Não me aprisionem os gestos
Não me aprisionem os gestos
a criança ainda não desertou
Ainda sonho cavalgadas de estrelas
e danças lúbricas de flores
em madrugadas azuis
e jardins suspensos de ouro
e crianças aladas a brincar
e gargalhadas de prata.
Não me aprisionem os gestos
que o mar não cabe num dedal
e meus gestos têm a sugestão do mar
o mistério das ondas do mar
a comunicabilidade do mar
Levem-me a Lógica
fiquem com a Política
roubem-me a Metafísica
tirem-me a roupa
e deixem-me morrer de fome
Porém não me aprisionem os gestos
que uma ave sem asas não é ave
E que diria o meu eu-adulto
ao meu eu-criança
- o único afinal -
que sabe viver em sonho e poesia?
Ah por favor
não me aprisionem os gestos
que a criança em mim não desertou ainda.
Ovídio Martins, in " Caminhada", Editorial Minerva, Lisboa 1963
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