“Jaz morto e arrefece o menino de sua mãe” (1973), escultura de Clara Menéres
(Fonte: Panorama da arte portuguesa do século XX, Fernando Pernes
Porto, Campo das Letras, 1986, p. 265.)
Os Corpos
vede
que jazem
à minha
frente
a pele
citrina
da morte
biliosa
os habita
espécie de
pacto
sobre tudo
isto que vedes
a maneira de olhar
o sangue
calar a
revolta
este pânico
entreaberto
nos olhos dos
cadáveres
e os coágulos
duros deste sol
há uma
mentira acreditável
em quem vê as
armas caídas
ao lado
destes corpos
cumplicidade
de admitir nos mortos
a espera da
nossa morte
vede que
jazem
estes membros
como insónia
sobre os
corpos destruídos das granadas
perfil rígido
das
metralhadoras
para sempre
presas no sovaco
cratera da
nossa boca
de comer e
tanto vomitar a guerra
mas vede
também
que ira
interrompida
se morde
contra a morte
sobre estes
mortos
João de
Melo, in “Navegação da terra”,
Lisboa, Editorial Vega, 1980, 1ª ed.
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