Vigésima sexta carta a M.M.
Eu não quero saber. Não quero mais palavras. Só quero um espaço
que seja tão verdadeiro
como o das adolescentes que amam seus corpos deslumbradas.
Que sejam filhas do vento folhas do sol
e a apaixonada lucidez do silêncio
de uma velha sala clara com amplas janelas sobre um rio.
Espaços
espaços
entre as árvores ou nuvens
sobre o mar ou sobre as dunas.
Que uma mulher dance e ria
toda de branco
sobre um terraço branco
e se dispa depois
e continue a dançar e a rir.
E quando desaparecer
numa nuvem resplandecente
o espaço será tão claro e novo
que eu sentirei que o poema começou
na página branca na mesa onde eu ainda não estou.
António Ramos Rosa, in " Cartas Poéticas entre António Ramos Rosa e Manuel Madeira", Livros do Mundo
Poema/Carta Poética de António Ramos Rosa para o também poeta Manuel Madeira... O olhar, o leve sentido de luxúria, a imagética dos corpos e o movimento que os faz vibrar, na voz de Ramos Rosa, o nosso maior e mais premiado poeta vivo, a esculpir a ideia, a burilar o verso, ainda com oficina aberta, à beira dos 90 anos!... Como é salutar e belo, escutar as palavras jovens e limpas, inspirar o ar fresco que delas emana, enfim, absorver toda a juventude que se subtrai desta Carta Poética!...
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