O ovo da serpente
por Eugénio Lisboa
“Espero que os espectadores de televisão, que tenham
acompanhado o congresso do CHEGA, em Viana do Castelo, se tenham apercebido de
vários pormenores altamente significativos. É que são mesmo de notar e pelas
piores razões.
Em primeiro lugar, a sala enorme, toda em
profundidade, a lembrar-nos os cenários de má memória, organizados pelos
arquitectos do terceiro Reich. A música a embalar as emoções e a adormecer a
razão. Os jogos estonteantes de luz e ruído, acariciando e seduzindo os
sentidos, para que se não notasse muito o vazio das promessas e os dislates da
gritaria. O tom alevantado e carregado sempre de emoção, do líder do CHEGA,
gritando, com enorme convicção, aquilo que sabia não
ser verdade. Porque sabe muito bem que uma mentira, repetida muitas vezes e com
ar de grande sinceridade, acaba por se tornar uma verdade. Tratava-se ali de
seduzir e não de esclarecer. De submeter e não de iluminar. Como observava o
líder do Terceiro Reich, ao vencedor, não se lhe pergunta, depois, se disse a
verdade. Todos os aforismos da cartilha nazi estavam ali em esplendoroso vigor.
A grandeza do cenário foi sempre o vício dos ditadores.
Ah, e a bandeira portuguesa: faltava esse rebuçado!
Ali ao lado, para que o líder, no seu discurso final, se aproximasse dela, a
namorasse e acariciasse, com gozo quase sensual. A lembrar-nos o Charlie
Chaplin, de O GRANDE DITADOR, acariciando o globo, brincando com ele,
apropriando-se gulosamente dele… Quase um acto de posse sexual. Colossalmente
aplaudido, claro está.
Anda já por aí o ovo da serpente. Acautelai-vos, que
não vá ele dar fruto!”
Eugénio Lisboa, 15.01.2024
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