades, a maioria morta pelo ódio desses abjectos ditadores. Quase quatro anos se passaram desde que o maléfico ditador da Rússia invadiu a Ucrânia. Nesse tempo, a crueldade reinou e a soberba da capitulação do povo ucraniano nunca esmoreceu em Putin. Vê , agora, a oportunidade maior, através da ajuda do seu admirador dos USA, de vergar a Ucrânia aos seus apetites de grandeza territorial. A astúcia e a crueldade escondem-se no esgar matreiro deste antigo serviçal da KGB.
    Oxalá  a Ucrânia e a Europa saibam discernir com lucidez.
    Metalúrgica de Mariupol em pleno ataque pelas tropas russas

    Crónicas da Infâmia
    10 . Da crueldade assassina


    O homem de ontem morreu no de hoje,
    o de hoje morre no de amanhã.
    Plutarco, De E apud Delphos,18

    Sofrer é um momento muito prolongado.
    Não podemos dividi-lo por estações. […]
    Para nós o tempo não progride. Ele gira.
    Parece circular em torno de um centro de dor.
    Oscar Wilde, De Profundis


    De acordo com a tradição popular , o tempo mede-se. É , por tal, mensurável. Tentar tecer qualquer tratado sobre o tempo ou evocar as diversas teorias quânticas que sobre ele circulam, postuladas por clarividentes cientistas, não é esse o propósito. Não, o que me traz e quase me obriga a reescrever é o horror que chega diariamente e se arrasta sem fim, desde 24 de Fevereiro, dia em que a Ucrânia anunciou ter sido alvo de 203 ataques russos, durante doze horas. Tempo que é real , que matou, feriu, destruiu, arrasou. Tempo que gira, circula de ontem para hoje e num amanhã que se anuncia igual ou mais lúgubre.
    Por mais que se prometam conversações e se formem mesas de negociação , o fumo da paz não eclode e nem o Vaticano é capaz de o propiciar. O Papa Francisco anunciou ter comunicado a Putin, ao vigésimo dia desta infame invasão assassina, a disponibilidade para um encontro em Moscovo. Putin , lá do fundo do inferno, não ouviu, não respondeu, talvez de tão ensimesmado com o satânico barulho da fornalha e o diabólico prazer de a encher. A miragem de um novo Império russo alteia-lhe o ferino coração e agiganta-o perante a aniquilação dos mais fracos. São assim os déspotas, os monstros que se julgam imortais e acima do Homem.
    E os dias sucedem-se num terrífico devir que por mais que nos magoe , continuam indiferentes ao peso da mágoa de cada um. E se ficamos incomodados neste limbo de espectador , não sei como será viver nessa guerra. A morte persegue feroz em desafio constante à vida que se deseja preservar. É uma luta titânica, em estado de autêntica vulnerabilidade e sofrimento.
    E há quem argumente que se busca a guerra e não a paz. Como é possível encontrar a paz , quando se é invadido em brutalidade e desmesura no seu próprio país.
    Vladimir Pastourkhov, (historiador e filósofo a viver em Londres) recorda que quando esta catástrofe eclodiu , ela não lhe era inesperada . A tendência do regime russo para a fascização desde 2011 ( quando se sentira um esboço de revolução liberal popular, NDLR), era evidente. E acrescenta: -" Publiquei em 2012 uma série de artigos , recebidos então como as meditações de um louco, porque escrevi que a natureza do regime tinha mudado e que a guerra com a Ucrânia estava em marcha . Esta guerra da Ucrânia é a consequência inevitável da evolução do regime putinista, que tendo medo da revolução e desejando preservar o seu poder, utiliza a energia das massas, desviando-as para uma agressão exterior. Putin teve sempre a mesma ideia: preservar o seu poder. E soube expulsar a revolução para o exterior à custa da guerra, para dirigir a energia das massas para o estrangeiro."
    A finalidade está exposta e confirmada. Putin tem como ambição a conquista de novos territórios. A Rússia, que sonha , terá de ser o antigo império perdido. E a Ucrânia é o território que lhe serve agora. A guerra feita pelo seu exército faz da sua pequenez, uma força. Violar, esquartejar, esventrar, envenenar é o alimento que o sustenta . Sendo um espírito fraco encontra na tirania a sua fortaleza .
    Chegámos ao sentimento do não valor da existência quando compreendemos que ela não pode interpretar-se, no seu conjunto, nem com a ajuda do conceito de fim, nem com a do conceito de unidade, nem com a do conceito de verdade. Não chegamos a nada, não logramos coisa nenhuma dessa espécie, dizia Friedrich Nietzsche.
    Que resta, então, à Ucrânia? Render-se e entregar o seu território aos apetites sanguinários de Putin?! Que fazer perante tal iniquidade? O mundo observa. A Ucrânia resiste, com o seu território a ser destruído , qual Cartago saqueada, incendiada, quase regada com o mesmo sal.
    E as pessoas que sobrevivem em caves, em bunkers improvisados, nos túneis húmidos e agora fétidos de uma metalúrgica bombardeada , fustigada pela cruel cegueira das bombas, na cidade destruída de Mariupol? E as crianças sem infância , à mingua dos dias de fome? E os idosos, frágeis, vulneráveis entre ruínas ? Que fará o mundo? Espera que todos morram? Que tudo soçobre para Putin reinar.
    Não imagino como se possa baixar os braços à sórdida voragem deste facínora invasor.
    Será que a história da humanidade pode ser escrita com tal infâmia?!
    Que Deus não salve Putin. Viva a Ucrânia.
                    4 de Maio de 2022
    Maria José Vieira de Sousa

domingo, 17 de agosto de 2025

Ao Domingo Há Música

Sobre uma torre estava uma mulher de túnica branca, a pentear os cabelos que lhe chegavam aos pés. O pente soltava sonhos, com toda as suas personagens: os sonhos saíam dos cabelos e iam pelo ar.

Eduardo Galeano, O País dos Sonhos - O Livro Dos Abraços.

A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me  dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.
 Fernando Birri, citado por Eduardo Galeano in ‘Las palabras andantes?’

 

O apontamento musical deste domingo traz a memória de um tempo iniciático de uma geração que sonhava ainda e acreditava na utopia. Uma geração ruidosa que não gritava para abafar o ruído. Apenas pretendia clamar bem alto que contassem com ela, num mundo onde a paz e a liberdade fossem reais. 
Hoje , o mundo  está cheio  de um ruido ensurdecedor que fere e mata. É tempo de reviver uma outra utopia para ruidosamente lhe dar término.

Creedence Clearwater Revival , em Have You Ever Seen The Rain (Official).
Creedence Clearwater Revival, em Up Around The Bend (2021 Stereo Remix / Remaster).
   
Creedence Clearwater Revival, em  Proud Mary (Lyric Video).
 
Creedence Clearwater Revival, em  Down On The Corner (Official Lyric Video).
 
"Os Creedence Clearwater Revival (frequentemente chamados Creedence ou CCR) foram uma banda de rock norte-americana activa no final dos anos 60 e início dos anos 70, composta pelo vocalista, guitarrista e compositor principal John Fogerty, o seu irmão, o guitarrista rítmico Tom Fogerty, o baixista Stu Cook e o baterista Doug Clifford. Estes membros tocaram juntos desde 1959, primeiro como The Blue Velvets, depois como The Golliwogs. O seu estilo musical abrangeu os géneros roots rock, swamp rock e blues rock. Tocavam num estilo de Southern rock, apesar das suas origens na área da Baía de São Francisco, com letras sobre o rio Mississippi e outros elementos populares da iconografia do sul dos Estados Unidos, bem como letras com consciência política e social sobre temas como a Guerra do Vietname. A banda actuou no Festival de Woodstock de 1969, no interior do estado de Nova Iorque. O grupo separou-se amargamente no final de 1972, após quatro anos de sucesso nas tabelas."

sábado, 16 de agosto de 2025

Viajar pelos Lugares Mais Surpreendentes do Peru

PERU EM 4K – Os Lugares mais surpreendentes que poucos conhecem, por Mundo real. 
"Prepare-se para descobrir um Peru que vai muito além de Machu Picchu…Neste vídeo em 4K cinematográfico, será levado por uma jornada pelas paisagens mais surreais, místicas e escondidas do país dos Andes. De cachoeiras cristalinas a montanhas coloridas, de vales secretos a trilhas ancestrais, conheça os lugares mais surpreendentes que poucos conhecem — mas que vão ficar gravados na sua memória. Cada imagem é uma pintura viva.Cada trilha, uma passagem para o sagrado. Esse é o Peru invisível ao turista comum… e absolutamente imperdível."

sexta-feira, 15 de agosto de 2025

Putine , o bufo prodigioso

PUTINE, O BUFO PRODIGIOSO
Manual do insulto
(Em linguagem muito contundente
e em redondilha maior mal-empregada)

1

Este bufo achavascado,
este grande rabisseco,
bandido azoratado,
que, no crime, não é peco,

2

este enorme sevandija
e grandíssimo coirão,
faz-que-mija-mas-não-mija,
este filho de um cabrão,

3

sempre a armar ao pingarelho,
engrunhido e quezilento,
já careca e sem pentelho,
coa banana já dormente,

4

grandessíssimo brigão,
sebento e cleptomaníaco,
este inepto fanfarrão,
perigoso hipocondríaco,

5

este camisa-de-vénus,
para uso em piça alheia,
este dono de um ânus
que só dá para diarreia,

6

egrégio filho da puta,
que cheira mal da boca
e manda os outros prà luta,
enquanto se fecha na toca,

7

um poltrão de cu tremido,
cara de bode sem pêlo,
calhordas mal fodido,
sacana, no atropelo,

8

pariu-o o cu de sua mãe
– assim nasceste tu!
e a vagina de mamãe
ficou com cara de cu.

9

Protoplasma fedorento
e pateta enxacoco,
todo ele, ressentimento,
imbecil e monobloco,

10

que aborto malcheiroso,
que rosto alucinado!
Que focinho ardiloso,
que velhaco mais safado!

11

Mas pede misericórdia
minha caneta cansada
de mexer nesta mixórdia,
que não nos leva a nada.

12

Então, de ti me despeço,
com extrema devoção:
prò inferno, não te impeço,
hasta la vista, cabrão!
                            12.03.2022
Eugénio Lisboa, in Poemas em tempo de guerra suja, Guerra & Paz Editores, Setembro de 2022, pp.26-28

quinta-feira, 14 de agosto de 2025

A fuga à realidade

A fuga à realidade
por Eugénio Lisboa

 

The whole  problema with the world is that fools and fanatics are so certain
of themselves and wiser people so full of doubts.
                                         Bertrand Russell

"Quando ainda vivia em Moçambique, tive um amigo, agora já falecido, que era um conhecido jornalista, poeta, contista, cronista, com um razoável talento e bastante leitura. Embora não enfeudado a nenhum partido, “torcia”, como grande parte da juventude, naquele tempo, para o lado da esquerda dura. Um dia, em conversa amena, falei-lhe do escritor inglês Aldous Huxley, que eu lia desde a minha adolescência e de quem admirava a inteligência acutilante, alimentada por uma enorme erudição. Os seus romances Antic Hay (1923), Point Counter Point (1928), Brave New World (1932), Eyeless in Gaza (1936), After Many a Summer (1939), os seus admiráveis contos Two or Three Graces (1926) e os seus provocantes ensaios Proper Studies (1927), Ends and Means (1937) e The Human Situation (1978) deixaram marca profunda, na sua época e ainda hoje são altamente dignos de serem revisitados. Nove vezes candidato ao Prémio Nobel, a egrégia Academia Sueca nunca se decidiu a dar-lhe o galardão, talvez por razões que têm muito que ver com a história que comecei a contar. Esse meu amigo dos tempos de Lourenço Marques, ao mencionar-lhe o nome de Huxley, teve uma reacção muito particular: fez um sorriso, muito contraído, quase doloroso e, a muito custo, lá disse de sua justiça: “Prefiro não ler esse escritor. É demasiado inteligente e por isso, perigoso.” Nunca mais esqueci esta resposta, que ouvi depois na boca de muitos outros, igualmente inclinados para a mesma ideologia, pródiga em oferecer certezas confortáveis. A inteligência, por outro lado, desassossegava, oferecia só hipóteses de trabalho, sempre efémeras e substituíveis por outras hipóteses  menos erradas. Mas os ideólogos não costumam gostar de pensar. Foi precisamente Huxley quem disse que pensar é a excepção à regra de não pensar. E Russell notou, com inquietante justeza, que a maioria das pessoas preferiria morrer a pensar e, de facto, faz isso mesmo. Esta rejeição muito generalizada do acto de pensar explica a prosperidade de tantas religiões e ideologias, que são outras tantas religiões. Só os destemidos pensam e os destemidos são uma minoria da humanidade. Uma ideologia forte oferece certezas fortes e nada é um nicho tão acolhedor como uma certeza 
forte. O problema é que o refúgio em certezas fortes é sempre uma fuga à realidade da incerteza e da dúvida, mesmo que sejam estas que fazem andar para a frente o conhecimento humano."
O hábito de fugir à realidade torna-se particularmente perigoso em chefes políticos como Hitler, Estaline ou Putine, cuja alienação pode tornar-se a causa de grandes catástrofes. Nunca esqueço os oficiais alemães que chefiavam dantescos campos de extermínio, mas, à noite, eram carinhosos maridos e pais de família e ouviam, com deleite, a mais refinada música clássica. As cartas de Himmler à mulher são cartas de um marido modelarmente carinhoso. Estes homens encontravam, na noite doméstica, uma fuga à horrenda realidade do dia. Putine, ex-funcionário superior dessa fábrica de assassinatos sem julgamento que foi a KGB, deve ter tido, como o Mr. Kutz da novela de Conrad, Heart of Darkness - que Coppola transportou para o cinema, colocando-a no Vietnam – que refugiar-se fora da realidade, para sobreviver. Esse “fora da realidade” é onde ele continua a residir, para grande risco de ucranianos, de russos e de europeus em geral.
Viver com certezas fortes é, repito, um dos maiores perigos para a continuação da vida na terra. Deixo aqui, para terminar esta pérola de saúde mental: “Ensinar como viver sem certezas e, contudo, sem nos deixarmos paralisar por hesitações, é talvez o essencial que a filosofia da nossa época pode fazer pelos que a estudam.” (Bertrand Russell)."
Eugénio Lisboa, 04.03.2022

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Esse impulso natural

A Música
Agostinho dizia «'Bem' – tu escutas esta palavra e respiras fundo, tu a ouves e suspiras». E ele afirma que o homem não pode exprimir em palavras o sentido mais profundo, a riqueza que se esconde na noção de ‘bem’, assim como sua completa realização: "Dizer, não se pode; calar, também não... Mas o que fazer, se não é possível falar e não dá para calar? Exultai! Jubilate! Levantai a voz sem palavras da vossa profunda felicidade!". Esta "voz sem palavras" (ou uma de suas formas) é: a música! Contudo, ela não é só a voz da felicidade, mas também a voz sem palavras da infelicidade, da carência pela ausência, da frustração, da tristeza, do desespero (a meta não é alcançável sem mais, pois pode ser íngreme e também pode ser dada por perdida!)". No desenrolar mais profundo da realização do ser, mesmo onde a linguagem não se expressa, encontra-se esse impulso natural (também do espírito!). "Daí se segue", diz Kierkergaard "que a música se acha relacionada à fala, tanto precedendo, como sucedendo, manifestando-se como primeiro e como último". A música produz um âmbito de silêncio; nela, a alma entra ‘nua’, por assim dizer, sem a "veste" da oralidade "que se enreda em todos os espinhos" (Paul Claudel). 
“O homem que não tem a música dentro de si e que não se emociona com um concerto de doces acordes é capaz de traições, de conjuras e de rapinas. “ (William Shakespeare, “ O Mercador de Veneza”).
 
Rhapsody in Blue , de George Gershwin, por Leonard Bernstein e   New York Philharmonic (1976).

terça-feira, 12 de agosto de 2025

Sobre o Poder

Para Weber , o poder está fatalmente ligado à violência, postulado que Hannah Arendt recusa. O poder, para Arendt, assenta na consensualidade de uma acção solidária e nunca instrumental onde a verdade é a pedra angular: “ a persuasão e a violência podem destruir a verdade , mas não substitui-la. A verdade é determinante para o entendimento do poder . O poder repousa sobre a reunião de homens iguais que partilham a Liberdade que é o verdadeiro” conteúdo  e sentido original da coisa política”. Quando o poder se esvazia desse conteúdo transforma-se em violência.

segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Viajar pela Polinésia

Andar por terras distantes e conversar com diversas pessoas torna os homens ponderados.
                    Miguel Cervantes
POLINÉSIA FRANCESA como nunca imaginou.Descubra o paraíso para lá dos postais, por Rutas del Mundo.

domingo, 10 de agosto de 2025

Ao Domingo Há Música


 O ritmo tem algo mágico; chega a fazer-nos acreditar que o sublime nos pertence.
                                                  Johann Goethe

Nem sempre temos a percepção exacta de um caminho, quando surge uma encruzilhada inesperada. No entanto, sabemos de imediato quando há qualquer coisa maior que nos comove e encanta. Descobrimos que estamos no lugar certo e é esse momento de nos deixarmos ir.
Assim acontece com a música. Ouvimo-la e a magia toma-nos.

I Gave My All é uma comovente colaboração de Teddy Swims, Billie Eilish, Beyoncé e Adele — quatro vozes poderosas numa balada carregada de emoção. Este hino mergulha profundamente na vulnerabilidade, no amor, no sacrifício e na dor de dar tudo e ainda assim perder."

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sábado, 9 de agosto de 2025

Livros e eventos culturais para Agosto



os meus livros de Agosto
frutos maduros pendurados nos ramos do Verão
por Manuel S. Fonseca
"Sabem – já experimentaram de certeza –, aquele contentamento doce e silencioso, que nos faz fechar os olhos e nos deixa em paz com a natureza, essa alegria contida que se basta a si mesma? É o que sinto com os meus cinco livros deste mês: não me lembro de um Agosto de cujos ramos se dependurassem livros como estes.
A começar pelo Atlas da II Guerra Mundial. É bom e é monumental, quase o dobro do formato dos nossos outros Atlas Históricos, 24 cm de largura por 31 de altura. E é o mais sistemático atlas da II Guerra: todas as batalhas, todos os exércitos, num livro que é uma revolução gráfica, obra de vários historiadores, com organização de Jean Lopez, numa investigação multidisciplinar de três anos. Para recordar essa guerra que começou há 86 anos no dia 1 de Setembro de 1939, fonte da tremenda onda de dor e morte que varreu a Europa e o mundo. 
Da antítese da guerra que é ou deveria ser a literatura, fala-nos o espanhol Felipe Díaz Pardo em A literatura universal em 100 Perguntas. E eu disse «fala-nos» e não «escreve-nos» porque estas 100 Perguntas são a conversa de sonho que sempre quisemos ter sobre «o que tem o vinho que ver com o nascimento do teatro» ou «qual o escritor que melhor usou o monólogo interior» ou «se é possível encontrar Dostoiévski no local do crime». São 300 páginas de sabedoria, surpresas e de um divertissement efervescente: champanhe, ah pois! 
E agora olhem bem para o orgulho deste editor: estão a ver-me a ulular de prazer na varanda? Não admira: é o que acontece a qualquer editor que possa publicar, com um cheirinho de «inédito» a enobrecer-lhe o café, o grande Luiz Pacheco. A culpa é toda, e redondíssima, do Nicolau Santos. Foi o Nicolau que convidou o irascível Pacheco a escrever crónica in illo tempore no Diário Económico e no Público. Para isso mandaram cartas, trocaram confidências, traficaram inconfidências. E ficaram provas de tudo. Num precioso livrinho, Bater sempre também cansa… mas às vezes até é pouco, estão reunidos os textos que testemunham a nua – sim, nua – e linda sinceridade e genialidade da escrita de Luiz Pacheco e a sua desassombrada visão da vida e da criação literária. E, poderia lá faltar, a sua – ohhh! – «percepção» de algumas grandes figuras da nossa intelectualidade. Setenta e duas páginas de ouro.
Falta-me falar de dois romances que chegam às livrarias em cima da nossa rentrée literária. Publico, pela segunda vez, Evelina Gaspar. No seu O Destino Português de Sam, Evelina traz na mão um homem real, o artista Sam Abercombry. É um australiano, pintor, que se apaixonou por Portugal e, obsessivamente, pelo nosso mito sebastianista. Vive connosco há 30 anos e é feliz em Portugal! E andamos nós a chorar baba e ranho pelos cantos. Vamos, mas é, ler este romance e dar com Sam saltos de canguru.
Fecho com o meu amigo luso-angolano Onofre dos Santos. Este é o seu quarto romance comigo. Se o título – O Último Romance de Camilo – vos faz pensar que Onofre abandonou os temas angolanos dos livros anteriores, estão perdidamente enganados. Agora, como é que Onofre arrasta o velho Camilo Castelo Branco para África e lhe põe na boca a palavra Angola… Ou será que é tudo um pretexto e Camilo, salvo o caixote que lhe chega de Malanje, nunca sairá de Portugal, Porto e Seide? 
São os meus cinco livros de Agosto, frutos maduros pendurados nos ramos do Verão. Um dos pêssegos é Luiz Pacheco. Há editores felizes."
Manuel S. Fonseca, editor da Guerra & Paz
Planeamento Editorial Não-Exaustivo Relógio D’Água
Ago-Nov 2025
Agosto
— Jacarandá, de Gaël Faye (Vencedor Choix Goncourt du Portugal 2025 + Vencedor Prémio Renaudot 2024)
— Os Costumes do País, Edith Wharton (Vencedora Prémio Pulitzer + Prefácio de Claire Messud)
— Mishima ou A Visão do Vazio, de Marguerite Yourcenar
— Tarzan dos Macacos, de Edgar R. Burroughs
— No Castelo do Barba Azul, de George Steiner
— Porque Escrevo, de George Orwell (Ensaios Singulares)
— Matar Um Elefante + Um Enforcamento, de George Orwell (Ensaios Singulares)
— As Mulheres e a Ficção, de Virginia Woolf (Ensaios Singulares)
— A Nossa Necessidade de Consolo É Impossível de Satisfazer, de Stig Dagerman (Ensaios Singulares)

Setembro
— Lavagante, de José Cardoso Pires (Filme estreia a 2 de Outubro, assinalando o centenário de nascimento do autor)
— Hospitalidade, de Djaimilia Pereira de Almeida
— Fidalguia sem Maquia, de Luís Aguiar-Conraria (Prefácio de Fernanda Câncio)
— Pontas Soltas II, de José Gil e Ana Godinho
— Abraço, de Anne Michaels (Finalista Booker Prize 2024)
— Os Lobos da Floresta da Eternidade, de Karl Ove Knausgård
— O Estranho Desaparecimento de Esme Lennox, de Maggie O’Farrell
— Coisas Que só Eu Sei, de Camilo Castelo Branco (Contos Singulares)
— Coração, Cabeça e Estômago, de Camilo Castelo Branco (Prefácio de Gonçalo M. Tavares)
— A Pessoa e o Sagrado, de Simone Weil (Ensaios Singulares)
— Filosofia da Aventura, de Georg Simmel (Ensaios Singulares)
— O Balanço da Inteligência, de Paul Valéry (Ensaios Singulares)
— As Alegres Comadres de Windsor, de William Shakespeare (Projecto Shakespeare)
— O Imperador da Alegria, de Ocean Vuong

Outubro
— O Fim dos Estados Unidos da América, de Gonçalo M. Tavares
— Embaixada a Calígula, de Agustina Bessa-Luís (Prefácio de Guilherme d’Oliveira Martins)
— O Princípio da Incerteza: III — Os Espaços em Branco, de Agustina Bessa-Luís
— Marguerite Yourcenar — Liberdade e Paixão, de Cristina Carvalho
— Conversas sobre Deus — Um Diálogo com Simone Weil, de Byung-Chul Han
— Visitação, de Jenny Erpenbeck (autora vencedora do International Booker Prize 2024)
— As Planícies, Gerald Murnane
— Pergunta 7, de Richard Flanagan (Vencedor Baillie Gifford Prize 2024, autor vencedor do Booker Prize)
— Hyperion, de Dan Simmons (Vencedor Prémio Hugo e Prémio Locus)
— A Espada Cintilante, de Lev Grossman
— Sunderworld, Vol. I: As Extraordinárias Desilusões de Leopold Berry, de Ransom Riggs
— Duna III (Romance Gráfico), de Frank Herbert, adaptado por Brian Herbert e Kevin J. Anderson

Novembro
— Matilde, de H. G. Cancela
— Ciência Pop, de Carlos Fiolhais e João M. Santos
— Tóquio, Estação de Ueno, de Yu Miri (Vencedor National Book Award)
— A Morte e o Jardineiro, de Gueorgui Gospodinov
— O Terceiro Reino, de Karl Ove Knausgård
— Jane Austen: Uma Biografia, de Claire Tomalin
— Henrique VI, Parte I, de William Shakespeare (Projecto Shakespeare)
— Henrique VI, Parte II, de William Shakespeare (Projecto Shakespeare)
— Henrique VI, Parte III, de William Shakespeare (Projecto Shakespeare)


Um total de 13 exposições de fotografia e uma mostra de ‘cartoons’ compõem a terceira edição da Mostra de Fotografia e Autores (MFA) Faro, que decorre até 23 de agosto na capital algarvia.
2 Ago a 23 Ago 2025
Fábrica da Cerveja
Rua do Castelo, 10, Faro
"A organização, a cargo da CC11, em colaboração com o Município de Faro, adianta que estarão em exposição na Fábrica da Cerveja fotografias de autores nacionais e estrangeiros e também uma mostra de ‘cartoons’ de André Carrilho.
Durante o período em que decorre a mostra, haverá a oportunidade de tirar retratos ‘à la minute’ e, a 19 de agosto, quando se assinala o Dia Mundial da Fotografia, haverá uma programação especial.
Logo a receber os visitantes encontra-se “a mais performática das exposições da mostra”, em que se vai poder tirar fotografias ‘à la minute’, no âmbito do projeto “A fabulosa máquina de fazer parar o tempo”, de João Paulo Barrinha, em que o ato fotográfico é encarado como performance.
A mostra apresenta também o projeto vencedor da 1.ª edição do Prémio CC11 Fotografia, “Blessed Ground”, um ensaio documental de Ricardo Lopes, que em 2024 acompanhou o impacto da extração industrial de ouro em comunidades rurais de Moçambique.
Os visitantes poderão ainda ver “Alambiques & Alquimistas”, de João Mariano, que retrata as tradições da destilação de aguardente de medronho nas serras de Monchique e Espinhaço de Cão, e o projeto “Muito Frágil”, de Marc Schroeder, que reúne retratos de estranhos com quem se cruzou em Lisboa.
“Margem Sul”, de Luís Ramos, “Joy Bangla”, de Filipe Bianchi, “Crossing Boundaries”, de Alberto Picco, uma retrospetiva do percurso do fotojornalista Carlos Lopes (1949- 2021) e “Middle Ground”, de Joe Wood, são outras das exposições que poderão ser vistas na Fábrica da Cerveja.
A mostra apresenta, ainda, 31 fotografias do projeto “Cante”, de Ana Baião, feito ao longo de uma década e que retrata quem dá corpo e voz ao cante alentejano, e “Change of Season”, que reúne os olhares de 13 fotógrafas sobre transformação, identidade e mudança.
Além destas, estarão também patentes as exposições “O Algarve”, com imagens do arquivo fotográfico de Asta e Luís de Almeida d’Eça, casal que se notabilizou na fotografia vocacionada para a promoção turística da região ao longo das décadas de 1960 a 1980.
O último piso da mostra está inteiramente dedicado à exposição “Da Ucrânia com amor”, de Adriano Miranda, que reúne fotografias e crónicas publicadas no jornal Público, um testemunho direto da guerra na Ucrânia.
Já o piso térreo da Fábrica da Cerveja apresenta “Senhor Lobo”, de André Carrilho, uma seleção de ilustrações criadas para a imprensa ao longo de 2024, retratando as personagens e os acontecimentos que marcaram o ano.
A MFA Faro é de entrada gratuita e estará aberta ao público entre 02 e 23 de agosto, de terça a sábado, das 18:00 às 23:00, e ao domingo, das 10:00 às 13:00."
Fonte: Agência LUSA
Piquenique jazz com Maria Anadon e Hans Fuecker
"Faça o seu farnel e junte-se ao piquenique jazz no relvado do Museu de Lisboa – Palácio Pimenta!

6 Set 2025  |  17h00

Museu de Lisboa - Palácio Pimenta
Campo Grande, 245 – 1700-091 Lisboa
Preço
Entrada livre
Na companhia da voz de Maria Anadon e do pianista alemão Hans Fuecker, saboreie uma série de canções dedicadas ao universo gastronómico, compostas por George Gershwin, Cole Porter e Joni Mitchell, entre outros.
Pelo jardim do Museu de Lisboa ecoam, assim, clássicos como Frim Fram Sauce, Black coffee, A case of you, Recipe for love, Let’s call the whole thing off, The days of wine and roses e The lady is a tramp. E como em 2025 se celebram os 70 anos da passagem de Cole Porter por Portugal, aproveite ainda para dançar ao som de êxitos como Night and day, Begin the beguine, Let’s do it e I've got you under my skin."


50 Independentes: Arte e Liberdade nos Países Africanos de Língua Portuguesa
Exposição que assinala os 50 anos das independências de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe.

12 Jul a30 Ago 2025

Perve Galeria
Rua das Escolas Gerais, n.º 13 . 1100-218 Lisboa
Preço
Entrada livre
"Reúne 50 artistas e mais de 150 obras da Coleção Lusofonias da Perve Galeria, abrangendo mais de 75 anos de produção artística no vasto território da lusofonia.
Entre os nomes apresentados destacam-se artistas com percursos internacionais consolidados, como Ana Silva, Bertina Lopes, Ernesto Shikhani, Malangatana Ngwenya, Manuel Figueira, Manuela Jardim, Reinata Sadimba e Teresa Roza d’Oliveira, entre muitos outros.
A Perve Galeria, em parceria com a Casa da Liberdade – Mário Cesariny, apresentam a exposição “50 Independentes: Arte e Liberdade nos Países Africanos de Língua Portuguesa”, que celebra os 50 anos das independências de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe.
Com curadoria de Carlos Cabral Nunes, a exposição reúne obras de 50 artistas representados na Coleção Lusofonias, um acervo construído ao longo de mais de duas décadas com o objetivo de valorizar e divulgar a produção artística do vasto território da lusofonia, em particular de autores que têm sido historicamente invisibilizados pelo sistema da arte e pela narrativa dominante.
O núcleo patente na Perve Galeria, complementar ao apresentado na Casa da Liberdade – Mário Cesariny, apresenta um conjunto alargado e diverso de obras que atravessam diferentes disciplinas artísticas e abrangem mais de 75 anos de produção nos PALOP, organizados em três núcleos temáticos. O primeiro evidencia práticas de resistência ao colonialismo e aos regimes autoritários, com uma forte carga política e emancipatória; o segundo reflete os processos de afirmação identitária e cultural no pós-independência; o terceiro explora dinâmicas contemporâneas, evocando temas como a diáspora, os cruzamentos culturais e a complexidade das experiências híbridas no contexto global.
Através de obras de artistas de distintas gerações e geografias, incluindo nomes com percursos internacionais já consolidados, como Ana Silva, Bertina Lopes, Ernesto Shikhani, Malangatana Ngwenya, Manuel Figueira, Manuela Jardim, Reinata Sadimba ou Teresa Roza d’Oliveira, entre muitos outros, esta exposição constitui um espaço de encontro, escuta e reflexão crítica sobre os caminhos da arte e da liberdade nos Países Africanos de Língua Portuguesa.
Propõe-se assim uma leitura ampla e plural da produção artística lusófona, destacando o papel da arte como forma de resistência, memória e construção de futuros mais justos e inclusivos."
Visita guiada "Há 150 Anos a Aturar o Zé!"
"O Zé Povinho fez 150 anos em junho, mas está mais vivo do que muitos que por aqui andam!

10 Ago 2025  |  11h00

Museu Bordalo Pinheiro
Campo Grande, 382 | 1700-097 Lisboa
Preço
Entrada livre

Tem uma certa idade e já o aturamos há muito, mas deixemo-nos de idadismo. Este centenário é, na verdade, um companheiro e está bem vivo.  

Vamos provar-vos isso dia 10 de agosto, na Visita Guiada Há 150 anos a Aturar o Zé! 

Quem quer vir conhecê-lo? "

Próximas Datas: 10 agosto (domingo)  
Horário: 11h00  
Preço: Visita gratuita, mediante inscrição prévia  

Informações/inscriçõesservicoeducativo@museubordalopinheiro.pt  
Nota: As inscrições devem ser feitas até às 12h00 da sexta-feira anterior. 

>> Mais informações 

E ainda outras sugestões para leituras 



Os livros do verão
Dez leituras para os dias quentes
por Agenda Cultural de Lisboa 1 Julho, 2025

"Escreveu Pedro Homem de Mello no poema Homenagem: “Poetas podeis crer: / Nosso destino / É pedir vida, ainda, às coisas mortas!”. Para os meses de julho e agosto sugerimos a leitura de dez publicações recentes, entre elas, precisamente, o segundo volume da poesia completa do poeta de Povo que Lavas no Rio. Dez livros repletos de vida para ler no período de férias.

Pedro Homem de Mello
Poemas 1964-1979

Cobrindo os anos entre 1964 e 1979, este segundo volume de poemas de Pedro Homem de Mello vem encerrar a publicação da obra completa do autor. A sua poesia, única e inconfundível, é marcada, como salientou José Régio, pela “sinceridade profunda do seu interesse pelo folclore vivo e do seu amor pelo povo” (“Povo! Povo! Eu te pertenço / Deste-me alturas de incenso”, imortalizado por Amália Rodrigues). Centrada na contradição entre “corpo e alma”, explora o tema do desejo (frequentemente homoerótico), contrapondo a experiência da fugacidade do prazer à permanência do remorso e à noção de culpa e de pecado. “Um pagão com o hábito de ser católico”, lhe chamou David Mourão-Ferreira acrescentando, ao associar o seu universo poético à pintura de Leonardo: “Há em Pedro Homem de Mello, muito de certos artistas do Renascimento, pagãos por natureza, – presos no entanto à letra (que não ao espírito) da religião estabelecida”. A edição ficou a cargo de Luís Manuel Gaspar, com um posfácio incindindo sobre os dois volumes de Fernando Cabral Martins. Eis o tão aguardado regresso do poeta de Eu Hei-de Voltar um Dia, que escreveu: (…) E cumprindo uma promessa, / O Poeta que fui eu / Em cada verso regressa / Do país onde morreu?” LAE Assírio & Alvim

Ernest Hemingway
O Jardim do Paraíso
Ernest Hemingway (1899-1961) nasceu em Oak Park, a pouca distância do local onde Frank Loyd Wright começou a construir os seus projetos. Na realidade, a revolução que o escritor promoveu na prosa em tudo se assemelha à que o famoso arquiteto empreendera nas suas “casas da pradaria”: redução da forma ao essencial e despojamento de toda a ornamentação. O Jardim do Paraíso é um romance póstumo, publicado pela primeira vez em 1986. Hemingway terá trabalhado nele por mais de uma década, sem nunca o ter dado por terminado. David e Catherine Bourne, apesar de parecem irmão e irmã, são um jovem casal americano. Em lua-de-mel no sul de França, entregam-se a uma série de jogos eróticos que exploram essa semelhança, enquanto David, aspirante a escritor, se dedica a redigir o manuscrito de um “romance africano”. Conhecem então a bela Marita e entre os três estabelece-se um relacionamento complexo que se adensa à medida que a escrita do livro se aproxima penosamente da conclusão. Uma obra ímpar no universo do autor, que explora com ousadia e elegância os temas do triângulo amoroso, da fluidez de género e da fusão de homem e mulher numa mesma entidade. Foi um dos livros de referência para o artista português Julião Sarmento. LAE Livros do Brasil

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Samanta Schweblin
O Bom Mal
Samanta Schweblin nasceu em Buenos Aires em 1978 e vive em Berlim desde 2012. Vencedora de prémios importantes, como o Juan Rulfo e Casa de las Américas, é autora dos volumes de contos Pássaros na Boca e Sete Casas Vazias, e do romance Distância de Segurança, que, assim como Kentukis, foi finalista do International Man Booker Prize. A revista Granta inclui-a na lista dos 22 melhores escritores de língua espanhola com menos de 35 anos. O título da presente coletânea de contos, O Bom Mal, é profundamente revelador do universo literário da autora que explora o território do ambíguo, da estranheza, da inquietação, do fantástico e até do terror. Como escreveu o crítico do Expresso, José Mário Silva, Samanta Schweblin “insiste em rasgar o tecido do quotidiano com as lâminas da estranheza e do desajuste”. Curiosamente, estes seis contos têm todos origem na vida real, inspirados em pessoas, animais, factos ou acontecimentos que Samanta conheceu ou testemunhou. Sobre a narrativa William à Janela, declara: “aconteceu verdadeiramente. Talvez seja o conto mais autobiográfico que escrevi, e talvez também por isso seja melhor não dizer mais nada.” LAE Elsinore

Julian Barnes
Mudar de Ideias
“Alguns de nós temos convicções fortes fracamente sustentadas, outros têm opiniões fracas fortemente sustentadas. Sempre presumi que os liberais como eu têm opiniões moderadas moderadamente sustentadas. Mas não tenho a certeza de que continue a ser esse o caso. Quando agora pedem a minha opinião sobre um assunto público qualquer, a tentação que me assalta é replicar: ‘Bom, na República Benigna de Barnes…’ Neste breve conjunto de ensaios e palestras cujos temas são Memórias, Palavras, Política, Livros, Idade e Tempo, nunca saímos em boa verdade dessa “República Benigna de Barnes”, onde o escritor, com recurso a histórias da sua vida e da de outros, vai dando conta daquilo em que as suas ideias se mantiveram inalteradas (sobretudo no uso rigoroso das palavras e nos valores sociais e civilizacionais a que a política devia corresponder), ou em que houve mudança de opinião (nomeadamente sob a influência da memória dinâmica e nunca estável, e na apreciação de determinados escritores). Terminamos a leitura deste livrinho ligeiro e divertido com uma ideia benigna sobre a pessoa do autor. São textos que geram empatia e proximidade, onde apenas uma pessoa discursa, mas em que a ilusão da conversa acontece. "RG Quetzal

Paulo José Miranda
Máquinas de Ficção
Paulo José Miranda evoca a tradição de “textos acerca de textos” referindo como influência maior e mais antiga a de Pseudo-Dioníso que se fez passar por Dionísio o Aeropagita, um ateniense que se teria convertido ao cristianismo após escutar as palavras de São Paulo. Pseudo-Dioníso não só inventou um autor que teria vivido 400 anos antes dele, como se referiu a livros que teria escrito e que nunca apareceram. Livros que cita mais de uma vez. Para além disso, “parece usar as citações de livros que não escreveu para construir aqueles que escreveu”. A propósito, Paulo José Miranda conclui; “A pós-modernidade surgiu algures no Médio Oriente entre os séculos V e VI”. Ora, Máquinas de Ficção é, justamente uma invulgar recolha de textos sobre textos. Originalmente publicados no jornal Hoje Macau, convidam o leitor, de forma provocatória, a explorar resenhas de livros que nunca foram escritos — “mas que talvez devessem existir”. Cada texto é uma porta aberta para um universo literário alternativo, onde a crítica se torna criação. Mantendo o jogo com o leitor, Paulo José Miranda cita um excerto de um suposto ensaio de Hélder Macedo, autor que muito admira: “No universo não há lado de fora e lado de dentro, tudo é lado de dentro. E assim acontece no romance. (…) Tal como no universo, no romance tudo é intertextualidade.” LAE Caminho

Fernanda Cachão
O Estado Novo em 101 Objetos
A jornalista Fernanda Cachão lança uma obra, resultante de uma pesquisa de cerca de cinco anos, onde reúne uma seleção de 101 objetos que representam como se vivia antes do 25 de abril de 1974. Esta iconografia de objetos e documentos ilustra, muitas vezes melhor do que palavras, a ideologia que, com firmeza e com tato calculado, dominou Portugal durante 48 anos. Para as novas gerações será, porventura, com alguma surpresa que realizarão que em tempos era preciso licença para usar isqueiro, ter autorização do marido para sair do país e tantas outras condicionantes impostas ‘a bem da nação’. O livro pode ser lido abrindo as páginas ao acaso, ao sabor da curiosidade, para saber um aspeto do regime e o seu enquadramento, pessoal e público. Ficam-se a conhecer ou recordar aspetos curiosos e pessoais como as alcunhas de Salazar: ‘o Botas’, por ter sido fotografado numa cena bucólica, em Almourol, com António Ferro, mostrando as solas das botas esburacadas, uma prova da sua apregoada frugalidade (ainda que normalmente usasse botas de canos alto de boa pelica); ou ‘o Esteves’, por serem constantes as notícias que informavam ‘esteve ontem em visita o Sr. Presidente do Conselho…’. Em suma, trata-se de um compêndio ilustrado do que não convém esquecer. TCP Lua de Papel

Inês Lampreia
No tempo dos super-heróis
É o segundo livro de Inês Lampreia, que tem publicado textos de crónica, ficção e prosa poética nos últimos anos. No tempo dos super-heróis reúne 12 contos e é a um deles que vai buscar o título. No posfácio, afirma o poeta e ensaísta João Rasteiro: “Mais do que uma escrita feminista, julgo estarmos perante uma escrita feminina, comprometida com a contenda por uma sociedade mais justa”. Tendo sobretudo mulheres como protagonistas, mas não reivindicando nenhuma causa, a autora deixa-as subentendidas nas várias histórias que nos conta, passadas desde os tempos das nossas avós e bisavós aos dias de hoje. Cada conto vale por si, no entanto, avançando na leitura, vamos percebendo que se ligam uns aos outros e que, todos juntos, criam um retrato de Portugal no último século. Inês Lampreia usa uma escrita tão descomplicada e “da terra” como as histórias que imaginou. Evoca vidas duras, seja na pobreza ou na solidão, seja na crueza dos campos alentejanos ou na alienação dos dias em Lisboa – cada uma no seu contexto, vidas impregnadas de infelicidade, algumas ainda com réstias de esperança, outras nem isso. Porque, se ali existe uma avó que se refugia nas nuvens ou uma mãe que voa atrás do canto dos rouxinóis, parece que hoje a poesia se foi. GL Urutau

Afonso Cruz
O vício dos livros II
“Há aqueles que não podem imaginar um mundo sem pássaros; Há aqueles que não podem imaginar um mundo sem água; Ao que me refere, sou incapaz de imaginar um mundo sem livros”. É com esta frase do argentino Jorge Luis Borges que Afonso Cruz inicia O vício dos livros II. Depois de, em abril de 2021, ter lançado O vício dos livros, o autor regressa com mais histórias, reflexões e curiosidades para aqueles que não podem viver sem a literatura. Sempre a pensar no leitor e na recorrente questão de como incentivar hábitos de leitura, este volume reúne cerca de 40 textos, alguns autobiográficos, sobre o processo de escrita e sobre a capacidade de a poesia dar vida a tudo aquilo que é objeto da sua arte, dando a conhecer histórias de autores como Eduíno de Jesus, Lídia Jorge, Marguerite Duras, Rainer Maria Rilke ou Raul Brandão, entre outros. A paixão pelos livros é transversal a todos os textos, como se pode também constatar nas pinturas alusivas ao ato de ler, de artistas como Diego Rivera, Matisse, Picasso ou Matisse, escolhidas para ilustrar a presente edição. Refere Afonso Cruz: “os livros só alcançam sucesso através do murmúrio”. Aceite, pois, o nosso murmúrio. SS Companhia das Letras

Louisa Yousfi
Em Nome do Bárbaro
“Mas o que será que perde o bárbaro que a civilização arrastou na sua corrida para o progresso humano, alimentando-o generosamente com as riquezas culturais de que tanto se orgulham os impérios (…)?” Esta é a questão-chave à qual o presente manifesto estético e político sobre a condição dos descendentes da imigração pós-colonial, procura responder. De autoria de Louisa Yousfi, jornalista, crítica literária e escritora, filha da imigração argelina em França e uma das vozes centrais do pensamento decolonial, aqui se expõem as armadilhas e a violência das políticas de integração e mostra como a assimilação pode equivaler à perda de identidade, língua, religião e cultura. Elogiado por figuras como Françoise Vergès e Annie Ernaux, este ensaio revela a estranheza da condição pós-colonial: “bárbaros” no coração do Império, que habitam os seus subúrbios, falam a sua língua, dominam perfeitamente os seus códigos, mas que têm sérias contas a ajustar com ele. É em nome deles que fala, dos que se atrevem a “fitar o nosso sol da Barbárie de frente”, como escreveu o autor argelino Mohammed Dib, citado em epígrafe. Uma espantosa viagem à alteridade radical, desmistificando, sem concessões, as narrativas do ocidente e as suas falhas morais. LAE Orfeu Negro

Julio Cortázar, Carlos Fuentes, Gabriel García Márquez e Mario Vargas Llosa
As Cartas do Boom
No romance Adão no Éden, Carlos Fuentes escreve: “(…) a mimese é inevitável na literatura e, no fim, escolher bem os mentores é uma demonstração de talento”. Julio Cortázar, Carlos Fuentes, Gabriel García Márquez e Mario Vargas Llosa são os quatro principais romancistas do chamado “Boom Latino Americano”. As cartas trocadas entre eles revelam as múltiplas e valiosas correspondências que se estabeleceram entre as suas obras no auge deste quarteto. Citando os editores do presente volume, as cartas documentam “um momento em que os criadores pareciam ter começado a escrever menos sozinhos para ‘tocar’ em conjunto, como parte integral de uma mesma literatura”. Mentores uns dos outros, de certa forma, como confessa o escritor mexicano: “(…) sei que cada um de nós está muito consciente do que os outros estão a fazer”. Este intercâmbio permite um acesso sem precedentes às suas relações pessoais e coletivas, e desvenda de forma privilegiada a literatura e a política latino-americanas no contexto histórico entre os anos de 1959 e 1975. Testemunha igualmente a relação sincera de amizade e respeito que os unia e que põe definitivamente em causa a máxima de Carlos Fuentes, expressa no citado romance: “Lê os escritores, mas não os conheças pessoalmente.” LAE Dom Quixote