«Há épocas de tal corrupção, que, durante elas, talvez só o excesso do fanatismo possa, no meio da imoralidade triunfante, servir de escudo à nobreza e à dignidade das almas rijamente temperadas».
«A hipocrisia, suprema perversão moral, é o charco podre e dormente que impregna a atmosfera de miasmas mortíferos e que salteia o homem no meio de paisagens ridentes: é o réptil que se arrasta por entre as flores e morde a vítima descuidada».
«É o progresso das ideias que traz as reformas, e não o progresso dos males públicos quem as torna inevitáveis».
«A indiferença silenciosa, grave, quase benévola, é a manifestação legítima da morte de toda a crença».
Alexandre Herculano nasceu em 27 de Março de 1810 e faleceu com 67 anos. Foi um homem de uma extraordinária dimensão : poeta, historiador, político, jornalista, agricultor, romancista, polemista, tradutor. A sua excepcional capacidade projectou-o para além do seu tempo.
A Historiografia moderna deve-lhe a sua fundação. Os quatro volumes da " História de Portugal" foram por ele redigidos num tempo notável. O rigor científico da sua obra histórica provocou algumas duras reacções na época, nomeadamente por parte do Clero porque negou lendas de carácter religioso tais como a aparição de Cristo em Ourique. Austero e religioso era um investigador íntegro e independente
(...) "Era um homem de acção que lutou toda a vida, sem transigências, por convicções e princípios, descreve Isabel Mateus. Não actuava "ao sabor das conveniências e interesses dominantes nos meios ligados ao poder". Só assim, e com uma "notável frontalidade e coragem", poderia ter criado tantas polémicas e defendido tantos projectos. Mas Herculano acreditava apaixonadamente na liberdade de expressão, melhor, "no respeito pela dignidade do ser humano, nas liberdades individuais". Tinha um "profundo humanitarismo", refere Isabel Mateus. Esta convicção guiou a sua acção política. No ano em que também se comemora o centenário da República, evocar Herculano é particularmente importante, pois ele foi um dos seus acérrimos defensores. Embora, tivesse nascido um século antes da proclamação da República era seu apologista e um convicto adverso ao absolutismo miguelista , facto que o obrigou a emigrar para França, onde frequentou a Biblioteca de Rennes. Alguns dos seus mais belos poemas foram escritos, nessa época, na condição de " trovador do exílio" como ele próprio se intitulava.
Consciente do potencial do indivíduo enquanto cidadão, acreditava que Portugal seria um país progressista, se apostasse nos seus valores humanos e "não tanto em termos materiais", continua a investigadora. Aliás, é enquanto deputado pelo Porto que defende, por exemplo, a aplicação de um plano de ensino popular.
No seu percurso político assume também ser contra a centralização do poder, em prol do "poder municipal, o mais vivaz, o mais activo, o mais popular de todos os poderes", dizia, segundo Carlos Novais, autor de Alexandre Herculano - Opúsculos Tomo I. Nesta composição de textos, e à semelhança do que ainda hoje muitos defendem, Herculano afirma que "todos os interesses que deviam ser zelados por municípios estão à mercê de um ministro que reside em Lisboa, e que nem os conhece, nem devidamente os aprecia".
No"Dicionário de Literatura" de Jacinto Prado Coelho pode ler-se o seguinte sobre a morte de Alexandre Herculano:"Em 1877, apagava-se a chama do homem de maior prestígio intelectual e moral da sua geração. Personalidade completa, acabada, se as há. Capaz da paciência beneditina da investigação, tanto como da penetrante agudeza da crítica histórica ou literária; dotado da visão arquitectónica na ordenação das ideias, tanto como da imaginação efabuladora de romancista e dramaturgo ( fez representar um drama: O Fronteiro de África), não lhe faltando a emotividade que se exprime por alguns dos mais belos poemas do seu tempo - o que não lhe impede a lucidez com que sabe encarar os problemas de ordem prática da sua lavoura ou do país."
Alexandre Herculano foi um progressista, um humanista e um homem de princípios e causas. É uma das maiores figuras portuguesas. Além de ter sido um cidadão probo e justo, um político coeso e humanista, lançou com mestria os germens da modernidade, mas o seu bicentenário mal foi assinalado. Portugal não valoriza os seus notáveis. A maioria é lançada a um obscuro esquecimento. A grandeza de um país também se mede pelo modo como se trata quem o faz engrandecer.
A Vitória e a Piedade
Eu nunca fiz soar meus pobres cantos
Nos paços dos senhores:
Eu jamais consagrei hino mentido
Da terra aos opressores
Mal haja o trovador que vai sentar-se
A porta do abastado,
O qual com ouro paga a própria infâmia
Louvor que, foi comprado.
Desonra àquele, que ao poder e ao ouro
Prostitui o alaúde!
Deus à poesia deu por alvo a Pátria,
Deu a glória e a virtude.
Livre o poeta seja,
E em isento a inspiração transforme
Que na sua alma adeja.
Alexandre Herculano
Alexandre Herculano é um dos grandes, mas a alma pequena destes nossos governantes não o sabe. A nossa Cultura é muito maltratada.
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