"O tempo envelhece depressa", o último título de Antonio Tabucchi, escritor falecido em Lisboa no passado dia 25 de Março, já chegou às livrarias, com a chancela das Publicações D. Quixote.
A obra é uma antologia de nove contos, em que "todas as personagens parecem estar empenhadas numa confrontação com o Tempo", escreve a editora sobre o derradeiro livro de Tabucchi, que é editado quase 30 anos após o primeiro publicado em Portugal, em 1983, "A mulher de Porto Pim", também uma colectânea de contos.
A morte marca presença em alguns dos textos de "O tempo envelhece depressa", nomeadamente em "O círculo", cuja acção narrativa começa numa reunião familiar por ocasião do 10.º aniversário da morte do avô Josef, de Saint-Gall.
Outra "estória", como escreve Tabucchi, intitula-se "Os mortos à mesa" e, ainda noutro conto, "Entre generais", afirma-se que "este país é pequeno demais para morrer". Neste conto, a memória remonta à Hungria de 1956, quando entraram os tanques soviéticos no país e a personagem László era um jovem oficial do exército magiar.
Em "Os mortos à mesa", um ex-espião da Stasi, a polícia política da antiga RDA, passeia-se por Berlim até confessar junto do túmulo do dramaturgo Bertold Brecht, que durante anos espiou, para depois ir comer num "restaurante de classe" onde se serve "um spaghetti com gambas, mais gambas que spagetti", escreve, para acrescentar, nas palavras do ex-espião para o dramaturgo: "No nosso tempo não havia sítios destes, perdemos o melhor".
"Bucareste não mudou nada", outro conto, é uma nova reflexão sobre os "novos tempos" depois do comunismo, neste caso concreto, quinze anos após a morte do "casal condicator", escreve o autor, referindo-se a Nicolae e Elena Ceausescu, que durante décadas dominaram o país.
Segundo a editora, Tabucchi mostra-se nestes contos "sensível às convulsões da História recente".
Autor de cerca de 25 títulos, entre ficção e ensaio, Tabucchi traduziu com Maria José de Lancastre, sua mulher, a poesia de Fernando Pessoa, sobre o qual escreveu os ensaios "Un baule pieno di gente", em 1990, e "La nostalgie, l'automobile et l'infinit", em 1998, depois de todos os outros que a Imprensa Nacional da Casa da Moeda reuniu em "Pessoana Mínima", numa edição original de 1984.
Nascido em Pisa, Itália, em 1943, Tabucchi considerava Portugal uma segunda pátria, tendo em 1991 escrito o primeiro romance em português, "Requiem", que Alain Tanner passou ao cinema.
Foram aliás, várias as obras do escritor que passaram à sétima arte, nomeadamente "O fio do horizonte", adaptado por Fernando Lopes, "Noturno indiano", por Alain Corneau, e "Afirma Pereira", por Roberto Faenza.
Em Portugal estão publicados 17 dos 25 títulos do autor. O romance "Tristano morre", editado há seis anos, foi antecessor deste conjunto de "estórias". Fonte DN e Lusa
Sobre o livro: «Todas as personagens deste livro parecem estar empenhadas numa confrontação com o Tempo: o tempo dos acontecimentos que viveram ou estão a viver e o tempo da memória ou da consciência. Mas é como se uma tempestade de areia se tivesse levantado nas suas clepsidras: o tempo foge e detém-se, gira sobre si próprio, esconde-se, reaparece a pedir contas.
Sensível às convulsões da História recente, Antonio Tabucchi mede-se com o nosso Tempo “desnorteado”, em que os ponteiros do relógio da nossa consciência parecem indicar uma hora diferente daquela que vivemos.»
Sensível às convulsões da História recente, Antonio Tabucchi mede-se com o nosso Tempo “desnorteado”, em que os ponteiros do relógio da nossa consciência parecem indicar uma hora diferente daquela que vivemos.»
António Tabucchi. Os seus livros, as suas tão bem construídas novelas, a maioria das suas tão familiares estórias têm tanto de Portugal, tanto da nossa vida de portugueses, vivendo portuguesmente num país inevitavelmente português, que por vezes até nos esquecemos que a pátria do autor era a Itália. Mas, Tabucchi adorava Portugal e os portugueses!... Veio um dia de visita e gostou. Veio outras vezes e continuou a gostar cada vez mais. Veio novamente e ficou indissoluvelmente ligado a Portugal. Inclusive, a nível familiar. Até ao fim. Quem não se esqueceu de o ler, de amar os seus livros vai sentir a falta dele, vai sentir saudade, pois volta e meia surgia um novo livro da sua produção nos escaparates das livrarias. E o líamos com sofreguidão e prazer. Ele deixou-nos, todo inteiro, na sua última obra "O Tempo Envelhece Depressa", ficando-nos o sabor de uma inesquecível verdade. Que, ao contrário de nós, é o tempo, a implacável temática do Tempo que envelhece. Extraordinário!... Uma metáfora adorável, doce, imperecível, para não nos sentirmos magoados. Todavia, António Tabucchi merece toda gratidão, todo o nosso carinho e admiração. Para todos nós ele permanecerá um dos nossos, dos que nos são mais queridos. Não poderemos ficar muitos anos sem ti!... Até breve, António!
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