domingo, 23 de agosto de 2015

Ao Domingo Há Música

"A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a actividade poética é revolucionária por natureza; exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria outro. Pão dos eleitos; alimento maldito. Isola; une. Convite à viagem; regresso à terra natal. Inspiração, respiração, exercício muscular. Súplica ao vazio, diálogo com a ausência, é alimentada pelo tédio, pela angústia e pelo desespero. Oração, litania, epifania, presença. Exorcismo, conjuro, magia. Sublimação, compensação, condensação do inconsciente. Expressão histórica de raças, nações, classes. Nega a história, em seu seio resolvem-se todos os conflitos objectivos e o homem adquire, afinal, a consciência de ser algo mais que passagem. Experiência, sentimento, emoção, intuição, pensamento não-dirigido. Filha do acaso; fruto do cálculo. Arte de falar em forma superior; linguagem primitiva. Obediência às regras; criação de outras. Imitação dos antigos, cópia do real, cópia de uma cópia da Idéia. Loucura, êxtase, logos. Regresso à infância, coito, nostalgia do paraíso, do inferno, do limbo. Jogo, trabalho, actividade ascética. Confissão.Experiência inata.Visão,música, símbolo. "Octavio Paz, in " O Arco e a Lira", Ed. Cosac Naify 

O escritor argentino Julio Cortázar (1914-1984) referiu-se a este ensaio  do grande escritor e poeta mexicano   Octavio Paz (1914-1998) como  “o melhor ensaio sobre poética já escrito na América”. A Música também é poesia , afirma Paz. Assim, se extrapolarmos estas palavras iniciais deste admirável texto para a Música, teremos uma mesma verdade. E a Música poderá ser  oração, litania, pifania, presença, pão dos eleitos...Arte de falar em forma superior; linguagem primitiva.Obediência às regras; criação de outras...
E, partindo dessa verdade,  descobrimos uma peça musical vestida  de  diferentes interpretações, em que a obediência às regras está presente, mas a criação de outras sonoridades  transforma-a num acto de verdadeira libertação.

- "You'll Never Walk Alone"(1945), do musical "Carousel" de Richard Rodgers e Oscar Hammerstein, pela soprano Susan Bullok,  nos BBC Proms de 2011.

- Na voz de Louis Armstrong, a mesma canção adquire um novo fulgor. Surge diferente, enroupada de outra graciosidade. Louis Armstrong , o mágico, criador de outros paraísos e fazedor de  dias maravilhosos. What a wonderful singer!


- E, apenas no piano, a belíssima interpretação de Nina Simone.

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