terça-feira, 6 de junho de 2017

Que nunca nos consolaremos

13 de Junho de 1978
A mania que têm as  pessoas (no caso, o simpático Severo) de definirem espontaneamente o luto por meio de fenómenos: Não estás contente com a tua vida? - Mas sim, a minha "vida" vai bem, não tenho nela qualquer falta fenomenal; mas sem qualquer perturbação exterior, sem "incidências", uma falta absoluta: precisamente, não é o "luto" , é o desgosto puro - sem substitutos, sem simbolização.

Luto       14 de Junho de 1978
( Oito meses depois): o segundo luto.

Luto        20 de Julho de 1978
Impossibilidade - indignidade - de confiar a uma droga - sob o pretexto da  depressão - o desgosto , como se fosse uma doença, uma "possessão" - uma alienação ( qualquer coisa que nos tornasse estrangeiros) - quando é um bem essencial, intímo...

Bibliothèque nationale     29  de  Julho de 1978
                                                          Bonnet 29 (1)
Carta de Proust a André Beaunier depois da morte de sua mãe , 1906.
Proust explica que não podia ter felicidade senão no seu desgosto... 
(mas sente-se culpado porque foi para sua mãe, devido à sua má saúde ,fonte de preocupações) " Se este pensamento não me dilacerasse incessantemente , encontraria  na recordação, na sobrevivência, na comunhão perfeita em que vivíamos uma doçura que não conheço."

-p.31. Carta a George de Lauris que acaba de perder a mãe (1907)

« Agora, posso dizer-lhe uma coisa: vai ter momentos de doçura em que ainda não pode acreditar. Quando tinha a sua mãe pensava muito nos dias de agora em que já não a teria. Agora pensará muito mais nos dias de outrora em que a tinha . Quando  se tiver habituado a essa coisa medonha que é a rejeição definitiva para o outrora, então senti-la-á muito de manso reviver, voltar a tomar o seu lugar, todo o seu lugar ao seu lado. Neste  momento não é ainda possível. Seja inerte, espere que a força incompreensível  (...) que o despedaçou volte a fazê-lo recompor-se um pouco, digo um pouco porque ficará para sempre com alguma coisa de despedaçado. Diga também isto de si para si porque é uma doçura saber que nunca amaremos menos, que nunca nos consolaremos , que nunca nos lembraremos cada vez mais.»
Roland Barthes,in " Diário de Luto", Edições 70,  pp.154, 155, 172, 180, 181
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(1) Henri Bonnet, Marcel Proust de 1907 à 1914, Paris, Nizet, 1971

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