terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Crónica de Inverno

CRÓNICA DE INVERNO
Por Eugénio Lisboa
"No dia 15 de Julho de 1960, por ocasião da Convenção do Partido Democrático, J. F. Kennedy cunhou uma frase para a eternidade: “Estamos na orla de uma Nova Fronteira.” Hoje, nesta passagem de 2013 para 2014, estamos também na orla de uma Nova Fronteira, mas é a fronteira que nos separa do inferno. Não vale a pena enganar quem nos lê, vendendo-lhe a moeda falsa de uma esperança enganadora. Dizia um anónimo que um optimista é alguém que pensa que o futuro é incerto. Ora nós não cremos que o futuro, tal como se desenha, com os dados que temos, seja um futuro incerto: é, pelo contrário, um futuro certo e, por sinal, bem negro. Porque é um futuro de pobreza, sem esperança. Diz um provérbio que um homem a afogar-se se agarra a uma palha. Nós assistimos hoje a toda uma sociedade com História, a afogar-se sem ter uma palha a que se agarrar. A esperança, mesmo remota, costumava ser essa palha. Mas um governo de depredação e de pilhagem sem escrúpulos tem estado determinado a surripiar até essa pífia bóia de salvação: uma esperança, mesmo pouco fundamentada. As pessoas, de tanto sofrerem, deixaram de acreditar. Um autor francês célebre observou um dia, com cinismo cauterizante, que o futuro já não era o que costumava ser. Ele parece, agora, simplesmente não existir. De há dois anos e meio para cá, assistimos à execução exemplar do que há de pior nos manuais da governação: a mentira, a falta de escrúpulos, a violência, a opressão, o empobrecimento programado, o enriquecimento escandaloso e obsceno de poucos.
Governar teve, quase sempre, má imprensa e má literatura. Já Voltaire, “gamin” pouco domesticável, observava que “em geral, a arte de governar consiste em tirar tanto dinheiro quanto possível a uma parte dos cidadãos, para o dar a outra parte” (em geral, tirar aos que já pouco têm, para dar aos que já têm demasiado). Kin Hubbard assanhava o tom assassino, quando dizia: “Governar é uma espécie de pilhagem legalizada.” E o grande Tolstoi, do alto da sua santa iconoclastia, gostava de não medir por aí além as palavras: “Governo é uma associação de homens que exercitam a violência sobre o resto de nós.” Foi assim no tempo dos czares e foi assim no tempo dos czares que vieram depois – mesmo aqueles que falavam em nome do povo.
Não vivemos num mundo em que falte o dinheiro: o que se passa é que há cada vez menos pessoas a terem a posse de uma fatia cada vez maior desse dinheiro (não por mérito, mas por manha maligna). Dizia Cervantes, no seu Don Quixote, que “só há duas famílias no mundo: os que têm muito e os que têm pouco.” No entanto, depois dele e por algum tempo, as coisas deixaram de ser assim: havia alguns que tinham muito, havia bastantes que tinham alguma coisa e havia também bastantes que tinham pouco. Os governos actuais andam, com eficácia, a destruir o grupo do meio – os bastantes que tinham alguma coisa – transferindo-os para o grupo dos que não tinham quase nada ou mesmo nada. Esta pobreza crescente tem sido causada, paradoxalmente, pelo muito dinheiro que há nas mãos de muito poucos! O dinheiro tem tomado de assalto todas as conquistas mais notáveis do século XX: trabalho, educação, saúde, recreio... Dizia Cicero, qui s’y connaissait, que “não há fortaleza tão forte que o dinheiro não possa tomar de assalto.” Tudo se torna negócio, para quem é provido de dinheiro e desprovido de escrúpulos (nem precisa de ser provido de muita inteligência: ao contrário da crença em vigor, não é preciso ter muita inteligência para enriquecer – uma combinação bem doseada de astúcia e falta de escrúpulos é amplamente suficiente). O dinheiro permite todas as vitórias para uns poucos e todas as derrotas para os muitos mais. Tudo se torna negócio: a educação, a saúde, o bem-estar... O dinheiro toma conta de tudo, até da verdade, amordaçando-a ou pervertendo-a. Arthur Balfour, mais tarde Lord Balfour, que foi primeiro ministro britânico, ao qual se deve a famosa “Declaração Balfour”, que está na origem da criação do Estado de Israel, não era peco a falar: as suas “tiradas” são famosas (por exemplo: “A lucidez de estilo de Asquith é positivamente uma desvantagem, quando ele não tem nada a dizer”) e uma delas rezava assim: “Nada deve impedir a verdade, salvo uma substancial soma de dinheiro.” É isto que tem sido a bíblia e a medalha de toda a praga neoliberal que nos governa por esse mundo fora. Uma praga que se considera cristã, mas para quem o espírito do cristianismo é letra morta. Dizia o dramaturgo irlandês, George Bernard Shaw, com a ferina acutilância que o caracterizava, que “o cristianismo talvez fosse uma coisa boa, se alguma vez tivesse sido experimentado.” Infelizmente, o neoliberalismo que impera, infecta e destrói todo o tecido social é a negação mesma do espírito cristão.
A pobreza é um mal, não é um vício. Pode e deve ser combatida com energia e eficácia, sob pena de toda a sociedade ruir. Dizia alguém que a melhor maneira de ajudarmos os pobres é não nos tornarmos um deles. É essa realmente a via. Como? Não quero terminar esta crónica de fim de ano, em estado de negra negação. Há de facto uma via – e só uma: dar luta continuada e sem quartel à gente que nos governa – e não só em Portugal. Lutar, dizer não, não e não, até nos ouvirem: quer gostem, quer não gostem (e, seguramente, não vão gostar). Nós somos muitos e isto é uma força!"
                                                                      Eugénio Lisboa

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Ai, América

América, América...
                                    Manoel de Andrade
Trago ainda na alma o mapa dos caminhos...
Meus versos riscam teu dorso para cantar um tempo único e perfumado.
América, América,
ali, entre os ramos e o penhasco, o abismo florescido,
acolá, o milho semeado e a colheita rumorosa.
Entre serras e quebradas vai o colla dedilhando sua flauta,
é seu hino à pachamama modulando o silêncio do altiplano.

Canto meu enredo de viandante,
passo a passo rumo ao norte e à alvorada.
Quantos atalhos, meu Deus, quantas fronteiras!
A travessia ao entardecer no Titicaca,
o Illimani batido pelo sol,
e aquela noite sob as estrelas em Macchu Picchu!
Ah! este aguaceiro vem agora molhar minha saudade,
e tudo me chega como um recanto do passado...
e se hoje digo amigos e digo hermanos,
ouço nossos passos ecoar pelas vielas seculares de Quito e de La Paz.

Ai, América, ainda não disse de ti quanto quisera,
abre teu cântaro, ó Poesia, e dá-me o frescor do rocio,
dá-me a magia e o lirismo...,
que canção para mim soará mais bela que tuas sílabas de encanto?
América, América,
Lembro-me do fulgor do teu rosto renascido da utopia,
tuas bandeiras de sonhos
feitas de plumas e veias transparentes.
Os campos todos semeados
e o porvir tatuado em cada gesto.
Tudo era aroma na gleba cultivada,
nos brotos germinava a esperança
e nossas pálpebras se abriam para o amanhã.

Canto a América que vivi,
entre alegrias e lágrimas, canto o continente ao sul de Anahuác.
Falo de uma América primeira,
asteca, quiché, chibcha, quéchua, mapuche e guarani,
essa América materna,
botânica e mineral,
sangrada por Cortez, Pizarro e por Valdivia.
Falo de uma só pátria,
a grande pátria de Bolívar,
pilhada e violentada,
submetida pelas garras perversas do Império.
Vi tuas trincheiras abertas
e depois as densas trevas caírem sobre o sul.
Sobreveio o chumbo cruel,
os labirintos da dor e as atrocidades.
Na penumbra gemiam os cravos, gemiam as rosas,
e agonizava a vida ainda em botão.

Canto para denunciar a verdade sufocada,
e eis que mancho este verso para nomear Garrastazu, Bordaberry, Videla, Pinochet
e seus rastros genocidas num tempo silenciado.
Canto para dizer das valas clandestinas,
das ossadas do Atacama
e dos “voos da morte” para o mar,
Meu réquiem para trinta mil argentinos,
meu canto para as “crianças da ditadura”,
para os sobreviventes e suas cicatrizes,
para a viuvez e a orfandade
para las Madres de Plaza de Mayoe suas lágrimas perenes.

América, América,
quarenta anos se passaram
e tuas feridas ainda emergem da tragédia!
E aqui declino a “operação” perversa dos “condores”
e os seus generais malditos.
Canto por ti, América,
por tuas aldeias de bravos e por teus calvários,
por teu nevado esplendor tantas vezes torturado,
América de tantos massacres e patíbulos,
ouço-te ainda na voz melancólica dos charangos, quenas e zamponhas,
chorando por la matanza de San Juan, em Potosi.
Uma América de martírios,
estrangulada em Cajamarca,
esquartejada em Cusco,
sacrificada em La Higuera.
executada em Trelew e El Frontón,
e nos rituais da morte em Villa Grimaldi e no Dói-Codi.

Por tanta dor nessas memórias
eu vos peço perdão pelo meu canto.
Ele é também assim: um áspero clarim no entardecer.
Distante, tão distante,
no tempo e nos andares,
e hoje, em busca de mim mesmo,
ainda abrigo o mesmo combativo coração.
Não sei o que te espera, América,
os anos correram inquietantes e velozes
restando um mundo com seu som intolerável.

Busco meu íntimo silêncio,
e, por um momento, digo basta...,
meu pensamento em prece, e num lampejo, viaja ao sul do Chile.
Lá, muito além do Bio-Bio, há um golfo deslumbrante.
Vou em busca de Arauco,
lá lutaram meus heróis, Caupolicán e Galvarino.
Foi lá onde viveu Lautaro e onde vive Frederico.
Vou para rever o cone nevado do Antuco
rever o vale e a Cordilheira,
o seu dossel verdejante, onde se gesta a vida.
Vou para relembrar uma baía de barcos,
para construir uma paisagem na alma,
uma tenda de luz para um amigo.

                                                               Curitiba, 22 de dezembro de 2.013
Manoel de Andrade, poeta brasileiro

domingo, 29 de dezembro de 2013

Ao Domingo Há Música

" A Música pode, em suma, ser considerada como a expressão de um mundo não conhecível, mundo de essência espiritual que se exprime de um modo ideal. Nada de mais ideal, com efeito, do que a Música - não possui forma alguma, ou melhor , nenhuma forma tangível , como é o caso da pintura ou da escultura. E, apesar disso, cada trecho musical possui uma individualidade própria.Uma sonata, uma sinfonia, são monumentos tal como um quadro ou uma estátua. Os quartetos de Beethoven possuem uma arquitectura especial , facilmente discernível, e que constitui um modelo de perfeição. É nisso, precisamente, que reside  um dos elementos de sedução  da Música: ela exprime a perfeição de uma maneira suficientemente fluída e ligeira para podermos prescindir do esforço.
A Música é a expressão perfeita de um Mundo Ideal que nos é comunicado através da harmonia. Esse mundo existe não a um nível superior ou inferior ao mundo real, mas paralelamente  a este." Albert Camus, in " escritos de juventude", pag.159, Edição Livros do Brasil, Lisboa

Tecidos de arquitecturas várias, ora compostos em linguagens mais canónicas , ora construídos em partituras mais populares, todos os trechos musicais têm uma individualidade própria.   Chegam e despertam-nos. 
Neste final de 2013, desviámo-nos da música erudita, que foi soberana em muitos destes nossos dias,  para darmos   voz aos novos valores que foram aparecendo e que construirão, com o talento que já revelaram, um percurso notável no domínio musical.
Fica uma selecção variada que qualquer um pode fruir, refruir ou rejeitar. Que de Música se faça também 2014.
Até lá, apresentam-se os melhores e sentidos votos de eufonia perfeita.

"Vieste do fim do mundo
num barco vagabundo
Vieste como quem
tinha que vir para contar
histórias e verdades
vontades e carinhos
promessas e mentiras de quem 
de porto em porto amar se faz."
João Loio                                         

A voz quente de Gisela João, em " Vieste do Fim do Mundo", acompanhada à guitarra portuguesa por Ricardo Pereira, à viola por  João Tiago, baixo por Francisco Gaspar. A letra e música são de João Loio  , a  produção e a direcção musical têm a assinatura de Frederico Pereira



"So don't go if you wanna know
Don't go if you don't know
Don't go, if you wanna know
Don't go, don't go, don't go

Beautiful stranger, take me by the hand
Make me dance all night
I wanna take the chance
I love the way you move
And the way you put your hands on my hips
are moving while you take it slow
Makes me feel like I'm on a river flow
Cause we've got time
And yes we've got time

Beautiful stranger, I wanna loose my mind
Beautiful stranger, in the depth of your eyes
Beautiful stranger, oh oh oh oh
I remember, I remember, I remember...your

Sweet music, sweet sweet sweet music, sweet music rising..."

A voz de  Hindi Zahra ,uma talentosa cantora franco marroquina,  em "Beautiful Tango".


"All this life is all for love
Its the only road Ill choose
And every street and avenue
Only one will lead me back to you
One Love, One Love, One Love
One Love, One Love, One Love" 
Angus and Julia, vozes frescas de dois irmãos australianos que emprestam aos sons , o encanto do folk-blues. Do Álbum "Memories Of An Old Friend "(2011), extraiu-se a composição " All of me".

"For days that I'm calling you
The light of the day is true
Yes, we're hopeless
Do you think we lost it?"
Lucia é uma cantora romena de 18 anos.” Silence” foi o seu primeiro single gravado ,em 2012. Apresentámo-lo, então,  neste espaço." Em " Days," composição posterior,  pode-se confirmar a  voz vibrante e delicada desta jovem cantora.  

"Morreu no passado dia 23 de Dezembro, nos Estados Unidos da América, aos 93 anos de idade, o músico e compositor Yusef Lateef, um dos primeiros a incorporar elementos da world music no jazz tradicional. Autor e multi-instrumentista, responsável por canções como "Love theme for Spartacus" e "Morning", venceu em 1987 um prémio Grammy pelo seu álbum "Yusef Lateef's Little Symphony"."
Integrado no Yusef Lateef Quartet, ei- -lo, em " In  the Evening (Folk)", uma das muitas excelentes composições que nos legou . A gravação foi realizada  no Parc Floral de Paris, em 1972.

sábado, 28 de dezembro de 2013

28 de Dezembro

28 de Dezembro, o dia em que os irmãos Lumière apresentaram o cinematógrafo
"O cinematógrafo é o marco inicial da história do cinema e foi apresentado ao mundo a 28 de Dezembro de 1895, pelos irmãos Lumière. Exactamente dois anos mais tarde, estreia em Paris a peça ‘Cyrano de Bergerac’, de Edmond Rostand. A patente do cinematógrafo – considerado um aperfeiçoamento feito pelos irmãos Lumière do cinetoscópio de Thomas Edison – foi registada a 13 de Fevereiro de 1895, sendo que o aparelho é exibido a 28 de Dezembro do mesmo ano.
Trata-se de uma máquina que torna possível a gravação de uma série de momentos instantâneos, em fotogramas, o que permite criar a ilusão do movimento. Mas a invenção dos irmãos Lumière, com o conhecimento fornecido por Edison, tornou-se num símbolo que representa hoje a origem do cinema.
Esse contributo foi dado por Auguste Marie e Louis Jean Lumière, que em virtude da sua invenção acabaram por receber o epíteto de ‘pais do cinema’. E nas origens do cinema, também a 28 de Dezembro, estreia em Paris, em 1897, a peça de teatro ‘Cyrano de Bergerac’, do autor francês Edmond Rostand.
Nasceram a 28 de Dezembro, Woodrow Wilson, 28.° Presidente dos EUA (1856), Johnny Otis, músico norte-americano (1921), Mariana Rey Monteiro, atriz portuguesa (1922), Guy Debord, escritor francês (1931), Pinto da Costa, presidente do Futebol Clube do Porto (1937), José Pedro Gomes, actor, autor e encenador português (1951), James Foley, cineasta norte-americano (1953, Richard Clayderman, pianista francês (1953), e Denzel Washington, ator norte-americano (1954).
Morreram neste dia Pierre Bayle, filósofo e escritor francês (1706), Samuel Holland, engenheiro e general do exército britânico (1801), Olavo Bilac, jornalista e poeta brasileiro (1918), Maurice Ravel, compositor e pianista francês (1937), Paul Hindemith, compositor, violista e maestro alemão (1963), Clayton Moore, actor norte-americano (1999), e Susan Sontag, escritora e activista norte-americana (2004).

"Guarda costeira japonesa mostra imagens da nova ilha do Japão, que nasceu em Novembro a mil quilómetros a sul de Tóquio e não para de crescer. Fruto de forte atividade vulcânica, a ilha colou-se à 'vizinha' Nishinoshima, que já existia no local
"De acordo com a guarda costeira japonesa, que sobrevoa o local quase todos os dias, o que recentemente era um ilhéu – que poderia até desaparecer nas águas do oceano Pacífico – é agora uma ilha, com uma extensão de cerca de 15 hectares.
Dado este fenómeno de união, a nova ilha vai perder o nome de baptismo que lhe fora atribuído: Niijimam, ou Shinto. Estas duas expressões japonesas significam “nova ilha”. Assim, não terá qualquer nome e deve passar a integrar a ilha de Nishinoshima.
O espaço aéreo foi sobrevoado por um vulcanólogo, de helicóptero, sendo que o especialista garantiu que a ilha não vai ‘morrer’ e será permanente. Surpreendente é a forma rápida como ocorreu e a sua união a Nishinoshima."PT

Navio russo continua preso em gelos da Antárctida
"O “Snow Dragon”, um quebra-gelo da China, ficou a cerca de 20 quilómetros do “MV Akademik Shokolskiy”, o navio russo que pediu socorro, na véspera de Natal, ao ficar preso na Antárctida. As más condições do tempo obrigaram o “Snow Dragon” a adiar o resgate para amanhã.
O “MV Akademik Shokolskiy” vai ficar preso no gelo da Antárctida por mais uma noite. Imobilizados desde a véspera de Natal, os marinheiros deste navio russo viram hoje a salvação aproximar-se e a ficar a cerca de 20 quilómetros de distância. O quebra-gelos chinês “Snow Dragon” foi abrindo caminho enquanto conseguiu, mas as más condições do tempo, aliadas à densidade do gelo, obrigaram ao cancelamento da operação de resgate, que será retomada amanhã.
A bordo do “MV Akademik Shokolskiy” continuam as 74 pessoas que, desde o dia 28 de Novembro, refazem a expedição que há um século levou Douglas Mawson à Antártida. A bordo seguem cientistas, turistas e os tripulantes do navio. O chefe da missão, Chris Turney, afirmou por rádio satélite que as pessoas a bordo estão tranquilas e com boa moral, apesar da tensão inerente a estarem presas no gelo desde o dia 24 de Dezembro.
Turney acrescentou que o navio ficou encalhado no extremo sul da Tasmânia devido a uma tempestade de neve trazida por ventos que sopravam a mais de 70 quilómetros por hora. Para o resgate foram destacados três quebra-gelos, com o chinês a ser o primeiro a chegar e o que mais se aproximou do barco russo." PTJornal

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Résistance

"Telle une promenade dans les labyrinthes de l’amour, Le Parc chemine à travers les codes de la séduction, de la rencontre aux premiers échanges charnels, jusqu’à l’abandon de soi. Quatre jardiniers aux lunettes noires, cupidons des temps modernes, mènent le jeu dans un jardin imaginaire. Au-delà des références littéraires à la « Carte du Tendre », La Princesse de Clèves ou encore Marivaux, Le Parc demeure une histoire intemporelle dans laquelle Angelin Preljocaj interroge avec humour et acuité la relation à l’autre, cette étrange attirance où se jouent l’éveil à la sensualité, la découverte de l’autre et par là-même de soi. Les musiques de Mozart, notamment quelques-uns des plus beaux adagios de ses concertos pour piano, ajoutent à cette pièce une touche de tendresse. Premier ballet créé par le chorégraphe pour l’Opéra de Paris en 1994, Le Parc est devenu, depuis, une œuvre essentielle du répertoire et mélange avec subtilité classique et moderne."
Angelin Preljocaj
Découvrez un extrait du ballet Le Parc, à l'affiche du palais Garnier du 7 au 31 décembre 2013. De La Princesse de Clèves à la Carte du Tendre, Angelin Preljocaj suit le cheminement des sentiments, depuis la rencontre, la résistance à l'amour jusqu'à l'abandon de soi.
Lié à Le Parc

 La Princesse de Clèves, était un point de départ merveilleux, l'histoire de cette femme qui résiste à l'amour. J'avais envie de transmettre, à travers le mouvement, la danse, la relation entre deux interprètes, cette résistance, cette pérégrination, ce qu'elle ressent." Angelin Preljocaj.
Danseurs : Aurélie Dupont et Nicolas Le Riche

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Descansar as angústias na letra redonda

DESCANSAR AS ANGÚSTIAS NA LETRA REDONDA
Por Eugénio Lisboa
"Miguel Torga, de quem se celebra este ano o centenário do nascimento, ficará, na história literária de Portugal, como um dos mais eminentes representantes da brevidade e da concisão: a narrativa curta, o poema relativamente curto, o poema curto ou o muito curto, ou as “entradas” no já célebre Diário, quase sempre breves, acutilantes e certeiras. Nos Contos da Montanha, nos Novos Contos da Montanha, na Rua ou em Pedras Lavradas, do mesmo modo que na poesia (seja a inserida no Diário, seja a publicada em livros assumidamente só de poesia), Torga investe de sentido profundo a ousada e discutível proposta de Claude Roy, quando este afirma que “toda a mestria tende a condensar-se.” Isto só em parte é verdade: eu diria antes, sendo mais cauteloso, que alguma mestria tende a condensar-se, como de resto o reconhece o próprio Claude Roy, quando observa: “Nada é mais admirável que as obras de grandes dimensões que não são grandes máquinas. A não ser, talvez, as obras muito curtas, cuja brevidade nunca dá a impressão de secura, cuja concisão se repercute lentamente, longamente, que se prolongam em harmónicas.” E acrescenta estas palavras que parecem assentar como uma luva no avaro protocolo torguiano: “Exprimir muito em poucas páginas é uma grande delicadeza. A delicadeza e a obra de arte têm de comum o serem uma e outra uma economia. As verdadeiras boas maneiras e o verdadeiro bom estilo poupam-nos tempo e forças.” Eis como o agreste e rude contista da montanha se transfigura no delicado propiciador de condensados a rebentar de conteúdo pelas costuras, só porque subtilmente atento à economia da nossa disponibilidade.
Médico, interventor cívico intemerato, “vocação contrariada de vagabundo”, auscultador atento e não batoteiro das virtudes, manhas e vícios do povo português, com o qual mantém uma relação de curiosidade fraterna mas não adocicada, Torga vaza, com vigor e, não raro, com fulgor, dentro dos moldes apertados e exigentes da criação breve, o muito que tanto a vagabundagem como a vida sedentária lhe foram ensinando.
O homem Torga, carregando consigo todo um teor de anedotas, mitos, lendas e, provavelmente, invenções malévolas, não convidava muito ao convívio. Quantas vezes, estudante de engenharia, em Lisboa, não fantasiei ir passar uma semana ou duas a Coimbra, com o fito de cocar, de longe, de muito longe, enquanto fingisse ler um livro de Unamuno, o vulto do homem que esculpira o Alma-Negra ou a Mariana. Mas sempre temi o confronto entre “o homem que fez a obra e o homem que a obra faz supor”. O mítico autor do Diário, que eu devorava nos escassos ócios que me deixava um exigente curso de engenharia, era por certo alguém que melhor fora deixar a vaguear, caçador solitário, na montanha que, para nós, bichos da cidade, desenhara com minúcias amorosas de campeador agreste e convencido. “O Torga” foi-me, durante muitos anos, uma tentação. Mas recusei sempre e, se calhar fiz mal, ceder ao chamamento. Parece que, afinal, o caçador implacável e manhoso era um tipo abordável e até cordial. E que teria gostado de conhecer. Desencontros que a vida tece, quando o receio de uma decepção em nós mina a possibilidade de um entendimento. De modo que o Torga de que aqui vos vou falar, com a brevidade que ele tanto amava e tão eminentemente cultivava, é aquele que transparece dos seus livros de criação pura e dos outros que, mesmo não parecendo de criação pura, o são afinal também, porque de todo o barro que vem às mãos de um bom escultor sai sempre obra asseada e perene: o Diário, o Portugal ou o Traço de União exibem tanto a marca do criador como qualquer bom conto da montanha ou qualquer ode das melhores que nos deixou.
                                                                     :: ::
Como todos os grandes escritores, Miguel Torga acolheu e acarinhou, dentro de si, um mundo de contradições. Lega-nos uma vasta obra feita de palavras apetecidamente trabalhadas, ao mesmo tempo que nota, poucos anos antes de morrer, que “sempre a experiência [lhe] ensinou  que os momentos mais significativos da nossa condição, por embargo ou pudor, são mudos”. Dito de outro modo, o cultivo continuado e apaixonado do verbo levou-o à descoberta do valor insigne do silêncio. Por outro lado, tendo passado toda uma vida a comunicar com o leitor, em prosa e em verso, conclui, numa anotação do seu último volume do Diário (com data de 10.9.1991), que: “Ninguém sabe nada de ninguém. Morremos inéditos. Tanto que tenho dito de mim, por palavras e obras, e pasmo diariamente diante da incompreensão dos mais íntimos. Foi inútil e inglório todo o meu esforço para ser transparente aos olhos do mundo. (...) Fiquei a ser, não o poeta que realmente sou, mas o monstro que me inventaram.” Ou ainda, e de forma mais sucinta e acutilante: “Vamos para a sepultura secretos como viemos. E sempre a fazer, laica ou religiosamente, sinceras confissões.” Inutilidade de toda a escrita? Futilidade de toda a intervenção? Conclusão final – pessimista – de um escritor que arriscou a liberdade na luta pelo ideal de uma pátria a viver em democracia? É verdade que, no mesmo  Diário, e em data muito próxima, Torga regista isto: “Afirmei recentemente que o meu verdadeiro rosto, presente ou futuro, está nos livros que escrevi.” Mas que “verdadeiro rosto” s é, como ele próprio insinua, mais do que provável que o irão desfigurar? Esta obsessão relativa ao indecifrado segredo que todos nós – e em especial, ele, Torga – levamos para o túmulo irriga-lhe, de resto, as páginas do último volume do Diário. Noutro ponto, volta à carga, com ênfase reveladora: “E cada novo livro que publico”, sublinha ele, “é apenas mais um S.O.S. que, por descargo de consciência, lanço engarrafado ao mar das montras. Se o embrulho for encontrado em qualquer praia por alguém, e a mensagem lida e entendida, óptimo. Se não for, paciência. Nunca as nossas inquietações e angústias podem ser inteiramente partilhadas. Ao fim e ao cabo, todos vivemos e morremos em segredo. O mais profundo e significativo de nós em nenhuma circunstância vem à luz do solo. Principalmente ao bico da pena dos que mais se explicam e confessam mascarados de penitentes, e são quase sempre mestres consumados do disfarce. Santos Agostinhos há poucos.” A inculcação do número reduzido de Santos Agostinhos, isto é, de confessados dilacerantemente sinceros, aliados à verificação assumida de que “o mais profundo de nós em nenhuma circunstância vem à luz do sol” [sublinhado nosso], leva à conclusão não demasiado abusiva de que o autor de Bichos se não inclui entre os pares do autor de A Cidade de Deus.
Permitam-me juntar a este acervo de proclamações de um cepticismo radical quanto à possibilidade de uma efectiva comunicação – não desfigurada – entre autor e leitores,  permitam-me juntar, dizia, esta acutilante passagem lançada no mesmo Diário, por ocasião dos seus 84 anos: “Todos sabemos [reparem: “Todos sabemos”], clara ou brumosamente, que nascemos sós, vivemos sós e morremos sós. E que, até nas horas menos infelizes, no mais fundo do nosso inconsciente, lateja, cruciante, a dor incurável dessa condenação. Mas sabemos também que a Bíblia, o livro dos livros, nos ensina que não há homem sem homem, e que o próprio Cristo teve, a caminho do Calvário, a fortuna de um Cireneu para o aliviar do peso da cruz. O que, trocado por miúdos, significa que a solidão radical de cada existência – que, nos poetas, a cegueira de Homero ilustra premonitora e paradigmaticamente – é mitigada por uma força que, se não vence os destino, inconformadamente desde sempre o desafia.”
Neste texto fundamental, o autor de O outro Livro de Job, faz – ou retoma – três afirmações fundamentais: 1) Toda a existência humana é afligida por uma “solidão radical”; 2) essa “solidão radical” pode, às vezes, ser “aliviada” por terceiros (como o Cireneu que “aliviou” Cristo a caminho do Calvário), mas não pode ser definitivamente “curada”; 3) a força promotora de tal alívio pode “desafiar” a incurabilidade do destino solitário do homem, mas não pode vencê-la ou resolvê-la. A rebeldia de Orfeu é, em suma, um “panache” que lhe dá aura e dignidade mas não lhe resolve nenhum problema essencial da existência. Torga é, nisto, muito claro, saturninamente explícito, repetidamente afirmativo.
Eduardo Lourenço apontou, há muito, um dedo certeiro, àquilo a que chamou “desespero humanista” em Miguel Torga, com o que quis significar a desconfiança do autor de Poemas Ibéricos." Eugénio Lisboa

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

É um poema


Um Poema

Não tenhas medo, ouve:
É um poema.
Um misto de oração e de feitiço...
Sem qualquer compromisso,
Ouve-o atentamente,
De coração lavado.
Poderás decorá-lo
E rezá-lo
Ao deitar,
Ao levantar, 
Ou nas restantes horas de tristeza.
Na segura certeza
De que mal não te faz.
E pode acontecer que te dê paz..."
Miguel Torga, in " Diário XIII", Obra Completa, Círculo de Leitores


A voz de Ruzanna Nahapetjan,  em " Benedictus" de  Charles Gounod , acompanhada pelo coro Christian Male Voice Choir LdH de Vaassen, dirigido por  Freddy Veldkamp.

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

O SIGNIFICADO DO NATAL

O SIGNIFICADO DO NATAL
Manoel de Andrade 
       "Nestes dias que precedem o Natal, ocorre-me pensar nas tantas portas que se fecham para o seu real significado, mascarado por estranhas personagens natalinas e maculado por poderosos interesses mercadológicos. Ocorre-me também pensar que se o Cristianismo fosse verdadeiramente interpretado não haveria tantos sectarismos e o simbolismo da manjedoura de Belém seria fraternalmente reverenciado no mundo inteiro, além da barreira das religiões.
         Jesus não fundou nenhuma igreja, nem dogmatizou nenhuma religião. Trouxe-nos a imagem de Deus como um pai, mostrou a importância da religiosidade e nos revelou o significado incondicional do amor. Não escreveu nada, mas deixou, na memória de seus discípulos, a sabedoria de suas parábolas e, no Sermão da Montanha, toda a essência do cristianismo, falando do amor aos inimigos, do perdão das ofensas e da importância de dar a outra face como um caminho aberto para a reconciliação. Resumindo, quis dizer-nos que ser cristão é saber transformar o orgulho em humildade e o egoísmo em amor.
         A ênfase de sua filosofia propunha a redenção humana pela educação e não pelo constrangimento. Embora abominasse o pecado, Ele amava o pecador e acreditava que educar é despertar o senso da justiça, do amor e da beleza moral que existe, potencialmente, em cada ser humano. Nesse sentido, entre tantos factos de sua vida pública, exemplificou sua tolerância e sua caridade diante da mulher adúltera e do bom ladrão, no alto do Calvário.
          Passados vinte séculos hoje perguntamos qual o significado do seu nascimento para cada um de nós. Sobretudo perguntamos quantos já leram e estudaram o seu Evangelho. Nesse singelo banco escolar que é o planeta,  -- onde ainda somos espiritualmente crianças  -- seu conteúdo é uma cartilha insubstituível para soletrarmos o beabá do amor, da paciência e do perdão. Diante das sabatinas diárias da vida é imprescindível aprendermos o que significa “orar e vigiar” e não fazer a ninguém o que não queremos que nos façam. Quantos são capazes de vivenciar suas lições e seus exemplos, ante as provas e os embates do dia a dia, oferecendo a outra face ante o agressor e perdoando sempre? Se já começamos a ensaiar essa difícil conduta então Jesus já nasceu para nós e temos um Natal para comemorar. Mas muitos ainda trazemos o coração fechado a essa realidade, tais como as estalagens de Belém, cujas portas se fecharam ao seu nascimento.
          Se perguntássemos a Paulo de Tarso onde nasceu Jesus, ele certamente diria que foi diante das Portas de Damasco, onde chegou para aprisionar alguns cristãos da cidade. Se perguntássemos a Maria Madalena onde Ele nasceu, com certeza, responderia que Jesus nasceu para ela na casa de Simão, o fariseu. Foi ali que depois de lavar e enxugar seus pés ela ouviu sua voz compassiva perdoando-lhe os pecados.
  Onde predomina o orgulho e o egoísmo --- essas patologias crónicas da alma humana --- Ele não poderá renascer, ainda que invocado em rituais e ladainhas. É imprescindível que façamos do coração uma manjedoura humilde para que Jesus possa renascer em nossas vidas. Caso contrário, além da beleza sentimental da fraternidade e o significado envolvente do Natal no seio da família, temos apenas uma data histórica para comemorar, com muitos presentes, a figura patética de um Papai Noel, um banquete de sabores e aparências e o apego às ilusões do mundo. " Manoel de Andrade, poeta brasileiro

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Ler o mundo a partir de baixo


 Natal: a História no seu reverso
"Há um testemunho de Kant que diz bem da sua grandeza de filósofo e de homem. Poucos dias antes de morrer - 12 de Fevereiro de 1804 -, confiou a amigos: "Senhores, eu não temo a morte, eu saberei morrer. Asseguro-vos perante Deus que, se sentisse que esta noite iria morrer, levantaria as mãos juntas e diria: Deus seja louvado! Mas, se um demónio mau se colocasse diante de mim e me insinuasse ao ouvido: Tu tornaste um homem infeliz, ah! então seria outra coisa."Afinal, o que é mais importante e decisivo não é a dignidade de todos e a sua felicidade? Não é devido ao seu combate ímpar pela liberdade e dignificação de todos que o mundo se inclina unânime, com respeito, perante a memória de Mandela?Este é também o segredo do Papa Francisco: renovar a Igreja, evangelizá-la, para ela poder, por palavras e obras, evangelizar o mundo: levar a todos a notícia boa e felicitante do Deus de Jesus Cristo. O seu programa de pontificado, na exortação "A Alegria do Evangelho", de que aqui já dei conta, é simplesmente este: o Evangelho. Para isso, há um método, um caminho, uma luz: ler o mundo a partir de baixo, dos pobres, dos excluídos, e agir em consequência, isto é, colocando-se no seu lugar e, a partir desse lugar, que é o lugar de Deus, cumprir a sua missão. Para que todos possam realizar a dignidade de homens e mulheres e alcançar a alegria e a felicidade, para lá do consumismo e materialismo reinantes: "Deus quer a felicidade dos Seus filhos também nesta Terra, embora estejam chamados à plenitude eterna", escreve Francisco. Normalmente, a História é lida a partir dos vencedores, mas a missão da Igreja é lê-la e ensinar a lê-la a partir das vítimas, dos perdedores. Uma revolução das consciências, que, em termos cristãos, se chama conversão, metanóia, mudança de mentalidade e de horizonte.Então, o centro não é a Igreja nem os dogmas nem as leis, mas Cristo, o Evangelho e as pessoas. "Quando a vida interior se fecha nos próprios interesses, deixa de haver espaço para os outros, já não se ouve a voz de Deus, já não se goza da doce alegria do Seu amor, nem fervilha o entusiasmo de fazer o bem. Este é um risco, certo e permanente, que correm também os crentes". "Uma fé autêntica - que nunca é cómoda nem individualista - comporta sempre um profundo desejo de mudar o mundo, transmitir valores, deixar a terra um pouco melhor depois da nossa passagem por ela."A Igreja tem de avançar sem medo. Francisco repete: "Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas fora a uma Igreja doente pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com ser o centro e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos. Mais do que o temor de falhar, espero que nos mova o medo de nos encerrarmos nas estruturas que nos dão uma falsa protecção, nas normas que nos transformam em juízes implacáveis, nos hábitos em que nos sentimos tranquilos, enquanto lá fora há uma multidão faminta", "sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de vida".Afinal, os preceitos dados por Cristo "são pouquíssimos". E Francisco tem um sonho: "Sonho com uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo actual do que à sua autopreservação." Para isso, Francisco convoca todos para uma reforma, a começar pelo papado: "Uma corajosa reforma, que toque tanto o espírito como as estruturas."Se se não quiser ficar só com uma parte minúscula da História - a História dos triunfadores -, é preciso recuperá-la e reconstruí-la na sua maioria: os escravos, os colonizados, as mulheres, os velhos, as crianças, os mortos, os drogados, os humilhados, todas as periferias. Isso: o reverso da História, a História recuperada no seu reverso. Para haver Natal de e da humanidade, como anunciaram os anjos aos pastores pela noite dentro: "Não temais, anuncio-vos uma grande alegria, que será a de todo o povo: nasceu-vos um Salvador". Natal feliz!" Anselmo Borges, em Crónica publicada no DN, 21/12/2013

domingo, 22 de dezembro de 2013

Ao Domingo Há Música

"E o menino com o brilho do sol...
Na menina dos olhos sorri e estende a mão.

Entregando o seu coração...
E eu entrego o meu coração."

O Brasil tem vozes brilhantes que cantam e sabem celebrar a Música. As palavras soltam-se numa cadência suave, mergulhando nos sons que as projectam. Do amor e da vida,  canta  Nana Caymmi numa intensidade que deixa rasto. Com lugar de direito no podium  das vozes maiores do panorama musical brasileiro, Nana Caymmi é uma excelente proposta para as celebrações  que Dezembro sempre requer.

" De volta ao começo" , composição de Gonzaguinha, por Nana Caymmi.


" Dois corações", composição de Ronaldo Bastos na voz de Nana Caymmi.



" Lembra de mim ", um tema de Ivan Lins,  extraído do Álbum "Contemporâneos" (2002), de Dori Caymmi .

sábado, 21 de dezembro de 2013

Em Dezembro

Casablanca

"Regressa às salas o lendário "Casablanca": a reposição, em cópia digital, restaurada, permite-nos reencontrar o mítico par Humphrey Bogart/Ingrid Bergman.
Em boa verdade, Casablanca será tudo menos uma novidade. Produzido em 1942 pelos estúdios Warner Bros., com realização do cineasta de origem húngara Michael Curtiz, consagrando o lendário par Humphrey Bogart/Ingrid Bergman, este é um daqueles títulos regularmente citados, celebrados e reproduzidos (nas cassetes de vídeo, no DVD e, claro, no mais recente e sofisticado Blu-ray).
O certo é que a sua reposição (em salas de Lisboa e Porto) adquire um significado tanto mais importante quanto, por certo, representará para muitos espectadores a possibilidade de ver Casablanca, finalmente, no contexto para o qual foi pensado: o grande ecrã de uma sala escura. Aliás, o acontecimento redobra de significado tendo em conta que o filme reaparece numa cópia restaurada, em formato digital, devolvendo-nos as muitas nuances da notável fotografia a preto e branco assinada por Arthur Edeson."


Les sirènes de la renommée
Éditorial - 19/12/2013 par Laurent Nunez dans Mensuel n°539 à la page 3 (624 mots) | Le Magazine Littéraire
"Il y a de cela cent ans, à Prague, un obscur employé d'une compagnie d'assurances rentrait chez lui chaque soir, seul, pour écrire Le Procès. Il venait de se fiancer, sans grande envie, avec une certaine Felice Bauer. Il s'appelait Franz Kafka.
Se doutait-il, tandis qu'il quittait les bureaux poussiéreux de l'Arbeiter-Unfall-Versicherungs-Anstalt für das Königreich Böhmen, qu'il allait devenir l'un des plus fameux romanciers du xxe siècle, qu'il composait alors une terrible parabole, riche de mille interprétations - et que sa vision de la société allait coïncider avec la société même ? Rien n'est moins sûr. Kafka semble parfois extralucide, tant il a pressenti et décrit notre monde impersonnel, la lourdeur de la bureaucratie, et l'absurde avant l'Absurde ; mais quoique désireux d'écrire, il se sentait toujours très coupable de le faire. On lui doit des phrases noires comme des énigmes : « Dans ton combat contre le monde,seconde le monde », « Dieu ne veut pas que j'écrive ; mais moi, je dois. » C'est par ce combat contre l'Ange que Kafka a gagné le coeur de ses lecteurs. Notre vision du monde s'est moulée dans la sienne. Ce n'est pas sans risque ni abus, comme l'explique drôlement Alexandre Vialatte, son premier traducteur français, son meilleur critique : « II n'est plus de situation qui ne soit devenue "kafkaïenne". Si une mayonnaise rate, c'est la faute de Kafka. » Et c'est ainsi aussi (c'est le K. de le dire) que Vialatte est grand.

Coupable d'écrire ? C'est peut-être ce même paradoxe qui a permis à Pierre Michon, en 1984, de composer le recueil desVies minusculesComment écrire sans se hisser ridiculement sur la pointe de son stylo ? Comment devenir auteur quand on déteste l'autorité ? Les éditions Gallimard viennent de publier les actes d'un colloque de Cerisy-la-Salle, où les meilleurs spécialistes de la littérature contemporaine se sont entretenus avec l'écrivain orléanais. C'est-à-dire : avec ses livres, et la modestie qui leur est propre. Le volume est élégant, précis, construit, jamais pédant. On découvre les carnets de l'écrivain avec Pierre-Marc de Biasi ; on déplie les récits les plus brefs avec Bruno Blanckeman, on caresse des figures avec Dominique Viart. Ah ! Une oeuvre, vraiment, c'est aussi l'ensemble des critiques qui s'ajoute à cette oeuvre. Par ces lectures généreuses, on oublie que les livres sont parfois les enfants de la douleur. Michon, le patron : « La littérature, c'est la galère. Mais la mer est belle. »

Tout le monde connaît Hans Christian Andersen, à qui on doit « Le vilain petit canard », « Les habits neufs de l'empereur », et bien sûr « La petite sirène ». On lui doit également trente pièces de théâtre et beaucoup trop de romans, qu'on ne lit plus, et des poèmes secrets et romantiques, qui parlent de l'exil et de l'enfance, et de la neige qui étouffe les arbres. Voilà qu'on vient enfin de traduire ces poèmes en français. Andersen était comme Voltaire : il pensait avoir donné le meilleur de lui-même en vers ; la postérité a choisi la prose. Mais ses vers (à l'inverse de ceux de Voltaire) ne sont guère mauvais. Il faut les relire lentement, avec bonté et bienveillance - et il nous faut peut-être apprendre à sourire devant notre sentiment de désuétude. En tout cas, l'écrivain danois paraissait très conscient du décalage entre l'écriture d'une oeuvre et sa réception, entre avoir écrit et être lu : « Si d'aventure, tout en haut d'un sapin de Noël/ On suspendait le coeur d'un poète,/ Celui qui le recevrait en cadeau sursauterait à coup sûr :/ "Mon Dieu, ce qu'on m'a donné-là... mais ce n'est rien !" » Des vers parfaits pour ce mois de janvier : à quoi bon suspendre le coeur d'un poète en haut de votre sapin ? Déposez plutôt des livres à son pied."
lnunez@magazine-litteraire.com
Par Laurent Nunez
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Imunoterapia no cancro eleita como avanço mais importante de 2013
por Lusa, texto publicado por Paula Mourato
"O uso da imunoterapia para combater o cancro foi o avanço científico mais significativo em 2013, revela o "ranking" anual da revista Science sobre as dez descobertas mais importantes, hoje divulgado.
Diversos ensaios clínicos de imunoterapia - um tratamento que actua sobre o sistema imunitário, incluindo os linfócitos T, para que ataque os tumores - revelaram-se muito promissores, sobretudo contra os cancros agressivos, como o melanoma, segundo os responsáveis da última edição deste ano da revista, que sai hoje para as bancas.
Um grande número dos avanços em imunoterapia do cancro remonta à descoberta, no final dos anos 80, por investigadores franceses, de um receptor nas células T, que as impede de atacar os tumores cancerígenos com toda a sua força.
Experiências em ratinhos demonstraram que, ao neutralizarem o receptor, as células-chave do sistema imunitário reduziam consideravelmente os tumores cancerígenos nos roedores.
Mais recentemente, em 2006, investigadores japoneses identificaram um novo receptor capaz de travar a acção anticancro das células imunitárias, tendo os primeiros ensaios clínicos em doentes sido promissores, lembra a Science.
Há dois anos, a modificação genética das células T, visando a sua reprogramação para destruir os tumores, suscitou, também, entusiasmo na comunidade médica e foi objecto de um grande número de ensaios clínicos, sobretudo em doentes com leucemia.
De acordo com a Science, sinal da importância do potencial da imunoterapia é que vários laboratórios farmacêuticos estão a investir neste tratamento contra o cancro, depois de o terem ignorado durante anos.
No "ranking" da Science das dez descobertas científicas mais importantes de 2013 figuram, ainda, a técnica de modificação de genes chamada CRISPR, usada para manipular os genes de plantas, animais e células humanas, bem como a biologia estrutural, utilizada pela primeira vez na produção de uma vacina.
A revista destaca, também, a técnica de imagem CLARITY, que torna os tecidos cerebrais transparentes e os neurónios visíveis, os modelos de órgãos humanos cultivados em laboratório, como rins e cérebros, a identificação da origem dos raios cósmicos nas estrelas que explodem (supernovas), a descoberta de que o sono é essencial para o cérebro se limpar, aumentando o espaço entre os neurónios, e os estudos sobre a importância das bactérias que habitam o corpo humano." DN

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

As 10 livrarias mais interessantes do mundo


"María Luisa Fundes, do jornal “ABC”, de Madrid, escreveu pequenos textos sobre as dez livrarias mais interessantes do mundo. “Para os aficionados à leitura, as livrarias são paraísos inigualáveis e incomparáveis.” Lá, entre as estantes, descobre-se o universo, globaliza-se o conhecimento. Muitas pessoas passam horas circulando entre as estantes, folheando e lendo algumas páginas dos livros. Há aqueles que se empolgam com as capas, e até com o papel, por exemplo o pólen (que não gera reflexos). Às vezes entra-se numa livraria com o objectivo de comprar determinado livro, mas, ao perceber um lançamento interessante, o indivíduo o coloca na sua cesta. Pode ser Joyce, Proust, Thomas Mann, Tolstoi, Machado de Assis, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, Bernardo Élis ou Afonso Felix de Sousa. As livrarias bonitas, como as citadas, são uma atracção à parte. El Ateneo, de Buenos Aires, assim como outras, é uma atracção turística. Os apaixonados pelos livros acabam se tornando também apaixonados pela livraria. É raro uma pessoa sair de lá sem fazer ao menos uma fotografia. Trata-se de uma livraria-museu, que já foi um teatro."Revista Bula

1 — El Ateneo, Buenos Aires

María L. Fundes diz que foi “uma ideia genial converter um teatro dos anos 20, já fechado, numa livraria de primeira. El Ateneo, de Buenos Aires, é uma das melhores livrarias da América. A selecção de livros é amplíssima. E o entorno [interno] é inigualável. Permanecem o cenário e o palco. Tudo com novas funções [há um café-restaurante]. Uma maneira brilhante de desfrutar e recuperar edifícios antigos”. Em Março desde ano, ao visitá-la, pude ver que Clarice Lispector é um dos destaques nas mesas.

2 — Galignani, Paris

“Giovanni Antonio Galignani nasceu em 1757, no norte da Itália. Depois de um período em Londres, instalou-se em Paris, onde criou uma pequena editora, abriu uma livraria e fundou um jornal. É a primeira livraria inglesa na Europa fora das ilhas britânicas. Foi instalada na Rua de Rivoli, onde abriu as portas com as melhores selecções de literatura anglo-americana e francesa, assim como uma selecção sem igual de livros de arte e moda”, diz o “ABC.

3 — Selexyz Bookstore, Maastricht


A livraria está instalada num edifício onde funcionou uma igreja de dominicanos. Além de bonita, até “impressionante”, é arejada e tem um café. É apontada como “espectacular”.

4 — Livraria da Vila, São Paulo


O “ABC” nota que São Paulo é a “capital gastronómica e cultural do Brasil”. A repórter elogia a construção arquitectónica, do “genial arquitecto” Isay Weinfeld — as portas são estantes —, e diz que, além de bela, a Livraria da Vila oferece espaço para bate-papo, concertos e exposições.

5 — El Péndulo, México


A livraria, diz o “ABC”, é um espaço amplo e relaxante no qual se pode, além de desfrutar das calorosas [e calorentas] tardes mexicanas, olhar livros, discos e vídeos. “Entre as numerosas livrarias, El Péndulo, situada no elegante bairro de Polanco, na capital azteca, tem o toque original de ter plantas no seu interior.” A livraria oferece concertos, cursos e tem um café-restaurante.

6 — Brentano’s, Paris


“A oferta cultural de Paris é ilimitada.As suas livrarias também. Mas a Brentano’s é diferente: trata-se de uma livraria com quase 120 anos e que oferece um repertório variadíssimo para o leitor multicultural, interessado em ler em vários idiomas”, diz o “ABC”. A livraria é especializada em obras norte-americanas, já que a cadeia de livrarias surgiu nos Estados Unidos. Está “situada na Avenida da Ópera, entre a Ópera Garnier, o Louvre e a Praça Vendôme”. Frequentar a livraria “é uma imersão na cultura universal”, sugere o jornal espanhol, apesar de sugerir a especialização americana.

7 — Rizzoli, Nova York



Segundo o “ABC”, é “uma das livrarias mais simbólicas dos Estados Unidos. O espaço é acolhedor, as luzes ténue, o estilo é retrô e a selecção de livros, fantástica. É uma referência em pleno coração de Manhattan. Os livros de culinária são uma das especialidades desta livraria: o presente perfeito. A colecção completa da magnífica Editora Rizzoli está disponível, junto com uma extensa selecção de livros em italiano”, regista o jornal espanhol.

8 — Lello, Porto


“Lello e Irmão é a livraria mais espectacular de Portugal e uma das mais bonitas do mundo. Situada no centro antigo da cidade do Porto, foi fundada em 1869”, diz o “ABC”. Na sede actual, está desde 1909. A mudança foi feita pelos irmãos Lello, seus segundos proprietários. “A fachada é maravilhosa, mas o interior ainda é mais bonito.” Lá tudo é surpreendente. “No segundo piso são feitas exposições de arte e pode-se desfrutar de um café.”

9 — Shakespeare & Co, Paris


A livraria é pequena mas é das mais charmosas de Paris — era frequentada por Hemingway, Scott Fitzgerald e James Joyce, que era amigo da proprietária (Sylvia Beach editou pela primeira vez o romance “Ulysses”, pai da literatura moderna). O “ABC” diz que a livraria tem um entorno “acolhedor para turistas e sonhadores”. É “situada em frente ao Sena e à catedral de Notre-Dame, está em pleno coração do bairro dos estudantes — o bairro latino. Como muitas das livrarias parisienses mais interessantes, foi fundada por estrangeiros e tem sido amiúde o centro de reunião de escritores de língua inglesa. Os livros proibidos na Inglaterra e nos Estados Unidos sempre estiveram disponíveis”.

10 — Corso Como 10, Milão


“Carla Sozzani, importante personalidade do mundo editorial do sector de revistas na Itália e irmã da poderosa Franca Sozzani, directora da ‘Vogue Itália’, abriu a livraria em 1990. Nessa época, era uma galeria, dedicada principalmente à arte e à fotografia. Depois, ampliada, tornou-se um espaço para o sector de moda, restaurante e livraria. São realizadas no local exposições, concertos e outras actividades culturais. A selecção de livros de moda e fotografia é espectacular”, regista o “ABC”.