Procuro-te
Procuro a
ternura súbita,
os olhos ou o sol por nascer
do tamanho do mundo,
o sangue que nenhuma espada viu,
o ar onde a respiração é doce,
um pássaro no bosque
com a forma de um grito de alegria.
Oh, a carícia da terra,
a juventude suspensa,
a fugidia voz da água entre o azul
do prado e de um corpo estendido.
Procuro-te: fruto ou nuvem ou música.
Chamo por ti, e o teu nome ilumina
as coisas mais simples:
o pão e a água,
a cama e a mesa,
os pequenos e dóceis animais,
onde também quero que chegue
o meu canto e a manhã de maio.
Um pássaro e um navio são a mesma coisa
quando te procuro de rosto cravado na luz.
Eu sei que há diferenças,
mas não quando se ama,
não quando apertamos contra o peito
uma flor ávida de orvalho.
Ter só dedos e dentes é muito triste:
dedos para amortalhar crianças,
dentes para roer a solidão,
enquanto o verão pinta de azul o céu
e o mar é devassado pelas estrelas.
os olhos ou o sol por nascer
do tamanho do mundo,
o sangue que nenhuma espada viu,
o ar onde a respiração é doce,
um pássaro no bosque
com a forma de um grito de alegria.
Oh, a carícia da terra,
a juventude suspensa,
a fugidia voz da água entre o azul
do prado e de um corpo estendido.
Procuro-te: fruto ou nuvem ou música.
Chamo por ti, e o teu nome ilumina
as coisas mais simples:
o pão e a água,
a cama e a mesa,
os pequenos e dóceis animais,
onde também quero que chegue
o meu canto e a manhã de maio.
Um pássaro e um navio são a mesma coisa
quando te procuro de rosto cravado na luz.
Eu sei que há diferenças,
mas não quando se ama,
não quando apertamos contra o peito
uma flor ávida de orvalho.
Ter só dedos e dentes é muito triste:
dedos para amortalhar crianças,
dentes para roer a solidão,
enquanto o verão pinta de azul o céu
e o mar é devassado pelas estrelas.
Porém eu procuro-te.
Antes que a morte se aproxime, procuro-te.
Nas ruas, nos barcos, na cama,
com amor, com ódio, ao sol, à chuva,
de noite, de dia, triste, alegre — procuro-te.
Antes que a morte se aproxime, procuro-te.
Nas ruas, nos barcos, na cama,
com amor, com ódio, ao sol, à chuva,
de noite, de dia, triste, alegre — procuro-te.
Eugénio de Andrade, "As Palavras
Interditas" 1951, in “ Poesia”, 2ª
ed., revista e acrescentada, Porto:
Fundação Eugénio de Andrade, 2005
Neste soturno Setembro em que tudo parece vedado, a procura impõe-se como forma de não sucumbir.
"...Enquanto o verão pinta de azul o céu / e o mar é devassado pelas estrelas", as palavras, que só um poeta sabe dizer, incitam a caminhar "com amor, com ódio, ao sol, à chuva, / de noite, de dia, triste, alegre ", mas à procura "Antes que a morte se aproxime".
Pavarotti com Monica Naranjo, duas vozes que se conjugam numa sonoridade especial e de muita musicalidade, são também uma boa fonte de energia para este Domingo de um tempo desgastado.
O registo é de 2000 num espectáculo para a Paz, promovido por Pavarotti .
Poesia e Música duas inesgotáveis fontes de prazer. Juntá-las é sublime.
ResponderEliminarSaber juntar Música com o poema de um grande poeta é um acto de grande sensibilidade. A música requer sonoridades, ritmo que o verbo poético encerra brilhantemente no talento de quem sabe manipulá-lo. Eugénio de Andrade tem uma poesia variada e de grande profundidade." Procuro-te" é um desafio constante que ,aqui, aparece acompanhado pelas vozes fabulosas de Pavarotti e Monica Naranjo, uma espanhola talentosa, numa grande ária "Agnus Dei".
ResponderEliminarDivino para um Domingo.
Domingo sem Poesia e Músicas criteriosamente escolhidas, não é um autêntico domingo!...
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