sábado, 31 de julho de 2021

Memória

Maria Antonieta

MEMÓRIA

Para a Maria Antonieta,
que nos deixou neste dia

Há já cinco anos que me deixaste,
sem nunca, afinal, me teres deixado;
por mais que tenhas partido, ficaste
suave ser, para sempre recordado.

Foste presença discreta e subtil,
ousada e mansa, sempre iluminada:
alma minha, para sempre gentil,
tão sábia a amar como a ser amada.

Saíste discreta e sem grande aviso,
despedindo-te em gesto secreto:
deixaste-me no momento preciso

em que julgaste que o teu fim chegara:
continuar seria indiscreto,
para ti, minha presença tão rara!

30 de Julho de 2021
Eugénio Lisboa  

sexta-feira, 30 de julho de 2021

Eventos culturais


AO SOM DO PIANO NO MUSEU DO ORIENTE
Os pianistas Inês Filipe e Rafael Ruiz são os próximos convidados do Ciclo de Concertos Antena 2 no Museu do Oriente.
MUSEU DO ORIENTE 10 AGO | 19H00

 
Colóquio “Seara Nova”: Discurso programático e intelectualidade republicana (1921-1979)
Encontra-se aberta a chamada de trabalhos para o Colóquio “São Mesmo as Últimas”: Diário de Lisboa, 1921-1990, que decorre no dia 30 de Novembro, na Fundação Mário Soares e Maria Barroso, em Lisboa.
Jornal de referência no panorama jornalístico português, ao longo dos cerca de 70 anos em que foi publicado, o Diário de Lisboa (1921-1990) foi pioneiro e inovador em muitos aspectos, tendo nele colaborado alguns dos mais notáveis e reconhecidos jornalistas portugueses, assim como grandes figuras da cultura nacional.
> Formulário para submissão de propostas


 

REABERTURA

Museu da Língua Portuguesa

 

Sáb, 31 jul

 

Seis anos após o incêndio que destruiu dois terços da estrutura do edifício, o Museu da Língua Portuguesa de São Paulo reabre ao público com novos conteúdos, experiências audiovisuais inéditas e ambientes imersivos, permitindo ao visitante mergulhar na história e na diversidade do idioma falado por 261 milhões de pessoas. Instalado na cidade com mais falantes de língua portuguesa do mundo, o Museu celebra a língua como elemento fundador da nossa cultura. Patrocinadora do Museu desde a primeira hora, a Fundação Calouste Gulbenkian apoiou também a obra de reconstrução.
SABER MAIS

 

MUSEU GULBENKIAN

O Poder da Palavra III

 

Até 31 mar 2022, Galeria do Oriente Islâmico

 

Este projeto participativo, que envolve um grupo diversificado de habitantes de Lisboa que se expressam em várias línguas (árabe, persa, turco e português), propõe uma intervenção expositiva centrada no tema “Mulheres: navegando entre a presença e a ausência”. 
 

 

JUSTIÇA INTERGERACIONAL

Políticas públicas justas para todos

 

A Fundação Gulbenkian lançou uma ferramenta que permite verificar o impacto das políticas públicas nas gerações presentes e futuras. Ao ajudar a fazer as perguntas certas e a considerar várias variáveis, a ferramenta permitirá aos decisores prevenir eventuais desequilíbrios intergeracionais.

 

PUBLICAÇÕES

Biblioteca digital

 

Há de tudo um pouco: de Platão a Santo Agostinho, da Arte Islâmica ao Pós-Pop, Clássicos da cultura mundial, obras marcantes da cultura portuguesa, publicações na área da Astronomia e do Direito, da Física e da Astrofísica, da Economia, da Educação, da Filosofia e da Psicologia, da Matemática e da Teologia, e ainda catálogos de exposições, estudos, relatórios e publicações institucionais. Ao todo, são dezenas de obras publicadas online, numa mesma biblioteca, prontas para serem descarregadas por todo e qualquer interessado.
SABER MAIS
Exposições

GALERIA PRINCIPAL

Tudo o que eu quero. Artistas portuguesas de 1900 a 2020

 

 

Últimos dias: até 23 ago. Entrada gratuita
 

ÁTRIO BIBLIOTECA DE ARTE

Livros de Artista de artistas mulheres

 

 

Até 20 set. Entrada livre


Pedro Tamen (1934-2021)

 

9
A Luz que Vem das Pedras

A luz que vem das pedras, do íntimo da pedra,
tu a colhes, mulher, a distribuis
tão generosa e à janela do mundo.
O sal do mar percorre a tua língua;
não são de mais em ti as coisas mais.
Melhor que tudo, o voo dos insectos,
o ritmo nocturno do girar dos bichos,
a chave do momento em que começa o canto
da ave ou da cigarra
— a mão que tal comanda no mesmo gesto fere
a corda do que em ti faz acordar
os olhos densos de cada dia um só.
Quem está salvando nesta respiração
boca a boca real com o universo?
Pedro Tamen, in "Agora, Estar (1975) - Retábulo das Matérias", Gótica/Lisboa, 2001, p.407
Pedro Tamen

O poeta,  tradutor,  Pedro Tamen, (1934-2021), 86 anos, morreu ontem, 29 de Julho, em Setúbal, onde estava hospitalizado. Dedicou mais de 50 anos à poesia, longamente premiada, mas sem abdicar do vício da tradução.
 Pedro Tamen: uma vida entre duas paixões
"Figura activíssima" da vida cultural portuguesa, publicou a primeira obra na década de 1950.
por Sérgio Almeida
"A escrita e a tradução foram duas paixões constantes na vida do poeta Pedro Tamen, falecido ontem, aos 86 anos, em Setúbal, onde se encontrava hospitalizado.
A irregularidade na publicação não significou menor empenho, antes um envolvimento amplo na causa cultural que não se esgotou na escrita. Esse dinamismo já se fazia notar quando, ainda como estudante universitário, dirigiu o jornal "Encontro" e ajudou a fundar cineclube Centro Cultural de Cinema.
Ao lado do amigo António Alçada Baptista, dirigiu, entre 1958 e 1975, a editora Moraes, ajudando-a a tornar-se uma referência no setor.
Vogal do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian durante 25 anos, presidiu ao P.E.N. Clube Português e foi dirigente da Associação Portuguesa de Escritores.
Tão significativa no seu percurso como a escrita foi a tradução. Durante mais de três décadas, traduziu dezenas de autores, incluindo Gabriel García Márquez, Reinaldo Arenas, Marcel Proust ou Gustave Flaubert, tendo conquistado vários prémios, como o atribuído pela Associação Portuguesa de Críticos Literários, em 1991.
As quase duas dezenas de livros de poesia que publicou foram reunidas na edição "Retábulo das memórias" (2013), com cerca de mil páginas.
Entre as distinções que viu serem-lhe atribuídas enquanto poeta constam o Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores, em 2010, e o Prémio Casino da Póvoa/Correntes d"Escritas, em 2011.
Numa nota publicada no sítio oficial da Presidência da República, Marcelo Rebelo de Sousa lamentou a morte de "uma figura ativíssima da nossa vida cultural e cívica, durante mais de meio século", recordando nomeadamente a sua intervenção "como militante de grupos católicos de orientação conciliar".
Por sua vez, a ministra da Cultura classificou Tamen de "figura maior da literatura portuguesa" e enalteceu "uma obra poética extraordinária, com um domínio magistral da língua portuguesa e das suas sonoridades".
As cerimónias fúnebres do poeta vão realizar-se amanhã, numa capela em Palmela, no distrito de Setúbal, apenas com a presença de familiares, devido às contingências da pandemia.
Licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa, o autor de "Um teatro às escuras" não demorou muito a trocar a advocacia pelo envolvimento literário. O primeiro livro, "Poema para todos os dias", saiu quando tinha apenas 22 anos, publicando a obra seguinte, "O sangue, a água e o vinho", dois anos mais tarde, antes de um silêncio que se estenderia por década e meia."
Sérgio Almeida, JN

quinta-feira, 29 de julho de 2021

C'est l'amour qui retient

 

Les plaisirs ont choisi pour asile
 ce séjour agréable et tranquille, 
que ces lieux sont charmants 
pour les heureux amants ! 
 C'est l'amour qui retient 
dans ses chaînes mille oiseaux
 qu'en nos bois nuit et jour on entend. 
Si l'amour ne causait que des peines, 
les oiseaux amoureux ne chanteraient pas tant. 
 Jeunes cœurs, tout vous est favorable,
 profitez d'un bonheur peu durable. 
Dans l'hiver de nos ans
 l'Amour ne règne plus,
 les beaux jours que l'on perd
 sont pour jamais perdus.

La passacaille , do Acto V  da tragédia musical Armide , de Jean-Baptiste de Lully, (Florença, 28 de Novembro de 1632 – Paris, 22 de Março de 1687).  Interpretação do tenor  Cyril Auvity, acompanhado pela orquestra  Les Arts florissants, sob a direcção do Maestro William Christie.
  
De Henry Purcell, (10 de Setembro de 1659, Westminster, Londres - 21 de Novembro de 1695, Londres) How Happy the Lover, de " King Arthur - Act IV. Passacaglia."

quarta-feira, 28 de julho de 2021

Colonialistas quem, nós?

"Livro de Vozes e Sombras, de  João de Melo, Publicações D. Quixote, 2020,foi o vencedor da 26.ª edição do Grande Prémio de Literatura. A decisão do júri, constituído pelo professor e escritor Vítor Aguiar e Silva, pelo presidente da Associação Portuguesa de Escritores, José Manuel Mendes, e, pelo professor da Universidade do Minho Carlos Mendes de Sousa, foi unânime. O prémio tem o valor pecuniário de 15 mil euros.
O júri, segundo comunicado enviado à agência Lusa, realçou o “apurado sentido de composição e a qualidade de escrita no desenvolvimento de um romance que, percorrendo diversos espaços geográficos e sociais, bem como tempos convulsionados, traçam uma memória colectiva densa, avessa a todo o esquematismo, a partir de núcleos efabulatórios, nos quais avultam personagens de grande finura e poder contrastivo”.Um belíssimo romance que aproxima ou supera o autor das suas obras mais credenciadas. Rebuscou e acertou uma estrutura febril e avassaladora, puxou para a literatura a história da FLA – Frente de Libertação dos Açores mediante uma entrevista a uma das suas figuras icónicas de uma jornalista vinda de Lisboa, umas boas décadas depois. Há memórias de uma guerra da Guiné, chega o 25 de Abril com os seus ventos de independentismo insular, salta-se para a Angola colonial e depois a descolonização, aqui João de Melo legou páginas que passarão para a posteridade, tal o vigor emprestado àquela turbulência, ao espetáculo das fugas, ao desmoronamento de vidas. Vozes e sombras a atestar que o tempo passa e o bicho humano se adapta.
Com os Açores, de onde João de Melo é natural, no centro da narrativa, o Livro de Vozes e Sombras é uma obra sobre as aspirações revolucionárias do pós-25 de Abril de 1974, vividas entre os Açores, Lisboa e as nações africanas, que estiveram sob administração portuguesa. 
Há um incontestável esmero na arquitetura desta obra. Logo o encontro entre a jornalista Cláudia Lourenço e o lendário agente da FLA, Mariano Franco, partem do porto de Ponta Delgada para as Capelas. João de Melo está em casa, daí a vivacidade de nos falar do incenso, dos canaviais, cedros, ciprestes, dragoeiros e criptomérias, e aquele vento forte, desalmado, que atravessa lameiros, córregos e canadas. É pela voz do lendário insurrecto que se começa a falar do colonialismo, do império, ele estivera na Guiné, experiência duríssima. Diga-se de passagem, é o episódio mais canhestro deste belíssimo romance, só mesmo quem não andou pela Guiné e não lhe conhece a orografia é que pode falar em precipícios e abismos. Mariano conta e torna a contar, assistiu à revolução em Lisboa, meteu-se mesmo nas manifestações, jurou a si próprio que iria travar todo aquele delírio proletário na sua terra. Surge Manuel Cristóvão, um sindicalista que um dia será forçado a vir para o continente, descobrirá uma companheira, uma retornada de Angola a quem caberá o discurso final da reconciliação pós-Império. Este Manuel Cristóvão será alvo de sevícias, o tempo se encarregará de atirar a FLA para o caixote do lixo da História, a normalização far-se-á sentir após os acontecimentos do 25 de Novembro.
E saltamos para Angola, para a Casa Grande de Munakala, mergulhamos a sério no colonialismo, personificado pelo granjeiro Custódio Pinto, o 25 de Abril chegou a África, onde se esperava compromisso entre os diferentes movimentos de libertação, estala a demência, começam as fugas, os assassinatos, as destruições, mata-se selvaticamente o gado, Custódio manda a mulher e uma das filhas para Nova Roma, incendeia a casa. Aqui se encetam páginas literárias de grande qualidade, até porque a narrativa cabe à menina cega transformada no oráculo daquela curva da história, Ângela conta igualmente a chegada a Lisboa, a vergonha de serem chamados colonialistas, racistas, reacionários, exploradores e assassinos dos africanos. E depois a vida em Lisboa, o pai perde a saúde mental, a vida de três mulheres muda radicalmente.
Mariano Franco retoma a conversa com Cláudia Lourenço, muito cedo se apercebe que a CIA também veio ajudar a atear o fogo, fazia jeito a subversão dos Açores contra Portugal, para dar dinamismo à FLA foi mesmo dissolvido o Movimento para a Autodeterminação do Povo Açoriano, percebeu-se que era na brutalidade e no bombismo que convinha intimidar. Mariano conta mesmo um episódio dessa brutalidade que o leva ao remorso. Tem o maior interesse a descrição que João de Melo faz deste interior da FLA, o que motiva os seus membros.
Tudo se normaliza então, Mariano é expulso como expulso fora o sindicalista Manuel Custódio. Nesta trama literária de diferentes retornos vamos encontrar pessoas à deriva como a própria jornalista e o entediado representante do jornal na ilha, um tal Gil, que não sabe bem quem ama, que corre de uma paixão para outra.
A jornalista regressa a Lisboa e ouve das boas do chefe da redação, falta nervo ao material da entrevista, havia para ali muita mentirinha doce e heroísmo bacoco, ela que trabalhasse mais, é nisto que Cláudia Lourenço tem inspiração de saber por onde anda o sindicalista Manuel Cristóvão, chegou a hora de grandes revelações, a tal menina ceguinha da Casa Grande de Munakala tem muito para contar, dirá coisas como: “Um dia, ouvia um militar – que lá esteve a defender os bens e a pátria dos colonos – que a experiência dessa guerra lhe entrara nos ossos como um veneno, e não mais saíra. Sei o que isso é. Uma enfermidade do espírito e da consciência, para sempre. Fomos os demónios da memória portuguesa. De lá, desse continente histórico, regressou connosco uma ferida para a qual não há remédio nem cura possível”. Os desabafos não se ficam por aqui: “Não encontro as palavras certas para falar da minha mágoa histórica. Gostava de ser filha de um país primitivo, anterior à loucura da sua expansão para o exterior. Tivessem os portugueses visto no mar o prolongamento simbólico do território, e já não teriam complexos quanto à pequenez do seu país. Foi o passado que determinou o meu destino. Por isso me queixo dele e dele me lamento”.
Manuel Cristóvão também tem muito para contar. “Descobrira algo de novo no seu trabalho: a dignidade da vítima. Ninguém como a vítima nos mostra a sua própria realidade de baixo para cima, do chão para a cabeça dos homens, e destes para o céu dos deuses ou para a terra fria dos vivos e dos mortos”. Lisboa, Açores, Guiné e Angola. Projectos derrubados, vidas recomeçadas neste esplêndido romance marcado por retornos e pelo amor aos lugares, dêem eles pelo nome de Campo de Ourique ou a ilha de S. Miguel."
Mário Beja Santos, in "Mais Ribatejo".

Ponta Delgada nos primórdios do sec. XX.

Colonialistas quem, nós?
por João de Melo
"Começou  por justificar historicamente as razões da luta pela independência das ilhas dos Açores . Portugal só fora um país a valer no conceito das nações enquanto manteve as suas possessões ultramarinas. O Brasil na América do Sul, as províncias na África e na Ásia, os arquipélagos europeus dos Açores e da Madeira a meio do Atlântico, uma universidade lusíada  a bem dizer à escala do globo terrestre. Segundo a FLA, o país mantinha os Açores e a Madeira  na condição de últimas colónias. Porque as outras , as ricas e cobiçadas terras de África, iam recebendo de presente a libertação nacional, as inacreditáveis guerras civis, os bárbaros genocídios tribais, os vandalismos guerreiros e a vingança dos pretos sobre os brancos - que já debandavam em massa para Portugal. Essas tais colónias  acabaram por cair nas garras de rapina das potências mundiais - em tratos e pilhagens  de blocos e nações que entre si dividiam as possessões portuguesas- com o capitalismo à frente e o comunismo logo atrás.
- Colonialistas, nós? Nem por isso, menina Cláudia. 
Ou, por outra, continuou Mariano, fomos nem mais nem menos colonialistas do que o têm sido nos Açores: seus ocupantes. O colonialismo é a doença crónica dos impérios - e nós gozávamos de saúde  no nosso falso imperialismo. Ao invés de outras potências coloniais, fomo-nos miscigenando com os indígenas à medida que os civilizávamos. Conhece outro povo que tivesse praticado isso à nossa maneira - ingleses, espanhóis, franceses, holandeses? Nem por sombras. Nós transmitimos valores humanos, padrões de atitude, modos e ensinamentos de uma civilização, uma língua, a religião católica, civilidade, costumes, protocolos. Prova disso, o facto de a civilização lusíada se ter disseminado por todos os continentes. Vemo-las nas igrejas de Macau, Goa, Damão e Diu, nas fortalezas militares da costa africana de Marrocos, em Malaca e em Mombaça e na melhor arquitectura do Brasil - quando os portugueses se tornaram senhores do comércio marítimo e introduziram na Europa os misteriosos produtos da Índia: pimenta, canela, açafrão, gengibre, noz-moscada. Povoámos terras desertas - outras ficaram sob o estado selvagem dos indígenas-, e nelas os portugueses ergueram cidades, vilas e aldeias, com as suas igrejas , as tendas e cabanas nos matos de África, e caminhos de ida e volta nos sertões. Além disso, ensinámos a negros e índios o nome  das coisas , os instrumentos e ofícios, o modo de trabalhar e a prática de tudo:(...) 
E a saberem as palavras com que o mundo designa as coisas: dinheiro é dinheiro, pólvora é pólvora, sapato é sapato, uma mesa e uma cama são uma mesa e uma cama, e pronto!
- Quer-me parecer que não concorda comigo. Pois não?
Pouco ou nada subsiste por essas Áfricas e Ásias da escola civilizadora dos brancos. A corja da tropa lembrou-se de pôr fim à nossa posse sobre as províncias ultramarinas. O regresso em massa dos brancos e a fantochada da independência dos novos países deu sabe em quê, menina?, numa enorme e terrível tragédia. Nossa e deles. Ficámos todos a ver navios, ao cabo de cinco séculos  de expansão marítima e de presença militar em tais paragens : o ouro, o diamante, o petróleo e as minas de sal-gema foram dadas a mãos estrangeiras. A tragédia dos africanos? Terem de aprender tudo de novo, a começar pelo engano ilusório de se dizerem independentes, enquanto jibóias, leões e aves carnívoras  rondam as suas riquezas.(...) Mais do que um erro histórico e uma estupidez política, a nossa descolonização deu origem a uma cadeia de amanhos e desgraças. Encheu-nos a todos da nossa vergonha nacional.
- O país  anterior deixou de existir. O de agora, veremos se sobreviverá enquanto estado e nação desta Europa.
Não podíamos ficar de braços cruzados nem deixar que tudo nos acontecesse por livre-arbítrio dos comunistas, e se consumassem as traições da pátria. A ordem dos três «dês»», «democratizar, descolonizar , desenvolver », ficou por cumprir em todas e em cada uma das paragens portuguesas de aquém e além-mar, e não só nas partes de África e da Ásia, sob a nossa bandeira. Falta-nos uma solução para os Açores e para a Madeira.
Então estes arquipélagos não são colónias, como os outros o eram, ou seja, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe? Quatro arquipélagos achados desertos, e depois povoados. (...) O certo é que  deram origem a novos povos, o açoriano e o madeirense, com matriz histórica, cidadania e uma cultura própria. Nem são uma raça nem uma tribo, são uma etnia  da memória e do pensamento a que chamamos identidade insular. Daí o nosso direito à soberania: sermos tão índios  e tão pretos quanto os da Índia , do Brasil  e de África. (...)
Portugal não mais quis saber de nós, desta pobreza, da perdição solitária das ilhas. (...) Fomo-nos na diáspora sem regresso, idos da terra da fome e das belezas naturais para a terra prometida da saúde e da abundância, na outra margem do mar. Saímos da agricultura, do leite das vacas, da pesca e dos baixos ofícios, e fomos para a neve, o gelo, os tufões americanos. Quisemos o que os portugueses não nos deram: liberdade económica, progresso, trabalho digno nas fábricas  e nas terras, o direito a casa própria, família e futuro. Sabem lá, os senhores de Lisboa, o que custa ser estrangeiro num país de estrangeiros. Começava tudo por uma carta de chamada que nunca mais vinha e que nos fazia penar na ansiedade da espera. Chegávamos ao destino, era outra língua, gente a falar connosco e nós nada, uma tristeza alegre, uma alegria triste: havia trabalho, ganhava-se bom dinheiro, e mais nada.(...) Assim nos forjámos como povo. Em terra alheia, na nostalgia das coisas recordadas por entre lágrimas que gelavam nos invernos de Boston e de Toronto. As luas americanas traziam-nos à lembrança a rua da ilha onde nascêramos, a casa que nos vira crescer e ir embora de vez, na solidão das saudades. O arquipélago continuou a ser para nós o centro de uma ideia, uma pátria que nos merecia na hora do regresso à nossa terra: sem a sombra dos continentais por cima de nós, nem as leis , os tributos , as ordens colonialistas de Lisboa."
João de Melo, in Livro de Vozes e sombras, Publicações Dom Quixote, Junho de 2020, pp.43- 47

segunda-feira, 26 de julho de 2021

A AUDÁCIA DE FAZER


OTELO: A AUDÁCIA DE FAZER
por Eugénio Lisboa
 
Há serviços tão grandes que não se
podem pagar a não ser com ingratidão.
Alexandre Dumas
 
“Morreu no passado dia 25 Otelo Saraiva de Carvalho, nascido em Lourenço Marques, como eu, tendo frequentado o mesmo liceu que eu frequentei (ele, seis anos mais novo), de certo modo, moçambicano, sem deixar de ser português, mas com a marca distintiva dos ali nascidos: uma certa candura, simplicidade, afectuosidade e fácil entrega, em suma, uma total falta de ronha, em língua de boa cepa moçambicana. Coração na boca, capaz dos maiores dislates, mas não intrinsecamente mau, bem ao contrário. Sem grande cultura, nem mesmo cultura política, superficial, susceptível de derivas perigosas, impulsivo, mas invulgarmente audacioso e determinado no fazer, como poucos portugueses: a maioria acomodou-se, durante décadas, sem grandes problemas de consciência, no seio de um regime pífio, provinciano, inculto, censório, persecutório, sem ambição, dispensando sem escrúpulos os melhores e apaparicando os medíocres acomodatícios, imitando timidamente os fascismos disponíveis no mercado, mas com uma falta de visão de dona de casa pobre (mas agradecida), sem ideias e odiando quem as tivesse, um regime sufocante, vergonhoso mas sem vergonha – em suma, um pântano mal cheiroso e venenoso. Um regime em que os meus textos, que me tinham custado anos e anos de estudo empenhado e amoroso, eram trucidados às mãos de censores boçais e analfabetos, desconfiados de tudo e da própria sombra. Um regime em que o acesso aos livros e à cultura em geral era brutalmente vigiado e reprimido por incompetentes caninamente obedientes à voz do dono. Tudo perpetrado, de alma contente, a bem da Nação. O homem do leme, Salazar, no seu casamento de conveniência com a Igreja Católica de Cerejeira, fora ao ponto de dizer que quem não era católico era antipatriota. Isto explica o aparecimento de tantos Tartufos, logo apostados em parecer mais devotos que os devotos. O mérito era secundário ou mesmo perigoso. Nos estudos, se um aluno se destacava em conhecimento e rebeldia, logo aparecia um ou outro professor colado ao regime, que avisava: “Cuidado! De pequenino é que se torce o pepino…” A mediocridade, por outro lado, sossegava e era abençoada.
Uma guerra absurda e mortífera – que o tiranete de Santa Comba sempre soubera que não ia acabar bem – arrastava-se, perante os olhos de uma comunidade internacional que nos condenava sem apelo e nos remetia para um patético “orgulhosamente sós”. E deixando um rasto pavoroso de mutilações físicas e psíquicas, que ficariam a marcar pela vida fora os por elas atingidos.
Otelo e outros capitães souberam ousar pôr fim a tudo isto. Não é pouco, ao fim de 48 anos de opressão, de Caxias, Peniche e Tarrafal a bem da Nação, 48 anos de terror e desmotivação, aparecer alguém a ter a audácia de achar que podia pôr termo ao absurdo, mostrando como fazê-lo e fazendo-o. “Um herói”, disse-o Romain Rolland, no seu romance Jean-Christophe, “é aquele que faz o que faz. Os outros não o fazem.” Otelo e os seus companheiros de Abril fizeram o que havia a fazer: o que a maioria dos portugueses não fizera, o que, para não poucos, viria a constituir uma encapotada afronta.
Antes do 25 de Abril, quando eu ia lá fora encher-me do que não havia em Portugal, acesso livre à cultura, sem o intermediário de vigilantes, quando ia a Paris, a Londres, a Roma, a Bruxelas, e quando me perguntavam qual era a minha nacionalidade, tinha vergonha de dizer que era português. Depois do 25 de Abril, passei a ter menos vergonha e até a ter algum orgulho. Fiquei, em suma, com uma dívida insanável para com Otelo e os capitães de Abril. E nunca gostaria de a pagar com a moeda mais em uso nestes casos: a ingratidão, que Dumas denuncia na epígrafe que colei a este texto. Com isto, não quero encobrir os actos ulteriores de Otelo, que totalmente repudio. Quero muito lisinhamente não ser ingrato.
Otelo, a despeito de tudo o que, depois, fez, de tonto, de perigoso e de mal, , foi, com outros, o herói que pôs fim ao reino da estupidez e da vergonha. Regatear-lhe reconhecimento, a pretexto de derivas mal congeminadas, pode ser mesquinho e tortuoso (ou simplesmente exercício de má pontaria). Não houve quase nunca heróis quimicamente puros, embora um Salgueiro Maia, rara excepção, se tenha aproximado muito desse ideal. Dos gregos antigos, de Alexandre da Macedónia, de Júlio César até Napoleão e, mais recentemente, George Patton ou MacArthur (na segunda guerra mundial), não há heróis puros, repito. A todos eles se podem pôr as mais severas reservas. A coragem e a audácia têm o seu preço elevado, no equilíbrio instável dos temperamentos dos homens não vulgares. Não compreender isso é não compreender nada. É querer comer o bolo e guardá-lo. É ser ingrato. “Não há um único dos que comigo aprenderam a disparar, que depois não faça de mim o alvo”, observou o acutilante Montherlant, que nunca teve frio nos olhos. No exercício quotidiano da mesquinhez e da ingratidão, há não sei quantos a quem Otelo restituiu a liberdade e que lhe agradecem escoicinhando-o e, às vezes, insultando-o. Não nos enterneçamos: as coisas são o que são e os homens são o que podem ser."
                                                                                             26.07.2021
Eugénio Lisboa

Novidades literárias

"A Carta do Achamento do Brasil" , de Pero Vaz de Caminho, é uma edição da  Guerra & Paz , livros brancos, com 80 páginas.  
«A carta de Caminha é algo inteiramente novo e, repita‑se, um documento único na história da humanidade. Estou consciente de que me restrinjo à «humanidade europeia» (e especificamente ocidental), mas na minha vasta ignorância não tenho notícia de nada que se lhe assemelhe. Nem Marco Polo revela tal candura perante o inesperado, o maravilhoso descoberto, mesmo se planeado (e a isso já iremos mais adiante).
A narrativa de Pêro Vaz de Caminha − confesso que prefiro não entrar em pormenores sobre ela para que o leitor a descubra virgem, e a aprecie por si próprio, pois ela dispensa glosas − basta lê-la atentamente para nos darmos conta da abertura de horizontes dos recém-chegados a um universo novo, inteiramente inesperado. Vemo-los fascinados perante a natureza e a beleza de um povo que os deslumbra.
Tudo surge descrito numa linguagem gostosa, ditada por um olhar eivado de quase ingénua inocência.»
Onésimo Teotónio Almeida

Famoso pelos seus romances, com destaque para “Os Detetives Selvagens” e “2666”, o autor chileno Roberto Bolaño foi, antes de tudo, um poeta. Não é por acaso que os personagens das suas extensas narrativas costumam praticar versos, imersos no submundo da América Latina — palco das narrativas do autor.
“Chegar à poesia de Roberto Bolaño é chegar a uma cidade desconhecida e reconhecê-la. Ela não só condensa e espelha muito de seus romances como parece ser o ponto onde tudo começa: laboratório de escrita no qual uma espécie de poeta despreocupado e feliz mexe com o que há de mais poético” — Marília Garcia
“A universidade desconhecida”, sexto e último livro de poemas de Bolaño, publicado postumamente em 2007, sob o título de “La universidad desconocida”, está editado  pela Companhia das Letras, e reúne versos de todas as fases da sua vida.
O conjunto, traduzido para o português por Josely Vianna Baptista, foi organizado pelo próprio autor antes de sua morte precoce, em 2003, aos 50 anos. Em termos da edição, ela tem 832 páginas e a arte da capa é de Raul Loureiro.
No seu trabalho poético, ele realça a melancolia, o humor soturno e vislumbres apocalípticos do futuro, sem perder de vista uma grande devoção ao poder dos versos e à potência gerada pela comunhão dos jovens em torno da literatura.
Sobre o autor:
Nascido no Chile, em 1953, narrador e poeta, Roberto Bolaño impôs-se como um dos escritores latino-americanos do nosso tempo. Publicou, entre outros, os ensaios recolhidos em “Entre Paréntises”, os livros de contos “Llamadas Telefónicas” (Prémio Municipal de Santiago do Chile), “Putas Asesinas” e “El Gaucho Insufrible”, e os romances “Estrella Distante”, “Amuleto”, “Monsieur Pain”, “Nocturno de Chile”, “Amberes”, “Los Detectives Selvajes” (Prémio Herralde de Novela e Prémio Rómulo Gallegos, ambos por unanimidade) e o monumental “2666”.
Fonte: Porto Editora
"O Homem do Turbante Verde”, de Mário de Carvalho (ed. Porto Editora, 160 páginas)
Sinopse:
"Uma expedição arqueológica no deserto, o alvoroço de uma troca de reféns e a terra dos Makalueles, numa África irreal. A tropa, a clandestinidade e toda uma juventude empenhada, a braços com os dilemas de um tempo histórico ainda recente. O celacanto, peixe pré-histórico alado, e o Alfa que nunca sai a horas. De permeio, um chochman perdido alhures, a maldita barbárie e os delírios da solidão, em narrativas curtas, cheias de inquietação e susto. E ao fundo, omnipresente, a fina ironia a que Mário de Carvalho já nos habituou."
Sobre o autor:
"Nasceu em Lisboa em 1944. Licenciou-se em Direito e viu o serviço militar interrompido pela prisão, durante a ditadura que assolou Portugal. Depois da Revolução dos Cravos, em que se envolveu intensamente, Mário de Carvalho exerceu advocacia em Lisboa. O seu primeiro livro, “Contos da Sétima Esfera”, editado, pela primeira vez, em 1981, causou surpresa pelo inesperado da abordagem ficcional e pela peculiar atmosfera, entre o maravilhoso e o fantástico. Desde então, tem praticado diversos géneros literários – romance, novela, conto, crónica, ensaio e teatro –, percorrendo várias épocas e ambientes, sempre em edições sucessivas. Pela sua múltipla capacidade literária, o autor foi agraciado com os prémios literários portugueses mais prestigiados, designadamente, os Grandes Prémios de Romance, Conto, Teatro da, ao qual se junta, agora, o Grande Prémio de Crónica e Dispersos Literários, todos atribuídos pela Associação Portuguesa de Escritores, o prémio do Pen Clube Português e o Prémio Internacional Pégaso. Por esse motivo, os seus livros encontram-se traduzidos em várias línguas. Por fim, obras como “Os Alferes”, “A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho”, “Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde”, “O Varandim seguido de Ocaso em Carvangel”, “A Liberdade de Pátio” ou “Ronda das Mil Belas em Frol” são a comprovação dessa extrema versatilidade."
Fonte: Porto Ediotora
“O Dia da Independência” – “Trilogia Bascombe” – Livro 2, de Richard Ford (ed. Porto Editora, 568 páginas)
Sinopse:
"Frank Bascombe vive num subúrbio de New Jersey, está divorciado há sete anos e a ex-mulher voltou a casar, levando os filhos de ambos para o Connecticut. Aos 44 anos, enquanto vê vacilar todas as suas relações pessoais, abandona a carreira de jornalista desportivo e tenta a sua sorte como agente imobiliário. Porém, sempre atormentado pela mediocridade do quotidiano, não encontra grandes saídas para aquilo que considera «o Período Existencial» da sua vida.
No fim de semana do 4 de Julho, dia da afirmação da identidade americana, Frank Bascombe faz-se à estrada com o filho, numa peregrinação pela América profunda, tornando-se o melhor observador da realidade americana – um homem comum vivendo experiências comuns.
Segundo livro da “Trilogia Bascombe”, “O Dia da Independência” foi agraciado simultaneamente com o Prémio Pulitzer e o Pen/Faulkner, tornando-se o primeiro livro a receber os dois galardões e confirmando Richard Ford como um dos maiores autores americanos dos nossos tempos.
Martyn Rady narra a epopeia de uma dinastia e do mundo que ela edificou – e depois perdeu – ao longo de quase um milénio. Com origens modestas, os Habsburgos tornaram-se senhores do Sacro Império Romano-Germânico no século XV. Depois, no intervalo de poucas décadas, as suas possessões passaram a incluir grande parte da Europa, estendendo-se da Hungria a Espanha, além de regiões do Novo Mundo e do Extremo Oriente. A família continuou a dominar a Europa Central até à catástrofe da Primeira Guerra Mundial."
Sobre o autor:
Martyn Rady, nascido em 1955 em Inglaterra, é titular da cátedra Masaryk de História Centro-Europeia no University College London. Grande especialista na Europa Central, é autor de “The Habsburg Empire: A Very Short Introduction”, “The Emperor Charles V” e de outras obras sobre as histórias húngara e romena."
Fonte: Editora Minotauro
 “No Tempo dos Girassóis”, de Martha Hall Kelly (ed. Editora Minotauro, 582 páginas)
Sinopse:
"Inspirado em testemunhos reais, “No Tempo dos Girassóis” oferece uma visão vívida e detalhada da experiência da Guerra Civil, desde as plantações bárbaras e desumanas, a uma cidade de Nova York devastada pela guerra e aos horrores do campo de batalha. É uma história arrebatadora de mulheres presas num país à beira do colapso, numa sociedade às voltas com o nacionalismo e a crueldade racial.
Georgeanna Georgy Woolsey destoa do mundo das festas luxuosas e segue sua paixão pela enfermagem. No sul Jemma vive como escrava, mas a chegada do exército da União dá-lhe uma rara oportunidade de fuga. Mas se decidir fazê-lo, irá abandonar a família que tanto ama."
Sobre a autora:
"Martha Hall Kelly nasceu em Nova Inglaterra, mas tornou-se nómada, dividindo o seu tempo entre Nova Iorque e Atlanta, no Estado da Geórgia. Trabalhou em publicidade durante vários anos enquanto investigava para escrever “Mulheres sem Nome” (Editora Minotauro, 2018), o seu primeiro livro, que se tornou um bestseller instantâneo. No ano seguinte, chegou a Portugal, pela mesma editora, “Rosas Esquecidas”, o seu segundo romance."
Fonte: Edições ASA
As Loucuras de Brooklyn”, de Paul Auster (ed. Edições ASA, 304 páginas)
“Paul Auster no seu melhor… Um romance de uma sabedoria tremenda.” — New Statesman
Sinopse:
Tendo como pano de fundo as polémicas eleições americanas de 2000, “As Loucuras de Brooklyn” conta-nos a história de Nathan e do seu sobrinho Tom. Divorciado e afastado da sua única filha, Nathan procura apenas a solidão e o anonimato. Por seu lado, o atormentado Tom está a fugir da sua em tempos promissora carreira académica e da vida em geral. Acidentalmente, acabam ambos a viver no mesmo subúrbio de Brooklyn, e juntos descobrem inesperadamente uma comunidade que pulsa de vida e oferece uma súbita e imprevisível possibilidade de redenção.
Sob a égide de Walt Whitman, desfila neste livro toda a dimensão e multiplicidade de Brooklyn: os personagens típicos de bairro, drag queens, intelectuais frustrados, empregadas de cafés decadentes, a burguesia urbana, tudo isto sob o olhar ternurento que Auster lança da mítica ponte de Brooklyn, sem contudo deixar de orquestrar romances improváveis e diálogos hilariantes, e considerar experiências tão extremas como o casamento entre uma actriz pornográfica e um fanático religioso.
“As Loucuras de Brooklyn” é o mais caloroso e exuberante romance de Paul Auster, um hino inesquecível às glórias e mistérios da vida comum."
Sobre o autor:
Nascido em 1947 em Newark, Nova Jersey, Estados Unidos, estudou literatura francesa, inglesa e italiana na Columbia University, em Nova Iorque. Viveu em Paris de 1971 a 1975. De volta à cidade que nunca dorme, em 1980, mudou-se para o bairro do Brooklyn, onde vive e trabalha até hoje. Poeta, tradutor, crítico de cinema e literatura, romancista e guionista de cinema, publicou ensaios, memórias, poesia e ficção. Da sua vasta e multifacetada produção literária destacam-se “Trilogia de Nova Iorque”, “Mr. Vertigo”, “A Noite do Oráculo”, “No País das Últimas Coisas”, “Timbuktu”, “Leviathan” ou, ainda, “Sunset Park” para citar apenas alguns exemplos. O seu romance mais recente, e mais longo, curiosamente, chama-se “4 3 2 1” e foi editado em Portugal pela Edições ASA e no Brasil pela Companhia das Letras."
Fonte: Relógio D’Água Editores
“De Noite Todo o Sangue É Negro”, de David Diop (ed. Relógio D’Água, 128 páginas, com tradução de Miguel Serras Pereira)
“De tal forma encantador e visceral que acho que nunca o esquecerei.” — Ali Smith
Vencedor do International Booker Prize de 2021
Sinopse:
"Numa manhã da Primeira Guerra Mundial, o capitão Armand comanda o ataque contra o inimigo alemão. Os soldados avançam. Entre eles estão Alfa Ndiaye e Mademba Diop, dois atiradores senegaleses que combatem sob a bandeira francesa.
Alguns metros à frente da trincheira de onde saiu, Mademba Diop cai ferido de morte sob o olhar de Alfa, seu amigo de infância e mais do que irmão. Alfa vê-se sozinho no meio do caos do grande massacre das trincheiras, e a sua mente é abalada. Ele, ainda há pouco um camponês africano, vai distribuir a morte numa terra desconhecida. Espalha a violência e semeia o terror, a ponto de amedrontar os próprios camaradas.
Deslocado para a Retaguarda, recorda o seu passado em África, um mundo ao mesmo tempo perdido e ressuscitado, cuja evocação é, só por si, um ato de resistência à primeira grande carnificina da era moderna.
Sobre o autor:
David Diop nasceu em Paris e foi criado no Senegal. É professor na Universidade de Pau e Pays de l’Adour, onde a sua pesquisa inclui tópicos como a literatura francesa do século XVIII e as representações europeias da África nos séculos XVII e XVIII. “De Noite Todo o Sangue É Negro” (título adoptado em Portugal), publicado como “Irmão de alma” no Brasil pela Editora Nós, que foi agraciado com o international Booker Prize de 2021, é o seu segundo romance.
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 ”Figuras numa Paisagem”, de Paul Theroux (ed. Quetzal Editores, 568 páginas)
“Quem ainda não leu estas trinta peças literárias ficará impressionado com a variedade dos seus interesses e o aprofundamento da pesquisa. Uma coleção abrangente, facilmente navegável, e que faz pensar.” — Booklist
Fonte: Quetzal Editores
Sinopse:
"Nesta sequência de grandes lugares, pessoas e prosas, os ensaios de viagem levam-nos ao Equador, ao Zimbabwe, ao Havai e muito além; as pérolas de crítica literária revelam fascinantes profundezas (e facetas pouco conhecidas) nas obras de Henry David Thoreau, Graham Greene, Joseph Conrad e Georges Simenon, entre outros; e a série de impressionantes perfis pessoais levam-nos numa viagem aérea com Elizabeth Taylor, a envolver-nos com a neurologia de rua de Oliver Sacks e a explorar Nova Iorque com Robin Williams.
A este variadíssimo leque de temas, experiências, gostos, encontros, autores, celebridades, artistas e geografias não podiam faltar as reflexões mais íntimas e as histórias e recordações mais pessoais e familiares – em textos como «O verdadeiro eu: uma recordação», «A vida e a revista Life» ou «Paizinho querido: recordações do meu pai».
“Figuras numa Paisagem” é uma entrada essencial no vasto universo de Theroux, cuja argamassa é uma ampla meditação e a procura constante do autêntico nas pessoas, nos lugares e nos livros.
Sobre o autor:
Paul Theroux nasceu no Massachusetts, em 1941, e vive atualmente entre Cape Cod e o Havai. Foi professor em Itália, no Malawi, no Uganda, e também em Singapura e Inglaterra. Escreveu romances, ensaios e alguns dos melhores livros de viagens de sempre, como “O Velho Expresso da Patagónia”, “Comboio-Fantasma para o Oriente” e “O Grande Bazar Ferroviário”, todos publicados pela Quetzal."

 ”O Nosso Jogo”, de John le Carré (ed. Dom Quixote, 400 páginas)
Fonte: Publicações Dom Quixote

Sinopse:
"Aos 48 anos, Tim Cranmer é um agente secreto a viver uma reforma antecipada no Somerset profundo. Com a Guerra Fria travada e vencida, está livre para se dedicar ao seu solar de família, às vinhas e à amante, a jovem e bela Emma. Mas ao passado ninguém foge, e o passado de Tim vive a 30 quilómetros de distância, na pessoa do caótico Larry Pettifer, professor universitário radical e entediado, pinga amor e, durante 20 anos, multifacetado agente duplo de Tim contra a agora desaparecida ameaça comunista. E, entre os dois homens, existe Emma e uma rivalidade por resolver.
Entretanto, Larry e Emma desaparecem. E Tim embarca numa perseguição a ambos, transformando-se ele próprio em presa, ao seguir os amantes através do campo minado das suas novas lealdades. Mas, à medida que Tim atravessa o terreno devastado da Inglaterra pós-thatcheriana e entra na selva sem lei de Moscovo e do Sul da Rússia, somos também levados a partilhar com ele o dilema de um legalista despojado do nosso tempo, privado do passado e do futuro, e a braços com os últimos resquícios de humanidade."

Sobre o autor:
John le Carré (19 de outubro de 1931, Poole, Reino Unido – 12 de dezembro de 2020, Royal Cornwall Hospital, Truro, Reino Unido) estudou em Berna e Oxford, foi professor em Eton e esteve durante cinco anos ligado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, sendo primeiro secretário da Embaixada Britânica em Bona e, posteriormente, cônsul político em Hamburgo. Começou a sua carreira literária em 1961, tendo-se tornado um escritor mundialmente reconhecido com o livro “O Espião Que Saiu do Frio”, o seu terceiro. Entre os seus romances, todos eles assinaláveis êxitos de vendas e de crítica, contam-se “O Alfaiate do Panamá”, Single & Single, “O Fiel Jardineiro”, “Amigos até ao Fim”, “O Canto da Missão” e “Um Homem Muito Procurado”
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 “Nova Identidade”, de Jorge Gomes Miranda (ed. Edições Tinta da China, 412 páginas
“O poder de observação e a mestria narrativa que se evidenciam na abordagem do impacto íntimo com que enfrentamos os choques sociológicos do mundo à nossa volta fazem dele o cronista em que melhor podemos folhear as imagens que nos devolvem, em jeito de reprise, o presente que estamos a viver. […] O trajecto poético de Jorge G. Miranda insere-se em toda uma tradição da poesia contemporânea (de Cavafis a Larkin) que procura recuperar para o poema uma vocação narrativa.” — jornal Público

fonte: Edições Tinta da China
Sinopse:
Antologia poética de Jorge Gomes Miranda.
Num só volume, cinco livros que voltam assim às livrarias – “O Muro das Jubilações”; “Nova Identidade”; “A Herança”; “Por Baldios, a Garça”; e “A História de Uma Enxurrada”.
Sobre o autor:
"Jorge Gomes Miranda nasceu em 1965, no Porto, cidade onde vive e trabalha. Ex-crítico literário do jornal Público. É autor dos seguintes livros de poesia: “O Que Nos Protege” (Pedra Formosa, 1995); “Portadas Abertas” (Presença, 1999); “Curtas-Metragens” (Relógio D’Água, 2002); “A Hora Perdida” (Campo das Letras, 2003); “Postos de Escuta” (Presença, 2003); “Este Mundo, sem Abrigo” (Relógio D’Água, 2003); “O Caçador de Tempestades” (& etc, 2004); “Pontos Luminosos” (Averno, 2004); “Requiem” (Assírio & Alvim, 2005); “Falésias” (Teatro de Vila Real, 2006); “O Acidente (Assírio & Alvim, 2007); Velhos (Teatro de Vila Real, 2008); Resgate (Fundação Serralves, 2008); El Accidente” (Quálea Editorial, 2009). Organizou ainda antologias literárias e escreveu também uma novela: “O Transplante” (Porto 2001, 2002).

 “O Pináculo”, de William Golding (ed. Dom Quixote, 208 páginas)
Fonte: Publicações Dom Quixote

Sinopse:
"O Deão Jocelin tem uma visão: Deus escolheu-o para erigir um magnífico pináculo na sua catedral. O pedreiro encarregado da obra desaconselha-o fortemente, pois a velha catedral foi construída sem fundações e é um milagre que se mantenha de pé. Mesmo assim, o pináculo ergue-se, octógono sobre octógono, cume sobre cume, até os pilares começarem a estremecer e a afundar-se no solo.
A sua altura lança uma sombra cada vez mais escura sobre o chão e, em particular, sobre o Deão Jocelin. Mas este, que acredita ser um mero instrumento nas mãos de Deus, abençoado por uma visão do Criador, insiste em elevar mais e mais alto o pináculo. Todavia, as consequências da concretização do seu objectivo revelam-se trágicas para aqueles que o rodeiam.
Ambientado na Inglaterra medieval, e inspirado na história da catedral de Salisbury, “O Pináculo” é um romance sobre a realização criativa, que dá vida ao impossível, mas também sobre o custo financeiro, físico e espiritual da loucura de um homem. Ao espelhar na narrativa a progressão dessa loucura, William Golding alcança algo extraordinário. A aparente simplicidade de um livro complexo é o testemunho da sua habilidade literária."
Sobre o autor:
"Escritor inglês, William Gerald Golding nasceu a 19 de setembro de 1911 na pequena aldeia de St. Columb Minor, na Cornualha. Filho de um professor primário de fortes entusiasmos políticos e de uma activista dos direitos das mulheres, começou a escrever precocemente, com apenas sete anos de idade. Após ter concluído os seus estudos secundários na Marlborough Grammar School, ingressou no Brasenose College da Universidade de Oxford, com o intuito de cumprir o desejo paterno e versar Ciências da Natureza. Não obstante, ao fim de dois anos encontrou forças para seguir a sua verdadeira vocação e pediu transferência para Literatura Inglesa. Em 1934, ainda estudante, publicou o seu primeiro livro, uma compilação de poemas intitulada “Poems“. No ano de 1939 mudou-se para Salisbury, onde passou a lecionar Inglês na Bishop Wordsworth’s School. Em consequência da deflagração da Segunda Guerra Mundial alistou-se na Real Armada Britânica, ascendendo pouco tempo depois ao posto de comandante de um torpedeiro. Presenciou o afundamento do couraçado alemão Bismarck e o desembarque na Normandia. Finda a guerra, Golding retomou o ensino e a sua grande ambição, a escrita. Em 1954 publicou o seu primeiro romance, “Lord Of The Flies” (O Senhor das Moscas), que se tornou num sucesso de vendas imediato e internacional. Seguiram-se, entre outros volumes, “The Inheritors” (1955), “Free Fall” (1959), “The Spire” (1964), “Darkness Visible” (1979) e “Rites Of Passage” (1980, “Ritos de Passagem“). Investido cavaleiro em 1988, William Golding foi vencedor de inúmeros prémios, entre os quais o prestigiado Nobel da Literatura, em 1983. Faleceu em Perranarworthal a 19 de Junho de 1993."



Cet été, que lisez-vous?

Des idées de lecture pour l'été
Novidades da Relógio D’Água que chegarão às livrarias em Julho:

1 — O Princípio da Incerteza: I — Jóia de Família, de Agustina Bessa-Luís
2 — O Hóspede de Job, de José Cardoso Pires (Prefácio de Bruno Vieira Amaral)
3 — Inventor de Vendavais, de Hélia Correia (Infanto-juvenil)
4 — Uma Estranha Amizade: Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão, de Maria Filomena Mónica
Eça foi aluno de Francês de Ramalho Ortigão e mais tarde escreveu com ele capítulos alternados de O Mistério da Estrada de Sintra. Em 1871 lançaram em conjunto As Farpas, mas esta cumplicidade literária andou a par com uma amizade ambígua, que se reflectiu no modo como Ramalho tratou os inéditos que Eça deixou.
5 — Aprender a Rezar na Era da Técnica, de Gonçalo M. Tavares (Reedição)
6 — A Guerra do Mundo, de Niall Ferguson
7 — Os Ensaios, de George Orwell (Prefácio de Pedro Mexia)
8 — Homens em Tempos Sombrios, de Hannah Arendt
Hannah Arendt fala-nos de Rosa Luxemburgo, Angelo Giuseppe Roncalli, Karl Jaspers, Isak Dinesen, Hermann Broch, Walter Benjamin, Bertolt Brecht, Waldemar Gurian, Randall Jarrell, autores que viveram os tempos difíceis das primeiras décadas do século XX.
9 — Devorar o Céu, de Paolo Giordano
Neste romance, o autor de A Solidão dos Números Primos, aborda a aventura de um grupo de jovens italianos, unidos por laços de amizade e amor, cujas preocupações ecológicas se radicalizam até um inevitável ponto de ruptura.
10 — As Crónicas de Explosão, de Yan Lianke
11 — A Taça Dourada, de Henry James
É, a par de Retrato de Uma Senhora, o mais importante romance de Henry James.
12 — Linha Final, de Don DeLillo (Tradução de Paulo Faria)
Linha Final, de Don DeLillo, é um romance em que se exploram a fundo os meandros do futebol americano enquanto espelho da angústia e do medo contemporâneos.
13 — Águas Profundas, de Patricia Highsmith
14 — O Quarto de Jacob, de Virginia Woolf
15 — Encontros com Livros (Ensaios e Prefácios de 1902 a 1939), de Stefan Zweig
Stefan Zweig escreve de modo original sobre obras de Goethe, Sigmund Freud, Thomas Mann e Honoré de Balzac.
16 — De Noite Todo o Sangue É Negro, de David Diop
Vencedor do Booker International Prize.
Um jovem soldado senegalês, que luta nas trincheiras da França, durante a I Guerra Mundial, vê morrer o seu melhor amigo, esventrado por uma baioneta inimiga. Depois de um breve período em que pratica a vingança contra soldados alemães, com uma crueldade que assusta os seus próprios camaradas, é enviado para a retaguarda, onde recorda o seu passado africano, filho de camponeses.