domingo, 24 de maio de 2020

Ao Domingo Há Música

Transparência

Morrer é só não ser visto,
é sair de ao pé de ti,
apagar-me em tudo isto,
deixar de ver o que vi.

Morrer é não estar em ti,
e mais do que não te ver,
é não ser visto por ti,
no deserto do não ser.

Morrer é como apagar-se
a chama que houve em nós,
é uma espécie de ficar-se
vazio da própria voz.

Vive o amor da atenção
que se tem por quem se ama.
Mas a morte atiça em vão
o fio que não dá chama.

Morrer é só não ser visto,
e passar a pertencer
a um livro de registo
que guarda o nosso não-ser.
                   Londres, 20.11.1983
Eugénio Lisboa, in "A matéria intensa", Editora Peregrinação, 1985

Temos vindo a publicar, com indefectível prazer,  alguns dos poemas que Eugénio Lisboa tem produzido quase diariamente, neste tempo de peste. Nome maior da nossa Literatura, completa amanhã noventa anos.    Fomos ao retábulo da nossa memória e reencontrámos este seu magnifico poema ,  musicado por Amélia Muge.  
"Transparência", na voz de Amélia Muge , com poema de Eugénio Lisboa e música de Amélia Muge. Acompanham-na José Peixoto (guitarra acústica), Yuri Daniel (contrabaixo e baixo eléctrico), Catarina Anacleto (violoncelo), Filipe Raposo (piano e acordeão), José Manuel David (sopros) e Carlos Mil-Homens (cajón).O arranjo é de António José Martins, a produção de Amélia Muge/António José Martins.
canção pertence ao álbum “Não sou daqui".

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