Biografia
Para Marco Pólo Passos
Cheguei com dezessete anos de esperança...
sem recurso
sem norte
sem uma referência sequer.
Passageiro de destino,
trazia uma ferida aberta pela súbita orfandade
e na memória um coração paterno destroçado.
Trazia uma única saudade,
o coração ancorado na distância
e um sonho prometido no sacrário da alma.
Numa mala de papelão
trazia os meus tesouros:
um terno de formatura azul-marinho,
o diploma ginasial,
minhas primeiras letras
e uma certidão de nascimento desbotada.
Uma escada lúgubre e empinada
o quarto mais barato da pensão
seis metros enquadrados
partilhados com um motorista de ônibus urbano... rude e desonesto,
o telhado inclinado sobre as camas
o arrulho amoroso das pombas
uma clarabóia que se abria para o céu
um aluguel adiantado
a matrícula no colégio público
o “sortido” dos primeiros dias
o pão nosso dos últimos dias
o derradeiro centavo
a fome
o terceiro dia
o desencanto
e a imensa solidão do mundo.
Um banco solitário
um pânico silencioso, resignado e calmo
a morte na alma.
As horas passam
os transeuntes passam
indiferentes à minha dieta de água e impotência.
À luz do meio dia... uma discreta agonia
e de repente... um grito...
meu apelido da infância...
um abraço inesperado, fraterno e conterrâneo...
quando...? onde...? como...? venha comigo Lelo...
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obrigado Marco Polo por aquela bandeja farta
pelos primeiros amigos
por tudo...
e sobretudo...
obrigado
pela tua mão invisível, Senhor...
que desde sempre amparou meus passos.
Todos somos de - certo modo - passageiros na vida, no deambular por tantos lugares e pessoas, sim!..., porque percorremos também as pessoas, inúmeras vezes detalhadamente, como se fossem (e são!) também mapas geográficos com os seus próprios códigos, os seus percursos, os seus contormos, as suas entrelinhas, o seu paralelismo. Mesmo quando não descobrimos destino, apercebemo-nos que o destino está em nós...Somos nós! - V.
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