segunda-feira, 29 de julho de 2024

Se eu soubesse...

MEMENTO MORI

Este mar não vai desaparecer.
O que vai desaparecer sou eu.
Este mar vai continuar a ser.
Deixar de vê-lo é destino meu.
 
Continuará a espelhar o sol,
que, de mim, para isso, não precisa.
Estender-se-á como vasto lençol
o mar que tem grandeza por divisa.
 
O mundo existia antes de mim,
porque há ser que convive com não ser.
Haverá mundo, depois do meu fim
 
e ser que ignora o meu não ser.
Está bem assim porque é natural,
embora pareça demencial.

                       
19.01.2023
Eugénio Lisboa

Sentir
 
Se eu soubesse sentir o que sinto,
se o que sinto fosse de se dizer,
se não fosse que, ao dizê-lo, minto,
a vida seria outro viver.
 
Porque sentimos mais do que sentimos
e muitíssimo mais do que dizemos.
Sentimos só o que consentimos
e do que sentimos pouco sabemos.
 
O que sinto é uma caverna escura,
onde se esconde o que se não diz:
se senti-lo já é uma loucura,
 
dizê-lo, só à custa de ardis.
Sentir está sempre além do que sentimos
e, deste, tantas vezes, nós fugimos.
                     11.01.2024
Eugénio Lisboa

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