Sociedade doente
"Perdeu-se a noção da responsabilidade numa época que se
devora a si mesma, sem nada oferecer em troca.
Um
procurador da República está detido por suspeita de corrupção. Até ser acusado,
se o for, é inocente. No entanto, a situação assume extrema gravidade, e enodoa
um alto funcionário do Estado, ao mesmo tempo que alarga a mancha de dúvidas
sobre as instituições, já atingidas, moral e juridicamente, por inúmeros casos
sórdidos.
A mentira, a aldrabice, o cambalacho constituem a carta de alforria de uma sociedade que este ‘sistema’ corroeu até à medula. Anteontem, o Dr. Passos, com a desfaçatez que se lhe reconhece, disse, numa escola da Amadora, nunca "ter convidado os portugueses a emigrar". E acrescentou: "Mas a emigração pode ser a última alternativa ao desemprego." Mentir é ultrajante; mentir aos miúdos é pecado venial. Atribuam, os meus dilectos, ao Dr. Passos a classificação por ele merecida. Para mim não passa de um tipo instável, em zaragata sem tréguas com a verdade.
A mentira, a aldrabice, o cambalacho constituem a carta de alforria de uma sociedade que este ‘sistema’ corroeu até à medula. Anteontem, o Dr. Passos, com a desfaçatez que se lhe reconhece, disse, numa escola da Amadora, nunca "ter convidado os portugueses a emigrar". E acrescentou: "Mas a emigração pode ser a última alternativa ao desemprego." Mentir é ultrajante; mentir aos miúdos é pecado venial. Atribuam, os meus dilectos, ao Dr. Passos a classificação por ele merecida. Para mim não passa de um tipo instável, em zaragata sem tréguas com a verdade.
O facilitismo alimenta a ganância, a ganância é produto de um tempo que
estimula a ‘competitividade’, e esta origina a liquidação dos valores e dos
padrões, ao contrário do que se propaga. Perdeu-se a noção da responsabilidade
numa época que se devora a si mesma, sem nada oferecer em troca. Quando os
exemplos que vêm de ‘cima’ podem sugerir que tudo é permitido, então, navegamos
num mar de múltiplas incertezas. A desconfiança enredou-se em todos nós. No
trabalho, nas relações sociais, no amor e, até, na futilidade maldosa de que as
nossas televisões constituem a imagem mais nítida.
A detenção de um procurador da República, como, aliás, a de um
ex-primeiro-ministro, são de molde a fazer-nos reflectir que tipo de país
desejamos. Pertenço a uma grande geração que se bateu, com abnegada coragem,
para que Portugal fosse outro, melhor, de todos e para todos.
Chegados a isto, talvez sejamos responsáveis por um mundo que, na realidade,
nunca quisemos.” Baptista–Bastos, em
Crónica publicada no CM,em 02.03.2016
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