Eugénio Lisboa , escritor, poeta ,crítico literário, é também expoente maior das grandes vozes democratas que sabe elevá-la em prol da justiça social , da dignidade humana e da verdadeira Liberdade.
Num tempo em que se perde o leme e se confunde o rumo, Eugénio Lisboa retoma a palavra escrita e lança, com mestria, uma nova carta ao Primeiro Ministro.
Num tempo em que se perde o leme e se confunde o rumo, Eugénio Lisboa retoma a palavra escrita e lança, com mestria, uma nova carta ao Primeiro Ministro.
Sentindo-nos honrados com a transcrição desta Carta Aberta que recebemos de Eugénio Lisboa apresentamos-lhe , com muito apreço, o nosso agradecimento.
SEGUNDA CARTA AO PRIMEIRO MINISTRO DE PORTUGAL
Senhor Primeiro Ministro
Não há muitos dias, dirigi a
V. Exa. uma carta que, como cidadão, entendi dever enviar-lhe. Era uma carta
séria - e para ser levada a sério - , profundamente meditada e que visava dar a V. Exa. uma ideia do
sofrimento que grassa no nosso país, motivado por uma política financeira
fundamentalista e insensata, que tem promovido um sofrimento estéril e,
portanto, beirando o criminoso.
O problema, com este governo
a que V. Exa. preside, é ser constituído por políticos amadores e vastamente
incultos: faltando-lhes cultura (histórica e não só), tendem a não ter
perspectivas e a não mergulhar nas experiências milenares que a História
regista para com ela aprendermos.
O Sr. Ministro das Finanças,
por exemplo, invoca, com ar professoral e quase menosprezante, modelos
“científicos” que, de “científico, nada têm. Um dos ingredientes fundamentais
do universo científico é o princípio da verificabilidade: quando uma hipótese
de trabalho não é verificada pelos arreliadores factos, deve ser abandonada,
procurando-se outra melhor. É aquilo a que Popper chama a “falsificação” da
hipótese que já não serve, para maior proveito da que vem a seguir... O Sr.
Ministro das Finanças tem visto todas as suas hipóteses - que, aliás se resumem a uma: cortar nos
rendimentos dos pobres e da classe dita média – desbaratadas pelos resultados
da aplicação delas. Mas, essas hipóteses, a que chama “modelos”, persiste em aplicá-las
em doses reforçadas. Fazendo este curioso raciocínio: aquilo que é calamitoso,
em doses modestas, é virtuoso, em doses reforçadas. A ciência, é claro, tem
horror a estes comportamentos.
A economia já é uma ciência
relativa (“comportamental”, lembra, e muito bem, o sensato e competente Dr.
Bagão Félix), mas, nas mãos dogmáticas do Sr. Ministro das Finanças, ela não
passa de um dogma religioso, com pés de barro e consequências sinistras.
Falei nos ensinamentos da
História. Se V. Exa., em vez de confiar nas crenças religiosas do Sr. Ministro
das Finanças, se desse ao trabalho de ir ler a intervenção do deputado Victor
Hugo, em 10 de Novembro de 1848, veria que, já nesse tempo remoto, falando de
cortes selvagens que se propunham fazer para o orçamento do ano seguinte, o
grande poeta e realista que era Victor Hugo dizia o seguinte, que traduzo, para
benefício de V. Exa.: “Ninguém mais do que eu, caros senhores, está penetrado
da necessidade urgente de aligeirar o orçamento; simplesmente, na minha
opinião, o remédio para o embaraço das nossas finanças não reside em certas
economias mesquinhas e detestáveis; o remédio estaria, quanto a mim, mais alto
e algures; estaria numa política inteligente e tranquilizadora, que desse
confiança à França, que fizesse renascer a ordem, o trabalho e o crédito, e que
permitisse diminuir, suprimir mesmo as enormes despesas sociais que resultam
dos embaraços da situação.” Repare, Sr.
Primeiro Ministro: o remédio estaria “mais alto e algures” (para nós, naquilo –
Parcerias Público-Privadas, especulações na Bolsa, transferências para fora e
paraísos fiscais, empresas e institutos que alimentam clientelas, etc. etc. –
em que V. Exa. se recusa a mexer, castigando, de preferência, a classe média,
para proteger desavergonhadamente uma falsa elite de falsos empresários). E
repare ainda: “uma política inteligente e tranquilizadora”. Porque se trata
mesmo de tranquilizar um povo levado ao desespero e à beira dos mais
indesejáveis desacatos. As revoluções surgem nestes momentos e sabe V. Exa.
porquê? Leia o nosso Eça, tantas vezes de bom conselho. Diz ele: “As desgraças
das revoluções são dolorosas fatalidades, as desgraças dos maus governos são
dolorosas infâmias.” É quando as pessoas já não toleram a extensão das
“dolorosas infâmias” que se não importam de experimentar o risco das “dolorosas
fatalidades” das revoluções”. E não se apresse V. Exa. a sugerir que estou a
ameaçá-lo (nem para isso tenho poder e, ainda menos jeito e desejo): estou só a
preveni-lo. Não estique demasiado a corda.
O Sr. Ministro das Finanças,
para lhe ser franco, parece-me um ser astral e completamente alienado das
realidades sociais do País. Será um técnico, embora se me afigure fraco em
cálculo e previsão. Mas, a V. Exa., que não é técnico de coisa nenhuma,
cumpre-lhe, ao menos, compensar um pouco, com alguma sensibilidade política e
social (digamos, simplesmente: humana), a total e inquietante insensibilidade
do chanceler das Finanças. Pode ser (quem sabe?) que ainda vá a tempo.
Com os melhores cumprimentos,
Eugénio Lisboa
Uma carta que deveria ser amplamente divulgada!...
ResponderEliminarNão traduz unicamente o pensamento de Eugénio Lisboa, mas muito, muito mais que isso!...
Traduzirá o pensamento da grande maioria dos portugueses nesta hora dramática!