Morreu
a escritora Luísa Dacosta
“A escritora Luísa Dacosta morreu
neste domingo aos 87 anos no hospital de Matosinhos, disse à Lusa fonte
editorial, citando a família
O corpo da escritora, natural de Vila Real, vai estar na segunda-feira a partir
das 15:00 no sanatório de Matosinhos, seguindo-se a cremação na terça-feira, às
10:00, segundo a mesma fonte.
Luísa Dacosta, que completava 88 anos na segunda-feira, formou-se na Faculdade
de Letras de Lisboa em Histórico-Filosóficas, iniciou a sua atividade literária
em 1955 e recebeu em 2010 o Prémio Literário Vergílio Ferreira, atribuído pela
Universidade de Évora.
Entre os seus livros contam-se «Província», «A Menina Coração de Pássaro»,
«Sonhos Na Palma da Mão», «O Valor Pedagógico da Sessão de Leitura»,
«A-Ver-O-Mar» ou «Nos Jardins do Mar». Escreveu também livros infantis.
Em 2011, a décima edição da revista Correntes, publicação associada ao festival
Correntes d'Escritas, na Póvoa de Varzim, homenageou a autora, que na sessão de
abertura do certame se mostrou satisfeita por ter tanta gente a «ouvir uma
escritora pouco lida».
«Fui sempre mais homenageada como professora do que como escritora», comentou,
confessando que a sua obra -- «autobiográfica» - era pouco compreendida. “JN
DIÁRIO A BORDO DE UM ELÉCTRICO
Manhã de Primavera (entre a
Circunvalação e o Jardim do Passeio Alegre)
Por Luisa
Dacosta
"Os
guindastes de Leixões ficaram para trás. O eléctrico corre em direcção ao
Castelo do Queijo e um ar marinho, sápido e pegajoso, vem às lufadas trazido
pelo vento norte, que entra por uma das janelas abertas. Sardinha em lata tem
conta. Mas no eléctrico cabe sempre mais um. E é o que acontece, na paragem do
redondel, frente à estátua. Entramos na Avenida de
Montevideu com as antigas vivendas a transformarem-se e restaurantes e clubes,
outras a serem substituídas por andares, outras a degradarem-se à espera de um
melhor preço de venda. À direita a esplanada está ainda pouco concorrida:
alguns velhos madrugadores a lerem as notícias, dois fãs de footing e o
tlim-tlim de uma bicicleta a responder às campainhadas do eléctrico. Depois do Molhe,
apetece correr os olhos pela balaustrada. E da pérgola,
caramanchão de cimento, olhar o mar, de flor, encristado pela nortada. Uma
traineira faz-se ao largo em direcção ao horizonte. Entre as manchas de cor dos
canteiros afloram as mantas rochosas da beirada em negro, cinza, lama e rosa.
Do lado da terra sucedem-se os andares, as lojas, as agências bancárias da
Avenida Brasi. E, de súbito, é a Senhora da Luz: casas de rés-do-chão e andar
mais rasteirinhas. Depois do boqueirão da Rua de Diu, que nos devolve o azul e
a entrada da Praia dos Ingleses é já o coração da velha Foz e quase se podem
fazer compras da janela: no talho, na padaria, no bazar ou supermercado. Mesmo
o peixinho miúdo da canastra. Ou cumprimentar conhecidos: - Bom dia! Bom dia! O
mar não se perde e arpoa-se pelas travessas da Senhora da Luz e da Praia. E
quase logo depois da barbearia, cujo telhado fica ao rés da nossa janela, e
onde se vêem esticadas e descontraídas as pernas do primeiro freguês é já o ar
mais lavado da Praia da Luz, onde, sem as vermos, sabemos as gaivotas a passear,
domésticas, como pombas. No alto a lua é uma água viva, translúcida,
translúcida, no oceano azul do céu. Contornamos o forte de São João. Deixamos
já o farol e, frente ao Cabedelo, a Praia das Pastoras. Que nome evocativo! Em
que tempo outro, e perdido, vinham elas trazer aqui a pastar ervas e maresia os
seus carneirinhos? Mas que os traziam, traziam. E um deles, agaiado e perdido
do rebanho, com os seus corninhos de biscoitinho queimado, ficou para sempre a
pular em cima do Chalé Suíço - e espera-me, familiar, na paragem do jardim."
Luisa
Dacosta, in Máxima, Abril de 1992
Luísa
Dacosta nasceu em 1927, em Vila Real de Trás-os-Montes. Formou-se na Faculdade
de Letras de Lisboa, em Histórico-Filosóficas. Mas as suas
"Universidades" foram as mulheres de A-Ver-O-Mar, que murcham aos
trinta anos, vivem e morrem na resignação de ter filhos e de os perder, na
rotina de um trabalho escravo, sem remuneração, espancadas como animais de
carga (-Ele não me bate muito, só o preciso) e que, mesmo afeitas, num treino
de gerações ,às vezes não aguentam e se suicidam (oh! Senhora das Neves! E tu
permites!) depois de um parto, quando o mundo recomeça num vagido de criança!
Às mulheres de A-Ver-O-Mar "Deve" a língua ao rés do coloquial. Foi professora do ciclo preparatório e alguma coisa deve também aos alunos: o ter ficado do lado do sonho. Isso a motivou a escrever para crianças.
Às mulheres de A-Ver-O-Mar "Deve" a língua ao rés do coloquial. Foi professora do ciclo preparatório e alguma coisa deve também aos alunos: o ter ficado do lado do sonho. Isso a motivou a escrever para crianças.
Nota bibliográfica
A autora está representada nas
seguintes antologias:
Daqui Houve Nome de Portugal, Eugénio
de Andrade, 1969.
De Que São Feitos os Sonhos, Areal Editores, 1985.
Portugal: A Terra e o Homem, Fundação Calouste Gulbenkian, II Vol., 3ª série, 1981.
De Que São Feitos os Sonhos, Areal Editores, 1985.
Portugal: A Terra e o Homem, Fundação Calouste Gulbenkian, II Vol., 3ª série, 1981.
Escreveu:
Província
Aspectos do Burguesismo Literário
Notas de Leituras
Vóvó Ana,Bisavó Filomena e Eu
De Mãos Dadas Estrada Fora...I
O Príncipe que Guardava Ovelhas
O Valor Pedagógicao da Sessão de Leitura
De Mãos Dadas Estrada Fora...II
O Elefante Cor-de-Rosa
Teatrinho do Romão
A Menina Coração de Pássaro
De Mãos Dadas Estrada Fora...III
A-Ver-O--Mar
Nos Jardins do Mar
Prefácio a Raul Brandão
Corpo Recusado
A Batalha de Aljubarrota
História com Recadinho
Os Magos Que Não Chegaram a Belém
Morrer a Ocidente
Sonhos Na Palma da Mão
Na Água do Tempo
Lá Vai Uma... Lá Vão Duas
(Informações retiradas da FEP)
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