"Para que percorres inutilmente o céu inteiro à procura da tua estrela? Põe-na lá."
Vergílio Ferreira, in “ Escrever”
Sempre que se chega a África, regressa-se a um mundo que nunca se esquece . Quando as portas do avião se abrem é um imenso e familiar fogo que se espalha por todo o corpo e o cheiro da terra recaptura-nos com tal intensidade que nos sentimos envergonhados pela traição da ausência. E a memória de tudo quanto ficou em nós reacende-se. Basta chegar. África envolve-nos e estamos de novo num mundo que não tem termo de comparação com outro continente. A Europa fica distante , acabrunhada numa assertividade disciplinada e caduca que nada tem a ver com o fulgor que se solta num continente em construção , espalhado por uma vasta área diversa, desigual.
Chegar a Angola é tudo isso e muito mais. Nada está na mesma. Tudo se alterou embora tenha passado apenas uma década de ausência. É a década da PAZ, ou talvez a década da mudança.
Os sons de uma natureza pródiga e inarrável permanecem inalterados , os tons do céu tropical, como sempre, raiam-se vermelhos num festim de fim de tarde, mas a marca urbana quer a nível habitacional, quer a nível rodovíário, quer a nível social alterou-se profundamente. Rasgaram-se campos com diferentes vias rodoviárias, construiram-se novos aglomerados habitacionais e projectaram-se muitas infra-estruturas. Luanda, o centro gravitacional do país, está diferente. Cresceu e está em permanente refazer da sua configuração.
Sair ou entrar na cidade pode ser feito através de vias rápidas, contudo circular no meio urbano é um autêntico desafio. Filas imperdíveis de veículos, de autocarros públicos e paralelos (candongueiros) , num labiríntico e curto circuito pode durar horas em desespero de quem tem horários a cumprir.
Quem conheceu Luanda já não descortina as ruas que compõem a cidade e arredores. A grande massa humana que, nos mercados ao ar livre, apresenta uma diversidade de produtos para venda , produtos cuja variedade empresta cor a muitas das ruas, das estradas ,dos becos, dos caminhos, habita maioritariamente musseques construidos dentro e em redor da cidade. A arquitectura urbana adquiriu, desse modo, uma nova forma e uma forte densidade que ronda quase a metade da população nacional.
Luanda e os seus arredores transformaram-se num imenso centro populacional composto por diferentes classes sociais que labuta pelo mesmo objectivo: (sobre)viver melhor em cada dia.
Entretanto, o país também se alterou. Não foi apenas a capital. A desminagem foi e continua a ser uma grande aposta , pelo que viajar é já uma realidade segura.
Angola deslumbra-nos nos seus contrastes paisagísticos. A folia das cores anda à solta neste país. São os verdes profundos e matizados de uma vegetação que chega a explodir nas águas dos rios. Os campos pintam-se, por vezes, de carmesim com as terras encarnadas numa alegria soberba que se expande para lá do horizonte. As savanas surgem majestosas e rasteiras habitadas por uma fauna profusamente variada e de singular diversidade cromática.Mas o deslumbramento emerge avassalador perante esses infindáveis areais que beijam um mar que se solta leve, quebrado, movediço, sempre pintado por múltiplas paletas, partindo-se em finas nuvens de espuma apenas para nos afagar.
Angola está aí. Um país em crescimento onde todos os angolanos querem ser felizes. Há lugar para todos acederem à felicidade desde que todos se revejam como irmãos e se permitam repartir um país rico e imenso.
Angola faz-se quando todos quiserem.
Obrigada pela poesia que nos deixa sobre Angola...
ResponderEliminarContinuação de boa estada!
Fátima Dias
Que bela descrição sobre Luanda!... Em especial pelo estilo deslizante, recortado, cheio de júbilo, por essa escrita tão sincera, quente, nostálgica e expontânea. Sem favor, um verdadeiro texto de Selecta, aberto à leitura de todos. O cuidado com a sintaxe igualmente encontra-se presente. E o realismo do descrito, da narrativa, faz sentir-nos na companhia da autora, aí em Luanda, tal a dinâmica e a adequação dos termos usados, das palavras que soube admiravelmente escolher para fotografar pormenores dessa pérola de África. Os nossos desejos que usufruam em Angola todo o tempo aí destinado. E boa viagem.
ResponderEliminarola maria jose gostei da descriçao apesar de muito floriada mas esta bem- tenho uma prima da mena que esta em luanda mas vai brevemente para o norte --soio--que me da noticias frescas --espero que tenha umas boas ferias --joao branco
ResponderEliminarComo são doces e aquecidas as manhãs de Luanda!... Há vida, movimento, despertar. Há sinais de mundo em procura de mundos. Repare-se só no mercado em ebulição, naquele vozear frenético e contagiante, no rodopiar das gentes, mexendo-se ondulante e nervoso e coleante, no colorido do vestuário, onde as cores vivas trespassam a alma, vivido no calor envolvente dos corpos, no sonoro e mastigado regatear entre o que compra e o que vende!... Na juventude que circula...Que tem tudo isto a ver com a envelhecida e anquilosada Europa, lá longe, ode tudo se torna sério e há muito se perdeu a alegria do riso?!...
ResponderEliminarMuito além do requinte intelectual deste texto, preocupa-me saber o que de positivo e de inconfessável os chineses estão fazendo em Angola, diante de uma imigração impactante, sinistras denúncias e um novo colonialismo?
ResponderEliminarPossível tentativa de resposta a Manuel... Talvez, um novo colonialismo, talvez,... pois o evoluir da História é cíclico, embora mude ligeiramente o enquadramento, a coreografia, e ainda muito mais os próprios actores em cena... Talvez... Todavia, os povos têm de relacionar-se, de cooperar uns com os outros. São livres. A decisão e o ganho pertence sempre ao povo angolano, que é soberano.
EliminarOs actores mudam com os tempos conforme a história se escreve. A China chegou a Angola num tempo difícil e prestou-se ao que muitos se negaram.Decifrar o que não é público não é para qualquer um.Fica, porém, visível uma imensa população chinesa espalhada pelo país que se dedica a todo o tipo de negócio. Angola é talvez o país africano com maior implantação chinesa. A escolha foi feita e está em marcha. .
EliminarEsperemos que sendo a China um estado emergente, não espalhe pelo mundo os tentáculos do poder económico cegando o real poder que deve liderar o mundo: a liberdade e o respeito pelos direitos do Homem.
Agradeço a Varela Pires e a editoria do site a atenção ao meu comentário, como pessoalmente agradeço a ambos pelo estimulante convívio nessa aldeia de encanto e de lirismo encrustada no espaço virtual do Algarve. Ao primeiro, pelas irretocáveis apreciações dos meus textos, e à segunda pelas portas que abriu para minha poesia em Portugal.
EliminarQuanto a Angola, as informações que tenho me induzem a manter essas tristes convições.
SOBERANIA de Angola: que desejável sonho depois de tantas lutas pela Independência e tão lamentáveis disputas pelo poder.
DECIFRAR O QUE NÃO É PÚBLICO: quem sabe um gesto muito perigoso e revestido de indigestos pressentimentos.
A ambos o meu abraço, fraterno e brasileiro..., Manoel de Andrade
EXCELENTE BLOG. Felicidades. Desde Tlaxcala Mexico America
ResponderEliminarAgradecemos as palavras gentis, bem como os votos.
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