"A política lança o maior desafio à acção. Toda a acção é incerta e necessita de uma estratégia, isto é, de uma arte de agir em condições aleatórias e adversas. Mas a acção política é um jogo particularmente incerto em que as acções podem provocar reacções que a destruam, em que o efeito pode atraiçoar a intenção , em que os fins se podem transformar em meios e os meios em fins. O mais impressionante e frequente em política é a derivação, a perversão e o desvio da acção. Por isso a observação de Saint–Just tem mais valor do que nunca: “ Todas as artes têm produzido maravilhas, só a arte de governar tem produzido apenas monstros.” Não é que todas as acções políticas tenham sido animadas pela ambição , pela sede de poder, pelo ubris, isto é, pelo pior ou pelo delírio. Pelo contrário, são inúmeros os actos políticos inspirados pelo amor à cidade e à humanidade, pela dedicação, pela vontade de edificar um mundo melhor. Mas como na tragédia de Goethe , em que as boas intenções de Fausto provocam a perda de Margarida, enquanto as más acções de Mefistófeles acabam por a salvar, também em política de boas intenções está o Inferno cheio, ao passo que as intenções infernais desencadeiam em reacção intervenções benéficas.
(…) A pobreza de pensamento e a riqueza de ilusões políticas contribuem para nos conduzir a tragédias e desastres. (…)Embora consistindo em jogos e conflitos de interesses, de forças, de poderes, de classes, de ideologias e de delírios, a política é, no seu cerne, um jogo do erro e da verdade. Por outras palavras , não é destituído de importância, não é acessório, antes é vital não nos enganarmos em política, e é vital que a política, que transporta consigo as nossas aspirações, não se engane nem nos engane. "
Edgar Morin, in “ As grandes questões do nosso tempo”, Notícias Editorial,1983
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