Entrevista
Telefonam-me do jornal:
-Fale de amor -
diz o repórter,
como se falasse
do assunto mais banal.
-Do amor? -Me rio
informal. Mas
ele insiste:
-Fale-me de amor -
sem saber, displicente,
que essa palavra
é vendaval.
-Falar de amor? - Pondero:
o que está querendo, afinal?
Quer me expor
no circo da paixão
como treinado animal?
-Fala...-insiste o outro
-Qualquer coisa.
Como se o amor fosse
“qualquer coisa”
prá se embrulhar no jornal.
-Fale bem, fale mal,
uma coisa rapidinha
-ele insiste, como se ignorasse
que as feridas de amor
não se lavam com água e sal.
Ele perguntando
eu resistindo,
porque em matéria de amor
e de entrevista
qualquer palavra mal dita
é fatal.
Affonso Romano de Sant'Anna
"Nasceu em Juiz de Fora, M.G., em 1938. Poeta, ensaísta, professor e doutor em literatura pela UFMG. Teve actuação destacada no movimento literário dos anos 1950 e 1960, além de intensa vida académica no Brasil e no exterior. Publicou o primeiro livro Canto e palavra em 1965 e passou a escrever para os principais jornais do país, sem jamais abandonar a poesia. Publica, em 1975, Poesia sobre poesia ,1980, Que país é este? e em 1981, A morte da baleia (1991). Na prosa, destacam-se: Carlos Drummond de Andrade – análise da obra (1980), a sua tese de doutoramento, Análise estrutural do romance brasileiro (1973) e Por um novo conceito de literatura brasileira(1978). Por seis anos (1990-1996) dirigiu a Biblioteca Nacional, dotando-a de uma flexibilidade administrativa e modernizando muitos de seus serviços. Em 1998, foram reeditados e reunidos num só livro A grande fala do índio guarani e A catedral de Colónia. O interesse pela arte barroca rendeu dois livros: Barroco, a alma do Brasil (1997) e Barroco, do quadrado à elipse (2001). Tem cerca de 70 livros publicados, e em 2000 prestou uma contribuição significativa a quem quisesse aventurar-se pelos caminhos da literatura, lançando A sedução da palavra, uma espécie de manual introdutório à criação literária. Em 2004 foi publicada a sua Poesia reunida 1965-1999, em dois volumes. Em 2007 publicou uma colectânea de ensaios ou cronicas culturais, como o autor prefere chamá-las: A cegueira e o saber. Obras mais recentes: Perdidos na Toscana (2009), Crónicas para jovens (2011), Ler o mundo ( 2011) e Como andar no labirinto (2012), uma colectânea reunindo 65 crónicas. "
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