quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

Eventos e Novidades Literárias em Dezembro

Casa da América Latina
De 30 novembro a 8 dezembro 2024 decorrerá mais uma edição da Feira Internacional do Livro de Guadalajara, este ano tendo como país Convidado de Honra a Espanha.
Do vastíssimo programa que ocupará os 9 dias de realização da FIL destacamos a cerimónia de entrega do Prémio FIL de Literaturas em Línguas Românicas ao amplamente reconhecido escritor moçambicano Mia Couto. Nos mais de 30 anos da sua existência, é a quarta vez que o Prémio FIL é atribuído a um escritor de língua portuguesa, depois de Nélida Piñón (1995), António Lobo Antunes (2008) e Lídia Jorge (2020). Este Prémio, no valor de 150 mil dólares, é o mais importante dos galardões atribuídos anualmente pela FIL, uns em colaboração com outras instituições mexicanas ou internacionais, como é o caso da Homenagem ArpaFIL (reconhecimento anual dado a um arquitecto “cuja trajetória profissional tenha contribuído para o engrandecimento artístico do património mundial”), outros por sua única iniciativa como é o caso do Prémio Sor Juana Inés de la Cruz (atribuído ao trabalho de uma escritora no último ano), ou o Prémio de Mérito Editorial (que premeia a visão e o ofício de uma figura fundamental no mundo dos livros).
O programa compreende atividades no âmbito da Literatura (FIL Literatura), da Ciência (FIL Ciência)), uma programação dedicada aos mais novos, a FIL Jovem e a FIL Ninõs, outra dedicada exclusivamente à América Latina (Latinoamérica Viva ) e a FIL Pensamento trabalhada em conjunto com a Universidade de Guadalajara. No âmbito da celebração do vigésimo quinto aniversário em 2011, a FIL Guadalajara lançou o programa “Os 25 segredos mais bem guardados da América Latina”, cujo sucesso, tanto entre o público em geral como entre os profissionais do livro, deu origem ao Latinoamérica Viva. A edição de 2024 do programa Latinoamérica Viva contará com a participação de quinze autores de destaque de nove países, que participarão em cinco mesas redondas.
Outras atividades paralelas, festejando o país Convidado de Honra, como o ForoFIL (9 noites de música ao vivo) ou a FILCine com uma programação de cinema, são realizadas durante a FIL. Para além destas atividades a FIL promove, durante o período em que dura o certame e mesmo ultrapassando-a no tempo, exposições de Artes Visuais e representações teatrais ou de bailado.
A FIL de Guadalajara, reconhecida como a segunda maior feira do livro do mundo, acolhe cerca de 100.000 visitantes diariamente (em 2023 foram 857.315) entre público em geral e profissionais do Livro (100 editoras participaram no Centro de Direitos de Autor, em 2023).
Manuela Júdice,
Secretária-Geral da Casa da América Latina em Lisboa – Portugal.

Programa Latinoamérica Viva
A edição de 2024 do programa Latinoamérica Viva contará com a participação de quinze autores de destaque de nove países, que participarão em cinco mesas redondas.
A literatura da América Latina não está unida apenas pelas línguas românicas, mas também pela diversidade de temas e géneros de onde emanam nomes essenciais para a literatura universal. De Gabriel García Márquez a Jorge Luis Borges, sem esquecer Gabriela Mistral ou Mario Vargas Llosa, esta região continua a gerar uma literatura prodigiosa. No programa América Latina Viva da Feira Internacional do Livro de Guadalajara, isso será evidente com cinco mesas de diálogo, nas quais participarão quinze escritores destacados da Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, México, Uruguai e Venezuela. Esta edição decorrerá de segunda-feira, 2 de dezembro, a sexta-feira, 6 de dezembro.
O primeiro painel será realizado na segunda-feira, 2 de dezembro, e reunirá três vozes marcantes da literatura latino-americana contemporânea. As escritoras Magalí Etchebarne (Argentina), Daniela Catrileo (Chile) e Isabel Zapata (México) irão discutir as suas obras e abordar temas como a identidade e o feminismo, bem como as suas perspetivas e experiências criativas. Por sua vez, Legna Rodríguez Iglesias (Cuba), Héctor Abad Faciolince (Colômbia) e Virginia Mórtola (Uruguai) partilharão as suas reflexões sobre a literatura na América Latina, as suas influências e a sua ligação com a realidade social dos seus países, na segunda sessão que terá lugar na terça-feira, 3 de dezembro.
Juan Álvarez (Colômbia), María Fernanda Ampuero (Equador) e Óscar Contardo (Chile) serão os encarregados de dar vida ao terceiro dia deste encontro, que terá lugar na quarta-feira, 4 de Dezembro, e no qual, entre outros temas, cada um abordará as preocupações que atravessam as suas respetivas obras. A quarta mesa será realizada na quinta-feira, 5 de dezembro, com a presença de Santiago Wills (Colômbia), Magela Baudoin (Venezuela) e Djamila Ribeiro (Brasil). Os participantes, através das suas experiências enquanto autores e ativistas, irão discutir a intersecção entre a literatura e aspectos sociais, como as questões de género, os direitos humanos e a equidade racial.
A última sessão do Latinoamérica Viva estará a cargo das autoras Lucrecia Zappi (Brasil) e Tamara Silva Bernaschina (Uruguai), que serão acompanhadas pelo escritor Carlos Aletto (Argentina), que partilharão as suas perspetivas sobre a narrativa contemporânea. Esta conversa, que terá lugar na sexta-feira, dia 6 de dezembro, será uma excelente oportunidade para descobrir o trabalho de três visões com estilos e trajetórias muito diferentes.
No âmbito da celebração do seu vigésimo quinto aniversário em 2011, a FIL Guadalajara lançou o programa “Os 25 segredos mais bem guardados da América Latina”, cujo sucesso, tanto entre o público em geral como entre os profissionais do livro, deu origem ao Latinoamérica Viva. A décima segunda edição deste encontro é organizada pela FIL Guadalajara com o apoio das editoras Páginas de Espuma, Almadía, Editora Lugar Común-Alliteration e Mandacarú Editorial, bem como dos ministérios das Culturas, Artes e Património do Governo do Chile, AC/E, Educação e Cultura do Uruguai, Culturas, Artes e Conhecimento da Colômbia, Negócios Estrangeiros, Comércio Internacional e Culto da República Argentina e da Universidade de Oregon.
Latinoamérica Viva
De segunda-feira, 2 de dezembro, a sexta-feira, 6 de dezembro
18h00 às 18h50
Expo Guadalajara
Toda a informação no site oficial https://www.fil.com.mx/info/info_fil.asp

“Levam tudo, e estragam tudo”
As mulheres da Ria não querem mais do que proteger o ecossistema em que vivem, na Culatra, e assegurar a sobrevivência da família. Conheça este projeto de participação cívica para a ação climática
Vivem na ilha da Culatra, do outro lado da Ria Formosa, entre Olhão e o oceano Atlântico, cerca de mil pessoas. A comunidade, com 200 anos, depende a 90% da pesca e de atividades ligadas ao mar.
Madalena conhece cada centímetro daquela ilha. Boa conversadora, chama cada banco de areia pelo nome – nomes que não vêm nos mapas, mas que se têm perpetuado, passando de geração em geração. Mariscadora, casada com um pescador, como grande parte dos casais culatrenses, sente diariamente a pressão das 4 000 pessoas que, no verão, “invadem” a ilha, das dezenas de barcos que lá se instalam, com as suas quilhas e âncoras a destruírem as pradarias marinhas daquele ecossistema tão sensível. Vê as formas desregradas como pescadores de outras águas vêm apanhar marisco de arrasto e não se conforma ao ver o seu sustento em risco de desaparecer.
A mariscadora bem pode protestar e lamentar-se, mas a sua voz nem sempre é ouvida. E é aqui que entra Valentina e a Sciaena, Associação de Ciências Marinhas e Cooperação. Apoiada pela Fundação Calouste Gulbenkian, esta associação montou o projeto Mulheres da Ria para dar voz aos culatrenses e ajudá-los a criar instâncias formais e informais de troca de informação e de participação comunitária. Tem como objetivos finais criar uma proposta de zona de proteção de área marinha de iniciativa comunitária, respetivo plano de gestão, e implementar um projeto piloto de proteção das pradarias marinhas, que são importantes sumidouros de carbono azul e contribuem ativamente para a promoção do equilíbrio ambiental nos ecossistemas costeiros.
Em paralelo, e porque reconhece a importância destas mulheres como pilares da comunidade, como as primeiras protetoras do ambiente local, “porque são mães”, a Sciaena visa “não apenas proteger o meio, mas também fortalecer a coesão social, capacitando-as e contribuindo para o desenvolvimento comunitário sustentável que respeita e valoriza os seus conhecimentos únicos, promovendo uma abordagem integrada que vai para lá da ação climática.”
Neste projeto, a Sciaena conta com vários parceiros: a Associação de Moradores da Ilha da Culatra, o Centro de Ciências do Mar (CCMAR), a Câmara Municipal de Faro e o OCEAN ALIVE – Cooperativa para a educação criativa marinha CRL.

Salavisa European Dance Award
Dois artistas inovadores são os vencedores do Salavisa European Dance Award 2024
Dorothée Munyaneza e Idio Chichava são os dois distinguidos na primeira edição deste prémio de dança. Ao longo de 2025 apresentarão as suas obras em vários palcos europeus
Os cinco finalistas, diversos em interesses, geografias e perfis, já eram, para o júri, “exemplos de compromisso e excelência”. Mas de entre os cinco, Dorothée Munyaneza e Idio Chichava destacaram-se “pelas suas abordagens artísticas particularmente bem-sucedidas nos seus trabalhos recentes, bem como pela profunda ligação que mantêm com os seus contextos artísticos, comunidades e colaboradores.” Tanto as obras de Dorothée como as de Idio “estão enraizadas não apenas em interesses artísticos pessoais, mas também numa compreensão complexa do mundo que os rodeia e do papel crucial que a dança pode desempenhar em discussões sociais mais amplas.”
Dorothée Munyaneza é uma artista multifacetada. Cantora, música, bailarina, atriz, escritora e coreografa, recusa fronteiras, utilizando a música, o canto, o texto e o movimento para abordar a rutura como força dinâmica e criar espaços de ressonância e esperança. Nascida no Ruanda, estudou música e ciências sociais em Londres, após o que se mudou para Paris, onde trabalhou com vários coreógrafos. Em 2013, criou a sua própria companhia, Kadidi. Para o júri, Dorothée aborda onde mais dói, “articulando história, trauma, mas também amor e esperança, com uma profunda compreensão do corpo e do seu potencial para contar histórias e criar espaços emocionais.”
Idio Chichava é bailarino, coreógrafo e diretor artístico da companhia de dança Converge+, em Moçambique, para onde regressou depois de uma carreira de sucesso em frança. No seu país natal, tem promovido o ensino gratuito da dança, junto das comunidades locais, e investido em produções multidisciplinares e criações colaborativas onde cada um tem espaço para explorar o seu mundo interior. Para o júri, o trabalho de Ídio “é uma afirmação poderosa da energia coletiva e do desejo de criar e coexistir.”
Dorothée e Ídio são os dois primeiros vencedores do Salavisa European Dance Award, prémio criado em 2023 pela Fundação Calouste Gulbenkian, em colaboração com outras seis instituições artísticas europeias – ImPulsTanz – Vienna International Dance Festival (Áustria), KVS (Bélgica), Dansehallerne (Dinamarca), Maison de la Danse/Biennale de la Danse (França), Joint Adventures (Alemanha), e Sadler’s Wells (Reino Unido) – com o objetivo de distinguir artistas de todo o mundo que demonstrem talento ou qualidades especiais que mereçam ser mais conhecidos para além das suas fronteiras nacionais.
Selecionados por três especialistas independentes – Mette Ingvartsen, Nayse López e Fu Kuen Tang –, os vencedores partilharão o prémio de 150.000€ e terão a oportunidade de apresentar o seu trabalho nos palcos de seis instituições culturais parceiras.
Song of the Land, de Chikako Yamashiro
Chikako Yamashiro (n.1976) apresenta Song of the Land [Canção da Terra], composta por duas peças distintas, que explora o entrelaçamento das memórias corporais com questões sociais e políticas específicas da história e das mitologias das ilhas de Okinawa, no Japão.
Mud Man (2016) [Homem de Lama] é uma instalação vídeo que tem como cenário a ilha de Okinawa (Japão) e as ilhas de Jeju (Coreia do Sul), locais onde a presença do exército dos Estados Unidos é alvo de grande controvérsia.
Apresentado pela primeira vez na Europa na sua versão original com 3 canais, o filme conta a história de uma comunidade que é confrontada com excrementos de pássaros que se assemelham a pedaços de lama que caem do céu.
Estes excrementos despertam as pessoas que estavam meio-adormecidas, as quais começam a apanhar os pedaços de lama para ouvir as vozes que emanam do seu interior e lhes falam de história e património, da natureza e de outras comunidades.
Abordando as camadas de memória histórica contidas num determinado território, esta obra debruça-se sobre a complexa construção da identidade enquanto comunidade, no que respeita à autonomia e à agência.
Em Seaweed Woman (2008) (Mulher-Alga], Yamashiro imagina-se como criatura mitológica do mar para personificar o corpo político de Okinawa.
Flutuando no oceano, coberta de algas marinhas que escondem e revelam partes do seu corpo, esta obra imersiva, composta por fotografias e vídeo projetados, mergulha o espetador num mundo místico, apresentando a muito contestada relocalização da base militar americana a partir de uma perspetiva subaquática.
Yamashiro seleciona elementos visuais ambíguos e fragmentados que convidam a múltiplas leituras. Canalizando as memórias e os conflitos de outros através do seu próprio corpo, a artista procura fomentar o discurso sobre a história de Okinawa, do Japão e de toda a Ásia Oriental.
Engawa – Temporada de arte contemporânea japonesa
Engawa é uma programação que traz a Lisboa um conjunto de criadores do Japão e da diáspora japonesa, muitos dos quais pela primeira vez em Portugal. Saber mais
29 nov 2024 – 13 jan 2025
Local
Espaço ProjetoCentro de Arte Moderna Gulbenkian
Preço
Entrada gratuita
Mediante levantamento de bilhete no próprio dia

Prix Goncourt
À l’ombre des jeunes filles en fleurs, La Condition humaine, Les Mandarins, Le Roi des Aulnes, Rue des boutiques obscures, et, dernièrement, Rouge Brésil, Les Bienveillantes, Trois femmes puissantes, L’Art français de la guerre, Chanson douce le prix Goncourt a récompensé depuis sa création en 1903 quarante romans parus à l’enseigne de la NRF.


Kamel Daoud
Houris
« Je suis la véritable trace, le plus solide des indices attestant de tout ce que nous avons vécu en dix ans en Algérie. Je cache l’histoire d’une guerre entière, inscrite sur ma peau depuis que je suis enfant. »
Aube est une jeune Algérienne qui doit se souvenir de la guerre d’indépendance, qu’elle n’a pas vécue, et oublier la guerre civile des années 1990, qu’elle a elle-même traversée. Sa tragédie est marquée sur son corps : une cicatrice au cou et des cordes vocales détruites. Muette, elle...
La Revue NRF
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Seja bem-vindo…
… ao guia de presentes da Guerra e Paz.

Aqui, vai encontrar os livros mais arrojados, graficamente elegantes e, por vezes, provocatórios do mercado editorial português. Entre edições exclusivas de luxo e limitadas, vai encontrar o presente ideal para colocar debaixo da árvore.Celebramos a ficção, a não-ficção e a poesia nesta seleção feita a pensar em si, devorador de livros.
Cabaz de NATAL -  
Sugestões de Natal


Relógio D'Água Editores
Planeamento Edirorial:
Novembro
Atos de Desespero, de Megan Nolan
Desfile, de Rachel Cusk
My Friends, de Hisham Matar (Vencedor Prémio Orwell na categoria de ficção política, Longlist Booker Prize 2024 e Longlist National Book Award 2024)
Songlight, de Moira Buffini (1.º volume de The Torch Trilogy)
Duna III (Romance Gráfico), de Frank Herbert, adaptado por Brian Herbert e Kevin J. Anderson
Franny e Zooey, de J. D. Salinger
Investigações Filosóficas, de Ludwig Wittgenstein
Macbeth, de William Shakespeare (Projecto Shakespeare)
Como o Grincho Perdeu o Natal, de Dr. Seuss
Desaparecida, de Maria Stepánova
MARTYR!, de Kaveh Akbar (Longlist National Book Award 2024)

Dezembro
Kairos, de Jenny Erpenbeck (Vencedor International Booker Prize 2024)
Reading Genesis, de Marilynne Robinson
Heretics of Dune (5.º volume da série Duna), de Frank Herbert
The Carnation Revolution: The Day Portugal’s Dictatorship Fell, de Alex Fernandes
Conversas entre Amigos, de Sally Rooney
O Estranho Desaparecimento de Esme Lennox, de Maggie O’Farrell
Os Emigrantes, de W. G. Sebald.

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Lettre-Pleiade-2024

terça-feira, 3 de dezembro de 2024

Quando os caminhos se encontram

Em Sami Yusuf (Cantor, Maestro e Compositor), todos os caminhos se encontram. Eis  a  maior razão para continuarmos a ouvi-lo , em When Paths Meet ( Vol.2 ). Acompanham-no The  Sami Yusuf Ensemble  , a Scoring Orchestra of Paris, The Métaboles,  solistas e músicos especializados, numa colaboração impressionante.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

O Dicionário

O Dicionário
por Machado de Assis
"Era uma vez um tanoeiro, demagogo, chamado Bernardino, o qual em cosmografia professava a opinião de que este mundo é um imenso tonel de marmelada, e em política pedia o trono para a multidão. Com o fim de a pôr ali, pegou um pau, concitou os ânimos e deitou abaixo o rei; mas, entrando no paço, vencedor e aclamado, viu que o trono só dava para uma pessoa, e cortou a dificuldade sentando-se em cima.
– Em mim, bradou ele, poderia ver a multidão coroada. Eu sou vós, vós sois eu.
O primeiro ato do novo rei foi abolir a tanoaria, indemnizando os tanoeiros, prestes a derrubá-lo, com o título de Magníficos. O segundo foi declarar que, para maior lustre da pessoa e do cargo, passava a chamar-se, em vez de Bernardino, Bernardão. Particularmente encomendou uma genealogia a um grande doutor dessas matérias, que em pouco mais de uma hora o entroncou a um tal ou qual general romano do século IV, Bernardus Tanoarius; - nome que deu lugar à controvérsia, que ainda dura, querendo uns que o rei Bernardão tivesse sido tanoeiro, e outros que isto não passe de uma confusão deplorável com o nome do fundador da família. Já vimos que esta segunda opinião é a única verdadeira.
Como era calvo desde verdes anos, decretou Bernardão que todos os seus súditos fossem igualmente calvos, ou por natureza ou por navalha, e fundou esse ato numa razão de ordem política, a saber, que a unidade moral do Estado pedia a conformidade exterior das cabeças. Outro ato em que revelou igual sabedoria, foi o que ordenou que todos os sapatos de pé esquerdo tivessem um pequeno talho no lugar correspondente ao dedo mínimo, dando assim aos seus súbditos o ensejo de se parecerem com ele, que padecia de um calo. O uso dos óculos em todo o reino não se explica de outro modo, sendo por uma oftalmia a que afligiu a Bernardão, logo no segundo ano de reinado. A doença levou-lhe um olho, e foi aqui que se revelou a vocação poética de Bernardão, porque, tendo-lhe dito um de seus dois ministros, chamado Alfa, que a perda de um olho o fazia igual a Aníbal, - comparação que o lisonjeou muito, - o segundo ministro, Ômega, deu um passo adiante, e achou-o superior a Homero, que perdera ambos os olhos. Esta cortesia foi uma revelação; e como isto prende com o casamento, vamos ao casamento.
Tratava-se, em verdade, de assegurar a dinastia dos Tanoarius. Não faltavam noivas ao novo rei, mas nenhuma lhe agradou tanto como a moça Estrelada, bela, rica e ilustre. Esta senhora, que cultivava a música e a poesia, era requestada por alguns cavalheiros, e mostrava-se fiel à dinastia decaída. Bernardão ofereceu-lhe as coisas mais sumptuosas e raras, e, por outro lado, a família bradava-lhe que uma coroa na cabeça valia mais que uma saudade no coração; que não fizesse a desgraça dos seus, quando o ilustre Bernardão lhe acenava com o principado; que os tronos não andavam a rodo, e mais isto, e mais aquilo. Estrelada, porém, resistia à sedução.
Não resistiu muito tempo, mas também não cedeu tudo. Como entre os seus candidatos preferia secretamente um poeta, declarou que estava pronta a casar, mas seria com que fizesse o melhor madrigal, em concurso. Bernardão aceitou a cláusula, louco de amor e confiando em si: tinha mais um olho que Homero, e fizera a unidade dos pés e das cabeças.
Concorreram ao certame. Que foi anónimo e secreto, vinte pessoas. Um dos madrigais foi julgado superior aos outros todos: era justamente o do poeta amado. Bernardão anulou por um decreto o concurso, e mandou abrir outro; mas então, por uma inspiração de insigne maquiavelismo, ordenou que não se empregassem palavras que tivessem menos de trezentos anos de idade. Nenhum dos concorrentes estudara os clássicos: era o meio provável de os vencer.
Não venceu ainda assim, porque o poeta amado leu à pressa o que pode, e o seu madrigal foi outra vez o melhor. Bernardão anulou esse segundo concurso; e, vendo que no madrigal vencedor as locuções antigas deram singular graça aos versos, decretou que só se empregassem as modernas e particularmente as da moda. Terceiro concurso, a terceira vitória do poeta amado.
Bernardão, furioso, abriu-se com os dois ministros, pedindo-lhes um remédio pronto e enérgico, porque, se não ganhasse a mão de Estrelada, mandaria cortar trezentas mil cabeças. Os dois, tendo consultado algum tempo, voltaram com este alvitre:
- Nós, Alfa e ômega, estamos designados pelos nossos nomes para as coisas que respeitam à linguagem. A nossa ideia é que Vossa Sublimidade mande recolher todos os dicionários e nos encarregue de compor um vocabulário novo que lhe dará a vitória.
Barnardão assim fez, e os dois meteram-se em casa durante três meses, findo os quais depositaram nas augustas mãos a obra acabada, um livro a que chamaram Dicionário de Babel, porque era realmente a confusão das letras. Nenhuma locução se parecia com a do idioma falado; as consoantes trepavam nas consoantes, as vogais diluíam-se nas vogais, palavras de duas sílabas tinham agora sete e oito, e vice-versa, tudo trocado, misturado, nenhuma energia, nenhuma graça, uma língua de cacos e trapos.
- Obrigue Vossa Sublimidade esta língua por decreto, e tudo está feito.
Bernardão concedeu um abraço e uma pensão a ambos, decretou o vocabulário, e declarou que ia fazer-se o concurso definitivo para obter a mão da bela Estrelada. A confusão passou do dicionário aos espíritos; toda a gente andava atônita. Os farsolas cumprimentavam-se na rua pelas novas locuções: diziam, por exemplo, em vez de: 'Bom dia, como passou?' - 'Pflerrgpxx, rouph, aa?' A própria dama, temendo que o poeta amado perdesse afinal a campanha, propôs-lhe que fugissem; ele, porém, respondeu que ia ver primeiro se podia fazer alguma coisa. Deram noventa dias para o novo concurso e recolheram-se vinte madrigais. O melhor deles, apesar da língua bárbara, foi o do poeta amado. Bernardão, alucinado, mandou cortar as mãos aos dois ministros, e foi a única vingança. Estrelada era tão admiravelmente bela, que ele não se atreveu a magoá-la, e cedeu.
Desgostoso, encerrou-se oito dias na biblioteca, lendo, passeando ou meditando. Parece que a última coisa que leu foi uma sátira do poeta Garção, e especialmente estes versos, que pareciam feitos de encomenda:
   O raro Apeles,
Rubens e Rafael, inimitáveis,
Não se fizeram pela cor das tintas;
A mistura elegante os fez eternos."
Machado de Assis, in Páginas recolhidas, Rio de Janeiro: W.M. Jackson Inc. Editores, 1952, pp. 27-32
Sobre o Autor:
"MACHADO DE ASSIS (Joaquim Maria Machado de Assis) nasceu no Rio de Janeiro a 21 de junho de 1839; aí faleceu a 29 de novembro de 1902. Autodidata, tornou-se o mais importante escritor brasileiro, e um dos maiores da língua portuguesa.
O lugar especial reservado a Machado de Assis na literatura brasileira justifica-se plenamente pela obra ficcional que escreveu; mencione-se Memórias póstumas de Brás Cubas, romance que marca a maturidade do escritor. Escreveu entre outros romances de grande importância, Dom Casmurro, obra que ainda hoje é lida e discutida nos meios literários e nos meios escolares
Para José Verissimo, Machado de Assis foi “a mais eminente figura de nossa literatura”; para Carlos Fuentes, Machado de Assis e o argentino Jorge Luis Borges são os dois grandes nomes da literatura da América Latina; em suas palavras: “Borges foi o primeiro narrador de língua espanhola nas Américas (Machado de Assis já o havia conseguido, milagrosamente, na língua portuguesa do Brasil)”, enfatiza Fuentes, um dos mais importantes escritores latino-americanos.
Machado também foi mestre no conto, como bem realça o Professor Sergius Gonzaga: “Mestre inquestionável do género, Machado de Assis experimentou as diferentes possibilidades de construção do relato curto (...) o conto tradicional, também conhecido como anedótico, o conto moderno e o conto de caracteres (...)”.

domingo, 1 de dezembro de 2024

Ao Domingo Há Música

Ah, quem escreverá a história do que poderia ter sido?
Será essa, se alguém a escrever,
A verdadeira história da humanidade.

O que há é só o mundo verdadeiro, não é nós, só o mundo;
O que não há somos nós, e a verdade está aí.
           Álvaro de Campos, Poemas

Há sempre quem possa escrever uma outra história.  Há quem tente e a represente de um modo diverso , inclusivo.
A Música é, por excelência, o palco onde todos se erguem , onde todos se representam, onde todos têm lugar, onde todos contam.

Sami Yusuf , em  L’Amour Vivant | When Paths Meet (Vol. 2).
 
"Sami Yusuf é um cantor, compositor, multi-instrumentista e compositor britânico de ascendência azerbaijana. O domínio das linguagens musicais do compositor Sami Yusuf deslumbra em ‘L’Amour Vivant’. O andamento inicial desenvolve-se na intrincada geometria do estilo barroco, forma que ficou impressa na alma do compositor durante a sua formação em Londres e que continua a ser uma inspiração acarinhada. Desde o início que ouvimos o encontro subtil de caminhos musicais no ritmo baladi árabe que fundamenta a graciosa melodia. A transição para o segundo andamento transporta os ouvintes para o coração de outra herança musical de Sami Yusuf, mergulhando-os no mundo do Azerbaijão da Ásia Central. O terceiro andamento revisita o som barroco antes de incorporar as tonalidades ricas e os ritmos matizados do Médio Oriente e da Pérsia, fundindo-os perfeitamente numa paisagem sonora arrebatadora. Seguem-se os sons meditativos da kora da África Ocidental e os tons sensuais do erhu chinês. O andamento final funciona como uma carta de amor às tradições clássicas mundiais aqui encapsuladas, entrelaçando habilmente as inúmeras emoções vividas ao longo desta viagem sonora. ‘L’Amour Vivant’ é uma das composições de Sami Yusuf do segundo concerto da sua série ‘When Paths Meet’. Apresenta o Sami Yusuf Ensemble, a Scoring Orchestra of Paris, The Métaboles e solistas e músicos especializados numa colaboração impressionante. ‘L’Amour Vivant’ é um cruzamento de estilo clássico no que há de mais inovador. Apresentou-se na Filarmónica de Paris."