A sós, os dois.Isto é, livro e leitor.Este não quer saber de terceiros,não quer que interpretem,que cantem, que dancem um poema.O verdadeiro amador de poemas ama em silêncio…
Mario Quintana
Sou uma leitora completamente dependente desse vício impune que é a leitura. Tenho uma biblioteca razoável com milhares de livros. Leio e releio com prazer desmedido esses livros , embora me surpreenda com alguns tesouros que , na gula incontinente da compra, não tive tempo de ler . Alguns descubro, num golpe esporádico de sorte, alinhados à sombra de outros, já saboreados em devido tempo. Outros há que se acotovelam numa mesa, à espera de uma voraz disponibilidade de consumo, para que se não confundam com todos os outros já degustados e bem arrumados pelas prateleiras.
Talvez para aqueles, que visitam este blog, não seja uma surpresa este gosto infindo pelos livros. Foram os livros que possibilitaram a criação e manutenção deste espaço. Vive de leituras e da aprendizagem que delas ficou. Renova-se e enforma-se de outras numa consanguinidade quase pura e impertinente.
E se a silly season se deu por extinta e a rentrée se desenha , é tempo de lançamento de livros , de apontar leituras e até de visitar uma Feira do Livro , que chega fora de um tempo a que nos habituou.
Quanto a livros novos , começo por um excelente livro de poesia que traduz, com magistral acuidade poética, um tempo que se viveu e se vive: a Guerra suja desencadeada por um terrível e alucinado invasor - Putin.
Com a chancela da Editora Guerra & Paz, Poemas em Tempo de Guerra Suja , de Eugénio Lisboa, é um livro que nos enleva pela perfeição artística de cada poema. Toca-nos fundo pela mágoa , pela dureza , pela raiva, pela angústia e por um inconformismo ético que só a palavra oriunda de uma magnífica oficina poética é capaz de traduzir.
No site da Editora pode ser lido o seguinte:
"A indignação é o combustível de Poemas em Tempo de Guerra Suja, o novo livro de Eugénio Lisboa. Actualíssima, a obra reúne os poemas que o poeta, ensaísta e crítico literário foi escrevendo em plena invasão da Ucrânia pelas tropas russas e nos quais Eugénio Lisboa reage a quente, com comoção e revolta, à devastação e aos crimes de guerra que têm vindo a manchar este ano de 2022. Um livro contra a guerra, mas, acima de tudo, contra Putin, Poemas em Tempo de Guerra Suja chega à rede livreira nacional no próximo dia 6 de Setembro, numa edição Guerra e Paz com a força de mil homens. O livro poderá ainda ser adquirido, nas Feiras do Livro de Lisboa e do Porto, que decorrem até 11 de Setembro.
«Preferia não ter escrito este livro, sinal de que não tinha havido uma guerra que, de resto, continua a haver. Um tirano, antigo espião de uma ditadura sangrenta, alimentando sonhos megalómanos de retorno a um império de má memória, promoveu a invasão e a destruição da Ucrânia e, dentro de mim, a indignação que é o sangue destes versos.»
Tendo consciência de que, embora haja grande literatura contra a guerra, escrita em todos os tempos e latitudes, a denúncia dos seus horrores não impediu que outras guerras surgissem depois, o poeta, ensaísta e crítico literário Eugénio Lisboa decidiu não baixar os braços."
Não Matarás!, o novo livro de Teresa Martins Marques, que acaba de ser lançado. Trata-se de um arrojado romance sobre um grande acontecimento político italiano, o rapto de Aldo Moro. Misterioso e repleto de sombra, este trágico acontecimento é o centro de todo esta obra. A leitura trará revelações e um olhar profundo sobre a investigação que tem sido feita nos últimos anos . Assim, no site da Editora Gradiva, chancela desta obra, poderá ler o seguinte:
"Roma, Via Fani, 16 de Março de 1978. O sequestro de Aldo Moro durante 55 dias, o massacre da sua escolta e finalmente o seu assassínio. Que abalariam a Itália e chocariam o mundo. E acabariam com os três maiores partidos políticos italianos. Reivindicado pela organização terrorista Brigate Rosse, quem foram realmente os seus mandantes? Este livro acompanha a investigação rigorosa que, nos últimos anos, tem vindo a lume na Itália, mostrando a rede de cumplicidades nacionais e internacionais, na origem dos crimes.
Teresa Martins Marques, com ligações à Itália, a quem a personalidade, o carácter e a acção de Aldo Moro cativaram e o crime horrorizou. Chocada com a recusa do governo democrata-cristão e do Partido Comunista em negociar com o grupo terrorista a sua libertação, leu tudo o que sobre o assunto se escreveu, falou com colaboradores, amigos, alunos e familiares, e ligou os fios que até hoje ninguém quis ou se atrevera a ligar. Numa escrita de uma fluência singular, a autora junta os dados e reconstitui o que só numa obra de «ficção» podia ser contado. O rapto de Moro não foi para negociar. Foi para matar."
A par destas duas novas obras, há uma série de lançamentos que não comentarei .Pretendo indicar alguns livros recentes que me tornaram refém de uma leitura compulsiva e inebriante. Eu, que leio obstinadamente, dei por mim a regressar aos meus tempos de jovem, quando a leitura de um empolgante livro anulava qualquer outra tarefa ou compromisso.
De Amim Maalouf, Escalas do Levante foi uma surpreendente descoberta, embora conheça bem este magnífico escritor por outras interessantes leituras. Há, contudo, neste livro uma tal beleza, dada quase como perdida, no desenho peculiar da personagem principal, Ossyane, o protagonista de uma trágica história de encontros e desencontros que nos prende do princípio ao fim. Li-o em mergulho fulminante , tal e qual como fazia nos meus dias de jovem leitora rebelde.
Marcador é a chancela desta edição , onde está aposta a sinopse deste tocante romance:
"Escalas do Levante era o nome que se atribuía antigamente ao rosário de cidades mercantis através das quais os viajantes da Europa chegavam ao Oriente.
De Constantinopla a Alexandria, passando por Esmirna, Adana ou Beirute, essas cidades foram, durante muito tempo, lugares de mistura onde conviviam línguas, costumes e crenças. Universos frágeis a que a História lentamente deu forma antes de os derrubar, quebrando, de passagem, inúmeras vidas.
A personagem central deste romance, Ossyane, é um desses homens de destino desviado. Da agonia do Império Otomano às duas guerras mundiais e às tragédias que, ainda hoje, dilaceram o Médio Oriente, a sua vida não pesará mais do que uma palha na tempestade. Pacientemente, recorda a sua infância principesca, a avó demente, o pai revoltado, o irmão desonrado, a sua estada na França ocupada e o encontro com a sua amada fugitiva, Clara, os seus momentos de fervor, de heroísmo e de sonho. E, depois, a descida aos infernos.
Despojado do seu futuro e da sua dignidade, privado das alegrias mais simples, que lhe resta? Um amor à espera. Um amor tranquilo, mas poderoso. Talvez, no fim de contas, mais poderoso do que a própria História."
Como Poeira ao Vento, um livro admirável de Leonardo Padura . Intenso e longo é um excelente romance. A revolução cubana, que tantas promessas trazia , fez crescer uma geração empenhada em ser melhor, em aprender, em sacrificar-se para se valorizar e melhorar um país. Mas a verdadeira face de uma falsa ideologia revelou-se e traiu essa geração que se viu numa encruzilhada sem futuro, sem progresso. A fome e a miséria grassaram . O universo perfeito dos iguais não passou de uma falácia , de uma iniquidade onde havia alguns iguais e a maioria numa desigualdade atroz.
Acompanhando um grupo de amigos de formação universitária, personagens fortes deste romance, acompanha-se a história de Cuba até ao tempo hodierno. Obrigados pelo medo , pela fome, pela falta de futuro acabam por fugir ou sair da ilha e sentir o desenraizamento de refugiado. Um livro de grande fôlego.
Na sinopse aposta no site da Porto Editora, que publicou o livro, lê-se:
"O dia começa mal para Adela, jovem nova-iorquina de ascendência cubana, ao receber um telefonema da mãe. Há mais de um ano que as duas estão zangadas, porque não só Adela se mudou para Miami, como vive com Marcos, um jovem havanês recém-chegado aos Estados Unidos, por quem se perdeu de amores e que a mãe rejeita pelas suas origens. Como se isso não bastasse, nesse dia Marcos mostra a Adela uma fotografia sua em criança com o grupo de amigos dos pais, autodenominado o Clã. E quando, entre aqueles rostos, Adela reconhece um que lhe é particularmente familiar, o seu mundo ameaça ruir."
Como poeira ao vento é a história de um grupo de amigos que sobreviveu a um destino de exílio e dispersão em Barcelona, no extremo Noroeste dos Estados Unidos, em Madrid, em Porto Rico, em Buenos Aires… Que lhes fez a vida, a eles que se amavam tanto? Que aconteceu com os que partiram e com os que decidiram ficar? Como é que o tempo passou por eles? Tornarão a uni-los o magnetismo do sentimento de pertença e a força dos afectos? Ou serão as suas vidas como poeira ao vento?
Fome Vermelha, A guerra de Estaline contra a Ucrânia, de Anne Applebaum, é um livro envolvente , de um grande rigor histórico que nos exige uma leitura atenta . A revelação dos métodos tenebrosos de Estaline para arrasar um povo leva-nos a confirmar que há sempre um novo tirano para continuar a história trágica do mal , como acontece com Putin.
Eis a resenha deste precioso documento , resultado de uma profunda investigação:
"Em 1932-3, quase quatro milhões de ucranianos morreram de fome, tendo sido deliberadamente privados de alimentos. É um dos episódios mais devastadores da história do século XX. Com autoridade e detalhes sem precedentes, Fome Vermelha investiga como isso aconteceu, quem foi o responsável e quais foram as consequências.
É o relato mais completo já publicado desses terríveis eventos.
Fome Vermelha baseia-se num manancial de material de arquivo e em testemunhos em primeira mão disponíveis apenas desde o fim da União Soviética, bem como no trabalho de estudiosos ucranianos em todo o mundo. Inclui relatos da fome por aqueles que sobreviveram, descrevendo o que os seres humanos podem fazer quando enlouquecidos pela falta de alimentos. Mostra como o Estado soviético, impiedosamente, usou a propaganda para pôr os vizinhos uns contra os outros, a fim de expurgar elementos supostamente antirrevolucionários. Também regista as acções de indivíduos extraordinários que fizeram todo o possível para aliviar o sofrimento.
Em paralelo com a fome, deu-se um ataque aos líderes culturais e políticos da Ucrânia, e posteriormente entrou-se num período de negação acerca desses acontecimentos. Os relatórios dos censos foram falsificados e a memória foi obliterada. Alguns jornalistas ocidentais acolheram a linha soviética, outros rejeitaram-na corajosamente e foram perseguidos. As autoridades soviéticas estavam empenhadas em obrigar a Ucrânia a abandonar as suas aspirações nacionais, e em enterrá-la juntamente com os seus milhões de vítimas. Fome Vermelha, um triunfo da erudição e da empatia humana, é um marco na recuperação daquelas memórias e daquela história. E mostra até que ponto o presente é moldado pelo passado."
Nota: Aconselho, ( a quem puder ) , visitar as Feiras do Livro (Lisboa e Porto) , perder-se por lá ,entre os stands das diversas editoras, e responder ao incessante apelo dos livros.
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