" Desejo que esta biblioteca seja tão variada quanto a curiosidade que a mesma induziu em mim."
É essa escolha pessoalíssima de Borges que compõe este livro, Biblioteca Pessoal, editado pela Quetzal Editores, em 2014.
Jorge Luís Borges incluiu nessa selecção uma obra portuguesa.Segue-se o respectivo prólogo.
José Maria Eça de Queirós
O MANDARIM
"Nos finais do século XIX, Groussac pode escrever com veracidade que ser famoso na América do Sul não era deixar de ser um desconhecido. Essa verdade, naqueles anos, era aplicável a Portugal. Famoso na sua pequena e ilustre pátria, José Maria Eça de Queirós ( 1845 -1900) morreu quase ignorado pelas outras terras da Europa. A tardia crítica internacional consagra-o agora como um dos prosadores e romancistas da sua época.
Eça de Queirós foi esta coisa um tanto melancólica: um aristocrata pobre. Estudou Direito na Universidade de Coimbra e, uma vez terminado o curso, desempenhou um cargo medíocre numa província medíocre . Em 1869, acompanhou o seu amigo, o conde de Resende, à inauguração do canal de Suez. Passou do Egipto para a Palestina, e a evocação dessas andanças perdura em páginas que muitas gerações lêem e relêem. Três anos depois ingressou na carreira consular. Viveu em Havana, em Newcastle, em Bristol, na China e em Paris. O amor à literatura francesa nunca o abandonaria. Professou a estética do Parnaso e, nos seus muito diversos romances, a de Flaubert. Em O Primo Basílio (1878) notou-se a sombra tutelar de Madame Bovary, mas Emile Zola julgou que era superior ao seu indiscutível arquétipo e juntou à sua sentença estas palavras : " Fala-lhes um discípulo de Flaubert."
Cada oração que Eça de Queirós publicou fora limada e temperada, cada cena da vasta obra múltipla foi imaginada com probidade. O autor define-se como realista , mas esse realismo não exclui o quimérico, o sardónico, o amargo e o piedoso. Como o seu Portugal, que amava com carinho e com ironia, Eça de Queirós descobriu e revelou o Oriente. A história de O Mandarim ( 1880) é fantástica. Uma das personagens é um demónio; a outra , a partir de uma sórdida pensão de Lisboa, mata magicamente um mandarim que lança o seu papagaio de papel num terraço que fica no centro do Império Amarelo. A mente do leitor hospeda com alegria essa impossível fábula.
No ano final do século XIX, morreram em Paris dois homens de génio, Eça de Queirós e Oscar Wilde . Que eu saiba, nunca se conheceram, mas ter-se-iam entendido admiravelmente."
Jorge Luis Borges, in Biblioteca Pessoal, Quetzal Editores, pp. 23, 24
Eça de Queirós foi esta coisa um tanto melancólica: um aristocrata pobre. Estudou Direito na Universidade de Coimbra e, uma vez terminado o curso, desempenhou um cargo medíocre numa província medíocre . Em 1869, acompanhou o seu amigo, o conde de Resende, à inauguração do canal de Suez. Passou do Egipto para a Palestina, e a evocação dessas andanças perdura em páginas que muitas gerações lêem e relêem. Três anos depois ingressou na carreira consular. Viveu em Havana, em Newcastle, em Bristol, na China e em Paris. O amor à literatura francesa nunca o abandonaria. Professou a estética do Parnaso e, nos seus muito diversos romances, a de Flaubert. Em O Primo Basílio (1878) notou-se a sombra tutelar de Madame Bovary, mas Emile Zola julgou que era superior ao seu indiscutível arquétipo e juntou à sua sentença estas palavras : " Fala-lhes um discípulo de Flaubert."
Cada oração que Eça de Queirós publicou fora limada e temperada, cada cena da vasta obra múltipla foi imaginada com probidade. O autor define-se como realista , mas esse realismo não exclui o quimérico, o sardónico, o amargo e o piedoso. Como o seu Portugal, que amava com carinho e com ironia, Eça de Queirós descobriu e revelou o Oriente. A história de O Mandarim ( 1880) é fantástica. Uma das personagens é um demónio; a outra , a partir de uma sórdida pensão de Lisboa, mata magicamente um mandarim que lança o seu papagaio de papel num terraço que fica no centro do Império Amarelo. A mente do leitor hospeda com alegria essa impossível fábula.
No ano final do século XIX, morreram em Paris dois homens de génio, Eça de Queirós e Oscar Wilde . Que eu saiba, nunca se conheceram, mas ter-se-iam entendido admiravelmente."
Jorge Luis Borges, in Biblioteca Pessoal, Quetzal Editores, pp. 23, 24
Sem comentários:
Enviar um comentário