sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

O que o outro acorda em nós


Amor

«Porque nós não nos pomos no lugar do outro: temos é que descobrir o que o outro acorda em nós.”(...)
“Eu sinto. Essa é uma das nossas diferenças: eu fico com pena de não ter conseguido contigo a paz e a harmonia. Tu fazes de tudo uma luta: julgas que é essa a tua força e não te passa pela cabeça que talvez seja uma fraqueza. Para ti, até o amor é uma luta. Para mim tem que ser paz.(...) Por mais que eu não queira, os meus passos continuam, em velhos edifícios em ruínas mas não apetece nada ceder porque acho que a reconstrução de tudo tem que começar com uma ligação verdadeira com aquela chamada indizível de que tenho a saudade. É aí que eu vejo o amor: uma vibração que não vem da inteligência e nem sequer dos sentimentos mas da natureza mais íntima e mais profunda do meu próprio ser.»
*António Alçada Baptista, in “ O Riso de Deus”, Editorial Presença

Empatia

« Que coisa é esse "dar-se conta" do sofrimento do outro que está aqui ao meu lado?(...)
Um amigo vem ter comigo e conta-me que perdeu o seu irmão e eu " dou-me conta " da sua dor (...) . Não me interessa perceber em que é que se funda a sua dor nem donde é que eu a deduzo. Talvez da sua cara transtornada e pálida, da sua voz entrecortada e rouca, ou talvez exprima a sua dor por palavras... Tudo isso , naturalmente pode ser investigado, mas não é o que me interessa. Não interessa também por que caminhos chego a este "dar-me conta", mas sim o que é esse dar-se conta: isso é o que importa saber! Não se trata de explicar e perceber a dor do outro, mas da vivência específica que não é nem por repetição de outras nem é consequência de uma minha experiência minha passada, mas que é o entrar imediatamente na experiência do outro: " faço a experiência de uma não experiência"!»
E. Stein, in " Il problema dell'empatia", Edizini Studium, Roma , 1985

* "No romance, " O Riso de Deus", António Alçada Baptista instaura uma forma de questionamento radical ao acompanhar a vida de Francisco, a personagem central deste romance, ao longo das suas escolhas, da sua procura, das suas deambulações pelo mundo ao sabor dos acasos e encontros e, muito especialmente , da intimidade de algumas mulheres cúmplices da mesma procura. Radicalidade que decorre do facto, inédito na sua escrita, de ser toda uma vida que é posta em balanço, tendo por contraponto esse limite que é a morte. Deus? Possivelmente. Mas um Deus que ri, joga, um deus apaixonado pela pura alegria de existir."

2 comentários:

  1. Sobre o António (Alçada Baptista) já aqui escrevemos o nosso testemunho. O testemunho de uma inolvidável amizade de amigo mais velho para amigo muito mais novo, e deste para alguém que era adorado, desejado, bom. O António Alçada Baptista foi um Homem bom! Hoje, tudo quanto nos faça recordá-lo gera uma saudade imensa, um envolvimento com uma sensação de perca. Uma saudade ainda sustida, apoiada na leitura da sua obra, grande parte dela confessional. O António escrevia sobre o mundo que detinha em si, olhando os outros sempre com uma benevolência e bonomia de alma inimitáveis. Ele viveu lado a lado com o perdão, o sentimento, a emoção, aquele esculpir paciente e persistente da Verdade feita monumento, merece de todos nós um grande respeito e admiração, merece que o recordemos até nos extinguirmos igualmente. Obrigado António por tudo quanto - sem alarde, sem pompa, sem ostentação - nos ensinaste!

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  2. "Darmo-nos conta" de algo que decorre ao nosso lado ou chega até nós, das necessidades primeiras dos outros, é distanciarmo-nos de nós mesmos, vivermos já no outro e isso em si é sublime demais para ser comentado... Quanto a nós, Edite (?) Stein percebeu isso na sua análise e oferece-nos a "beber".

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