" O meu poema anda por aí vadio
no mato ou na cidade
na voz do vento
no marulhar do mar
no Gesto e no Ser"
António Jacinto ( poeta angolano),"Poema da alienação - Poemas",CEI
"A pergunta no ar
no mar
na boca de todos nós:
– Luanda onde está?"
Luandino Vieira,(escritor angolano),in"Canção para Luanda"
Da velha Luanda, cidade mãe, aos novos bairros e povoações que a incorporam nos subúrbios, há um povo que se movimenta num labor diário.
Intenso, diversificado, caótico, original , improvisado, rudimentarmente organizado e nunca finalizado ou institucionalizado assim é o sistema de transportes que vigora e impera na capital angolana.
Uma variedade, um mistério que se vai desvendando à medida que se enxerga a cidade. Impossível não captar toda esta singularidade viária que se nos apresenta em espantosa e nítida realidade.
Tudo tem correlação com a hora e o local de partida. Embora haja um serviço residual de transportes , autocarros públicos, com algumas carreiras, é no privado que está a maioria da oferta.
Viver no centro da cidade é uma situação que abrange poucos. Deslocar-se para esse centro é, porém, uma realidade que confina muitos. Há um vai-vém interminável que se inicia de madrugada. Quem vive nos bairros novos para chegar ao centro tem de sair de casa às cinco horas da manhã ou mais cedo , conforme a hora de entrada.
E é um rodopiar de transportes numa oferta constante . Os candongueiros, agora designados por " quadradinhos" , funcionam como autocarros em carrinhas van, veículos comercais ligeiros, que transportam cerca de 14 a 15 pessoas quase enlatadas , quando cheios. Pintados de azul e branco, enchem as estradas luandinas. Filas e filas em movimento ou em paragens específicas para servir uma vasta população. Todos eles tem uma rota específica que foi definida e divulgada.
A mais recente novidade são os moto-taxis. Motociclos que fazem de meio de transporte entre as paragens dos " quadradinhos" e os bairros ( musseques e condomínios) para quem lá vive ou trabalha. Baptizados como " cupapatas" (Kupapatas) estão em profusão, à espera de quem lhes lance o sonoro e desejado pedido: " Me leva só, cupapata!".
Nesta cidade, existem também taxis. Os clássicos táxis assinalados com a cor oficial , sinal luminoso identificador, taxímetro e demais requisitos impostos. Mas os particulares , não convencionais , espreitam-nos . Estacionam junto aos passeios ou junto às bermas das estradas . Tomámo-los , nós os inexperientes, por qualquer automóvel particular em movimento. Enxame de cor e de marcas , ei-los por toda a parte em serviço regular de transporte. O povo atribuiu-lhes um nome:"turismo". É um turismo que chega e vai parando quando mais alguém lhe faz sinal, até preencher os quatro lugares em oferta. Quem entra paga tal como fizesse a viagem sozinho.
Circular em Luanda , (dentro, em redor de ou fora) , é uma aposta heróica. Quem vence é o tempo. Toma e enreda quem se mete nas malhas do trânsito.
Para quem não tem pressa, o tempo permite descortinar um mundo anacrónico e singular que emerge através das estradas , ruas, ruelas, caminhos ou picadas que bordejam esta metrópole.
Entrar na cidade, com a maresia no coração, é um bom começo para qualquer dia em qualquer parte do mundo. Assim acontece em Luanda.
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