quinta-feira, 25 de abril de 2013

No trigésimo nono ano de Abril


" (...)Contarás de Abril as casas de mil sóis , a imponderável descoberta dos sussuros, a brancura inadiável da perseverança, o resplendente varar dos dias, a feira alvoroçada das horas. Contarás de Abril a visão e o visto. Contarás de Abril as mãos dadas. Contarás de Abril o renascer da essencial frescura. 
Contarás de Abril." Baptista-Bastos " Contar de Abril", in" ABRIL, ABRIL, Textos de Escritores Comunistas, (DORL)", Edições Avante, Lisboa 1975
São passados trinta nove anos sobre a data que marcou o resto das nossas vidas. Foi o dealbar de um tempo novo que tardava em chegar. A Liberdade apareceu nas ruas e trôpega foi dando os primeiros  passos   até alastrar  por um país que se via amanhecer  e se deslumbrava com uma revolução em flor. Eram muitos os que por ela tinham lutado, por ela tinham sofrido e por ela tinham morrido.
Desses dias, alguns registos foram feitos. Miguel Torga, resistente, antifascista e um dos maiores poetas do Sec.XX,  escreveu no seu Diário: 
"Coimbra, 25 de Abril de 1974 - Golpe militar. Assim eu acreditasse nos militares. Foram eles que, durante os últimos macerados cinquenta anos pátrios, nos prenderam, nos censuraram, nos apreenderam e asseguraram com as baionetas o poder à tirania. Quem poderá esquecê-lo? Oxalá não seja duradoiramente de parada..."
Coimbra, 27 de Abril de 1974 - Ocupação das instalações da Pide. Enquanto, juntamente com outros veteranos da oposição ao fascismo, presenciava a fúria de alguns exaltados que reclamavam a chacina dos agentes , acossados lá dentro, e lhes destruíam as viaturas, ia pensando no facto curioso de as vinganças raras vezes serem exercidas pelas efectivas vítimas da repressão. Há nelas um pudor  que as não deixa macular o sofrimento. São os outros , os que não sofreram, que se excedem, como se estivessem de má consciência  e quisessem alardear um desespero que jamais sentiram." Miguel Torga, in " Diário XII " , Círculo de Leitores

Zeca Afonso é um dos grandes  cantores portugueses que mais  ergueu  a voz contra a tirania e a repressão exercidas pela Ditadura. Foi preso, perseguido e muitas das suas canções foram proibidas. Nunca deixou de compor, de cantar e de afrontar o Poder. "Grândola", canção que, na actualidade, é também um hino , serviu de senha para a marcha da Revolução. 
Neste  aniversário do 25 de Abril, recordá-lo é um dever honroso.
Do Álbum " Eu vou ser como a toupeira " (1972) extraiu-se a canção "No comboio descendente". O poema é de Fernando Pessoa e a Música de Zeca Afonso. Participaram também neste Álbum: Teresa Silva Carvalho, Carlos Alberto Moniz, José Jorge Letria e José Niza. A produção e a direcção musical são de José Niza.
O  vídeo, que se apresenta, resulta de um desenho original de João Abel Manta sobre Fernando Pessoa.


No comboio descendente

No comboio descendente
Vinha tudo à gargalhada.
Uns por verem rir os outros
E outros sem ser por nada
No comboio descendente
De Queluz à Cruz Quebrada...

No comboio descendente
Vinham todos à janela
Uns calados para os outros
E outros a dar-lhes trela
No comboio descendente
De Cruz Quebrada a Palmela...

No comboio descendente
Mas que grande reinação!
Uns dormindo, outros com sono,
E outros nem sim nem não
No comboio descendente
De Palmela a Portimão

Poema de Fernando Pessoa/ Música de Zeca Afonso

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