segunda-feira, 30 de abril de 2012

O imperador da língua portuguesa

Padre António Vieira
Do Império do Verbo ao Verbo como Império
"Há quatro séculos nascia em Lisboa, então ainda intacta no seu esplendor barroco, aquele que na ordem da escrita e do espírito seria a expressão mais acabada do seu inconsciente cultural e ideológico barroco: o de uma restauração através da evangelização e conquista espiritual do Novo Mundo da túnica de Cristo dilacerada na Europa pela Reforma luterana e as suas consequências.
Este drama pode parecer-nos hoje quase incompreensível mas este foi o quadro cultural, o pano de fundo, ao mesmo tempo religioso, político e cultural sem o qual a acção «militante», no sentido mais literal do termo, de António Vieira, enquanto pregador, missionário, político, escritor, sonhador de uma reconquista universal sob a bandeira de Cristo para tornar efectivo o «reino de Deus» na Terra, não tem explicação nem leitura. Para nós, portugueses, a sua aura e a sua memória nunca esquecida é, sobretudo, a do seu génio literário que encontraria sob a pluma do autor da Mensagem uma consagração mítica. Na evocação de Pessoa, Vieira «é o imperador da língua portuguesa».
Esta coroação de Vieira por Pessoa não releva de qualquer extravagância, nem é uma conversão à estética que o autor dos Sermões ilustrou. É tão só a homenagem da sua adolescência repatriada do Longe e comovida até às lágrimas pela leitura de uma passagem famosa de um dos seus Sermões referida no Livro do Desassossego:
«Não choro por nada que a vida traga ou leve. Há porém páginas da prosa que me têm feito chorar. Lembro-me, como do que estou vendo, da noite em que, ainda criança, li pela primeira vez numa selecta, o passo célebre de Vieira sobre o rei Salomão: “Fabricou Salomão um palácio...” E fui lendo até ao fim. Aquele movimento hierático da nossa clara língua majestosa, aquele exprimir das ideias nas palavras inevitáveis, correr de água porque há declive, aquele assombro vocálico em que os sons são cores e ideais, tudo isso me toldou do instinto como uma grande emoção política.»
Pessoa fecha o seu texto celebrando a «grande certeza sinfónica» da prosa teatral de Vieira. Podia ter dito arquitectónica que o é também, embora dúctil como a cera, tão firmes são as suas articulações. Essa essência teatral nada tem de formal no sentido comum e muito menos de formalista. Vieira é um pregador da palavra divina. É mesmo o pregador-mor dessa palavra na nossa língua. Como o será um dia na latina ou italiana na presença do Papa ou da Rainha Cristina. Uma «palavra acto» para um público umas vezes o mais selecto, o da Corte e do Culto, a quem leccionou com ironia, outras vezes o dos nossos colonos da Baía ou do Maranhão, com os seus escravos. Em vários sentidos, diante de auditórios pouco dispostos a ouvir de viva voz os seus requisitórios implacáveis, ou tendo dificuldade em compreender as parábolas pouco amenas com que lhe censura a crueldade, a inumanidade, a nenhuma caridade com que tratam os índios ou os negros escravos, António Vieira aplica-se a si mesmo a palavra de João Baptista: «Voz clamando no deserto».
Tudo é extraordinário na vida de António Vieira, mas nada mais extraordinário que ouvir a sua voz sublimar-se em S. Luís do Maranhão no famoso Sermão de Santo António (o dos Peixes) diante de um auditório modesto ou ignaro, como se estivesse em S. Roque onde a aristocracia da Corte e a gente letrada mandava estender tapetes para marcar lugar.
O maior sonhador que Portugal ouviu - e o maior dos seus sonhos foi o de um Portugal como digno do império de Cristo, reino de paz e equidade - era, como sabemos, homem do mundo quando o novo Rei do país restaurado recorreu aos seus dons de diplomata à James Bond, com o seu quê de maquiavélico (lembra Hemâni Cidade e mesmo Vitorino Nemésio), mas podia ser isso tudo porque de uma vez por todas, tinha aceite e assumido que na perspectiva de Deus «tudo era nada». A glória e a luz de Deus que na palavra divina estão contidas: é a única palavra que o pregador deve escutar para existir. Ou antes para ser.
A autonomia do Verbo em Vieira - pese à admi­ração que o seu famoso estilo pode suscitar - nada tem de nominalista, assimilando o ser-da-verdade à Linguagem, como se Vieira fosse, por antecipação um Wittengenstein do séc. XVII, Se a linguagem é para ele, por assim dizer, o campo visível e so­noro da verdade, ou mesmo casa do ser, é apenas como Verbo encarnado - e só nessa medida. O que, entre nós, não é audácia e vertigem menor do que supor que os limites do nosso pensamento são os limites da nossa linguagem. Como um S. Paulo da sua época, a pregação em que se investiu com uma paixão demasiado humana, como os seus inimigos e a mesma Inquisição lhe lembrariam, ao serviço militante de um Verbo de Deus encarnado, não é uma realidade de leitura óbvia, como a da experiência, Só o diagrama das suas vozes, como nota António José Saraiva, o confronto entre elas, permite desocultar um sentido capaz de esclarecer o enigma da História que fazemos e nos desfaz, na expectativa de uma revelação futura, sempre adiada, em que a humanidade acordará dos seus sonhos sempre falhados - ou pesadelos - para um eterno Dia.
No século chamado do Génio - o século de Descar­tes, de Pascal, de Leibniz, de Newton, mas também de Espinosa - aquele em que pela primeira vez o ateísmo adquire expressão cultural, traduzindo o discurso santo, a palavra de Deus, para verbo único e virtualmente humano, Vieira, como um louco de Deus, não tem outro código para ler e pregar a Verdade divina-profana, que o do Antigo Testamento e dos Evangelhos. Conhecia-os de cor e podia recorrer a eles tanto na prisão como na selva brasileira. Pode aplicá-lo a todas as circunstâncias, as mais triviais ou as mais graves, da ordem política, da ordem religiosa ou filosófica.
Os seus Sermões são quase como capítulos de um romance alegórico cheio de notações biográficas, de recriação quase teatral das cenas míticas da Bíblia ou dos Evangelhos com autênticos ensaios sobre a situação precária da economia do Reino e do dever que tinham os Estados da Nação de contribuir para a sua defesa pagando ou sobre o Amor divino, dignos de uma Carte du tendre, mística como a das grandes amorosas do século que não foi só o da Razão mas do mais ardente e sublime erotismo, aquele que só tem por objecto o Amor mesmo
Para o autor dos Sermões, que é também actor deles, o texto da realidade - a vivência e o sentido dela - coincide com o texto sagrado, lido e interpretado na luz que ele próprio é e significa. É um código universal que se pode e deve aplicar a todas as circunstâncias, não código profano do conhecimento mas substância da palavra que salva e edifica. A cultura que ele exprime ou traduz não é oposta à do verbo profano - Vieira, filho da Companhia, procede também da nova cultura humanista e tem-na em conta, Mas em última análise é um espírito oposto ao Mundo, em suma, um contra­discurso desse Mundo, seara infinita de palavras alheadas da mensagem evangélica e destinado a convertê-lo.
Em sentido literal, os Sermões são propaganda fide teatralizados, dignos filhos de uma cultura já em representação e em si mesma espectáculo: a primeira versão do que será, séculos mais tarde, a existência social e cultural do Ocidente como divertimento no sentido pascaliano do termo. O púlpito é um ‘teatro ao divino’ onde os auditores, seduzidos por toda a espécie de tentações - não só a do poder, da riqueza e das múltiplas seduções do espírito ou do corpo - vêm para, virtualmente, ser desenganados. O século ibérico foi por excelência o século do Desengano, o século de D. Quixote e do seu combate perdido - salvo no céu da nostalgia - só redimível e transfigurado pela sua loucura heróica. O antigo tempo cristão estava-se volvendo quimérico. Pelo menos, na Europa.
No Novo Mundo nem isso. Era um mundo sem notícia da Revelação, Este será sempre um tema de meditação e perplexidade para Vieira, o de pregar a uma humanidade que não só não recebera nunca a mensagem redentora de Cristo, mas vivera séculos sem ter notícia dela. Foi na resposta a esta questão, nova na cultura humana que define o Ocidente, que Vieira se empenhou como em nenhuma pois determinou a sua outra vocação e condicionou o destino que será o seu enquanto novo apóstolo de Cristo num tempo novo. Aquele que a descoberta do Novo Mundo sem notícia de Cristo tanto como da Lei natural que o mesmo paganismo conhecera, vive e morre sem redenção.
Esta questão preocupara a cultura europeia no primeiro meio século após as Descobertas. Nessa época Las Casas travara um combate épico para reconduzir a nova humanidade - tão duvidosa na sua identidade - à civilização cristã. O combate de Las Casas foi muitas vezes evocado - sobretudo no século XIX liberal - como o de um herói romântico. Foi um combate realmente heróico, tenaz, conduzido em nome de uma tradição teológica, jurídica, perfeitamente ortodoxa. A sua famosa defesa dos Índios guardará para sempre a marca de uma cultura católica ainda unificada, de profunda ressonância medieval, quer dizer, escolástica no seu discurso e ainda candidamente cristã na sua finalidade,
O tempo de António Vieira é já outro. Em todos os campos (teológico, ético ou político) o tempo barroco não é, como temos tendência a imaginá-lo, fechado sobre si mesmo, cerrado, como uma fortaleza integrista, mas um tempo dividido, inquieto. A Fé post-tridentina comporta uma nova tonalidade, onde a vontade joga um papel decisivo. Decerto a Igreja conserva em si todos os seus tempos. A da Companhia, a de António Vieira apresenta-se desde o início como Igreja militante. E, por assim dizer, navegante. Ainda a Companhia não fora confirmada e já Francisco Xavier estava a caminho do Oriente. Num sentido apenas metafórico ela é a guarda pretoriana de uma Igreja em luta consigo mesmo e de uma Europa em parte «perdida» para ela.
Na óptica de Vieira só a Providência teria o poder graças a esta milícia por excelência, de remediar essa ferida a nenhuma outra parecida, pois não procedera simplesmente do espírito de discórdia sempre activo no mundo, mas do próprio Deus, senhor do mundo e da História. A História, na visão cristã, continuava a depender do pecado original que a tinha posto em marcha, suspensa do interior pelo sacrifício do mesmo Deus, agora encarnado. Contudo, um fenómeno como o do protestantismo devia aparecer a um homem como Inácio de Loyola e, de certa maneira, a António Vieira, mais ardente e veemente que o fundador, como uma espécie de segunda Queda.
Vieira vai convertê-la em ocasião de nova ressurreição, quase num começo de nova era, com essa humanidade índia aparentemente imune ao pecado original, embora ignorante de revelação cristã, mas também ignorante dessa cultura moderna que sob o nome da Reforma dilacerara na Europa a túnica inconsútil de Cristo. E nisto consistia a segunda Queda. Como a primeira se redimira pela encarnação e sacrifício do Filho de Deus, esta requeria um novo Homem e, porque não, um segundo e definitivo triunfo de Cristo. Não nesta terra - como um dia a Inquisição lhe censurará - mas num «mundo-outro», espaço tempo ainda não desvendado de que a espera de tantos milhares de almas, em terras desconhecidas seria o anúncio paradoxal.
Ninguém mais que António Vieira parecia predestinado em tempos ainda mais incertos que os dos primeiros apóstolos da Companhia (Francisco Xavier, os Mártires do Japão), para ser o laço entre os dois mundos, o da Europa meio perdida e o Brasil. Ele não podia ser, em sentido preciso, o apóstolo do Brasil - essa terra que era também a sua, pela educação e pelo coração - pois os tempos de Manuel da Nóbrega e de Anchieta que venerou tinham passado. Mas podia ser o seu «conversor» - passe a expressão - e, de uma certa maneira o seu salvador. O Brasil será, sobretudo, a terra e o tempo da sua provação depois de ter sido o da sua revelação fulgurante de orador sagrado. Foi também o tempo da sua expiação - e assim percebido por ele - após a sua vida de homem do mundo. A Provação será menos a de sofrer e combater o ódio dos colonos, a quem a defesa da dignidade dos índios indispunha, que um combate de outra ordem: o de arrancar esse amados Índios que ele quixotescamente imaginava como pedras vivas de um reino isento naturalmente do pecado, a uma perdição tão fatal como a do homem branco e a sua idolatria do Poder e do Ouro.
António Vieira é uma mistura incomparável de sonhador por conta de um Reino futuro idealmente cristão e um não menos agudo observador da realidade. É para maior glória de Deus - e de algum modo para emendar esse estranho silêncio do abandono em que esse Deus tinha deixado uma parte da humanidade - que Vieira se esforça por salvar esses índios, cujos hábitos, depois da visão angelista que a piedade lhe sugerira, lhe eram pouco menos do que intoleráveis. Idealizá-los, de longe, como Montaigne, só requer abertura de espírito. Aceitá-los como próximos - aceitá-los todos como próximos e quase em sentido físico do termo, é mais que graça de Deus. Mas isso não o impede de ser justo e de se impressionar com a preocupação das questões que os Índios lhe colocam.
Na sua relação sobre a experiência no Maranhão o que nos surpreende é a voz do Índio, As suas «falas» são-nos presentes sob a forma de sonhos, quer como manifestações da «graça» quer como temíveis embustes do demónio. Através desses sonhos e das questões postas pelos Índios, pondo em causa a visão que os missionários lhe querem fazer partilhar, como que ouvimos a voz do mesmo António Vieira, perplexa, suspensa no mais profundo dele mesmo, entre a ofuscação da Luz e das Trevas.
Como se ele fosse um Voltaire inconsciente, Vieira empresta aos seus «cândidos» Índios uma lucidez terrível na sua recusa de aceitar os mistérios ou as crenças, a seus olhos inaceitáveis, ou repugnantes, como a do Inferno.
Nem sempre é fácil colocarmo-nos no lugar desse estranho e genial semeador da palavra de Deus que rejubila – por desespero talvez – quando as crianças baptizadas ou adultos apenas convertidos morrem cedo. É verdade que Vieira descreve o mundo real que deixaram como um autêntico Inferno. Isto é menos estranho se nós imaginarmos o sentimento pessimista que impregna a visão barroca do mundo. Nada espanta que as orações fúnebres da época, de Bossuet a Vieira, se tenham tornado o exemplo dessa visão sobre o duplo registo da nulidade deste mundo e do esplendor do outro. Mas o que na Europa relevava de uma dramaturgia cultural perfeitamente inteligível, tinha nos sertões do Maranhão qualquer coisa de surreal, onírico, quase insensato. Ópera ou requiem sem espectadores. Excepto Deus. E isso bastava a estes homens que, como Vieira, estavam confrontados com uma humanidade resistente à sua oferenda caridosa e buscavam, consciente ou inconscientemente, o martírio.
Há qualquer coisa de fantástico na aventura missionária de Vieira. Compreende-se que o autor-actor desta gesta condenada ao insucesso ou a um sucesso mitigado, segundo a opinião do mundo, seja o mesmo que consagra a sua História do Futuro ao pensamento de um mundo outro, ao verda­deiro reino de Deus, de que ele seria o novo Isaías. O sonho de um Quinto Império, a meio caminho entre o Céu e a Terra, realizando os desígnios de Deus, segundo Vieira, tem já uma longa tradição entre nós. Esse desígnio de impor a Lei de Cristo ao mundo inteiro era há séculos o dos reis de Portugal. Com ele transfigura Vieira a sua vocação de semeador, mais ou menos bem sucedido, do verbo de Deus, que é também o do fracasso futuro, pelo menos aparente, da própria Companhia no Novo Mundo.
Relacionar a visão de Vieira do Quinto Império com outros sonhos messiânicos ou utopias de que a cultura do Ocidente está cheia, não esclarece muito, Ela é antes o produto acabado do sonho imperial português no momento exacto em que Portugal sai do seu cativeiro da Babilónia e em que o imperialismo new look da nova Europa protestante se espalha pelo mundo, O império de Portugal, o seu império real, entra docemente no seu crepúsculo. Mas sob este sol poente, brilha um outro império, oposto ao mundo, como o sonhará Pessoa, o mesmo império que Vieira, apóstolo de um Deus ao mesmo tempo omni­potente e insondável, erige sobre «os destroços da realidade».
Com estes restos - a sua experiência de glória humana e de fracasso - ajudado não só pelos seus dons visionários mas por uma língua que nunca acabará de espantar e fazer sonhar os que penetram no seu jardim de parábolas vivas e de metáforas, Vieira oferece-nos a essência de uma Palavra que não pode aprender o sentido da realidade se não no espelho de Deus. Como sua sombra. Foi desta sombra enigmática que ele fez para os seus leitores, ou ouvintes, uma luz perpétua." Eduardo Lourenço
Texto lido na sessão de homenagem ao Padre António Vieira, Academia das Ciências de Lisboa, 06.02.2008

domingo, 29 de abril de 2012

Ao Domingo há Música

Quando a voz é sublime basta-se à sua própria  sonoridade para transmitir tudo aquilo que se  procura numa melodia. June Tabor  é essa voz e, em " Across the Wide Ocean " do Álbum "Ashore", revela como é possível e suficiente ouvi-la com um imenso deleite, apenas acompanhada ao piano.  

sábado, 28 de abril de 2012

As minhas ilusões


Hora sagrada dum entardecer
De Outono, à beira-mar, cor de safira,
Soa no ar uma invisível lira...
O sol é um doente a enlanguescer...

A vaga estende os braços a suster,
Numa dor de revolta cheia de ira,
A doirada cabeça que delira
Num último suspiro, a estremecer!

O sol morreu... e veste luto o mar...
E eu vejo a urna d’oiro, a baloiçar,
À flor das ondas, num lençol d’espuma!

As minhas Ilusões, doce tesoiro,
Também as vi levar em urna d’oiro,
No mar da Vida, assim... uma por uma...
Florbela Espanca, in " Livro de Mágoas "*, Bertrand Editora

* " Livro de Mágoas " é a primeira obra de Florbela Espanca a ser publicada  . Foi editada em Junho de 1919, na Tipografia Maurício, em Lisboa por Raul Proença,crítico literário muito prestigiado.

Numa burocracia, o chefe é o chefe

Os inteligentes construíram o mundo, os estúpidos vivem à grande

Nas « hierarquias de poder » a mesma ordem burocrática que sufoca a criatividade e a originalidade  estabelece a escala dos « méritos pressupostos », da qual não se pode discordar a não ser pondo em causa os próprios alicerces da sociedade. A estrutura hierárquica elimina a necessidade de distinguir os seres humanos na base das suas qualidades, dos seus talentos.
Numa burocracia, o chefe é o chefe, porque ocupa a posição de chefe, e não porque seja o melhor. Pode perfeitamente ser o mais estúpido que o último moço de fretes: isso não quer dizer nada, é ele quem manda – porque ele é o chefe. Os sargentos não são necessariamente mais imbecis que os simples soldados ; mas são os distintivos que lhes enfeitam as mangas ou os ombros que lhes conferem a autoridade de comando.
Os juízos de valor brilham pela mais completa ausência nos sistemas burocráticos, porque a estrutura hierárquica os tornou inúteis e consagrou assim o fim da vantagem constituída pela inteligência.
A imbecilidade está no poder. E o poder não precisa de génio.
Mas trabalha em seu próprio benefício, tende a imprimir  a sua própria imagem no mundo circundante e a multiplicar a estupidez, da qual extrai a sua razão de ser. (…)
Todos os regimes cuidam de sufocar a inteligência, que não só é desnecessária nos termos de seja que forma for de organização, mas constitui, além disso, um factor adverso e, por conseguinte, uma ameaça. As pessoas de bom senso, por exemplo, põem-se interrogações assustadoras, subversivas. Do tipo : « É possível que logo seja este cretino o meu chefe? ». ( Possível e mais que possível ). « Mas não haveria ninguém mais capaz para uma missão tão delicada ? » ( Havia, é quase certo, mas não era isso que interessava ). As ditaduras suprimem a liberdade de pensamento ( e, com frequência, também o pensador ). Em democracia cada cabeça vale um voto, ainda que se trate de uma cabeça oca. Todas as formas de domínio procuram impor a uniformidade dos pensamentos, dos desejos, do mesmo modo que visam massificar os indivíduos e vinculá-los a um modelo comum de imbecilidade.
Tal é a essência do poder. Que resulta das escolhas evolutivas e culturais da nossa espécie. O « homem-massa » da moderna sociedade industrial (  dissuadido de pensar, ensinado a alimentar desejos idênticos aos dos seus semelhantes, porque impostos por sistemas de condicionamento extremamente eficazes ), o homem que se limita a saber desempenhar uma função, é o produto de um processo evolutivo que dura há milénios e se orienta para a repressão da inteligência. Quem diz: « não me agrada , considera : « a evolução confundiu tudo. » será verdade ?

                           Pino Aprile, in “ELOGIO DO IMBECIL“, Edições Dom Quixote

quinta-feira, 26 de abril de 2012

O Tempo

PASSADO
Passou o vento, passou o dia,
passou a noite e a manhã.
passou o tempo, passou a gente,
passou cada hora de amanhã;

passou um canto esquecido
nos cantos de cada passo,
passou ao dizer que passo
sem se lembrar do compasso;

passou a vida como se nada fosse,
só passou e foi-se embora,
passou à pressa sem demora,
e passou tudo a quem ficou;

e se mais não passou
no fim de tudo ter passado,
foi porque algo se passou
no último passo que foi dado.
Nuno Júdice, in “Geometria Variável”, Ed. Dom Qixote, Lisboa 2005

Desafinado


Se você disser que eu desafino, amor
Saiba que isso em mim provoca imensa dor
Só privilegiados têm ouvido igual ao seu
Eu possuo apenas o que Deus me deu


Se você insiste em classificar
Meu comportamento de antimusical
Eu mesmo mentindo devo argumentar
Que isto é bossa nova
Que isto é muito natural


O que você não sabe nem sequer pressente
É que os desafinados também têm um coração
Fotografei você na minha Rolleyflex
Revelou se a sua enorme ingratidão


Só não poderá falar assim do meu amor
Ele é o maior que você pode encontrar viu
Você com a sua música esqueceu o principal
Que no peito dos desafinados
No fundo do peito bate calado
Que no peito dos desafinados
Também bate coração.
Tom Jobim & Newton Mendonça, 1958

João Gilberto e Caetano Veloso em " Desafinado" numa excelente interpretação, afinada e harmónica,em Buenos Aires, Argentina, num concerto de 2000.
   

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Revolução



Como casa limpa
Como chão varrido
Como porta aberta

Como puro início
Como tempo novo
Sem mancha nem vício

Como a voz do mar
Interior de um povo

Como página em branco
Onde o poema emerge

Como arquitectura
Do homem que ergue
Sua habitação

Sophia de Mello Breyner Andresen, in "O Nome das Coisas", Editorial Caminho

terça-feira, 24 de abril de 2012

Camus e a resistência francesa

Em 25 de Agosto de 1944, após quase cinco anos de ocupação nazi, Paris foi libertada pela 2ª Divisão Blindada francesa e pela 4ª Divisão de Infantaria dos Estados Unidos.
Albert Camus foi um dos grandes da resistência francesa que lutou  contra a ocupação alemã. Como Director do jornal " Combat " não se coibiu de  lançar a palavra contra a opressão, fazendo-o circular obstinadamente  apesar de todos os perigos da guerra prossecutória alemã.
E para que a memória não se apague, recorda-se o que Camus escreveu em 22 de Agosto de 1944:
"Foram necessários cinco anos de luta obstinada e silenciosa para que um jornal nascido do espírito de resistência débil e ininterrupto, no meio de todos os perigos da clandestinidade, pudesse finalmente circular às claras, numa Paris liberta de sua vergonha. Não se pode escrever isso sem emoção. Esta alegria confusa que começamos a ler nos rostos dos parisienses é também a nossa. Mas a tarefa dos homens da resistência não terminou. Houve o tempo da provação, e estamos vislumbrando o seu fim. É fácil para nós acolher um tempo de alegria. Em nossos corações ela toma o lugar que a esperança ocupou durante cinco anos. A ela também seremos fiéis". Albert Camus

segunda-feira, 23 de abril de 2012

No dia Mundial do Livro

O homem que lê

"Eu lia há muito. Desde que esta tarde
com o seu ruído de chuva chegou às janelas.
Abstraí-me do vento lá fora:
o meu livro era difícil.
Olhei as suas páginas como rostos
que se ensombram pela profunda reflexão
e em redor da minha leitura parava o tempo. —
De repente sobre as páginas lançou-se uma luz
e em vez da tímida confusão de palavras
estava: tarde, tarde... em todas elas.
Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já
as longas linhas, e as palavras rolam
dos seus fios, para onde elas querem.
Então sei: sobre os jardins
transbordantes, radiantes, abriram-se os céus;
o sol deve ter surgido de novo. —
E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança:
o que está disperso ordena-se em poucos grupos,
obscuramente, pelos longos caminhos vão pessoas
e estranhamente longe, como se significasse algo mais,
ouve-se o pouco que ainda acontece.

E quando agora levantar os olhos deste livro,
nada será estranho, tudo grande.
Aí fora existe o que vivo dentro de mim
e aqui e mais além nada tem fronteiras;
apenas me entreteço mais ainda com ele
quando o meu olhar se adapta às coisas
e à grave simplicidade das multidões, —
então a terra cresce acima de si mesma.
E parece que abarca todo o céu:
a primeira estrela é como a última casa. "

Rainer Maria Rilke, in ” O Livro das Imagens”, Relógio D'Água

domingo, 22 de abril de 2012

Ao Domingo Há Música

As velas da memória

(…)Quando aonde foi em que país?
Que vento faz quebrar nas costas destes dias
as ondas de uma antiga música que ouvida
obriga a recuar a noite prometida
em círculos quebrados para além das dunas
fazendo regressar rebanhos de alegrias
abrindo em plena tarde um espaço ao amor?
Que morte vem matar a lábil curva da dor?
Que dor me faz doer de não ter mais que morrer?

E ouve-se o silêncio descer pelas vertentes da tarde
chegar à boca da noite e responder

Ruy Belo, in  “Aquele Grande Rio Eufrates”, Editorial Presença


 Escutar "Mythodea, Movement 9, music for the NASA Mission Mars  Odyssey 2001" de Vangelis, nas vozes de Jessye Norman e Kathleen Battle,  talvez faça regressar rebanhos de alegria , neste penúltimo  Domingo  de Abril .

sábado, 21 de abril de 2012

A situação pode tornar-se explosiva

O efeito de Mateus
 Por Anselmo Borges
Significativamente, os mestres religiosos foram advertindo particularmente contra a ganância, que leva à corrupção, à opressão, à injustiça, à violência e à morte.
Ficam aí, a título de exemplo, três textos famosos do Evangelho segundo Lucas e São Mateus. Não se esqueça que Mateus sabia bem do que falava, pois tinha sido chefe de cobradores de impostos.
1. A primeira parábola é a do administrador infiel. Um homem rico tinha um administrador, que foi denunciado por ter dissipado os seus bens. Chamado a prestar contas e percebendo que ia ser demitido, reflectiu: "Que farei, visto que o meu patrão me tira o emprego? Lavrar a terra? Não posso. Mendigar? Tenho vergonha. Já sei o que vou fazer, para que haja quem me receba em sua casa, quando for despedido. Chamou, pois, separadamente, a cada um dos devedores do seu patrão e perguntou ao primeiro: Quanto deves? Ele respondeu: Cem medidas de azeite. Disse-lhe: Toma a tua conta, senta-te depressa e escreve: cinquenta. Depois, perguntou ao outro: Tu, quanto deves? Respondeu: Cem medidas de trigo. Disse-lhe o administrador: Toma os teus papéis e escreve oitenta."
Quando se olha para o descalabro de bancos, défices brutais em obras públicas, corrupções em cadeia, conhecidas e desconhecidas, somos levados a perguntar quantas vezes esta parábola se tornou realidade entre nós. Até sem papéis.
2. A segunda parábola é a dos talentos. A um foram dados cinco talentos - talento era uma unidade monetária. E ele, negociando, ganhou outros cinco. O que recebeu dois ganhou outros dois. O que recebeu apenas um, foi cavar a terra e escondeu o dinheiro do seu senhor.
Quando o senhor voltou, prestaram contas. E os que tinham recebido cinco e dois talentos ouviram a sentença: "Muito bem, servo bom e fiel; já que foste fiel no pouco, confiar-te-ei muito. Vem regozijar-te com o teu senhor." Mas o que recebeu um só talento disse: "Senhor, sabia que és um homem duro, que colhes onde não semeaste e recolhes onde não espalhaste. Por isso, tive medo e fui esconder o teu talento na terra. Aqui está, toma o que te pertence." Sentença do senhor: "Servo mau e preguiçoso! Sabias que colho onde não semeio e que recolho onde não espalhei. Devias, pois, levar o meu dinheiro ao banco e, à minha volta, eu receberia com os juros o que é meu. Tirai-lhe este talento e dai-o ao que tem dez."
E seguem-se estas palavras terríveis: "Ao que tem dar-se-á e terá em abundância. Mas ao que não tem até o que tem lhe será tirado."
Ora, não é esta a lógica da Banca? Não se trata, evidentemente, de modo nenhum, de legitimar a preguiça e a inépcia. Mas não é uma constatação: os ricos cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres? Aí está o que os sociólogos denominam, precisamente a partir da parábola, o "efeito de Mateus": quem leu mais em criança tem mais possibilidades em adulto; com trabalhos e resultados iguais, os cientistas mais famosos serão mais citados do que os menos famosos; quem mais tem, em princípio, aumentará constantemente a sua riqueza.
3. Mas, no Evangelho, depois destas parábolas, vem o Juízo Final. Do que se trata é de revelar o essencial da história do mundo, na perspectiva de Deus. E o decisivo não são actos de culto, mas a justiça e a solidariedade : "Vinde, benditos de meu Pai, tomai posse do Reino que vos está preparado, porque tive fome e destes-me de comer; tive sede e destes-me de beber; era peregrino e acolhestes-me; nu e vestistes-me; enfermo e visitastes-me; estava na prisão e viestes ver-me."
Os justos não sabiam: "Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, com sede e te demos de beber, peregrino e te acolhemos, nu e te vestimos, enfermo ou na prisão e te fomos visitar?" E Cristo: "Todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos foi a mim mesmo que o fizestes." O que se faz ao outro é feito a Cristo.
Entretanto, parece confirmar- se cada vez mais o "efeito de Mateus": não está o fosso entre os ricos e os pobres cada vez mais fundo? Cuidado! A situação pode tornar-se explosiva.
Anselmo Borges em Artigo de Opinião publicado no DN de 21/04/2012

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Angola em imagens I

Angola é um país multicolor, verdejante, árido, luxuriante, diverso e sempre surpreendente. De Cabinda ao Cunene, o olhar perde-se na riqueza da oferta, na desmesura do contraste. Em cada paisagem, em cada lugar, em cada rosto está sempre uma imagem inédita. Retratar Angola é querer apanhar o infinito.
Em jeito de insensata ousadia, apresenta-se um parco registo que  pretendeu  apenas fixar  retalhos dessa imensa  e  bela diversidade.






quinta-feira, 19 de abril de 2012

Queria escrever-te uma carta

Carta de um contratado
Eu queria escrever-te uma carta
amor,
uma carta que dissesse
deste anseio
de te ver
deste receio
de te perder
deste mais bem querer que sinto
deste mal indefinido que me persegue
desta saudade a que vivo todo entregue…

Eu queria escrever-te uma carta
amor,
uma carta de confidências íntimas,
uma carta de lembranças de ti,
de ti
dos teus lábios vermelhos como tacula
dos teus cabelos negros como dilôa
dos teus olhos doces como maboque
do teu andar de onça
e dos teus carinhos
que maiores não encontrei por aí…

Eu queria escrever-te uma carta
amor,
que recordasse nossos tempos a capopa
nossas noites perdidas no capim
que recordasse a sombra que nos caía dos jambos
o luar que se coava das palmeiras sem fim
que recordasse a loucura
da nossa paixão
e a amargura da nossa separação…

Eu queria escrever-te uma carta
amor,
que a não lesses sem suspirar
que a escondesses de papai Bombo
que a sonegasses a mamãe Kieza
que a relesses sem a frieza
do esquecimento
uma carta que em todo o Kilombo
outra a ela não tivesse merecimento…

Eu queria escrever-te uma carta
amor,
uma carta que ta levasse o vento que passa
uma carta que os cajús e cafeeiros
que as hienas e palancas
que os jacarés e bagres
pudessem entender
para que o vento a perdesse no caminho
os bichos e plantas
compadecidos de nosso pungente sofrer
de canto em canto
de lamento em lamento
de farfalhar em farfalhar
te levassem puras e quentes
as palavras ardentes
as palavras magoadas da minha carta
que eu queria escrever-te amor….

Eu queria escrever-te uma carta…
Mas ah meu amor, eu não sei compreender
por que é, por que é, por que é, meu bem
que tu não sabes ler
e eu – Oh! Desespero! – não sei escrever também
António Jacinto, poeta angolano, in “ Poemas”

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Fernando Pessoa quase autobiográfico

José Paulo Cavalcanti Filho, Advogado no Recife, consultor da Unesco e do Banco Mundial,  ex-Ministro da Justiça,  membro da Academia Pernambucana de Letras escreveu “ Fernando Pessoa – Uma quase-autobiografia”. Esta  monumental obra sobre a vida de Fernando Pessoa chega às livrarias a 19 de Abril, com chancela da Porto Editora.
José Carlos de Vasconcelos apontou, na apresentação à edição portuguesa, que este é «um livro absolutamente invulgar, extraordinário, "apaixonado" e que as centenas de páginas que tem, «se lêem como um romance, acrescentam muito ao conhecimento do percurso existencial de Pessoa e dos que lhe são próximos». O jornalista e director do Jornal de Letras salienta ainda a inteligência e a seriedade da investigação, ressalvando, porém, o possível cariz controverso de certas conclusões.

No Brasil, a revista Veja considerou “Fernando Pessoa – Uma Quase- Autobiografia” «a mais completa e detalhada reconstituição que jamais se fez da vida do autor». Mas este livro foi notícia também em Espanha. O El País revelou que contém «novidades surpreendentes sobre o genial poeta português» e que colocou o «mundo das letras em polvorosa». Na generalidade dos artigos, merecem elogio o esforço notável de pesquisa por parte do autor, a amplitude da obra – personalidades como Richard Zenith, Tereza Sobral Cunha, Eduardo Galeano ou Millôr Fernandes também o confirmam – e o facto de esta conseguir desmontar mitos e lendas em torno de Pessoa.
A obra vista pelo autor
«Este livro, pois, não é o que Pessoa disse, ao tempo em que o disse; é o que quero dizer, por palavras dele. Com aspas é ele, sem aspas sou eu (…).
Não é um livro para especialistas, por já terem, à disposição, páginas demais. Que contam seus poemas octossilábicos, ano a ano — três em 1919, seis em 1920, e por aí vai; ou os advérbios de modo usados, equivalentes a 2,94% das frases de sua obra; ou estudam o uso do vocativo nos seus versos; ou examinam cada palavra de Mensagem — após o que se sabe haver, no livro, dez com 13 sílabas; ou sustentam que castelos, espadas, gládios e padrões, expressões nele tão frequentes, seriam símbolos fálicos; ou relacionam o horizonte paradigmático que modifica o buraco negro da luz ofuscante da melancolia de Bernardo Soares com as teorias de um filósofo alemão da Escola de Frankfurt ou com a lituraterra da psicanálise; ou discutem o número de vezes, 125, em que neles aparece a palavra coração. Sendo mais frequente na obra, só para constar, a palavra mar — em Mensagem, 35 vezes; no seu mais longo poema, “Ode marítima”, 46; mais 13, em fragmento de uma “Ode to the sea” que escreveu como Alexander Search; muito mais, parei de contar quando o número se aproximava das duas centenas. Nem proponho uma nova interpretação de Pessoa — que também muitas existem, para todos os gostos. Reduzidos, então, os bons propósitos dessas páginas, a serem simples guia para não iniciados.»  in  "Um quase-prefácio”
Sinopse
«Conheci Fernando Pessoa em 1966, pela voz de João Villaret. Foi o começo de uma paixão que até hoje me encanta e oprime.»
Enamorado desta figura de romance por escrever e de uma obra imensa que dispensa apresentação, José Paulo Cavalcanti Filho partiu à descoberta do homem que aqui nos dá a conhecer, de corpo inteiro: um Fernando Pessoa multifacetado, homem vaidoso, com dons de inventor e astrólogo, de ambições desmedidas e existência modesta; uma vida banal e triste para uma obra verdadeiramente universal.
Da reconstituição das esferas culturais da época aos pormenores do quotidiano, Cavalcanti decifra a vida por trás das palavras, a solitária multidão de um só Pessoa.
Imprensa
«A mais completa e detalhada reconstituição que jamais se fez da vida do autor.»
Revista Veja
«Vinte anos levantando fontes inéditas de Pessoa.»
Revista Época
«Novidades surpreendentes sobre o genial poeta português. Mundo das letras em polvorosa.»
El País
«Primeira biografia escrita por um brasileiro e talvez a mais ampla.»
O Globo
«Cavalcanti descobriu que podia retratar o poeta a partir de seus próprios escritos.»
O Estado de São Paulo
Outras opiniões
«O que o grande escritor português nos deixou é uma vida-obra, ou obra-vida, sendo uma coisa indissociável da outra. Sei que José Paulo partilha esta ideia, e sei que dedicou vários anos a documentá-la.»
Richard Zenith
«A ideia de erigir sobre o caos documental pessoa uma “quase autobiografia” diz bem do prolongado envolvimento de José Paulo com a obra do poeta e da generosa franqueza com que necessariamente a si mesmo se desvela nessa expedição.»
Tereza Sobral Cunha
«Bem-vinda seja esta descoberta de José Paulo.»
Eduardo Galeano
Li este livro impressionante em suspense, mesmo sabendo, desde o início, que o herói morre no fim. E José Paulo revela nele a figura perfeita do anti-herói. Descreve-o com amplitude e detalhes que ele próprio não saberia repetir. Que admirável esforço perseguindo essa vida! E que admirável revelação de biógrafo!»
Millôr Fernandes
Fonte E-cultura

Sons de Angola

Angola tem sons e tons únicos. Gentes que cantam e que sonham. Angola é terra , é continente . Angola  chora, geme, grita,  sorri . Angola vive e revive nas vozes dos seus cantores. Waldemar Bastos, voz ímpar de Angola, fá-lo com mestria em " Ndapandula".


terça-feira, 17 de abril de 2012

Simplesmente Amo-te

Soneto – X L I V
Saberás que não te amo e que te amo
posto que de dois modos é a vida,
a palavra é uma asa do silêncio,
o fogo tem uma metade de frio.

Eu te amo para começar a amar-te,
para recomeçar o infinito
e para não deixar de amar-te nunca:
por isso não te amo todavia.

Te amo e não te amo como se tivesse
em minhas mãos as chaves da fortuna
e um incerto destino desditoso.

Meu amor tem duas vidas para amar-te.
Por isso te amo quando não te amo
e por isso te amo quando te amo.
Pablo Neruda, in “Cem Sonetos de Amor” Ed. Campo das Letras

Eu Simplesmente Amo-te
Eu amo-te sem saber como, ou quando, ou a partir de onde. Eu simplesmente amo-te, sem problemas ou orgulho: eu amo-te desta maneira porque não conheço qualquer outra forma de amar sem ser esta, onde não existe eu ou tu, tão intimamente que a tua mão sobre o meu peito é a minha mão, tão intimamente que quando adormeço os teus olhos fecham-se.
Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor" , Editora Campo das Letras

Não te quero senão porque te quero

Não te quero senão porque te quero
E de querer-te a não querer-te chego
E de esperar-te quando não te espero
Passa meu coração do frio ao fogo.

Te quero só porque a ti te quero,
Te odeio sem fim, e odiando-te rogo,
E a medida de meu amor viageiro
É não ver-te e amar-te como um cego.

Talvez consumirá a luz de janeiro
Seu raio cruel, meu coração inteiro,
Roubando-me a chave do sossego.

Nesta história só eu morro
E morrerei de amor porque te quero,
Porque te quero, amor a sangue e fogo. 
Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor" , Editora Campo das Letras

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Neste mundo há lugar para todos

"Queremos todos ajudar-nos uns aos outros. Os seres humanos são assim. Queremos viver a felicidade dos outros e não a sua infelicidade. Não queremos odiar nem desprezar ninguém. Neste mundo há lugar para toda a gente. E a boa terra é rica e pode prover às necessidades de todos.
O caminho da vida pode ser livre e belo, mas desviámo-nos do caminho. A cupidez envenenou a alma humana, ergueu no mundo barreiras de ódio, fez-nos marchar a passo de ganso para a desgraça e a carnificina. Descobrimos a velocidade, mas prendemo-nos demasiado a ela. A máquina que produz a abundância empobreceu-nos. A nossa ciência tornou-nos cínicos; a nossa inteligência, cruéis e impiedosos. Pensamos de mais e sentimos de menos. Precisamos mais de humanidade que de máquinas. Se temos necessidade de inteligência, temos ainda mais necessidade de bondade e doçura. Sem estas qualidades, a vida será violenta e tudo estará perdido. O avião e a rádio aproximaram-nos. A própria natureza destes inventos é um apelo à fraternidade universal, à união de todos. Neste momento, a minha voz alcança milhões de pessoas através do mundo, milhões de homens sem esperança, de mulheres, de crianças, vítimas dum sistema que leva os homens a torturar e a prender pessoas inocentes. Àqueles que podem ouvir-me, digo: Não desesperem. A desgraça que nos oprime não provém senão da cupidez, do azedume dos homens que têm receio de ver a humanidade progredir. O ódio dos homens há-de passar, e os ditadores morrem, e o poder que tiraram ao povo, o povo retomá-lo-á. Enquanto os homens morrerem, a liberdade não perecerá."
Charles Chaplin, in  Discurso final de «O Grande Ditador»

A Essência de Madredeus

Beatriz Nunes é a nova voz dos Madredeus que surge em "Essência", o  último e  novo registo do grupo  que acaba de ser  lançado.
Com "Essência" os Madredeus  preparam-se para festejar os seus 25 anos. São novas versões de 13 temas seleccionados entre as quase duas centenas que fazem parte do repertório da banda.
Teresa Salgueiro, assim como a maior parte dos músicos da formação original, deram entretanto lugar a novos elementos, entre os quais se destaca Beatriz Nunes, a nova vocalista em estreia neste disco de 13 faixas.
À guitarra clássica de Pedro Ayres de Magalhães e aos sintetizadores de Carlos Maria Trindade juntam-se agora as cordas de Varrecoso e de António Figueiredo e Luís Clode.
"Jorge Varrecoso, violista da Orquestra do São Carlos que também  integra a nova formação do Madredeus, terá dado o primeiro passo na direcção desta 'Essência' quando propôs a Pedro Ayres que se vestisse o repertório clássico deste ensemble com novos arranjos. Primeiramente para um novo espectáculo, que depois desembocou naturalmente neste novo registo", refere o texto de apresentação. Fonte Expresso
Madredeus com a  voz de Beatriz Nunes em " Estrada da Montanha" do álbum " Essência"