Outra abordagem da crise
Felicidade e Economia
"A
Europa não é feliz, duvida de si mesma", disse o circunspecto Presidente
francês, François Hollande, perante os dirigentes da Espanha, da Itália e da
Alemanha, durante um encontro em que se falou sobre formas de estimular o emprego "A Europa precisa de mais fantasia", acrescentou o
presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz. Apesar do seu isolamento
insular e do seu clima gélido, a Islândia era o país mais feliz do mundo até
rebentar a crise em Wall Street. Em boa medida, era também esse o caso da Europa,
exemplo de bonança em matéria de equidade, de estabilidade e de equilíbrio, em
matéria de liberdade e justiça.
Será
que a crise nos tornou infelizes, de repente? Em parte, sim, porque despertámos
bruscamente do sonho da prosperidade ilimitada [...]. 45 milhões de
desempregados no mundo industrializado, dos quais 14 milhões depois da crise,
quantifica a OCDE. E, apesar disso, países que ainda não atingiram os padrões
de desenvolvimento da Europa têm um nível de satisfação maior. E, a despeito da
fractura e da dolorosa e lenta recuperação, a própria Islândia conserva a
alegria de viver.
Falar
da ligação entre desesperança e crise não é uma ideia original do Presidente
francês. Também a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico
(OCDE) – horas antes de, na última semana de Julho, anunciar os piores
prognósticos para os 34 países industrializados que agrupa:Global economy is advancing but pace of recovery varies – apresentou o seu próprio "índice
de felicidade", O teu Índice para uma Vida Melhor. Será uma brincadeira?
Se não, porquê o empenho em misturar a crise com sentimentos tão pouco
quantificáveis e subjectivos como a alegria e a tristeza? [...] O facto de o
Produto Interno Bruto (PIB), ou o valor monetário dos bens e serviços produzidos
por um país num dado período, ter começado a ser calculado também em função da
população (PIB per capita) já tinha constituído um grande passo. [...]
Além
disso, os principais dados macroeconómicos, ainda mais directamente relacionados
com a área social, como o emprego, não dão ideia da forma como é distribuído o
rendimento, nem do modo como a maior ou menor generalização e qualidade da
saúde ou da educação afectam o nível de riqueza, ou da medida em que a economia
é afectada pela maior ou menor estabilidade política e pela abertura ao
exterior. Para já não falar de outros, mais tangíveis, que também determinam o
desenvolvimento, como o papel da mulher, o grau de introdução de tecnologias, o
nível de liberdade e democracia ou a gestão ambiental.
Por
isso, partindo de premissa de que "A verdadeira riqueza das nações são as
pessoas", as Nações Unidas começaram, nos anos 1990, a elaborar o Índice
de Desenvolvimento Humano (Relatório sobre o Desenvolvimento Humano 2013 –PNUD). Ao princípio não foi fácil. Usando como argumento a precariedade dos
dados, vários países ocultavam as suas vergonhas ou falseavam a medição das
receitas ou dos serviços, para não ficarem muito mal vistos.
No
entanto, este tornou-se o retrato mais aproximado da realidade do crescimento comparado
com o bem-estar, ou seja, do desenvolvimento. Ao fim de um quarto de século de
estudos e relatórios anuais, o índice evoluiu e passou a incluir variáveis como
a desigualdade, por vezes mais decisivas do que o rácio pobreza/riqueza. [...]
A verdade é que este índice da OCDE é um instrumento interactivo divertido, com
o qual cada um pode elaborar a sua própria lista do "bem viver",
ordenando segundo a sua preferência os 11 aspectos –da habitação ou da saúde, à
relação trabalho/ócio, passando por factores tão cruciais como "o sentido
de comunidade". Cada um tem a sua cor, em forma de pétalas de uma flor
maior ou menor consoante o país […, medida segundo, no fim de um qualquer dia
da vida de um cidadão comum, predomina o que é negativo ou o que é positivo.
As
comparações são sem dúvida muito interessantes: países com padrões de bem-estar
inferiores aos da Europa ou dos Estados Unidos, como o Brasil e o México, são
mais felizes do que a média dos ricos e, entre estes, é significativo o
descontentamento na Grécia, na Eslovénia e em Itália. Contudo, o mais
surpreendente é a desigualdade crescente na outrora igualitária Europa: a
desproporção entre os 20% de mais ricos e mais pobres é agora de 6 vezes, no
Reino Unido, de 5, na Grécia, e de 4, na Alemanha.”Presseurop, 1/08/2013
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