segunda-feira, 20 de abril de 2020

Poesia inédita em tempo de peste

PENTASSÍLABOS PARA UMA
VÉNUS DE MILO ABANDONADA

No Louvre deserto
a Vénus de Milo,
peito descoberto,
bonito mamilo,
não tendo a vê-la
ninguém como antes,
pensou: “Minha estrela
não é como dantes.
Antes, devoravam-me,
de olhos abertos,
e recomendavam-me
aos amigos certos.
Turbas assanhadas
com a minha nudez
expunham, pasmadas,
feroz cupidez!
Assim visitada
num belo museu,
fiquei viciada:
o mundo era meu!
Mas a peste veio
e tudo roubou:
que mundo feio
aquele em que estou!
Só, abandonada,
pior, desprezada,
ninguém a sorrir-me,
- o melhor é vestir-me!”
                            20.04.2020
Eugénio Lisboa,
Lamentando, polissilabicamente, os efeitos da peste no abandono e na morte de um mundo  onde a beleza e a nudez eram devidamente apreciadas e até veneradas.

Sem comentários:

Enviar um comentário